quarta-feira, 3 de julho de 2013

Base rachada e prazo curto ameaçam plebiscito

Justiça Eleitoral alerta para risco de consulta perder legitimidade.

Mensagem de Dilma ao Congresso propõe que voto popular decida sobre cinco temas, entre eles, financiamento de campanhas, mudança no sistema de eleição e coligações partidárias; parlamentares reagem.

A presidente Dilma Rousseff enviou ontem ao Congresso sua proposta para a realização do plebiscito para fazer a reforma política. Mas as divisões na base governista e o calendário apertado praticamente inviabilizam a execução da consulta a tempo de as novas regras valerem já para as eleições de 2014. 0 plebiscito já virou uma disputa política entre PT e PMDB. A Justiça Eleitoral avisou que precisa de 70 dias para organizar a consulta, pois é proibido realizá-la sem que a população esteja esclarecida sobre o tema. Com isso, dificilmente as mudanças serão aprovadas pelo Congresso até 4 de outubro, um ano antes das eleições de 2014. Nota assinada pela presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Cármen Lúcia, e pelos presidentes dos TREs alerta ainda que, sob pena de o plebiscito perder legitimidade, não há sentido realizá-lo sem que as novas regras vigorem para a eleição subsequente.

O Brasil nas ruas: Pedras no caminho

Com base dividida e prazo curto, plebiscito dificilmente será aprovado a tempo de valer para 2014

Sem apoio da maioria dos aliados e com calendário apertado, a presidente Dilma Rousseff enviou ontem ao Congresso Nacional sua sugestão de realização de plebiscito para fazer a reforma política. No entanto, o prazo para transformar em lei o que a população aprovar na consulta popular praticamente inviabiliza a vigência das novas regras nas eleições de 2014.

A Justiça Eleitoral avisou ontem que precisa de 70 dias para organizar a realização do plebiscito. Assim, dificilmente as mudanças serão aprovadas pelo Congresso até 4 de outubro, um ano antes das eleições de 2014. E a legislação proíbe que mudanças nas regras das eleições ocorram a menos de um ano do pleito. Sem acordo em torno do formato, do tempo de sua realização e, principalmente, quanto ao mérito das mudanças, o plebiscito se transformou numa disputa política entre PT e PMDB.

Na lista da consulta que Dilma quer submeter à população estão o financiamento de campanhas eleitorais, mudança no sistema eleitoral, coligações partidárias, fim da vaga de suplente de senador e o fim do voto secreto no Legislativo - esses dois últimos pontos desagradaram bastante aos parlamentares.

A nota assinada pelos presidentes dos Tribunais Regionais Eleitorais e pela presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Cármen Lúcia, frisa que mudanças na legislação só podem valer para uma eleição, se aprovadas com um ano de antecedência. Ou seja, para as mudanças vigorarem já no ano que vem, o TSE e o Congresso teriam que fazer uma verdadeira maratona até o início de outubro deste ano: o Congresso teria que aprovar a toque de caixa o decreto Legislativo, convocando a consulta popular. A partir de então, o TSE organizaria o pleito. Após o resultado do plebiscito, o Legislativo voltaria a apreciar, então, textos de projetos de lei ou propostas de emenda constitucional com os temas aprovados pelo eleitor para a reforma política.

Considerando os 70 dias que a Justiça Eleitoral alega que precisa para organizar, Câmara e Senado teriam, ao final de todo esse processo, duas semanas antes do início de outubro para votar os projetos, regulamentando as linhas aprovadas na consulta popular, o que é praticamente impossível.

O PMDB, como a oposição e outros partidos aliados, defende a realização da consulta popular junto com a eleição do ano que vem. Assim, as mudanças valeriam a partir das eleições de 2016. O PT insiste no discurso do plebiscito, mesmo sabendo das dificuldades, para marcar posição em defesa da reforma.

Na Câmara, proposta de Dilma chega a irritar parlamentares

Em nota, bancada do PMDB sugere redução de número de ministérios

Isabel Braga, Paulo Celso Pereira

BRASÍLIA - O prazo de 70 dias pedido pela presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministra Cármen Lúcia, para realizar o plebiscito da reforma política foi a saída honrosa que os congressistas precisavam para sepultar o projeto da presidente Dilma Rousseff de alterar as regras eleitorais já para as eleições de 2014. O governo enviou ontem de manhã o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, e o vice-presidente Michel Temer ao Congresso, com um ofício incluindo cinco pontos que Dilma defende para a reforma.

