domingo, 1 de setembro de 2013

OPINIÃO DO DIA – Marco Aurélio Mello: homenagem

Os reeducandos da Papuda estão homenageados

Marcos Aurélio Mello, Ministro do STF ironizando a decisão da Câmara

Casa de suspeitos - O saco de gatos da Casa Civil

Ex-assessor suspeito de pedofilia e estupro é preso no Paraná, mas órgão ligado à Presidência ainda emprega servidor acusado de tentar furar uma blitz de trânsito

Paulo de Tarso Lyra e Karla Correia

A Casa Civil está novamente no centro das atenções por denúncia de irregularidades praticadas pelos servidores. A ministra Gleisi Hoffmann foi convidada pela Comissão de Fiscalização e Controle da Câmara para dar explicações sobre o ex-assessor da pasta, Eduardo André Gaievski, preso ontem depois de passar nove dias foragido, acusado de pedofilia e aliciamento de menores durante o período em que foi prefeito de Realeza (PR). Além disso, o subchefe de Articulamento e Monitoramento da pasta, Luis Antonio Tauffer Padilha, teve a carteira de habilitação cassada após furar um bloqueio policial em Brasília. E o subchefe de assuntos jurídicos, Ivo Corrêa, é pressionado pela oposição a dar explicações na Comissão de Ética da Presidência por já ter sido diretor de relações governamentais do Google.

Ontem, por volta das 6h, Eduardo André Gaievski foi detido por policiais civis em Foz do Iguaçu (PR) e transferido para Curitiba. Ex-prefeito de Realeza, no sudoeste do Paraná, ele deixou o cargo de assessor especial da Casa Civil em 24 de agosto, logo depois de ter um mandado de prisão preventiva expedido contra ele. Petista, Gaievski é investigado por estupro de vulnerável. Segundo o advogado Natalício Farias, que representa a família de três supostas vítimas, Gaiesvski teve ajuda de outras mulheres para levar meninas de 13 e 14 anos a motéis. Os favores sexuais eram retribuídos com dinheiro e cargos na prefeitura. Na última segunda-feira, a Executiva do PT no Paraná suspendeu Gaievski do partido. As investigações estão a cargo do Ministério Público do Paraná em Foz de Iguaçu e da Polícia Civil.

Tauffer Padilha, cuja retenção da habilitação foi publicada no Diário Oficial do Distrito Federal de 23 de fevereiro de 2012 por ter tentado romper uma barreira policial durante uma blitz de trânsito, não é um servidor qualquer. Apontado como um dos cabos eleitorais da chefe da Casa Civil, ministra Gleisi Hoffmann, durante as eleições para o senado em 2010, Padilha ocupa atualmente o mesmo cargo exercido por Miriam Belchior — atual ministra do Planejamento — durante o governo de Luiz Inácio Lula da Silva.

Na época, ela era responsável por assessorar a então chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, com o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). A condução do PAC migrou para o Planejamento com Miriam Belchior, o que, em tese, esvaziou um pouco a subchefia de Articulação e Monitoramento. Mas Padilha ainda exerce o papel de negociações com prefeituras, atua nas nomeações para o Ministério das Cidades e tem trabalhado para emplacar aliados na Autoridade Pública Olímpica (APO). Por meio da assessoria da Casa Civil, Tauffer Padilha disse que não furou o bloqueio de trânsito e que recorreu da multa.

Já Ivo Corrêa teve sua atuação como diretor do Google publicada pelo Correio na edição de 15 de julho. A reportagem mostra que ele abdicou do cargo de servidor do Ministério do Planejamento para trabalhar como diretor de Relações Governamentais do Google. Quando foi nomeado para a subchefia de Assuntos Jurídicos da Casa Civil, passou a analisar, entre outras questões, o marco civil da internet o que, em tese, configura conflito de interesse.

A assessoria da Casa Civil respondeu que, para a contratação de qualquer servidor em cargos de confiança na administração pública federal, o governo realiza uma pesquisa com instrumentos de uso estrito dos órgãos de inteligência. A investigação se dá antes do ato da nomeação e não existem monitoramentos posteriores, tampouco previsão de revisão destes procedimentos. Segundo a nota, no caso específico de Gaievski, ainda é preciso ser levado em conta que o processo corria em segredo de justiça.

Memória

Alvo de denúncias

Desde que o PT assumiu o poder, em 2011, a Casa Civil da Presidência da República tem sido um foco de problemas para o Palácio do Planalto. O primeiro titular da pasta, José Dirceu, foi condenado pelo Supremo Tribunal Federal a 10 anos e 10 meses de prisão por comandar o esquema do mensalão. Nomeado para o cargo no início da gestão de Dilma Rousseff, Antonio Palocci caiu após as denúncias de que teria tido uma evolução patrimonial de 20 vezes, saltando de R$ 375 mil para R$ 7,5 milhões entre 2006 e 2010, quando foi deputado federal.

No fim do segundo mandato de Lula, a então ministra Erenice Guerra também foi obrigada a deixar a pasta. Em setembro de 2010, denúncias divulgadas na imprensa acusaram Israel Guerra, filho de Erenice, de participar de um esquema de tráfico de influência, em que cobraria propina de 6% para facilitar negócios com o governo.

Antes mesmo do mensalão, no entanto, a Casa Civil já produzia escândalos. Foi de lá que saiu a primeira crise do governo Lula. Em 2004, veio a público a gravação de um vídeo em que o então subchefe de Assuntos Parlamentares do Planalto aparecia cobrando propina do bicheiro Carlinhos Cachoeira para o PT e para si. A gravação era de 2002, quando Waldomiro presidia a empresa de loterias estaduais do Rio de Janeiro, a Loterj, no governo de Anthony Garotinho. Quando o vídeo foi divulgado, Waldomiro elaborava uma medida provisória para legalizar os bingos do país, que acabou abortada. Em 1º de março de 2012, a Justiça do Rio condenou o servidor a 12 anos de reclusão, três anos de detenção e multa de 170 mil reais. Ele ainda pode apelar em liberdade da sentença.

Fonte: Correio Braziliense

Mensalão o julgamento - STF discutirá prisão imediata de condenados

Caso conclua análise de recursos dos últimos seis réus, Supremo pode determinar detenções já nesta semana

Ministros vão definir se cumprimento das penas do mensalão terá início antes da análise de novas contestações

Com apenas seis recursos para serem julgados e a possibilidade de conclusão da atual fase de julgamento do mensalão nesta semana, o Supremo Tribunal Federal (STF) terá de decidir se vai decretar a prisão imediata dos condenados ou se aguardará a apresentação de novos recursos.

Em pelos menos dois casos já julgados pela corte, mandados de prisão foram expedidos logo após a rejeição do primeiro tipo de recurso.

Em outro caso mais recente, o do deputado Natan Donadon (ex-PMDB-RO), o tribunal preferiu aguardar a análise de todos os recursos possíveis antes de mandar o deputado para a prisão.

No mensalão, há duas situações a serem discutidas. Concluída a atual fase do julgamento, que analisa os chamados embargos de declaração --que servem para corrigir eventuais obscuridades, omissões ou contradições no acórdão que resume o que foi decidido no julgamento--, os ministros terão de avaliar se os embargos infringentes poderão ser apresentados.

Se aceito, esse recurso levaria à realização de um novo julgamento nos crimes em que os condenados receberam pelo menos quatro votos favoráveis pela absolvição.

Maior julgamento da história do STF, o mensalão condenou 25 réus. Desses, 12 tiveram votos suficientes para a apresentação de embargos infringentes, entre eles o ex-ministro José Dirceu e o ex-presidente do PT José Genoino.

O problema é que, apesar de previsto no regimento interno do tribunal, esse tipo de recurso não consta numa lei de 1990 que regula a tramitação de processos no STF e no Superior Tribunal de Justiça. Por isso, haverá debate para saber se eles são válidos.

Caso a existência dos infringentes seja rejeitada, o STF terá de discutir em que momento vai determinar a execução das penas.

Histórico

Em 2007 e 2008, a corte enviou para a prisão dois réus justamente nessa fase do julgamento. Os irmãos Luis Gonzaga Batista Júnior e Luiz Gonzaga Batista Rodrigues, acusados de homicídio, tiveram de começar a cumprir suas penas logo após a rejeição dos embargos de declaração.

Joaquim Barbosa foi o relator das ações e, em seu voto, determinou a prisão. Ele foi acompanhado pelos colegas.

No caso de Donadon, a prisão só foi determinada após o julgamento do recurso conhecido no meio jurídico como "embargos dos embargos de declaração".

Caso a corte entenda que os chamados embargos infringentes são cabíveis no mensalão, uma outra discussão será inevitável.

O tribunal terá de decidir se determina o início do cumprimento da pena de 13 dos 25 réus que não têm direito a esse tipo de recurso --entre eles, estão o deputado Valdemar Costa Neto (PR-SP) e o delator do mensalão, Roberto Jefferson-- ou se aguardará o julgamento dos infringentes dos outros réus para definir o futuro de todos.

Ministros ouvidos pela Folha disseram que, caso os infringentes sejam aceitos, o novo julgamento que resultará desse tipo de recurso dificilmente será concluído antes do fim do ano que vem.

Fonte: Folha de S. Paulo

Um apagão a cada ano

Forte reduto político de Dilma, o Nordeste sofreu três grandes blecautes em sua gestão, o que força a presidente a agir no setor

Um grande apagão por ano

Ex-ministra de Minas e Energia, presidente Dilma tem o desafio de recuperar o sistema energético brasileiro

Felipe Lima e Giovanni Sandes

Não bastassem as turbulências política e econômica, a presidente Dilma Rousseff vive um inferno astral na sua área de origem, a energética. Ela começou no Rio Grande do Sul como secretária estadual de Minas e Energia e foi nesse setor que, com sua fama de gerente eficiente, aos poucos alçou voo para a principal cadeira do Planalto. Após assumir a Presidência da República, porém, Dilma amarga a média de ter em seu governo ao menos um grande apagão por ano no Nordeste, importante reduto político nas três últimas eleições - e uma região que, certamente, pesará no embate de 2014.

