segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

OPINIÃO DO DIA – Rancière: a arte como intervenção política

O modelo da arte que assume um compromisso político teve em Brecht uma referência. Brecht almejava desestabilizar a percepção do espectador para que, no espaço da obra, ele visse como absurdo aquilo que considerava normal, produzindo assim alguma transformação em seu espírito, que poderia ser canalizada em energia para ações transformadoras. Esse raciocínio é muito problemático, claro. “Desestabilizar a percepção” era um princípio surrealista que Brecht tentou transmutar em pedagogia política. Isso nunca produziu efeitos políticos verificáveis, só produziu uma certa concepção do que uma “arte política” deveria ser. Mas há outro modelo de compromisso político, que está um pouco esgotado mas precisa ser renovado, que concebe o trabalho político do artista como a investigação de determinado aspecto da realidade que está enquadrado, estereotipado ou formatado pelo senso comum, na tentativa de devolvê-lo à realidade sensível. Esse modelo é importante para pensarmos na arte não como uma pedagogia ou explicação do mundo, e sim como uma reconfiguração do mundo sensível. Vejo isso no trabalho do cineasta português Pedro Costa, por exemplo. Em seus filmes com comunidades de imigrantes em Portugal (como “Juventude em marcha” e “O quarto de Vanda”), ele não está interessado apenas em descrever a miséria ou denunciar a exploração, mas sim em tornar sensível esse universo, em restituir a força da experiência e da palavra aos excluídos

Jacques Rancière, filósofo francês Em entrevista (embaixo) 

Manchetes dos principais jornais do País

O GLOBO
Chávez anuncia 4ª cirurgia e nomeia vice como sucessor
Turistas brasileiros gastam US$ 21 bi
STF decide hoje se cassa mandato de deputados
Escolas podem ter aula de ética

FOLHA DE S. PAULO
Chávez anuncia a quarta
cirurgia e aponta o sucessor
Haddad escolhe o ex-ministro Juca Ferreira para a Cultura
Supremo volta a discutir cassação de três deputados
Decisão no STF pode iniciar crise entre os Poderes
Qualidade de vida é uma nova forma de puritanismo
Ataque a ônibus após ação da PM mata 2 passageiros

O ESTADO DE S. PAULO
Chávez anuncia volta do câncer e nomeia sucessor
Congresso quer barrar prisão de deputados
PF afirma que Rose era o ‘braço político da quadrilha’
Em 6 anos, Tesouro injeta R$ 390 bi em bancos públicos

VALOR ECONÔMICO
Bolsa vacila com escassez de papéis e excesso de gestores
'Bolsa verde' negocia mata excedente
Preços de importados caíram 3,1%
O submarino brasileiro que vem de Cherbourg
Petrobras obtém licença no pré-sal

BRASIL ECONÔMICO
BNDES eleva para R$ 30 bilhões crédito destinado à infraestrutura
Com desoneração, vinte estados já estão no vermelho
Posse da terra
Chávez admite ter que deixar o poder

CORREIO BRAZILIENSE
Ficha Limpa amplia punição a mensaleiros
Olho gordo da Anvisa contra a sibutramina
Tumor volta e Chávez vai para Cuba

ESTADO DE MINAS
Hugo Chávez volta a Cuba para se tratar
Ficha Limpa tira políticos das eleições

O TEMPO (MG)
Fantasma das drogas atinge 91% dos municípios de Minas
Minas perde R$ 4,5 bi por ano com dívida e política mineral
Mercado de agrotóxicos dispara, e o Brasil se torna o maior consumidor

ZERO HORA (RS)
Calçadistas que deixaram o Rio Grande fecham portas

JORNAL DO COMMERCIO )PE)
Chávez se afasta
O nó PMDB X PSB

O que pensa a mídia - Editoriais dos principais jornais do País

http://www2.pps.org.br/2005/index.asp?opcao=editoriais

PF afirma que Rose era o ‘braço político da quadrilha’

