sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

Bombardeio aéreo - Maria Cristina Fernandes

Gripen no lugar das kombis e muda projeto de poder

O Estado que cresceu sobre quatro rodas agora deve ser conquistado pelo ar. A campanha petista pela joia da coroa da Federação começou com um bombardeio aéreo de grande alcance. Num único dia, o governo anunciou a compra dos caças suecos e a construção do terceiro aeroporto da região metropolitana de São Paulo.

É evidente que uma decisão de US$ 4,5 bilhões que mobilizou o lobby dos mais estrelados governantes do planeta e levou 13 anos para ser tomada não teve como alvo a comezinha disputa eleitoral em São Paulo. Mas está claro que a escolha do Gripen trará benefícios para o projeto petista de desalojar o PSDB do Palácio dos Bandeirantes.

Das três propostas em disputa, a dos caças suecos era a mais comprometida com aquilo que os petistas do ABC chamam de embrião de um polo tecnológico. Como já relatou Marli Olmos, do Valor, os suecos foram hábeis em prometer investimentos e fazer aliados em São Bernardo do Campo. Vai demorar, mas oferece ao discurso político uma promessa de futuro.

É com essa parceria que Luiz Marinho, o prefeito da cidade que ascendeu no sindicalismo e na política sob os auspícios do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, pretende reverter o esvaziamento da região que viu sua indústria automobilística espalhar-se pelo país.

O anúncio dos caças se deu no mesmo dia em que se noticiou o fim da produção de kombis, inadaptadas ao airbag, em São Bernardo do Campo.

Parece mera coincidência, mas é também uma migração de projeto de poder. Depois de entupir as cidades brasileiras de carros, o petismo investe mais decididamente, a partir do seu berço político, no desenvolvimento de um polo tecnológico voltado para a indústria de defesa, inteligência, segurança pública e exploração do pré-sal.

Como são setores dependentes de compras governamentais e de linhas de financiamento oficiais, podem servir de lastro ao já verbalizado projeto de 20 anos de poder, que passa pela tomada do Palácio dos Bandeirantes.

O PT paulista nunca esteve tão determinado nesse propósito quanto nesses anos em que esteve fora da cadeira presidencial. A eleição da presidente Dilma Rousseff foi o momento mais nacionalizado da cúpula petista. O ex-ministro Antonio Palocci, voz de Lula no comando, dividia forças com o ex-presidente da Petrobras, o sergipano José Eduardo Dutra e o atual ministro Fernando Pimentel (MG). O terceiro nome da coordenação de campanha, José Eduardo Martins Cardozo, hoje ministro, apesar de paulista, era da cota de Dilma e nunca pertenceu ao grupo lulista.

Em 2014, além de 100% do comando da campanha presidencial, os paulistas contarão, na presidência da seção estadual do partido, com o ex-prefeito de Osasco, Emídio de Sousa, petista de perfil executivo, próximo a Palocci.

Além de desalojar os tucanos, sua missão, na praça que congrega 22% de todos os eleitores do país, é compensar em São Paulo o avanço dos adversários sobre territórios que, nas três últimas eleições, cravaram PT para presidente.

O maior deles é Minas. O ex-governador de São Paulo e o atual, José Serra e Geraldo Alckmin, revezaram-se em derrotas para os petistas naquele Estado nas mesmas três eleições em que o senador Aécio Neves reelegeu-se e fez de Antonio Anastasia governador.

Desta vez, apesar de o PT ter em Fernando Pimentel um candidato competitivo ao governo do Estado, é improvável que o partido repita a façanha de colocar mais de um milhão de votos à frente dos tucanos como o fez em todos os primeiros turnos a partir de 2002.

Dos três maiores Estados do Nordeste, dois, Bahia e Ceará, deram a Dilma vantagem superior a dois milhões de votos em 2010. Desta vez, a situação é mais confortável no Ceará. Na Bahia, Estado que lhe deu a maior dianteira (2,7 milhões de votos) em todo o país, além de o PT não ter mais o bônus da reeleição de governador, enfrentará uma chapa de duas mulheres boas de briga, Lídice da Matta (governo) e Eliana Calmon (Senado), ambas no partido do governador Eduardo Campos (PSB).

No seu Pernambuco, um dos seis em que Dilma alcançou diferença superior a um milhão de votos sobre o PSDB, está claro que a campanha da presidente será dura. No primeiro turno de 2002, Lula só perdeu em três Estados. Dois deles, Ceará e Rio, tinham ex-governadores no páreo presidencial, Ciro Gomes e Anthony Garotinho, ambos ex-correligionários de Campos.

A presidente tampouco terá vida fácil nos Estados da fronteira agrícola, aqueles sempre manchados de azul nos mapas de resultados eleitorais. A situação poderia ser pior se Campos não tivesse que explicar tanto para o agronegócio que, se eleitos, Marina Silva, acolhida como centroavante, será jogada para o escanteio

Com um mapa nacional mais intrincado que o de 2010, Dilma não pode se dar ao luxo de perder em São Paulo. Nos nove turnos em que os paulistas foram às urnas escolher presidente (contando o único de 1989), em apenas dois - os de 2002 - o PT venceu em São Paulo.

Naquela eleição, o desemprego era o dobro do atual e afetava mais o bolsão industrial que o resto do país. A crise no emprego não foi capaz de impedir a vitória de Alckmin, ainda que o PT, com José Genoino, tenha, naquele ano, chegado pela primeira e única vez ao segundo turno na disputa pelo governo estadual. A maior prejudicada pelo desemprego em alta foi mesmo a candidatura de José Serra.

Não é para dar o troco que Alckmin pouco se esforçará por Aécio em São Paulo. É porque corre, de fato, o risco de não se reeleger se desprezar os palanques duplos que lhe são oferecidos por prefeitos dispostos a fechar com Dilma para presidente.

Com o voto 'dilmin' em 2010 a presidente ficou 783 mil votos aquém de Serra no Estado. O potencial de traição desta vez é maior porque o candidato a presidente vem do outro lado da Serra da Mantiqueira.

Dilma leva vantagem por São Paulo, pela primeira vez, não ter candidato na disputa presidencial. Mas esse bônus pode ser relativizado pelo voto 'edumin', sacramentado com a presença do PSB na chapa de Alckmin.

O caça petista ainda tem pela frente as nuvens pesadas da popularidade do prefeito da capital. Fernando Haddad corroi o bônus que o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, tem como sangue novo na política eleitoral. São Paulo nunca esteve tão decididamente no radar do partido, mas o céu dos petistas ainda não é de brigadeiro.

Fonte: Valor Econômico

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