Nenhum governante quer apagões em seu governo pelo dano político. A própria expressão "apagão" nasceu do racionamento nacional de energia em 2000 e 2001, último ano do governo Fernando Henrique Cardoso, quando a falta de planejamento deixou o País inteiro no risco de ficar sem luz. Além do custo político, há também o financeiro.

Segundo técnicos do governo federal, só no blecaute da última quarta-feira o prejuízo no Nordeste chegou a R$ 385 milhões.

A causa do novo apagão seria uma queimada abaixo de uma linha de transmissão, os longos cabos que levam a energia das usinas até as distribuidoras estaduais, como a Celpe, que fornecem para cidadãos e empresas.

"Interrupções de energia geram grandes prejuízos. Um sistema que nunca desligue é muito caro, a gente entende. Mas é preciso no mínimo questionar se não há algo a se fazer. Uma queimada não deveria desligar toda uma região", diz Camila Schoti, coordenadora de Energia Elétrica da Associação Brasileira dos Grandes Consumidores Industriais de Energia (Abrace).

Em 3 de fevereiro de 2011, foi uma falha em uma placa eletrônica do tamanho de uma caixa de pizza que iniciou um apagão de até 4 horas em algumas localidades do Nordeste. Ano passado se descobriu que a demora na volta da luz ocorreu por trapalhadas como a dificuldade em se abrir um mero portão.

Em 2012, os blecautes se espalharam no País. O Nordeste apagou em outubro. "O que temos visto é a frequência com que os problemas estão ocorrendo, que já deixou de ser razoável. É um indicador forte de que as escolhas do setor elétrico não estão sendo bem sucedidas", afirma Cláudio Sales, presidente do Instituto Acende Brasil.

Uma das fraquezas do Nordeste é consumir 8 mil megawatts (MW) e gerar 6 mil MW, ou seja, mesmo com usinas, "importar" energia do Sul e Sudeste.

"Isso já nos torna, infelizmente, dependentes do sistema. E o ponto mais frágil do conjunto são justamente as linhas de transmissão que cortam Tocantins e Piauí. Quando há um problema como ocorreu semana passada, há algo como uma queda de um castelo de cartas", conta João Paulo Aguiar, diretor do Instituto Ilumina.

"Essas linhas de transmissão são como autopistas de energia. Automaticamente, softwares do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) determinaram o desligamento de linhas seguintes e a região ficou sem abastecimento. É, grosso modo, como o disjuntor de uma casa desligar quando há grande oscilação de energia. Se isso não ocorresse a variação seria de tal maneira que os reflexos seriam graves", conta Nivalde de Castro, coordenador do Grupo de Estudos do Setor de Energia Elétrica da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

Em tese, poderia haver redundâncias, mais linhas entre a mesma origem e destino. Mas a conta é muito cara para uma rede apenas reserva - o Brasil possui hoje 100 mil quilômetros de linhas, duas voltas e meia na Terra pela Linha do Equador.

Só há redundância em Itaipu Binacional, a usina entre o Brasil e o Paraguai que atende 20% do País, uma área crítica. "Em um linha como a que resultou no apagão de quarta-feira, não há justificativa para mais de uma rede de transmissão", esclarece Nivalde.

Fonte: Jornal do Commercio (PE)

De Pernambuco para a Sapucaí

2014. Em ano eleitoral, escola de samba homenageia Estado no Carnaval do Rio e pode ajudar Eduardo Campos a ser mais conhecido

Bruna Serra

Ano eleitoral, 2014 fará o governador Eduardo Campos (PSB), literalmente sambar na ponta dos pés. Isso porque a cultura do Estado deve ser vista evoluindo na passarela do samba na Marquês de Sapucaí, no Rio de Janeiro, cidade que tem o Carnaval mais famoso do mundo. A agenda positiva em ano de campanha chega porque Pernambuco será o tema do enredo do próximo ano da escola da samba Mocidade Independente de Padre Miguel.

O enredo "Pernambucópolis" vai levar Pernambuco para a Sapucaí relembrando um dos mais renomados carnavalescos do País, Fernando Pinto. De quebra, ajudará o governador a ficar mais conhecido Brasil afora. O tema está sendo desenvolvido pelo carnavalesco carioca Paulo Menezes, que no início do ano esteve no Estado, junto com o diretor da escola, Paulo Viana, em busca de patrocínio para o desfile.

De acordo com Menezes, a ideia de homenagear o Estado surgiu devido a forte identidade cultural que apresenta, abrindo possibilidades de se explorar diversas vertentes da cultura pernambucana em todas as alas do desfile.

"Um verdadeiro passeio cultural por Pernambuco. Vamos falar do povo, da terra. De tudo que é cultura dentro de Pernambuco. É um enredo totalmente autoral e não tem conexão nenhuma com política", resumiu Menezes, ao ser questionado se a escola não poderia terminar beneficiando um presidenciável.

Apesar da visita ao Estado, a diretoria da Mocidade - que foi recebida pelo secretário estadual de Cultura, Fernando Duarte (PT) - ainda não conseguiu captar verbas para o Carnaval, que, no ano passado, chegou a movimentar quase R$ 2 bilhões, segundo a Prefeitura do Rio de Janeiro.

O samba-enredo, composto pelo sambista Dudu Nobre, ganhou o reforço do cantor pernambucano Lenine, e apesar de tratar o Estado com clichês linguísticos como "arretado" e "vixe Maria", exalta o folclore popular, o frevo e o forró.

"Ah meu Pernambuco, sou mameluco, do Norte sou leão. Um peregrino personagem de Cordel, levo comigo meu ‘padinho Padre Miguel’. Eu danço frevo até o dia clarear no colorido do folclore popular. Abre a sombrinha que o ‘galo’ madrugou. Também tem festa em Olinda, meu amor", diz o refrão do samba.

Paulo Menezes ressalta que o enredo foi eleito quatro vezes como o melhor do Carnaval carioca, com cerca de 80% de aprovação do público em enquetes realizadas com todas as escolas do Rio em sites da internet. "Vencemos todas as enquetes e na mídia estamos muito bem alinhados. Com certeza, faremos um grande e maravilhoso desfile, no Carnaval de 2014", finalizou o carnavalesco.

Fonte: Jornal do Commercio (PE)

Marina evita, mas aliados já discutem futuro sem Rede

Segunda colocada nas pesquisas eleitorais, Marina Silva se recusa a discutir, até mesmo a portas fechadas, um plano B para a sucessão presidencial de 2014 se não conseguir registrar seu partido, a Rede de Sustentabilidade, dentro do prazo exigido pelo Tribunal Superior Eleitoral. Apesar da cautela da ex-senadora, dirigentes da Rede que são detentores de mandato parlamentar já começam a pensar no futuro caso o projeto naufrague.

Para poder ter candidatos em 2014, a Rede precisa ser criada até 5 de outubro, mas tem enfrentado dificuldades para certificar as 492 mil assinaturas necessárias para obter o registro.

Sem uma legenda própria, Marina teria de procurar um partido para abrigar seu projeto de poder que oferecesse "um mínimo de conforto programático", como diz um operador político da Rede. O espectro é pequeno, mas traz opções. Amais viável seria o retomo ao PV, sua antiga legenda. Outras alternativas aceitáveis seriam o PDT, PPS e até 0 novato PEN, que poderia ser moldado à imagem e semelhança de Marina.

Todas essas siglas se dizem abertas ao diálogo e já abrigam militantes ligados a Rede. O problema é que uma eventual migração poderia deixar os parlamentares do grupo sem mandato, já que a lei só permite mudança para partidos recém-criados.

Para a maioria dos políticos que estão na linha de frente do movimento pela criação da Rede, a permanência em suas amais legendas se tomou insustentável. Deputado federal eleito pelo Rio, Alfredo Sirkis explodiu pontes com o PV, partido que ajudou a criar. Ele já sabe que não seria fácil conseguir a legenda para tentar renovar o mandato. "O grupo do (José Luiz) Penna (presidente nacional do PV) quer ver a minha caveira", afirma. Se eu quiser, sou candidato pelo PV pelas vias legais. Mas eu não sei se quero isso, Estou extremamente calmo, enfrentando essa situação com muita tranqüilidade, até porque eu não sou político, estou político"

O mesmo dilema vive o deputado federal Domingos Dutra (PT-MA). Ele anunciou publicamente que não fica na sigla se os petistas mantiverem a aliança com a família Sarney no Estado, hipótese mais provável. Dutra não esconde que, caso a Rede não saía do papel, vai buscar outras alternativas. "Estou acompanhando (o processo no TSE)y mas só vou pensar numa alternativa a partir do dia 20 de setembro. Aí eu vou ver se fico no PT ou se vou para outra sigla". PSOL, PDT e PSB já se ofereceram para abrigar o dissidente.

Na semana passada, o diretório paulistano do PSDB aprovou a expulsão do deputado federal Walter Feldman (SP). A decisão não deve ser endossada pelas demais instâncias da sigla, mas criou um constrangimento caso o parlamentar decida ficar entre os tucanos. "Apesar da iniciativa do diretório municipal, eu tenho uma relação muito carinhosa com o PSDB. Se a Rede não sair, não veria problema em ficar no partido", desconversa Feldman,

Embora tenha mandato garantido até 2016 na Câmara Municipal do Rio* o vereador Jefferson Moura já foi comunicado que não terá mais espaço nenhum em seu partido, o PSOL. "Ele está em um mato sem cachorro. Nem o grupo dele o aceitaria de volta", afirma o deputado federal Chico Alencar (PSOL-RJ). Já a ex-senadora e hoje vereadora.em Maceió Heloísa Helena, ex-presidente do partido e aliada de Marina, teria espaço para negociar. "Ela tem se distanciado muito da direção do PSOL até em Alagoas, mas foi uma fundadora do partido. Levaríamos isso em consideração", pondera o deputado Ivan Valente (SP), presidente nacional da legenda.