No relatório da Operação Porto Seguro, a PF sustenta que Rosemary Noronha era "o braço político da quadrilha" que se instalou em órgãos públicos para compra de pareceres. Celso Vilardi, advogado de Rose, afirma que “solicitar reunião não é crime"

PF afirma que Rose era o "braço político da quadrilha"

No relatório da Operação Por­to Seguro que entregou à Justi­ça Federal na última sexta-fei­ra, a Polícia Federal sustenta que Rosemary Noronha, ex-chefe de gabinete da Presidên­cia da República em São Paulo, era "o braço político da quadri­lha" que se instalou em órgãos públicos para compra de pare­ceres técnicos fraudulentos.

Segundo a PF, Rose "fazia aqui­lo que Paulo Vieira pedia". Viei­ra, ex-diretor de Hidrologia da Agência Nacional de Águas (ANA), foi nomeado para o car­go por recomendação e ingerên­cia de Rose que, em troca de e-mails interceptada pela PF, di­zia a seus interlocutores frequen­temente que se reportava ao en­tão presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a quem rotulava de PR.

A PF sustenta que Vieira era o líder da organização que teria se infiltrado nas repartições fede­rais, inclusive três agências re­guladoras, para atender interes-

! ses empresariais, como do ex-senador Gilberto Miranda, que também foi indiciado no inqué­rito da Porto Seguro.

Um irmão de Paulo, Rubens Vieira, chegou a cargo estratégi­co - diretor de Infraestrutura Ae­roportuária da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) - pelas mãos de Rose, conclui a PF.

"(Rosemary) marcava reu­niões, colocava pessoas de in­teresse de Paulo em contato com autoridades", assinala o relatório da PF.

Rose foi indiciada pela PF em quatro crimes: corrupção passi­va, falsidade ideológica, tráfico de influência e formação de qua­drilha. Nomeada para o cargo em 2009 pelo então presidente Lula, ela foi demitida no último dia 24 pela presidente Dilma Rousseff, quando estourou a Operação Porto Seguro. Segundo a PF, Rose mantinha "relação estável" com a organiza­ção, não agia apenas pontual­mente. O relatório da PF diz que Rose "não usava propriamente o gabinete (da Presidência da Repú­blica), mas se valia certamente do cargo e da influência".

No despacho de indiciamento de Rose - que não prestou depoi­mento, ficou em silêncio a PF assinala vantagens que ela rece­beu no exercício da função, co­mo passagens para cruzeiros ma­rítimos, obtenção de nomea­ções de familiares - inclusive a filha, Mirelle - em cargos públi­cos sem concurso." O documento da PF reitera observações já feitas anterior­mente, quando do indiciamen­to criminal de Rose.

Segundo a PF, a ex-chefe de gabinete da Presidência foi en­quadrada por tráfico de influên­cia e corrupção "em razão da identificação de constante tro­cas de favores com relevante va­lor financeiro entre ela a o gru­po de Paulo Vieira, cobranças de serviços de reforma presta­dos, cobrança de pagamento de "30 livros" por trabalho realiza­do, promessa de influência para indicação para cargos, produ­ção de documentos ideologica­mente falsos".

A PF diz ainda que Rose agia "como particular, e valendo-se de sua amizade e acesso com pes­soas em diversos órgãos públi­cos, para atuar e influir em no­meações e indicações."

"(Rosemary Noronha) marcava reuniões, colocava pessoas de interesse de Paulo em contato com autoridades."

Fonte: O Estado de S. Paulo

STF decide hoje se cassa mandato de deputados

Os ministros devem concluir hoje a votação sobre a perda de mandato dos deputados Valdemar Costa Neto (PR-SP), João Paulo Cunha (PT-SP) e Pedro Henry (PP-MT), condenados no mensalão. A tendência é pela aprovação da cassação imediata, o que deve gerar conflito entre os poderes, já que o presidente da Câmara, Marco Maia, entende que só o Congresso pode cassar parlamentares.

