segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

Vergonha na política

Antes de ir para a cadeia, em 5 de dezembro, o ex-deputado pôs um homem de confiança à frente do Partido da República — que é aliado de Dilma e comanda o Ministério dos Transportes — e continua a controlar a legenda com mão de ferro. Todas as decisões passam por ele. Das alianças eleitorais às candidaturas da sigla em 2014

Da cadeia, Valdemar comanda o PR

De dentro da Papuda, ex-deputado traça estratégias eleitorais a partir de conversas com parlamentares e da ascendência sobre a atual direção do partido, dono do Ministério dos Transportes e aliado do Planalto em 2014

João Valadares, Luiz Carlos Azedo e Vinicius Doria

Mesmo preso no Complexo da Papuda desde 5 de dezembro, o ex-deputado Valdemar Costa Neto (PR-SP), condenado a sete anos e 10 meses de prisão no processo do mensalão, continua dando as ordens no Partido da República (PR). A legenda é aliada do governo Dilma Rousseff (PT) e comanda o Ministério dos Transportes. Na semana passada, Valdemar teve uma reunião na cadeia com o secretário-geral da legenda e seu homem de confiança, o senador Antônio Carlos Rodrigues (PR-SP). De dentro da prisão, traça metas para eleger uma bancada de 40 deputados nas próximas eleições, conjectura alianças nos estados e faz sondagem de potenciais candidatos com possibilidade de votações expressivas.

Ao ser questionado, o senador Antônio Carlos Rodrigues, que ocupou a vaga deixada por Marta Suplicy (PT-SP) quando a petista assumiu o Ministério da Cultura, confirmou, na primeira conversa por telefone com o Correio, que ele ainda tem ascendência no partido. “Sem dúvida alguma. Não é por ele se encontrar nessa situação que iremos desprezá-lo”, justificou. Depois, no segundo contato com a reportagem, mudou o tom. O parlamentar, escolhido estrategicamente por Valdemar para conduzir as decisões da sigla, fez questão de salientar que ele já repassou o comando do partido. “O Valdemar se afastou do partido. Ele está estudando, fazendo um curso na prisão. Fiz uma visita particular. Ele é meu amigo”, ressaltou.

Consciente de que não escaparia da condenação imposta pelo Supremo Tribunal Federal (STF), o político preparou o PR para continuar sob o seu controle enquanto estiver privado de liberdade. Na presidência do partido, colocou o ex-ministro dos Transportes Alfredo Nascimento, que perdeu o cargo após denúncias de corrupção.

Um parlamentar do PR, ouvido reservadamente, confirma a influência do ex-deputado. Alega que o ex-presidente do PR está enfraquecido pelas circunstâncias que o cercam, mas diz que as decisões políticas que moldam o caminho do partido continuam sendo suas. De acordo com ele, de dentro da cadeia, Valdemar orienta os correligionários por meio do senador Antônio Carlos em relação a alianças e candidaturas em 2014.

Ele salienta que o ex-presidente do PR é uma figura muito querida na legenda, que sempre conversou muito com a bancada e que, por isso, continua exercendo uma liderança política natural dentro da sigla. “Ele se preparou para a prisão, mas, antes disso, preparou o partido para este momento. Da prisão, ele pensa e repassa as estratégias para as próximas eleições.”

O acordo para fechar o nome do deputado Bernardo Santana (PR-MG) como novo líder da sigla na Câmara, por exemplo, foi costurado por Valdemar antes de ser preso. O parlamentar assume o posto no fim de fevereiro. Além de dois advogados, Antonio Carlos Rodrigues é único político escolhido como porta-voz informal do partido. O atual líder do PR na Câmara, Anthony Garotinho (RJ), tentou ir a Papuda para um encontro com Valdemar, mas foi barrado. “Liguei para a secretária dele. Queria ir visitá-lo, mas tive a informação de que ele só estava recebendo os advogados. Acho estranho que ele tenha recebido o Antônio Carlos.”

Garotinho afirmou que Valdemar fez uma reunião após a condenação para informar os novos rumos do partido em virtude de sua prisão. “Estive nesta reunião e ele afirmou que estava passando o comando do partido, o que ele já vinha fazendo desde que teve esse problema.”

Escândalo
Acusado de envolvimento no escândalo do mensalão, Valdemar renunciou pela primeira vez a um mandato de deputado federal em agosto de 2005. Disse que o dinheiro recebido do PT era para ser utilizado na campanha eleitoral e não para fazer com que deputados votassem de acordo com o que determinava o governo Lula. Com o fim da primeira parte do julgamento do mensalão, ele foi condenado inicialmente em regime semiaberto por crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro.

Após a primeira renúncia, foi eleito novamente para a Câmara em 2006 e reeleito em 2010. O político deixou o cargo no mesmo dia em que o presidente do STF, Joaquim Barbosa, determinou a prisão na Papuda. A carta de renúncia foi lida em plenário pelo deputado Luciano Castro (PR-RR). “Ainda que a Constituição garanta a este parlamentar o direito ao exercício do mandato até o fim do processo de cassação, não cogito impor ao parlamento a oportunidade de mais um constrangimento.” Costa Neto era presidente do Partido Liberal (PL) na época do mensalão e foi acusado de receber mais de R$ 8 milhões do esquema em troca de apoio do partido ao Congresso.

Duas renúncias
Veja os principais episódios da vida parlamentar de Valdemar:

Agosto de 2005

Acusado de envolvimento no mensalão, Valdemar Costa Neto, presidente do PL na época, renuncia ao mandato de deputado federal pela primeira vez para evitar a cassação e consequentemente a perda
dos direitos políticos.

Outubro de 2006

Candidata-se novamente a deputado federal por São Paulo e consegue retornar ao Congresso.

Junho de 2009

Tem o nome citado nas investigações da Operação Castelo de Areia, conduzida pela Polícia Federal, que apurou crimes envolvendo executivos de construtoras no pagamento de propina para facilitar a liberação de terrenos em São Paulo.

Outubro de 2010

Consegue se reeleger como deputado federal.

Dezembro de 2012

Condenado a sete anos e 10 meses de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro.

Junho de 2013

Esteve no grupo de nove deputados que votou a favor da PEC 37, no dia 25 de Junho de 2013, que limitaria poderes de investigação do Ministério Público.

Dezembro de 2013

Renuncia ao cargo de deputado federal pela segunda vez e é preso no mesmo dia.

Mandatos exercidos

Deputado federal por
São Paulo
Fevereiro de 1991 até
agosto de 2005
(4 mandatos consecutivos)

Fevereiro de 2007 até dezembro de 2013
(2 mandatos consecutivos)

Filiações partidárias

Arena (1979 a 1980)
PDS (1980 a 1984)
PL (1990 a 2007)
PR (2007 até hoje)

Fonte: Correio Braziliense

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