0bsfáenl@5B Com medo de ficar de fora da disputa eleitoral do ano que vem, a Rede ingressou na segunda-feira com 0 pedido de registro no TSE mesmo sem cumprir os requisitos prévios para apresentar a solicitação. Até agora, o grupo conseguiu certificar cerca de 60% das assinaturas necessárias e criou apenas um dos nove diretórios estaduais exigidos pela lei.

Para agilizar o processo, os marineiros chegaram a pedir para que as assinaturas de apoio à criação da legenda fossem validadas pelos cartórios eleitorais sem a checagem da veracidade dos dados apresentados. O pedido foi negado pela ministra Laurita Vaz, relatora do caso.

Outras 200 mil assinaturas ainda aguardam o crivo dos cartórios, mas o número pode não ser o suficiente, devido ao elevado índice de rejeição das fichas em alguns Estados. Amanhã, a Executiva provisória da sigla se reúne em Brasília para fazer um balanço da situação.

Fonte: O Estado de S. Paulo

Cartório vê falta de estrutura no partido

Campeão de rejeição de assinaturas em SP rebate críticas de Marina à Justiça Eleitoral

O cartório da 257ª Zona Eleitoral, na Vila Prudente, região leste de São Paulo, invalidou mais da metade das assinaturas enviadas pela Rede Sustentabilidade, partido que a ex-senadora Marina Silva tenta criar. É um dos maiores volumes de rejeições na cidade, segundo os apoiadores da futura sigla. Os fiscais alegam que as assinaturas não conferem com as do cadastro.

O trabalho de conferência, ficha por ficha, geralmente é feito por 6 dos 11 funcionários que trabalham no local. Mas, quando a coisa aperta, para não descumprir o prazo legal de 15 dias para emitir as certificações, até o chefe do cartório, Fernando Ruiz Zambrano, faz o serviço.

A demora dos cartórios para certificar as assinaturas e a quantidade de fichas invalidadas sem justificativa/têm sido apontado pela Rede como os principais obstáculos para conseguir o registro do partido no Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

O advogado da sigla, Torquato Jardim, diz que os maiores problemas estão em São Paulo e no Distrito Federal. Enquanto a média nacional de rejeição é de 18%, nesses lugares passa dos 30%.

Zambrano explica que o processo demanda certo tempo porque é 100% manual. A ficha de cada eleitor é checada nos cadernos de votação da eleição anterior. Se a assinatura não conferir, outros documentos disponíveis são consultados.

Para evitar fraudes, a equipe diz ser muito criteriosa ao conferir as assinaturas. A funcionária Sandra Mara Benedicto Alves, que trabalha há cinco anos no cartório, conta que, no começo, demorava muito para cumprir o procedimento, mas agora, só de bater o olho na assinatura, reconhece se ela é ou não do eleitor. "A letra da pessoa é única, dá para perceber", afirma.

Zambrano defende o trabalho dos cartórios. Diz que na sua zona eleitoral não houve atrasos significativos e que o problema não é da Justiça Federal, e sim da Rede. uEles dizem que a Justiça Eleitoral não tem estrutura, mas quem não tem são eles. Falta organização. O Solidariedade, por exemplo, mandou muito mais fichas", afirma, citando a sigla que o deputado Paulinho da Força (PDT-SP) ajuda a criar. Enquanto a Rede enviou cerca de mil fichas ao cartório, o Solidariedade encaminhou o triplo.

Regras. Para formar um partido, a lei eleitoral exige que passem pelo crivo dos cartórios cerca de 492 mil assinaturas. Com medo de estourar o prazo, a Rede ingressou na última segunda-feira com o pedido de registro no TSE, mesmo sem cumprir os requisitos prévios para a solicitação. Segundo o último balanço, o grupo certificou 310 mil assinaturas. Faltam 182 mil.

A Rede diz que tem ainda cerca de 200 mil fichas em análise nos cartórios, mas esse número pode não ser o suficiente se as taxas de rejeição se mantiverem no atual patamar. No requerimento enviado ao TSE, os marineiros argumentaram que a futura sigla não poderia ser prejudicada pela morosidade do Judiciário e pediram que as assinaturas fossem validadas sem a checagem da veracidade dos dados apresentados. O pedido foi negado pela ministra e corregedora Laurita Vaz - mas ela cobrou agilidade dos cartórios e dos tribunais regionais eleitorais.

Fonte: O Estado de S. Paulo

Demora é fruto de processo antiquado – Jairo Nicolau

As dificuldades para o registro da Rede Sustentabilidade não devem ser colocadas exclusivamente na conta da inépcia de seus dirigentes. Como tem sido noticiado, boa parte da demora é fruto de um sistema arcaico de conferência de assinaturas realizado pelos cartórios eleitorais municipais.

Um modelo vulnerável a tudo que há de pior na nossa tradição burocrática: discricionariedade, deslocamento de centenas de funcionários da Justiça Eleitoral para conferir informações, boicotes. Só faltava exigir a firma reconhecida dos eleitores.

É curioso que o País que foi o primeiro a adotar a urna eletrônica em âmbito nacional e agora massifica o voto biométrico continue a registrar partidos dessa forma. Hoje seria relativamente fácil criar um sistema no qual o eleitor pudesse dar o seu apoio a um novo partido pela internet.

Para isso, basta criar um ambiente no site do TSE. Com uma senha, o número do título e algumas informações, teríamos um sistema muito mais eficiente e menos vulnerável do que o baseado nas assinaturas em papel. Sem contar que o modelo poderia ser empregado para o registro de iniciativas populares para projetos de lei. Antes que se esqueça, o direito de um conjunto de cidadãos de criar um partido é um direito fundamental nas modernas democracias. E deve ser facilitado.

O problema da nossa legislação é que ela é muito rigorosa no momento de criação e muito generosa a partir daí.

Novos partidos têm acesso aos meios de comunicação e ao Fundo Partidario antes mesmo de irem às urnas. Quem sabe não devêssemos inverter esta equação facilitar a criação, mas oferecer os recursos públicos apenas aos partidos com alguma representatividade.

Professor de Ciência Política da UFRJ

Fonte: O Estado de S. Paulo

FH aprova pacto entre Eduardo Campos e Aécio e diz que gostaria de conversar com Marina Silva

Ex-presidente culpou ‘força petista’ pela falta de diálogo entre os partidos

Lino Rodrigues

SÃO PAULO - O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) considerou positivo a formação de pacto político entre os pré-candidatos à Presidência da República, o senador tucano Aécio Neves, e o governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), visando as eleições de 2014. FH — que participou ontem, em São Paulo, de seminário temático pelos 10 anos do Tucanafro, secretariado da militância negra do PSDB — aproveitou para chamar a também candidata Marina Silva (Rede) para uma conversa. Ele ainda culpou a “força do petismo” pela falta de diálogo entre os partidos.

— Eu não sei realmente o que significa isso, e se é realmente um pacto. Acho que é positivo para o Brasil que eles (Aécio e Campos) conversem. Acho até que é lamentável que o Brasil tenha ficado, por força do petismo, nessa posição de não aceitar conversar com os outros, como se os outros fossem inimigos. Isso é muito antidemocrático. O certo é conversar. Acho muito bom e gostaria muito que a Marina (Silva) também conversasse — disse Cardoso, salientando que a presidente Dilma Rousseff, em vez de brigar, poderia conversar mais com os brasileiros:

- Eu, no lugar da presidente Dilma Rousseff, com a situação que o Brasil está, estaria fazendo um apelo para os brasileiros, em vez de estar fazendo briga entre os brasileiros — criticou ele.

Questionado sobre a possibilidde de dividir o palanque com o PSD, disse ser favorável se for feito um acordop nesse sentido. Mas lembrou que o governador Eduardo ainda não confirmou sua candidatura.

- Se for feito um acordo nesse sentido (dividir palanque), sou favorável. Mas ainda não sei se o Eduardo Campos vai ser candidato, ele ainda não confirmou. Eu gostaria que ele fosse. Porque nós precisamos ter vários pontos de vista no Brasil. O Eduardo foi um bom governador, um homem que eu gosto, tenho relação com a família dele, sobretudo com a Violeta, a tia dele, que é íntima nossa, gente que conheço e confio. Eu achei muito bom que ele possa discutir e vejo com alegria a candidatura dele.

O ex-presidente também comentou a possibilidade do partido realizar prévias para satisfazer José Serra, embora oa maioria do PSDB se inclina para Aécio e o ex-governador de São Paulo não tenha falado a ele, nem a ninguém, que é candidato

- Serra é uma pessoa que merece o nosso respeito e consideração. Ele está, naturalmente, buscando um espaço para ele. O partido tem que entender isso, não há nenhuma razão para ter qualquer reação negativa quanto a isso. O processo é democrático. Se for o caso, se faz uma prévia. Ele tem uma história, foi um grande governador, um gde ministro, um líder. O partido não pode simplesmente pegar seus líderes e não levá-los em consideração. Isso está errado avalio FH, lembrando que o partido sempre deu apoio a Serra e todas “as possibilidades de sua vida.

- Ele (Serra) foi candidato a muitas coisas e teve apoio integral e sempre foi muito considerado.

Sobre a comemoração do governo com o resultado do Produto Interno Bruto (PIB), soma de todos os bens e serviços produzidos as riquezas do país, que registrou alta de 1,5% no segundo trimestre do ano, o ex-presidente disse que também comemorou. Afinal, disse ele, quem não comemoraria uma melhora, depois de um período ruim.

— Eu também comemorei. Qual é o brasileiro que não fica feliz quando melhora? Está tão ruim, que é bom melhorar um pouco.