Mandatos na berlinda

STF deve decidir hoje se deputados condenados no mensalão serão cassados imediatamente

Jailton de Carvalho

UM JULGAMENTO PARA A HISTÓRIA

BRASÍLIA - O Supremo Tribunal Federal (STF) deve concluir hoje a votação sobre a perda do mandato dos deputados João Paulo Cunha (PT-SP), Valdemar Costa Neto (PR-SP) e Pedro Henry (PP-MT), réus parlamentares condenados no processo do mensalão. A tendência do tribunal é aprovar - com pelo menos cinco votos - a proposta de cassação imediata do mandato formulada pelo relator e presidente do Tribunal, Joaquim Barbosa. Mas a questão é delicada e, além de forte tensão politica, pode gerar um impasse institucional.

O presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), entende que o STF não tem poder de decretar a perda de mandato parlamentar, nem mesmo com base em sentença criminal. Esta seria uma atribuição exclusiva da Câmara, em caso de deputados, ou do Senado, em caso de senadores envolvidos em processos criminais. Na semana passada, Barbosa propôs a cassação do mandato dos três deputados condenados com base no artigo 55 da Constituição.

Pelo texto, perderá o mandato o deputado ou senador que "sofrer condenação criminal em sentença transitada em julgado". Para Barbosa, depois da decisão do STF, caberia à Câmara o papel burocrático de cumprir a ordem sem maiores delongas. Barbosa chegou a dizer que quem não cumprir a ordem do STF deveria arcar com as graves consequência que se seguiriam à desobediência de uma decisão da mais alta Corte do país.

Do outro lado, Maia usa o mesmo artigo para defender tese oposta. No parágrafo segundo, o artigo 55 da Constituição diz que, após a condenação criminal, "a perda do mandato será decidida pela Câmara dos Deputados ou pelo Senado Federal, por voto secreto e maioria absoluta, mediante provocação da respectiva Mesa ou de partido político representado no Congresso Nacional, assegurada ampla defesa".

Com base neste parágrafo e, em especial, na expressão "a perda do mandato será decidida", Maia disse que a palavra final sobre a cassação do mandato de qualquer deputado seria da Câmara, independentemente do conteúdo da decisão do STF. Maia se ampara em dois pareceres internos que são taxativos na indicação de que decisões do STF não atingem mandatos.

A direção da Câmara está certa também de que existe um roteiro específico a seguir. O STF teria que enviar para a presidência da Câmara a indicação de perda imediata do mandato de João Paulo, Valdemar e Pedro Henry. A partir daí, por uma iniciativa da Mesa da Câmara ou de algum partido, o caso seria encaminhado ao corregedor da casa, que interrogaria os três deputados e emitiria um parecer. Esse relatório teria ainda de ser enviado ao Conselho de Ética e, se aprovado, submetido ao plenário da Câmara. O plenário poderia ou não confirmar uma eventual decisão do STF pela perda do mandato dos deputados.

- Se o plenário rejeitar o pedido, os deputados não perdem o mandato - disse um auxiliar de Maia, resumindo a visão do presidente da Câmara.

Interlocutores do presidente da Câmara dizem ainda que nessa queda-de-braço está em jogo também a força do mandato parlamentar. A questão básica é se o STF poderia ou não decretar a perda de um mandato, a partir de uma decisão criminal. Não faz muito tempo que até para processar um deputado o STF precisava de autorização prévia da Câmara.

O tema é explosivo. Na sessão de quinta-feira passada, Barbosa defendeu enfaticamente que a Câmara deve apenas cumprir a decisão do STF. O revisor do processo do mensalão, Ricardo Lewandowski, discordou com um longo voto em que retrocedeu à França revolucionária para destacar a separação dos poderes e a valorização do mandato parlamentar.

Os demais ministros não votaram, mas quatro deles deram indicações de que acompanhariam o relator. Durante o embate entre relator e revisor, os ministros Marco Aurélio, Gilmar Mendes, Luiz Fux e Celso de Melo apresentaram argumentos que, em linhas gerais, reforçavam a tese de Barbosa. Já os ministros Dias Tóffoli e Cármen Lúcia pareciam inclinados a seguir Lewandowski.