A rejeição entre os parlamentares, inclusive os do maior partido da base, o PMDB, foi imediata; no fim da tarde, após uma longa reunião entre os líderes de todos os partidos, a opinião majoritária na Câmara era a de que a consulta não sairá mais este ano.

O próprio líder do governo, Arlindo Chinaglia (PT-SP), saiu do encontro admitindo a dificuldade de levar adiante a proposta de consulta:

- A questão das datas não é matemática, é política. Aqui, quando tem acordo, a gente faz quase chover para cima. Mas não é fácil acordo nesse tema, até porque cada partido disputa poder nesse tema.

Antes do pronunciamento do TSE, o próprio Temer já se mostrava cético:

- Primeiro, precisamos ter uma resposta do TSE. Se ele disser que leva três meses, como você vai fazer? Bem, digamos que seja menos, (ainda assim) não é fácil você propor uma emenda constitucional para se processar no prazo de um mês. A única sugestão que o Executivo faz é que saia o plebiscito. Agora, quando vai sair, é o Congresso que vai decidir - explicou.

O presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), elogiou a maneira respeitosa como Dilma apresentou a sugestão, mas também foi claro:

- Pelo que eu vi, é difícil a Casa chegar a um consenso de uma forma ou de outra, tanto plebiscito, quanto referendo. Mas acho que essa Casa tem que votar a reforma política, tem que ter a consciência de que tem que votar.

Cobrança ao parlamento

Na mensagem enviada ao Congresso, a presidente retomou o discurso em defesa das manifestações, cobrou uma atuação do Parlamento para a renovação do sistema político e defendeu o plebiscito: "A consulta popular é recomendável quando as formas de representação política dão sinais de que precisam ser renovadas". Fez questão de criticar a proposta de referendo, defendida pela oposição e alguns partidos da base, na qual a população aprova ou não a reforma já votada pelo Congresso.

Os cinco pontos de debate propostos pela presidente são: a forma de financiamento das campanhas (público, misto ou misto sem doação de empresas), a definição do sistema eleitoral (proporcional, distrital, distrital misto, majoritário ou em lista partidária), o fim da suplência de senadores, o fim da coligação proporcional e o fim do voto secreto no Parlamento.

Ainda que seja o de menor impacto no processo eleitoral, a inclusão do fim do voto secreto no Parlamento foi o que mais incomodou os deputados - projeto neste sentido foi aprovado na semana passada na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, como uma das principais respostas ao clamor das ruas. A sua inclusão no ofício de Dilma foi vista como uma intromissão indevida em temas do Parlamento.

A reação mais agressiva foi do PMDB. A bancada de deputados divulgou nota sugerindo medidas administrativas que o governo deveria tomar, como a redução no número de ministérios: "A bancada sugere ao governo, para uma demonstração de austeridade, a imediata redução do número de ministérios, se comprometendo, inclusive, a propor medida legislativa nesse sentido e abrindo mão, se necessário, dos seus", diz a nota.

A bancada ainda sugeriu a votação de uma "pauta-bomba" para o governo: a votação imediata de proposta que destina 10% das receitas da União para a Saúde e um debate prioritário do pacto federativo, que inclui a destinação de mais recursos federais para estados e municípios. Para completar, anunciou que só apoia a consulta popular se ela for realizada na mesma data das eleições do próximo ano. E avisou que pretende incluir temas como a instituição do parlamentarismo, o fim da reeleição e a mudança no tempo de mandato.

- A proposta de plebiscito é ineficaz, eu disse isso à presidente. O custo é absurdo e desnecessário. A população não quer ser enganada, e não há tempo de votar, em uma reforma política, nada que não seja por consenso - afirmou o líder do PMDB na Câmara, Eduardo Cunha (RJ).

Outros partidos da base, como PP, PTB e PSD também descartaram a hipótese de uma consulta popular que valha já para as eleições de 2014 e demonstraram irritação com a inclusão do fim do voto secreto na proposta de Dilma.

Fonte: O Globo

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