Fonte: O Globo

Campos defende ‘diálogo aberto’ do PSB com siglas de oposição

Governador disse que o partido não vai limitar as conversas aos aliados tradicionais

Flavio Ilha

ESTEIO – O governador de Pernambuco, Eduardo Campos, pré-candidato do PSB à Presidência da República, defendeu neste sábado em Esteio (RS) que o partido intensifique o “diálogo aberto com as forças mais diversas” da política brasileira, incluindo as siglas de oposição, antes de definir a estratégia da legenda para 2014. A declaração foi uma forma de defender a aliança estratégica firmada pelo socialista com o tucano Aécio Neves na última quinta-feira, que causou mal-estar entre líderes do PSB, especialmente no governador do Ceará, Cid Gomes.

Campos disse que o partido não vai limitar as conversas aos aliados tradicionais, entre eles o PT, porque nem sempre o PSB foi consultado em momentos decisivos da política nacional, como na campanha de 2010.

— O quadro político sofreu uma mutação muito acelerada nos últimos 90 dias. O PSB vai se colocar de maneira coerente (na discussão sobre 2014), mas sem estar preso ou amarrado a qualquer decisão prévia. Não há voz discordante, dentro do partido, sobre a conveniência de empurrarmos a definição sobre nossa estratégia apenas para 2014 — disse.

O governador visitou no sábado a Expointer, tradicional feira agropecuária do Rio Grande do Sul que recebe milhares de visitantes. Depois, foi respectivamente a Passo Fundo e a Caxias do Sul para encontros municipais do PSB. Na sexta-feira, Campos já havia cumprido agenda política em Santa Catarina.

Perguntado sobre a reação de Cid Gomes a seu encontro com Aécio Neves, Campos preferiu não alimentar a polêmica.

— Meu silêncio fala muito mais forte que qualquer palavra – afirmou.

Durante a visita à Expointer, Campos se encontrou com a senadora Ana Amélia Lemos (PP), que é uma das alternativas de palanque ao PSB no Rio Grande do Sul, que deve deixar o governo estadual, onde tem o vice-governador e a secretaria de Infraestrutura, até o final do ano. Em troca do apoio a Ana Amélia, o PP fecharia com a candidatura do líder do PSB na Câmara, Beto Albuquerque, ao Senado. Na conversa, Campos ouviu elogios da parlamentar, que deve ser candidata ao governo do estado em 2014.

— O discurso do Eduardo Campos é contemporâneo e tem força política. O país precisa desse sangue novo para fazer diferença na prática da gestão pública – cortejou a senadora.

Campos também cruzou pelos corredores da feira com o deputado estadual tucano Jorge Pozzobom. O PSDB é outro partido que pode compor uma aliança estratégia na eleição ao governo do estado em 2014. Pozzobom elogiou a aproximação entre Campos e Neves.

— A diferença entre 40 e 45 é muito pequena – lembrou Pozzobom em tom de brincadeira, referindo-se ao número de registro dos dois partidos.

Campos, entretanto, evitou especulações:

— O PSB do Rio Grande do Sul tem a nossa confiança para conduzir o debate sucessório no estado. Neste momento, não estamos tirando nenhuma posição em caráter terminativo. O PSB quer crescer com qualidade – sustentou.

Durante a visita, o governador pernambucano voltou a criticar a política econômica da presidente Dilma Rousseff apesar do crescimento de 1,5% do PIB no segundo trimestre do ano.

— Claro que torcemos para o PIB crescer mais e mais, mas o desafio agora é manter (o desempenho) no próximo trimestre. Há um certo grau de pessimismo entre os analistas. É preciso restaurar a confiança dos agentes econômicos garantindo que os fundamentos macroeconômicos continuam de pé. Se tem meta, tem que cumprir – disse, referindo à expectativa de inflação em 2013.

Fonte: O Globo

FHC defende acordo de Aécio com Eduardo Campos

Flávio Ferreira

SÃO PAULO - O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso afirmou ser favorável à formação de palanques duplos entre o PSDB e o PSB nas próximas eleições. A declaração foi feita em evento da militância negra do PSDB na manhã deste sábado (31).

Indagado sobre o acordo pré-eleitoral firmado entre o presidente do PSDB, Aécio Neves, e o governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), o ex-presidente disse: "Se for feito um acordo nesse sentido, sou favorável".

FHC disse ainda não estar informado sobre pacto e afirmou que a candidatura de Campos seria positiva para o país.

"Não sei se o Eduardo Campos será candidato, ele ainda não confirmou. Eu gostaria que ele fosse. Gostaria porque precisamos ter vários pontos de vista no Brasil. Ele foi um bom governador e gosto dele. Mas não posso deduzir daí que eles [Aécio e Campos] fizeram um pacto", disse FHC

Prévias

O ex-presidente também falou sobre a possibilidade de realização de prévias com a participação de José Serra.

"Serra está buscando espaço para ele e a gente tem que entender isso. Vamos ver quem tem maioria. Se for o caso, faz-se uma prévia. Mas o Serra ainda não disse que é candidato", afirmou.

FHC disse que a maioria do partido tem se manifestado a favor de Aécio. "Nesse momento a maioria do partido se inclina pelo Aécio Neves", disse.

Questionado se a busca de Serra por uma candidatura racharia o PSDB, o ex-presidente disse que "um partido maduro não racha assim, porque alguém tem uma aspiração e o outro também tem. Há mecanismos democráticos de solução, não tem que rachar nada".

PT

O ex-presidente defendeu conversas inclusive com Marina Silva, da Rede, e criticou o PT. "Acho lamentável que o Brasil tenha ficado, por força do petismo, nessa posição de não conversar com o outro, como se o outro fosse inimigo. Isso é muito antidemocrático".

Sobre o fato de o governo estar comemorando o resultado do PIB divulgado na sexta-feira, FHC afirmou: "Eu também comemoro. Qual é o brasileiro que não fica feliz quando melhora?. Está tão ruim, tem que melhorar um pouco".

Fonte: Folha de S. Paulo

Falando francamente - Fernando Henrique Cardoso

Não é preciso muita imaginação, nem entrar em pormenores, para nos darmos conta de que atravessamos uma fase difícil no Brasil. Mas comecemos pelo plano internacional.

Os acontecimentos abrem cada vez maiores espaços para a afirmação de influências regionais significativas. O próprio "imbróglio" no Oriente Médio, do qual os Estados Unidos saem com cada vez menos influência na região, aumenta a capacidade de atuação das monarquias do Golfo, que têm dinheiro e querem preservar seu autoritarismo, assim como a do Irã, que lhes faz contraponto. A luta entre wahabitas, xii-tas e sunitas está por trás de quase tudo. E a Turquia, por sua vez, encontra brechas para disputar hegemonias.

Enquanto isso, nós só faze mos perder espaços de influência na América do Sul. Nossa diplomacia, paralisada pela inegável simpatia do lulopetismo pelo "bolivarianismo", ziguezagueia e tropeça. Ora cedemos a pressões ilegítimas (como a recente da Bolívia, que não dava salvo-conduto a um asilado em nossa embaixada), ora nós próprios fazemos pressões indevidas, como 110 caso da retirada do Paraguai do Mercosul e da entrada da Venezuela. Ao mesmo tempo fingimos não ver que o "Arco do Pacífico" é um contrapeso a inércia brasileira. Diplomacia e governo sem vontade clara de poder regional, funcionários atordoados e papelões por todo lado - é o balanço.

Na questão energética, que dizer? A expansão das usinas está atrasada e sem apoio real do setor privado, salvo para construir as obras. Os caixas das empresas elétricas quebradas,graças a regulamentações que, mesmo quando necessárias, se fazem atropeladamente e sem olhar para os interesses de longo prazo dos investidores e dos consumidores. A Petrobrás, agora entregue a mãos mais competentes, mergulhada numa incrível escassez de créditos para investir e com o caixa abalado pela contenção do preço da gasolina. O que fora estrepitosamente proclamado pelo presidente Lula, a autossuficiência em petróleo, se esfumou no aumento do déficit das importações de gasolina. Agora, com a revolução americana do gás de xisto, quem sabe onde irá parar o preço de equilíbrio do petróleo para ser extraído do pré-sal?

Na questão da infraestrutura, depois de uma década de atraso nos editais de concessão de estradas e aeroportos, além das tentativas mal feitas, o governo inovou: fazem-se privatizações, disfarçadas sob o nome de concessões, com oferta de crédito barato pelo governo às empresas privadas interessadas. Dinheiro, diga-se, do BNDES (com juros subsidiados pelo contribuinte) e, ainda por cima, o governo se propõe a levar para a empreitada os bancos privados. Sabe-se lá que vantagens terão de lhes ser oferecidas para que entrem no ritmo do PAG, isto é, devagar e mal feito. Nunca se viu coisa igual: concessões que recebem vantagens pecuniárias e nada rendem ao Tesouro, à moda das ferrovias cujos construtores receberiam abonos em dinheiro por quilômetro construído. Só mesmo na Macondo surrealista de Gabriel Garcia Márquez. Espero que, aqui, a solidão de incapacidade executiva e má gestão financeira não dure cem anos...

Se passarmos para a gestão macroeconômica, os vaivéns não são diferentes. A indústria, diziam, não exporta porque o câmbio está desfavorável. Agora tivemos uma megadesvalorização, de mais de 25%. Se nada fizermos para reduzir as deficiências e ineficiências estruturais da economia brasileira, e se o governo não tiver a coragem de evitar que a desvalorização se transforme em mais inflação, o novo patamar da taxa nominal de câmbio de pouco adiantará para a indústria. Antes os governistas se gabavam da baixa de juros ("Ah, esses tucanos, sempre de mãos dadas com os juros altos!", diziam. De repente, é o governo do PT que comanda nova arrancada dos juros. E nem assim aprendem que não é a vontade do governante que dita regras nos juros, mas muitas vontades contraditórias que se digladiam no mercado. Olhar no umbigo, isso não.