A ministra Rosa Weber se manteve distante do debate e não forneceu pistas de como votará. Nove ministros têm participado das últimas rodadas de votação do STF. A vaga deixada pelo ex-presidente Ayres Britto ainda não foi preenchida. Teori Zavascki, o novo ministro, compareceu a uma das sessões, mas não interveio nas discussões.

Mesmo na hipótese de acolhida a tese do STF de perda de mandato imediata, isso só ocorreria de fato após a publicação do acórdão do processo do mensalão, o que deve demorar ainda alguns meses, já que o trâmite jurídico inclui prazo para recursos.

Fonte: O Globo

STF define hoje a situação dos deputados condenados

Três ministros já indicaram apoio a Joaquim Barbosa, que defende cassações

Decisão provocará atrito com a Câmara, para quem a palavra final sobre três réus deve ser do Legislativo

Márcio Falcão, Felipe Seligman e Rubens Valente

BRASÍLIA - O STF (Supremo Tribunal Federal) volta a discutir hoje a situação dos três deputados federais condenados por seu envolvimento com o mensalão, inclinado a determinar a cassação de seus mandatos.

O problema começou a ser discutido pelos ministros do Supremo na última quinta-feira e a decisão deverá provocar atrito com a Câmara dos Deputados, para quem a palavra final sobre os deputados deve ser do Legislativo.

A discussão afeta os deputados federais João Paulo Cunha (PT-SP), Valdemar Costa Neto (PR-SP) e Pedro Henry (PP-MT), condenados por crimes como corrupção passiva, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha.

O ex-presidente do PT José Genoino, que pode assumir uma vaga na Câmara como suplente no ano que vem, também poderá ser afetado pela decisão. Ele foi condenado por corrupção ativa.

Três ministros indicaram na quinta-feira que vão acompanhar o voto do relator e presidente do tribunal, Joaquim Barbosa, para quem o Supremo tem autoridade para determinar a cassação dos mandatos, cabendo à Câmara apenas formalizar a medida.

Se a opinião de Barbosa prevalecer, a cassação só ocorrerá depois que forem esgotadas todas as possibilidades de recurso dos advogados dos condenados contra as penas fixadas pelo STF, o que só deve ocorrer no ano que vem.

O revisor do mensalão, ministro Ricardo Lewandowski, discorda de Barbosa e afirmou na quinta-feira que a palavra final sobre os mandatos deve ser da Câmara, porque se trata de um juízo político.

O revisor entende que a suspensão dos direitos políticos dos três parlamentares, conforme foi declarada pelo STF, impede apenas que eles se candidatem à reeleição.

Na semana passada, o julgamento do mensalão foi suspenso depois dos votos de Barbosa e Lewandowski. Durante a sessão, os ministros Luiz Fux, Marco Aurélio Mello e Gilmar Mendes indicaram que seguirão Barbosa hoje.

São incertos os votos dos ministros Celso de Mello, Cármen Lúcia, Rosa Weber e Dias Toffoli. O ministro Teori Zavascki, que tomou posse há uma semana, disse que não vai opinar sobre o tema. Barbosa precisa do apoio de quatro colegas para prevalecer.

"A Constituição é expressa ao dizer que cabe à Câmara, não se trata de uma interpretação minha", afirmou ontem o advogado de João Paulo Cunha, Alberto Toron. "O Supremo não pode interpretar contra a Constituição, não há vazio nessa matéria."

O artigo 55 da Constituição diz que cabe ao Congresso, "por voto secreto e maioria absoluta", a decisão sobre o futuro do mandato no caso da perda dos direitos políticos, a exemplo do decidido no caso do mensalão.

O advogado de Pedro Henry, José Antonio Duarte Alvares, disse que a polêmica não deverá acabar com a decisão do Supremo. "Acredito que ainda existirá algum contraponto da Câmara", afirmou.

