sábado, 29 de junho de 2013

Mudar para ficar igual - Denise Rothenburg

Os políticos poderiam considerar, pelo menos uma vez na vida, os limites da ingenuidade do eleitor. As tentativas do Congresso e do Planalto em apresentar respostas às manifestações nas cidades serviram apenas para demonstrar o quanto as autoridades atrapalham o jogo democrático. Todas as medidas, entre promessas e projetos aprovados para diminuir o barulhos dos protestos, estão longe de resultados. E, sabe-se, entraram na pauta efetiva da Esplanada depois das imagens do mar de gente com cartazes improvisados a reivindicar de tudo. Um tudo resumido em transparência, algo difícil ao poder político.

Reportagem de Amanda Almeida, Juliana Colares e Diego Abreu publicada na edição de ontem deste Correio mostrou que todas as medidas apresentadas até agora têm grandes entraves para serem colocadas em prática. Mesmo com os sustos das manifestações, os políticos voltaram a fazer o que sabem: burocratizar a pauta. Primeiro, com ideias sobre plebiscito, tão desamarradas que é impossível apostar ou botar alguma fé. Pelo menos no que depender das reuniões feitas até agora entre Dilma e a base aliada. Ali, a cada encontro aumenta o pacote de propostas do tal plebiscito.

Depois de o Palácio do Planalto anunciar que as perguntas serão centradas no financiamento público de campanha e o sistema eleitoral — o que já daria uma confusão danada —, a pauta de itens do plebiscito só tem aumentado. Apareceu um com a ideia de ouvir a população sobre a reeleição e sobre se é possível esticar o mandato presidencial para cinco anos. Daqui a pouco, outro vai querer diminuir o número de parlamentares no Congresso. A lista será infindável, tudo para melar o plebiscito. É o que a maior parte dos políticos quer.

Satisfação

Na real, os políticos estão satisfeitos com o atual modelo. Qualquer ensaio de mudanças na verdade é uma tentativa de manter as coisas no devido lugar. Os exemplos são os mais variados. E os mais tristes. Por mais de 60 anos, parlamentares receberam 15 salários anuais, dois a mais do que qualquer trabalhador. E só pararam de receber este ano depois de uma campanha efetiva deste Correio, e com a troca do comando da Câmara dos Deputados, que, a partir de uma agenda positiva, viu na proposta a chance de reabilitar a imagem. Agora, com as manifestações, decidiu-se acabar com o voto secreto.

O fim do voto secreto chegou a ser estampado em uma das faixas da manifestação de quinta-feira da semana passada em Brasília. E foi considerado pelos políticos como uma reivindicação das ruas. Assim, apresentaram uma resposta, aprovando o texto na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara. O detalhe é que o projeto que está na pauta põe fim ao voto secreto apenas nos casos de cassação de parlamentares. Todos os outros, como veto presidencial, continuam fechados.

As dificuldades de implementação das propostas também aparecem na destinação dos royalties, responsabilidade fiscal, destinação de dinheiro para mobilidade urbana, aceleração de julgamentos por improbidade — uma meta do Judiciário —, passe livre para estudantes, redução do grande número de ministérios de Dilma e a rejeição do projeto de "cura gay".

Sem contar com a própria mudança de tipificação da corrupção, que passa a ser considerada crime hediondo. A alteração no rigor da lei nem sempre reduz a roubalheira dos políticos, como mostram alguns estudos. Como em quase todos os crimes.

Assim, as mudanças políticas estão longe da urgência das ruas. Os eleitores sabem disso, sem ingenuidade.

Quem precisa de oposição?

Depois de cometer todos os erros políticos nos primeiros dias das manifestações, Dilma Rousseff parece disposta a ouvir setores sociais. Mesmo que por sobrevivência política, a ação foi festejada por parte do PT, que espera um suspiro nos próximos dias dentro do Palácio do Planalto. Tal parte trata-se dos petistas mais ligados a Dilma. Os correligionários de Lula no partido preveem dias mais conturbados.

Fonte: Correio Braziliense

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