Já cansei de escrever sobre esses males e outros mais. Das deficiências no prestar serviços nas áreas de educação, saúde e segurança a mídia dá-nos conta todos os dias. Dos desatinos da vida político-partidária, então, nem se fale. Basta ver o último deles, a manutenção na Câmara de um deputado condenado pelo Supremo e já na cadeia! Não obstante, dada a amplitude dos desarranjos, parece inevitável reconhecer que a questão central é de liderança. Não digo isso para acusar uma pessoa (sempre o mais fácil é culpar o presidente ou o governo) ou algum partido especificamente, embora seja possível identificar responsabilidades. Mas é de justiça reconhecer que o desencontro, o bater de cabeças dentro e entre os partidos, faz mais zoeira do que gera caminhos. Daí que termine com uma pergunta ingênua: será que não dá para um mea culpa coletivo e tentar, mantendo as diferenças políticas, e mesmo ideológicas, perceber que quando o barco afunda vamos todos juntos, governo e oposição, empregados e empregadores, os que estão no leme e os que estão acomodados na popa?

É preciso grandeza para colocar os interesses de longo prazo do povo e do País acima das desavenças e pactuar algumas reformas (poucas, não muitas, parciais, não globais) capazes de criar um horizonte melhor, começando pela partidário-eleitoral (já que o ucasse presidencial nessa matéria não deu certo, como não poderia dar). Se os que estão à frente do governo não têm a visão ou a força necessária para falar com e pelo País, pelo menos a oposição poderia desde já cessar as rixas internas a cada partido e limar as diferenças entre os partidos. Só assim, formando um bloco confiável, com visão estratégica e capaz de seguir caminhos práticos, construiremos uma sociedade mais próspera, decente e equânime.

Fernando Henrique Cardoso, sociólogo e ex-presidente da República

Fonte: O Estado de S. Paulo

O mundo muda - Ferreira Gullar

Quanto mais radical for o militante, mais dificilmente admitirá que o seu sonho acabou

Os ideais de esquerda nasceram em meados do século 19 e ganharam corpo no começo do século 20, com a revolução de 1917. Com o nascimento da União Soviética, o ideal comunista ganhou corpo, deixou de ser mera utopia para se tornar realidade.

O sonho de uma sociedade igualitária, em que os trabalhadores seriam os dirigentes da nação e em que a mais-valia reverteria em benefício da sociedade e não de alguns burgueses ricos, parecia enfim concretizar-se.

É verdade que as primeiras décadas do socialismo soviético não apresentaram resultados muito positivos, mas para quem acreditava na sociedade igualitária, os problemas seriam em breve resolvidos.

O fato é que a simples existência da URSS já provocara importantes mudanças nos países capitalistas que trataram de atender a algumas reivindicações do trabalhadores.

A deflagração da Segunda Guerra Mundial, provocada pela Alemanha nazista, tumultuou o processo e provocou uma inesperada aliança entre os países capitalistas avançados e a União Soviética, o que adiou o conflito entre socialismo e capitalismo que, finda a guerra, levaria um mundo à chamada Guerra Fria e à beira de um conflito nuclear, o que felizmente não aconteceu.

Nesse período, o capitalismo se desenvolveu e derrotou economicamente o socialismo, levando ao fim da União Soviética e do sistema comunista que havia surgido no pós-guerra. A partir de então, o sonho revolucionário dos partidos comunistas disseminados pelo mundo inteiro se desfez. Não era mais possível, sensatamente, continuar lutando por um ideal de sociedade que fracassara.

Deve-se admitir, no entanto, que não é fácil abrir mão das utopias, dos projetos concebidos e aceitos como salvação da sociedade, o fim da desigualdade, o reino da felicidade sobre a Terra.

Tais utopias equivalem a crenças religiosas, de que dificilmente as pessoas abrem mão. Elas são, ademais, tanto uma como outra, o que dá sentido à existência. Para alguns é isso, para outros, a afirmação de valores ideológicos aos quais entregaram a vida. Há aí, sem dúvida, uma mistura de autoafirmação e autoengano.

Isso explica o que aconteceu com as esquerdas em diferentes países, inclusive o Brasil. Deve-se observar que quanto mais radical for o militante, mais dificilmente admitirá que o seu sonho acabou. Em setores da esquerda moderada, algumas mudanças na máquina capitalista aparecem como uma opção admissível, mas não para a esquerda radical que, por isso mesmo, defronta-se com um impasse: sabe que a revolução se tornou inviável mas teima em não aceitar a verdade. O que não significa que devamos aceitar os abusos do capitalismo.

E então nasce o neopopulismo que é, no fundo, a tentativa de manter o poder, dentro do regime capitalista, mas contra ele. Como isso tornaria o governo inviável, toma decisões contraditórias, para mostrar-se de esquerda e ao mesmo tempo atender às exigências do capital.

O que ocorre na Venezuela é exemplo disso, onde tal ambivalência conduziu o país a um impasse econômico que se agrava a cada dia. A verdade é que ou o novo governo muda de rumo ou leva o país ao caos econômico e social.

O que sucedeu na Venezuela começa a acontecer no Brasil, claro que em escala diversa, dada a natureza distinta dos dois países, tanto histórica quanto econômica.

Aqui, certamente, não surgirá um novo Hugo Chávez nem teremos uma sucessão presidencial tão surrealista quanto a que ocorreu ali. De qualquer modo, a atitude ambivalente do governo petista --que governa com a direita e finge que é de esquerda-- se mantém e compromete o crescimento do país.

Esse é um aspecto da questão que envolve o que restou da esquerda radical. É que ela chega ao fim tanto pelo esvaziamento ideológico quanto pela idade de seus líderes: Lula e Dilma não têm como seguir adiante por muito tempo.

Em suma, embora ainda haja quem teime em se dizer esquerdista, nenhum político profissional que pretenda de fato ascender no cenário nacional insistirá em repetir os chavões que saíram de moda.

Quem pretenda fazer carreira política seguirá outro caminho. Uma geração não ideológica --que nada tem da herança utópica surgida com Karl Marx-- assumirá o poder no futuro.

Fonte: Folha de S. Paulo /Ilustrada

Radiografia das cidades - Merval Pereira

No estudo sobre a gestão das grandes cidades brasileiras que a consultoria Macroplan, especializada em cenários prospectivos e planejamento estratégico, realizou recentemente, a radiografia das cem maiores cidades do país mostra as disparidades regionais de qualidade e cobertura dos serviços em cada município. Há cidades como Foz do Iguaçu (PR) que, entre 2007 e 2011, evoluiu da 23ª posição para a primeira do grupo no Ideb dos anos iniciais (nota 7), mas que deixa a desejar no campo da segurança, registrando alta taxa de homicídios (73/100 mil).

Ou o caso de Franca (SP), que possui o melhor percentual de domicílios com adequado saneamento (99,34%), mas ocupa a 81ª posição em remuneração média mensal. Chama a atenção também o descompasso entre as cidades. Há um abismo que separa os municípios no campo do desenvolvimento econômico, diz o estudo. Vitória (ES), por exemplo, tem o maior PIB per capita do país, de R$ 76.722, enquanto em Ribeirão das Neves (MG) o PIB per capita é de R$ 6.499. Blumenau (SC) exibe uma taxa de desocupação de 2,7%, e Paulista (PE) tem 14,6% da população economicamente ativa desocupada.

Na educação, Curitiba (PR) tem taxa de analfabetismo de 2,79%, mas 14,4% da população adulta de lua-zeiro do Norte (CE) é analfabeta. No terreno da saúde, as desigualdades prosseguem. Enquanto São losé do Rio Preto exibe a menor taxa de mortalidade (7/1.000), Guarujá tem 23 mortes em mil crianças nascidas vivas, registrando crescimento de 7% do índice entre 20082011. Franca (SP), Limeira (SP) e Uberlândia (MG) possuem mais de 99% dos domicílios com saneamento adequado, enquanto em Macapá (AP) só 17,5% das residências têm esse serviço. O estudo aponta ainda que há grande distância a ser percorrida quando a comparação é internacional. A mortalidade infantil média das cem cidades estudadas é de 12,79. Superior aos padrões definidos pela OMS (10/1.000 nascidos vivos) e o dobro dos verificados nos países membros da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE): 6,46/1.000 nascidos vivos.

A nota média no Ideb nos anos iniciais das redes municipais dessas cidades não chegou a 5 em 2011, enquanto a OCDE já havia alcançado nota 6 em 2005. A média de cobertura adequada de saneamento nos países da OCDE é de 98,41%, enquanto, nas nossas maiores cidades, a média é de 81,5%.

Os desafios das cidades requerem respostas rápidas. O acelerado processo de crescimento das cidades gera pressões crescentes por moradias, serviços públicos, trabalho de qualidade e melhores transportes. Cidades maiores consomem mais recursos, mais água, energia e produzem mais resíduos.

Segundo a Macroplan, o desempenho da gestão é fundamental para a qualidade de vida de seus moradores e a competitividade do país, reflexo, em boa medida, da competitividade combinada de suas cidades. Foi pensando nesses desafios que o estudo debruçou-se especialmente sobre a ação dos gestores. Para além de entender quais as principais fragilidades das cidades que constituem os elos centrais da rede de cidades, a Macroplan buscou identificar transformações possíveis em horizontes temporais de um ou dois mandatos e experiências concretas que delineiam estratégias de desenvolvimento e práticas de gestão capazes de produzir mais e melhores resultados.

O estudo aponta que as maiores fragilidades na totalidade das cidades estão na ausência de planejamento e na baixa capacidade de gestão, traduzidas em pulverização de esforços, imediatismo, improvisação e descontinuidade de projetos e recursos. "Tudo conduz à manutenção indesejável de baixos resultados para a sociedade"; avalia o coordenador do estudo e diretor da Macroplan, Gustavo Morelli.

"Está na hora de repensar a gestão pública na esfera municipal. O Brasil avançou consideravelmente nas duas últimas décadas, mas é preciso mais, os cidadãos cada vez mais escolarizados e informados demandam maior acesso e melhores serviços, melhor qualidade de vida" afirma Morelli.