Os ministros ainda devem discutir na sessão de hoje uma proposta de Lewandowski que reduz o valor das multas fixadas pelo STF, a possibilidade de cobrar indenizações dos condenados e o momento em que eles serão presos.

Fonte: Folha de S. Paulo

“O Brasil é uma vasta comilança” - Wilson Figueiredo

“Ninguém quer saber de discutir, ninguém quer agitar idéias”, queixava-se Lima Barreto, por intermédio do seu personagem Policarpo Quaresma, quando a República ainda estava na moldura do sonho de que passaria a limpo os costumes políticos que sobrecarregaram a monarquia e deixaram a desejar muito mais do que faltava ao Brasil no crepúsculo do Século 19.

“Todos querem é comer”, concluía Policarpo, para usar genericamente um verbo que tem significados variados mas uma única maneira de conjugar, com aplicação variada. O Triste fim de Policarpo Quaresma vocalizou com mão de mestre a decepção com a República que derrapava no encilhamento financeiro e na frustração das promessas à maneira possível à época. A simbiose entre interesse público e interesse privado dava o que comentar, o ano inteiro, na vida diária dos cidadãos.  A senha de Lima Barreto: “O Brasil é uma vasta comilança”.

O triste fim de Policarpo foi uma paródia que garantiu o futuro do seu autor em termos literários, mas não incrementou o gênero de tratar, com a mesma qualidade e em forma de ficção, a realidade política nacional. Nem limpou os costumes.  O produto literário bruto da República deixa a desejar, tanto quanto o saldo insuficiente dos períodos constitucionais e ditaduras que não dizem a que chegam e se vão sem prestar contas do que deixaram de fazer. E do resto.

O áspero sabor de paródia garantiu o sucesso do livro que manteve, com ironia e pessimismo, o sucesso do autor por todas as Repúblicas que se sucederam e sucumbiram aos mesmos sintomas enquanto o tempo transcorria. A primeira República, pretendida a dos sonhos, durou mais que todas as que se seguiram, e deixaram saldo negativo em literatura de compromisso político, que vem a ser a maneira suportável de reconhecer as verdades e conviver com as inverdades.

Pelo resultado ou, melhor, pela falta de saldo (para não dizer tudo), das sucessivas formas de governo que alternaram períodos constitucionais e ditaduras ao longo do século 20, o remédio para as crises que espreitavam a democracia, no gargalo das sucessões presidenciais, passou a ser, bem depois do que se comenta,  a reeleição que os fundadores da primeira república abominavam. Bateram o pé e não a deixaram entrar. Mais adiante, Fernando Henrique, no paraíso da utopia social-democrata, sem considerar as conseqüências, mordeu a maçã que uma serpente lhe ofereceu, saiu da história e assina ponto como ex-presidente. O resto também é conversa fiada.

“Todos querem é comer”, explode em veemência e indignação o personagem por intermédio do qual seu criador, Lima Barreto, diz o que pensa e o leitor concorda com a resignação de quem paga a conta por falta de alternativa. O verbo comer acolheu na atual república as significações que ampliaram sua presença na vida social. Em jogo de futebol, diz-se que o goleiro come frango (quando deixa a bola passar por falha ou desatenção). A fome endêmica de leis não explica mas deixa muito subentendido na flexibilidade do verbo. 


Já não há intervalo na faina das empresas do florescente ramo de negócios que o poder público administra ou se associa. Nem se percebem nuances nas diferentes aplicações do verbo, para não ter que usá-los na contabilidade oficial. Pelo jeito, o enriquecimento por fora dos mandatos e funções públicas, vai acabar mesmo  figurando nos cálculos do Produto Interno Bruto.

