quinta-feira, 15 de agosto de 2013

As duas faces do “orçamento impositivo” - Jarbas de Holanda

A aprovação da PEC do “orçamento impositivo”, ontem à noite pelo plenário da Câmara (em primeira votação por amplíssima maioria, que certamente será mantida numa segunda, antes de seguir para o Senado), e a decisão anterior do Congresso de estabelecer prazo de 30 dias para apreciação de vetos do Executivo constituem passos concretos para recuperação ao menos de parte da autonomia do Legislativo federal. Apequenada já no final do processo constituinte de 1988 pela guinada para o predomínio das prerrogativas do Executivo e a consequente montagem do chamado “presidencialismo de coalizão”. Que a partir de então facilitou a governabilidade, com as distorções fisiológicas utilizadas nos governos FHC e exacerbadas nos mandatos de Lula e de sua sucessora. A PEC que está sendo aprovada – que trans-forma de autorizativa em obrigatória a liberação de emendas parlamentares num valor total correspondente a 1% da receita corrente líquida da União no ano anterior – tem implicações negativas para a gestão fiscal do país, que só poderão ser evitadas ou minimizadas através de controles institucional e social, de problemática eficiência, da qualidade das emendas. Mas a situação vigente, de subordinação do pagamento delas aos interesses do Palácio do Planalto, não tem objetivado melhoria de qualidade e, pior que isso, baseia-se numa seletividade político-partidária que converte a liberação “num toma lá dá cá constrangedor e humilhante pa-ra os parlamentares e o Congresso”, como afirma o presidente da Câmara e autor da PEC, Henrique Eduardo Alves. E a viabilização da mudança – tentada em vão por outras direções do Congresso – está sendo propiciada pela persistente fragilidade política do governo Dilma.

Agora o esforço para concessões prioritárias
Adiado o leilão para o trem-bala pela terceira vez (agora por pelo menos um ano ou mais provavelmente para depois do pleito presidencial de 2014, pela combinação de restrições dos “parceiros estratégicos” estrangeiros a critérios e prazos e com o receio de alto custo eleitoral do polêmico projeto), o governo redobrará esforços para evitar a necessidade de novo adiamento, também, das concessões rodoviárias e ferroviárias programadas. Que são parte importante da aposta da presidente Dilma para reanimação da economia com investimentos privados e obras que elas propiciarão, se forem bem sucedidas. As principais concessões de estradas – de trechos das BRs 116 e 040 – tiveram seus leilões reprogramados para o início de dezembro, dia 2. As de trechos para ligação das BRs 050 e 262 (entre Açailândia, no MA, e Vila do Conde, no PA), estão até agora confirmadas para 18 e 19 de outubro. Todas as quatro ainda enfrentam restrições (para ajuste de critérios) por parte das construtoras interessadas. Quanto às concessões ferroviárias, as do Grupo 1, de trechos do Ferroanel para acesso ao porto de Santos, deverão ser realizadas em 18 de outubro. Enquanto as do Grupo 2, que engloba projetos de obras no Nordeste e no Sudeste, fo-ram adiadas para 2014. As contestações técnicas ao mega-projeto - lançado em 2009 com a enfática promessa de ser entregue antes das Olimpíadas de 2016 – foram reforçadas pelos protestos de rua do mês de junho Que apontaram as deficiências do transporte urbano como efeito emblemático da aguda contradição entre a enorme carga tributária do país e a precariedade dos serviços públicos. A insistência na iniciativa (respaldada pela sua grande patrocinadora, a presidente Dilma, e mantida com a garantia de recursos do BNDES, vultosos, bem como dos Correios e de fundos de pensão) não resistiu aos questionamentos de caráter técnico e político quanto aos custos, à oportunidade e à própria viabilidade econômica do trem-bala. E, por fim, à desistência, de dois dos referidos “parceiros”.

Um bom sinal da Argentina
Reportagem de O Globo, de ontem, resume bem no título “Urnas dão maior derrota ao Kircherismo em dez anos” o resultado das eleições primárias realizadas na Argentina no último domingo. Primárias com voto obrigatório do conjunto do eleitorado – conforme modelo institucional próprio do país – que define as listas partidárias do pleito para renovação parcial da Câmara e do Senado, que ocorrerá em outubro. Trechos da reportagem:“ o percentual obtido pela frente peronista, agora liderada por Cristina Kirchner, alcançou apenas 26% dos votos e foi derrotada nos maiores distritos eleitorais (Buenos Aires, Córdoba, Mendonza, Santa Fé e capital federal) e em províncias menores como Santa Cruz (terra natal de Kirchner), La Rioja, Catamarca, Jujuy e Corrientes – ao lado, foram perdidas 15 de 24 províncias. Ontem (2ª feira), já com os dados definitivos nas mãos, importantes líderes da oposição asseguraram que a Argentina passa a viver o fim de um ciclo político”. E a reportagem foi complementada por artigo do repórter especial José Casado, com o título “O último tango de Cristina”. Que incluiu o seguinte parágrafo: “Como na Venezuela (da duvidosa legitimidade do presidente ungido Nicolás Maduro), a derrota de Cristina traduziu a percepção prevalecente entre os argentinos sobre a tendência ao empobrecimento do país, ao menos no médio prazo. São múltiplos os sinais. Entre os mais visíveis, a expectativa generalizada de desvalorização da moeda (o peso), por conta do acúmulo de desvarios na política”.

Jarbas de Holanda é jornalista

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