Para ele, o desenvolvimento das cidades ganha relevância como estratégia para tornar os países mais competitivos e melhorar a qualidade de vida dos seus cidadãos. O que não será alcançado sem a melhoria da gestão na esfera municipal e a busca de maior articulação da rede de cidades. •

Fonte: O Globo

Sintomas de uma crise - Denise Rothenburg

O PMDB começa a virar novamente aquela pensão em que várias famílias convivem, mas um desconfia do outro.

Aos poucos, o PMDB vai voltando à velha forma da divisão interna. Principalmente, no protagonismo na aliança com o PT. Os parlamentares do partido começaram a perceber uma disputa velada entre os presidentes do Senado, Renan Calheiros (AL), e da Câmara, Henrique Eduardo Alves (RN), e outras rusgas internas. Se brincar, está em gestação mais uma daquelas divisões em que vai cada um para um lado na sucessão presidencial. Aquela velha fórmula que Lula adotara colocando todos os segmentos sob o seu governo na pré-campanha pela reeleição em 2006 acabou.

Embora de público todos digam que está tudo bem, deputados e senadores são praticamente unânimes em confidenciar que a relação está delicada, seja do PMDB com o próprio PMDB, seja do PMDB com o governo, e, ainda, do PMDB com o PT.

Mas, vamos por partes. Na relação interna, Renan não gostou do fato de Henrique Alves ter ido tratar dos vetos com a presidente Dilma e decidido que nem todos entrariam em pauta. Afinal, o presidente do Congresso é o senador e caberia a ele, Renan, definir o que deveria ser votado.

Não por acaso, depois desse episódio, a presidente Dilma foi até o Congresso. Na entrega do relatório da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) da Violência contra a Mulher, Dilma não só marcou a importância do tema, como também afagou o peemedebista. Muitos repararam que, antes e depois da solenidade, ela passou muito tempo conversando com Renan, sem dar a mesma atenção ao presidente da Câmara.

Essas rusgas de atenção e vaidades, no entanto, são as menores, uma vez que o PMDB começa a virar novamente aquela pensão em que várias famílias convivem, mas um desconfia do outro. Uma das famílias congrega Renan, o ex-presidente do Senado José Sarney e o líder do partido, senador Eunício Oliveira. Eunício tem ficado mais com a bancada, enquanto os outros dois vivem uma relação mais pacífica com o Planalto.

Na Câmara, as famílias são mais diversificadas. Uma congrega o grupo de Geddel Vieira Lima (na Câmara, representado pelo irmão Lúcio Vieira Lima), o ministro da Secretaria de Aviação Civil, Moreira Franco, e o presidente do Instituto Ulysses Guimarães, Eliseu Padilha. A outra é capitaneada pelo líder Eduardo Cunha, que a cada dia amplia sua influência na bancada, uma vez que não dá um passo sem combinar ou avisar a um expressivo grupo de seus pares. Eduardo Cunha cresceu tanto no papel de líder do PMDB que muitos chegam ao ponto de dizer que, se Henrique Alves não abrir o olho, será engolido pelo seu sucessor em termos de influência dentro do partido.

O patriarca dessas famílias, ou capitanias, ainda é o vice-presidente da República, Michel Temer. Mas há quem diga que o fim de seu reinado se aproxima. Michel terá que agir com firmeza e paciência se quiser manter seu partido na aliança com a presidente Dilma e o PT. Afinal, hoje, dadas as aspirações dos peemedebistas em termos de palanques estaduais, a aliança corre sérios riscos e nenhum dos grupos dentro do PMDB se mostra disposto a perder poder nos estados para preservar a vaga de vice. O raciocínio é o inverso: se para ter o poder no estado for preciso dar um chega pra lá na aliança com o PT, assim será.

O PMDB não hesitará em largar Dilma e, por tabela, o próprio Michel Temer, caso a presidente chegue em baixa na campanha eleitoral. Mas essa “largada” não será agora nem de uma vez. Afinal, é preciso esperar para ver como estará cada pré-candidato a presidente em 5 de outubro, quando termina o prazo de filiação partidária para os candidatos a algum mandato eletivo no ano que vem. Especialmente José Serra, que deve apresentar sua posição final nos próximos dias. Há quem jure que Serra deixará o PSDB, até para se manter no jogo da sucessão. Ele e a Rede de Marina Silva são as incógnitas do momento. E pode ter certeza, leitor: cada um dos pré-candidatos terá um pedacinho no PMDB na campanha. É a velha formação de um pé em cada canoa dentro da máxima “dividir agora para governar depois”, seja o presidente quem for.

Por falar em governar…
Para sorte da presidente, essas semanas até 5 de outubro devem seguir sem muitas pressões políticas da base aliada sobre o Planalto. O Congresso está às voltas com as repercussões negativas da preservação do mandato de Natan Donadon, que certamente dará novo fôlego às manifestações do próximo sábado, 7 de setembro. Além disso, os deputados estarão mais empenhados em conquistar espaço e tempo de tevê para 2014, deixando a escolha do candidato presidencial para depois do prazo de filiação.

Outro fator que ajuda Dilma nesse momento é a grata surpresa do Produto Interno Bruto. Os resultados positivos graças ao setor agropecuário deram uma lufada de ar fresco ao seu governo. E se a economia respirar sem a ajuda de aparelhos, o poder de atração da presidente continuará forte. O problema, entretanto, é segurar o PT nesse período. Não dá para o partido de Dilma aproveitar a fase boa e tripudiar em cima dos aliados nos estados ou no governo porque, se tem algo que vale para tudo na vida, é a incerteza sobre o dia de amanhã. De certo, no momento, só mesmo a divisão do PMDB e a pré-candidatura de Dilma.

Fonte: Correio Braziliense

Médicos cubanos - Eliane Cantanhêde

Um deputado presidiário manteve o mandato, o chanceler caiu, houve ameaças do boliviano Evo Morales e a invasão americana na Síria se desenhava iminente, mas nada tirou a contundência de uma foto na "Primeira Página" da Folha na semana passada: o médico cubano, negro, sendo humilhado por médicas brasileiras, brancas.

Há, assim, um triplo ataque aos médicos cubanos. O governo de Cuba os aluga mundo afora e embolsa a maior parte dos seus salários. O governo do Brasil se conforma em ter, lado a lado, médicos estrangeiros ganhando salários diretos bem superiores aos dos cubanos --a quem, preventivamente, nega refúgio. Por fim, eles sofrem esses ataques vergonhosos de colegas brasileiros.

É o típico caso de alvo errado. Os cubanos são vítimas, e não culpados de coisa nenhuma. Eles são inocentes úteis para o regime dos irmãos Castro e certamente serão de grande ajuda no Brasil, que fecha os olhos para a injustiça moral --se não erro legal-- de prestarem serviço por remuneração diversa de seus equivalentes de outros países.

A medicina cubana, como a chinesa, segue princípios de massificação, com atendimento à família, visita de casa em casa e prevenção a doenças transmissíveis. Logo, é muito compatível com as necessidades de centenas de cidades brasileiras.

Falta muito, mas o ministro da Saúde do governo Geisel, Paulo de Almeida Machado, praticamente revolucionou a saúde pública no país ao importar princípios, estratégias e ações da medicina chinesa para as regiões mais desassistidas do Brasil.

Geisel era um militar de direita, mas a sua política de saúde era, claramente, inspirada em regimes de esquerda. Almeida Machado era sanitarista e dava de ombros para esse detalhe ideológico. Sua missão era salvar vidas, cuidar de pessoas. E ele jamais humilharia médicos chineses ou cubanos. Até porque os admirava.

PS - Tiro duas semanas de férias dessas crises todas. Até a volta!

Fonte: Folha de S. Paulo

Ver pra crer - Dora Kramer

Reza a mais recente lenda que a preservação do mandato do deputado condenado à prisão e, em decorrência, à suspensão dos direitos políticos pelo Supremo Tribunal Federal foi um tiro que saiu pela culatra.

Por esse raciocínio, o Congresso, envergonhado, apressaria a aprova: ção de duas emendas constitucionais: uma para acabar com o voto secreto para cassação de parlamentares - ou, numa versão mais radical, para todos os tipos de votações outra para tomar automática a perda do mandato de condenados em ações penais depois do trânsito em julgado da sentença.

Pelo que se viu no plenário da Câmara na noite da última quarta-feira, é mais prudente esperar para ver antes de acreditar, A julgar pelo histórico de , suas excelências na abordagem do tema melhor mesmo é seguir a lei de São j Tomé a fim de economizar frustrações. Ainda sob os efeitos da ressaca moral: da inusitada decisão, deu-se um corre-corre de senadores e deputados a declarar a urgência de se tomar uma proviciência. Antes tarde, poder-se-ia dizer com boa vontade, não fosse o cinismo.

Renan Calheiros, o presidente do Senado absolvido duas vezes por força do voto secreto, pontificou: "A sociedade não tolera mais essa situação", fazendo-se de alheio ao fato de ser personagem de destaque na referida "situação".

Ato contínuo Calheiros marcou para a semana que vem a votação em plenário da emenda do senador Jarbas Vasconcelos que dirime a dúvida constitucional sobre quem dá a última palavra sobre a cassação de condenados, vinculando definitivamente o mandato à decisão da justiça.

Isso depois de assistir inerte à lenta tramitação da proposta desde o arrefecimento do ânimo em torno da "agenda positiva" resultante dos protestos de junho. A coisa só voltou a andar no dia seguinte ao estapafúrdio perdão dado a Natan Donadon, por causa da reação de fora. Se dependesse da "de dentro", a emenda continuaria sendo cozida em banho-maria.

Mas, vamos que o Senado a aprove no dia marcado (10 de setembro), a PEC terá ainda de passar por dois turnos de votações na Câmara. E lá anda a passos de tartaruga a emenda que acaba com o voto secreto. O presidente Henrique AlI ves determinou a suspensão de cassações até que a regra seja mudada.

E quem garante que será? Note-se: falamos de quórum de três quintos nas duas Casas, muito mais difícil de ser alcançado que a maioria absoluta exigida no caso de Donadon.