A questão não está posta, mas vai postar-se em breve, com o potencial que, no passado, levaria a uma crise, mas já aponta na direção do futuro que não tem tempo a perder e não pode voltar atrás. Nem dar passos maiores do que as pernas. No desabafo político de Lima Barreto, pulsa com ênfase de indignação cívica o toque de classe média veemente que, desde a propaganda republicana, desenvolveu lenta e crescente presença política.

O resto que falta está a caminho. O pedágio passa a ser pago na sucessão presidencial que começa com dois candidatos  do mesmo partido e da mesma procedência oficial  mas um prosseguirá e outro ficará pelo caminho no espaço legal disponível. A questão (Dilma ou Lula?) lateja nos bastidores, virá a público e trará conseqüências, estas sim, imprevisíveis e inevitáveis.

Fonte: Jornal do Brasil

A saída é trair - Ricardo Noblat

“Eu me arrependo de uma coisa: de ter tocado guitarra na festa do ministro Joaquim Barbosa. ” Luiz Fux, ministro do STF

O que se exige de um juiz para ser promovido pelo presidente da República a ministro do Supremo Tribunal Federal (STF)? Duas qualidades: reputação ilibada e apurado saber jurídico. É o que pede a Constituição , e estamos conversados. Não. Conversados não estamos. A reputação pode não ser tão ilibada e o saber , apenas razoável, desde que o aspirante , digamos assim, seja um homem sensível.

ENTENDA-SE POR sensível: capaz de atender vez por outra a favores de quem o nomeou. Ou dos que o ajudaram a ser nomeado pedindo por ele junto ao presidente e aos seus cupinchas. A verdade é esta: ninguém vira ministro sem contar com padrinhos fortes. De graça, por seus belos olhos e cultura enciclopédica, vira não. Esqueça. E é aqui que mora o perigo. Quero dizer: o problema.

COMO ESPERAR independência de quem pediu favores para chegar a ministro e de quem deve favores por ter chegado lá? Só há uma saída por ora: trair . De certa forma foi o que ocorreu com alguns ministros nomeados por Lula e Dilma. Lula queria ver os mensaleiros livres. Acabaram condenados. O advogado Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, revelou que Joaquim Barbosa pediu a José Dirceu para reforçar suas chances de ser ministro.

NÃO SE SABE se foi atendido. Joaquim acabou sendo impiedoso com Dirceu e a parcela maior dos réus do mensalão. Procedeu de acordo com sua consciência. Conforme as provas que enxergou no processo. Existe a favor de Joaquim o fato de ele ter ido parar no STF dois anos antes de o mensalão sacudir a República. Até então Lula parecia mais interessado em pôr um negro no STF do que em se acautelar contra escândalos e condenações futuras dos seus parceiros. Outros ministros chegaram lá depois de Joaquim. E aí...

TUDO COSTUMA ser muito delicado. Nada é dito de maneira direta. Pessoas próximas do presidente, sem nunca sugerirem que falam em nome dele, sondam as opiniões dos candidatos a ministro. Alguns assuntos preocupam o governo e podem lhe causar sérios embaraços. Dependendo das respostas dos candidatos...

“DEIXA COMIGO que eu mato no peito e chuto”, prometeu Luiz Fux ao ouvir de gente ligada a Lula notícias da aflição dele com o julgamento do mensalão. Fux ainda não era ministro. Pela terceira vez, estava em campanha para ser . Pedia socorro a políticos de todas as cores — Maluf, Delfim Netto, Antonio Palocci, Dirceu e Stédile, coordenador dos Sem Terra.

“MATO NO PEITO e chuto” não significava necessariamente que Fux absolveria os mensaleiros se os julgasse. Mas seus interlocutores entenderam que sim. E é bastante razoável pensar que Fux cometeu a frase para que ela de fato assim fosse entendida. “Eu não conhecia o processo. Ele tinha provas suficientes para condenar os réus”, explicou-se depois.

A INTUIÇÃO DE Lula acendeu a luz vermelha. “Como posso nomear um candidato apoiado ao mesmo tempo por Delfim e Stédile, pessoas tão diferentes?” , perguntou Lula. E não nomeou. Dilma nomeou. E ao comparecer à posse de Joaquim Barbosa como presidente do STF , nem sequer olhou para Fux. Tolice! Fux tem quem olhe para ele no calçadão de Ipanema.