O andar da carruagem dessa proposta é tortuoso, No meio do escândalo do mensalão, em 2006, a Câmara aprovou em primeiro turno o fim total do voto secreto, até para o exame dos vetos presidenciais. A segunda votação que permitiria o projeto ir ao Senado nunca se realizou.

No ano passado, empurrados pelo episódio que resultou na cassação de Demóstenes Torres, os senadores concluíram a aprovação do voto aberto só para cassação de mandatos. A emenda chegou à Câmara praticamente ao mesmo tempo em que se iniciava no Supremo o julgamento do processo do mensalão.

O então presidente da Casa, Marco Maia, chegou a dizer ao relator na Comissão de Constituição e Justiça, Alessandro Molon, que queria aprovar a PEC ainda em sua gestão. Mas o julgamento começou, a situação dos réus foi se desenhando periclitante e, certamente não por coincidência, o voto aberto deixou de ser urgente.

O assunto foi retomado em junho como parte da "agenda positiva". Aprovada na GCJ, a emenda seguiu para uma comissão especial e lá está no aguardo da realização de 10 a 40 sessões, das quais até agora só uma foi realizada.

Esse é o ritmo, cuja lentidão autoriza a desconfiança sobre o que vem adiante. Pode ser que os protestos marcados para 7 de Setembro surtam algum efeito, pois as manifestações de junho, ao que se vê no Parlamento, entraram por um ouvido e saíram pelo outro.

Fonte: O Estado de S. Paulo

Chuvas na horta - Tereza Cruvinel

O crescimento econômico de 1,5% no segundo trimestre dará impulso à recuperação eleitoral da presidente. Atenta a esse quadro, a oposição avalia o melhor ator para o papel de anti-Dilma

As águas voltaram a correr para o moinho da presidente Dilma Rousseff, alimentando a recuperação de sua popularidade que, segundo auxiliares, agora estaria na casa dos 40%, e, por decorrência, sua competitividade eleitoral. As pesquisas dirão. E, com isso, os adversários avaliam as condições de cada um para representar o papel de anti-Dilma no pleito de 2014, no esforço para barrar sua reeleição ou acumular forças para remover o PT do governo em 2018. Insere-se nesse movimento o encontro de quinta-feira entre os presidenciáveis Aécio Neves, do PSDB, e Eduardo Campos, do PSB.

O crescimento de 1,5% da economia brasileira no segundo trimestre, superando a taxa de desenvolvidos e emergentes, inclusive os Estados Unidos, excetuando-se apenas a China, deve dar novo impulso à recuperação da presidente. O índice superou as previsões mais otimistas e desmentiu as hegemônicas profecias negativas. O foguetório foi discreto: o ministro da Fazenda, Guido Mantega, proclamou a superação do “fundo do poço” mas previu crescimento moderado para o ano. Fora do governo, quem divergiu da manada e acertou foi o presidente da CNI, Robson Andrade. Em artigo na semana passada, ele apontou discrepância entre o pessimismo dos analistas e a realidade dos empresários, apostando na recuperação. A indústria, de fato, retomou a dinâmica, crescendo 2%, embora a agricultura tenha contribuído mais com o resultado trimestral.

Na frente social, Dilma parece estar ganhando a guerra do Programa Mais Médicos. Se ele der certo, lavrará dois tentos. Ganhará para si e para o candidato do PT ao governo de São Paulo, o ministro da Saúde, Alexandre Padilha. Ela tem viajado intensamente pelo Sudeste — região em que mais caiu e onde vem obtendo a melhor recuperação. Vem se recompondo com os partidos aliados. E como eles não resistiram a cometer mais um desatino, preservando o mandato do deputado condenado Natan Donadon, pode sobrar apenas para o Congresso os protestos esperados para o Sete de Setembro. No resto do semestre, a aposta de Dilma é no êxito das concessões de rodovias, ferrovias, portos e aeroportos ao setor privado. Se o governo não cometer grandes erros, se o inesperado e o imprevisível não emergirem com a força de junho, Dilma deve começar 2014 como a candidata mais competitiva, ainda que não volte a ser a franca favorita de antes. Como candidata, ela precisa é resolver seus problemas com o PMDB e com os partidos da amplia coligação que a elegeu, em 2010. Esse quadro é que vem pautando os movimentos dos adversários.

O papel de anti-Dilma
As dificuldades de Marina Silva para viabilizar seu partido, a Rede Sustentabilidade, começam a frustrar as apostas de que ela se tornaria o polo mais forte contra Dilma. Afinal, ela é quem tem os maiores índices de intenção de votos (26% contra 35% de Dilma, na última pesquisa Datafolha) e o melhor desempenho num eventual segundo turno contra a presidente (46% a 41%, na mesma pesquisa). Mas, agora, ainda que o partido consiga ser legalizado, admite-se no círculo marinista que isso ocorrerá no limite do tempo de filiação, quando já será praticamente impossível atrair adesões (para garantir tempo de televisão) e projetar alianças para 2014. Resta sempre a hipótese de concorrer por outro partido, o plano B que ela se recusa a discutir até com os mais próximos. Candidata ou não, Marina será um fator importante na sucessão, que nenhuma coalizão anti-Dilma desprezará.

Eduardo Campos foi recentemente citado pelo jornal inglês Financial Times como a maior ameaça a Dilma em 2014. Ele é a maior novidade no quadro, mas seu jogo político é o mesmo dos outros. Diferente é o jogo de Marina. E diferentemente dela, ele não cresceu com a onda de protestos. Apenas preservou-se, contendo a exposição. Até agora, não firmou alianças nítidas e tem problemas no próprio partido. Ao saber de seu jantar com Aécio Neves, o governador do Ceará, Cid Gomes, protestou contra a hipótese de ver o PSB transformado em linha auxiliar do PSDB. Ele e o irmão Ciro, que defendem o apoio a Dilma, podem deixar o partido em outubro, como fizeram em 2004, quando o PPS optou pela oposição ao governo Lula, do qual Ciro era ministro. O maior ativo de Campos hoje é a simpatia do empresariado, que, na hora H, pisará em duas canoas: a da presidente e a do adversário mais competitivo. Claro que é cedo para Campos que, no fim do ano, deve romper com o governo para começar o ano com postura mais agressiva.

Embora enfrente um problema partidário que atende pelo nome de José Serra, o senador Aécio Neves é que vem reunindo as melhores condições para o papel de anti-Dilma. Apresentou crescimento, embora tenha depois perdido uns pontos. Seu partido é nacionalmente estruturado, dispõe de máquinas poderosas nos estados de Minas e São Paulo, terá um tempo de televisão razoável. As candidaturas de Campos e Marina no primeiro turno lhe interessam para forçar o segundo, assegurando-se — desde agora — da unidade das oposições no embate final. Para isso, prestará aos dois todas as homenagens e fará até concessões nas disputas estaduais.

Batalha à vista
Campos, Aécio e Marina estarão unidos numa batalha que se avizinha. Talvez ainda nesta semana os governistas tentem votar, no Senado, o projeto do senador Romero Jucá, que altera algumas regras eleitorais. Para as oposições, casuísmo puro. Por exemplo, a redução do período de duração da campanha na tevê, a pretexto de poupar a paciência do eleitor. Aécio e Campos concluíram que eles é que perderão, pois precisam se tornar mais conhecidos nacionalmente.

Fonte: Correio Braziliense

Como a raiva reelegerá Dilma - Elio Gaspari

A oposição prega para os convertidos, associando-se a causas perdidas; médicos cubanos merecem crédito

A recuperação da popularidade do governo da doutora Dilma foi audaciosamente prevista pelo marqueteiro João Santana durante o rescaldo das manifestações de junho, quando ele disse que tudo não passava de um desabafo temporário. A doutora, que tivera 57% de aprovação, tomara uma vaia de estádio e caíra para 30%. Acredita-se que já retornou à faixa dos 40%.

Santana tinha motivos para acreditar na força de Dilma. Não foi ela quem aumentou as tarifas de transporte (pelo contrário, torceu o braço dos prefeitos Eduardo Paes e Fernando Haddad para baixá-las).

Enquanto a doutora tocava o expediente, a oposição dedicou-se a fortalecê-la. É uma oposição que converte crentes.

Seu primeiro alvo foi o programa Mais Médicos, que trouxe profissionais estrangeiros. Em vez de discutir também a reserva de mercado que as associações médicas estimulam, as pegadinhas do programa Revalida ou a burocracia das universidades federais, partiram para baixarias e ameaças. Uma equipe de repórteres da Folha descobriu um rombo no programa: em 11 cidades de quatro Estados, prefeitos pretendem demitir médicos brasileiros que estão em suas folhas, trocando-os por estrangeiros que serão pagos pela Viúva federal. "Mais médicos" onde não os há é uma coisa. Menos médicos brasileiros, bem outra. Basta lançar o programa "trocou, dançou".

A desqualificação dos cubanos tem um ingrediente de ingenuidade. Raul Castro não está mandando para o Brasil médicos que flanavam por Havana. Ele já enviou 113 mil profissionais para 103 países e fez da iniciativa uma fonte de dólares. São quadros selecionados, com formação política. Em tempos passados, cubanos iam para guerras onde morreram pelo menos 3.000 deles. O governo trabalha com a certeza de que o programa trará benefícios. A oposição, com o desejo de que dê tudo errado.

No caso da solidariedade que deram ao diplomata que desovou o senador boliviano no Brasil, esqueceram-se de pedir uma avaliação da sua conduta aos notáveis que estão entre seus quadros. Disputam a bola atrás da linha de fundos, pois pode-se detestar o PT, mas no dia em que um encarregado de negócios fizer o que acha melhor, a diplomacia vira bagunça.

Dilma vai para a reeleição (isso se não for preciso tirar Lula do banco de reservas) porque o PSDB tem mais ressentimentos que planos e mais queixas que projetos. Em 2010 o PT teve 55,7 milhões de votos. Desse jeito, a oposição corre o risco de sair da eleição de 2014 com os mesmos 43,7 milhões de 2010, satisfeita por ter conseguido que esses eleitores ficassem com muito mais raiva dos comissários.

Um sábio
Quando começou o julgamento do mensalão e nove em dez pessoas temiam que o STF fizesse uma pizza, um conhecedor da Casa avisou:

"Haverá uma farta distribuição de condenações. Muitas com penas superiores a dez anos."
Esse sábio acha que os recursos infringentes, capazes de aliviar a vida dos comissários e de seus tesoureiros, morrerão na preliminar:

"Meu palpite é uma maioria, de seis a cinco ou sete a quatro, mantendo as penas."

Alguns interessados já sentiram o cheiro da brilhantina e mudaram seus domicílios para Brasília, onde começou uma pequena reforma na penitenciária da Papuda.

Para os condenados a regime semiaberto, será um conforto. Irão da Papuda para a Câmara e dela para a cela. Já a turma do regime fechado safa-se das condições a que são submetidos os demais cidadãos no presídio do Tremembé.

Não aprendem
Um pedaço do comissariado petista namorou a ideia de salvar o comissário João Paulo Cunha do regime fechado por conta de sua condenação, pelo Supremo Tribunal Federal, a nove anos e quatro meses de reclusão.

Recordar é viver
O risco de um asilado vir a suicidar-se não é fantasia.

Depois da deposição de João Goulart, seu secretário particular, Eugenio Caillard, pediu asilo ao embaixador do México, Vicente Sanchez Gavito.

O diplomata negou-lhe o pedido e, na mesma hora, Caillard ameaçou matar-se, pulando a janela da sala em que conversavam. Gavito não quis arriscar e asilou-o.

Semanas depois, Caillard matou-se na embaixada, com barbitúricos.

Garibaldi no Brasil
Está chegando às livrarias "Garibaldi na América do Sul: O mito do gaúcho", do jornalista Gianni Carta. É o resultado de oito anos de trabalho em oito países. Republicano, corsário e namorador, antes de ser o herói da unificação da Itália, Giuseppe Garibaldi foi um subversivo na América Latina, metido na Revolução Farroupilha. Carta estudou o mito que envolveu o personagem, construído, entre outros, pelo romancista francês Alexandre Dumas.

Para quem acompanha as atuais vicissitudes da diplomacia brasileira, vale relembrar o episódio em que o ministro brasileiro em Montevidéu o chamou de "pirata" e pediu que fosse expulso do Uruguai. Garibaldi foi à legação brasileira e desafiou-o para um duelo. O ministro (João Francisco Régis) não aceitou, sustentando que representava o governo de seu país e não duelaria com um delinquente. Depois a diplomacia brasileira amansou-se.

Cadê o Amarildo?
Sabe-se que o major Edson Santos poderá deixar o comando da UPP da Rocinha.

Só não se sabe:

1) Onde está o pedreiro Amarildo.

2) Com que frequência as câmeras da PM pifam. (As da UPP pifaram na hora de registrar a saída de Amarildo.)

3) Com que frequência as viaturas da PM rodam com os GPSs desligados. (Os da UPP não funcionavam naquele mesmo dia.)

As duas últimas perguntas o secretário José Mariano Beltrame pode responder. É só querer.

Ócio
Nos quatro próximos quatro domingos o signatário usufruirá o programa Mais Ócio, financiado pela Bolsa Nada.

A Câmara pode criar o anexo dos condenados
A situação em que ficou o deputado Natan Donadon pode ser absurda, produto dos piores instintos do plenário da Câmara, mas é o jogo jogado. Seus pares acharam que ele não ofendeu o decoro do Parlamento. Por ser um criminoso, ficará na penitenciária da Papuda. Há precedentes de diversos países e nos Estados Unidos chegou-se a situações ainda mais esquisitas. Dois deputados foram reeleitos enquanto estavam na cadeia. Um deles, depois de solto, assumiu a cadeira e deu o voto que garantiu a presidência a Thomas Jefferson. Um terceiro, Jay Kim, condenado a um ano de prisão domiciliar em 1988, ia ao Congresso com uma pulseira eletrônica, sabendo que sua rotina seria de lá para casa.

O que parece ser uma monstruosidade poderia ser uma solução. Se os parlamentares ladrões condenados pelo Supremo Tribunal Federal forem para a Papuda, fica estabelecido que todos os brasileiros são iguais perante a lei. Deputado em regime fechado não faz mal a ninguém. A Câmara pode até construir o anexo 5 para a carceragem.

Fonte: Folha de S. Paulo

A preamar dos mascarados - Gaudêncio Torquato

A democracia é o governo do poder visível. Sob sua tutela "nada pode permanecer confinado no espaço do mistério", ensina Norberto Bobbio. A lição é oportuna na quadra em que vive o País, caracterizada por mobilização de grupos e setores, entre os quais o contingente que se autointitula Black Bloc, formado por pessoas que atuam de forma brutal, construindo barricadas, depredando lojas e monumentos, enfrentando a polícia, em aparente demonstração de que a revolta tem como foco o Estado e os símbolos clássicos do capital, a partir da concentração de riquezas e das instituições que encarnam tal representação, como bancos.

A crescente onda de violência puxada por esse grupamento, além do evidente refluxo que produz no apoio aos eventos de rua que há dois meses agitam a vida nacional, deixa transparecer uma crise de autoridade. O Estado não tem demonstrado competência para fazer cumprir a lei, seja por leniência, fechando os olhos para o vandalismo, seja por receio de que a força policial puxe para baixo a imagem já negativa de seus governantes, ou ainda por falta de qualificação do aparelho policial para lidar com uma nova ordem social. O fato é que o descontrole fica patente, ensejando, a cada nova manifestação, atos cada vez mais virulentos. Imagine-se o efeito bola de neve se a criminalidade crescente não receber um basta.

A par das motivações que estão por trás de suas ações diretas e truculentas, é inegável que os Black Blocs afrontam a lei e rompem a textura do Estado de Direito. Pode-se até argumentar que não seriam meros vândalos e baderneiros ao inseri-los no ciclo de protestos do final dos anos 90, quando o grupo ganhou visibilidade nas manifestações contra a Organização Mundial do Comércio, a batalha de Seattle (1999), e contra o G-8, em Gênova (2001), quando morreu o primeiro ativista do movimento antiglobalização, Carlo Giuliani.

Na moldura brasileira, porém, a indignação do grupo não tem como lastro um episódio de envergadura nem o pano de fundo de profunda crise econômica, como a que abalou nações em 2008. O movimento Occupy Wall Street, lembre-se, tinha como foco protestos contra a desigualdade econômica, a influência de empresas e bancos no governo americano, sob a tessitura da crise internacional. A situação deflagrou movimentos congêneres nos países assolados pela mesma borrasca financeira. Por aqui, o conceito dos Black Blocs entra mais na esfera da barbárie, convergindo para o que Elias Canetti, no clássico Massa e Poder, classifica como malta: "Um grupo de homens excitados que nada desejam com maior veemência do que ser mais; o que lhes falta de densidade real suprem por intensidade". A falta de discurso é suprida pela estética da destruição.

Não se trata de proibir manifestações, mas de obedecer aos dispositivos constitucionais, principalmente o inciso IV do artigo 5.º da Carta Magna, que estabelece: "É livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato". A este se segue a regra do inciso XVI: "Todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente". Fica patente que as máscaras cobrindo as feições dos militantes lhes conferem a condição de anônimos, enquanto outros pré-requisitos da ordem são desprezados, como a atitude pacífica, o espírito desarmado, o dano ao patrimônio público e privado, o direito de ir e vir de outros.

Visibilidade e transparência devem integrar o caráter público do poder do Estado, na medida em que constituem meios para distinguir o justo do injusto, o lícito do ilícito, o certo do errado, a cidadania ativa de maltas oportunistas. Se portam demandas legítimas de comunidades, se iluminam as consciências com as luzes do civismo e da ética, por que agir sob disfarce? Que coragem é essa, repartida entre pernas e braços que funcionam como aríetes de ferro e aço e rostos protegidos por lenços pretos?

Tentemos entender a inclinação civilizatória pela violência. Ortega Y Gasset chegou a sinalizar a propensão das massas à subversão, fruto do que chamava de era das nivelações: "Nivelam-se as fortunas, nivela-se a cultura entre as diferentes classes sociais, nivelam-se os sexos e até os continentes". Vejam só, o filósofo espanhol fez tal peroração no final da segunda década do século passado, quando descreveu o homem-massa, com sua vida sem peso nem raiz, "deixando-se arrastar pelas correntes", sem resistir aos redemoinhos que se formam nas artes, na política ou nos usos sociais. Pois bem, apesar dos ganhos civilizatórios em quase todas as frentes a serviço da vida humana, particularmente nos campos de educação e saúde, as mais perversas formas de barbárie têm-se desenvolvido nos intestinos do Estado moderno. E pior é ver que a democracia tem fracassado na promessa de debelar o poder invisível que se incrusta em todos os quadrantes do planeta, sob a forma da quebra da lei e da ordem, das ondas da vertiginosa criminalidade, do declínio dos valores morais e cívicos, dos conflitos étnicos e religiosos, do incremento dos negócios das drogas e armas, enfim, do esvaecer dos elementos básicos da civilização.

O que mudou na essência do discurso de Gasset? Piorou. Na esfera do homem-massa apenas mudou a dimensão. Antes integrado às vastas multidões que se deixavam levar ao sabor das correntes, hoje a pessoa se refugia em núcleos de referência, organizados pela cadeia de especialização que a sociedade foi impelida a buscar na esteira do progresso técnico.

A foto do presente flagra a violência dos caras-pretas. Mas a legenda é a mesma que Nietzsche gritou do penhasco de Engadine, nos Alpes suíços: "Vejo subir a preamar do niilismo".

Gaudêncio Torquato, jornalista, professor titular da USP,

Fonte: O Estado de S. Paulo