HÁ PROPOSTAS EM tramitação no Senado para mudar a maneira de escolha de ministros dos tribunais superiores e torná-la menos contaminada pelos interesses do governo e dos políticos. Difícil que prosperem. Não servem para o governo. Nem para os políticos que aprovam as nomeações na esperança de colher favores futuros.

Fonte: O Globo

Energia no palanque - Aécio Neves

Pouco antes das últimas eleições, a presidente Dilma Rousseff anunciou, em rede de rádio e TV, a decisão de reduzir em 20%, em média, a conta de luz dos brasileiros. Por mais que ficasse claro o viés eleitoral de uma medida a ser implementada apenas seis meses depois, ela mereceu aplauso de todo o país. A grande surpresa veio com a edição da medida provisória 579, que altera radicalmente o marco regulatório do sistema elétrico nacional.

Graves equívocos permeiam a proposta. A começar por reduzir a poucos gabinetes a responsabilidade por mudanças tão profundas, ignorando o Congresso, as empresas do setor, especialistas e vozes qualificadas do seu próprio partido e do governo, alijadas do processo.

A retórica não conseguiu esconder o alto risco que as mudanças carregam. Entre os que se levantam para alertar o governo está a voz corajosa do professor Luiz Pinguelli Rosa, ex-presidente da Eletrobras no governo Lula. Ele, como todos nós, concorda com a necessidade de redução do custo da energia, mas alerta que as medidas anunciadas não conseguirão alcançar esse objetivo; que a capacidade de investimento das empresas (leia-se ampliação da oferta, qualidade e segurança dos serviços) ficará comprometida, havendo o risco de desemprego no setor. Ou seja, no fim, quem vai pagar a conta -alta- é a população. A energia mais cara é aquela que o país não tem.

Com dificuldades de enfrentar críticas e o debate à luz do dia, o PT optou, mais uma vez, pela conveniência de torcer a realidade para que ela ganhe os contornos que lhe interessam. Sem argumentos, preferiu estimular a desinformação criando um mantra a ser repetido com ferocidade pela claque Brasil afora: "O PT quer baixar a conta de luz e o PSDB não deixa!"

Mentem. Na velha tese de que os fins (a permanência do partido no poder) justificam os meios, legitimam a mentira como arma do embate político e desrespeitam os brasileiros, em nome de quem dizem agir.

Pouco importa a desconfortável constatação de que governos do PSDB, como São Paulo, Paraná e Minas Gerais, pratiquem a isenção de impostos nesta área em patamares superiores à de governos do PT. Em Minas, metade das famílias não paga ICMS nas contas de luz. Tampouco que as oposições venham há muito cobrando redução dos cerca de dez tributos federais incidentes sobre a conta de luz.

É o velho PT agindo como sempre fez. Em época de crise, invente um inimigo e desvie a atenção dos seus problemas. Aí está, de novo, o discurso do nós -os bons- contra eles -os maus. O governo começou a tratar esta questão, tão séria e complexa, em cima de um palanque e, infelizmente, ainda não desceu dele. O país não merece isso.

Aécio Neves, senador (PSDB-MG)

Fonte: Folha de S. Paulo

Percepção e realidade - José Roberto de Toledo

2014 chegou antes de 2013. Desde a semana passada, a sucessão de Dil­ma Rousseff (PT) virou prato princi­pal e é improvável que o cardápio mude pelos próximos dois anos. O molho varia do explícito (o lança­mento do presidenciável Aécio Ne­ves pelo PSDB) ao subentendido (a polêmica do pibinho), passando pe­lo trágico (ascensão e queda do bai­xo clero da corrupção petista) e o cômico (revista inglesa pedindo ca­beça de ministro no Brasil).

A economia - que elegeu FHC, Lu­la e Dilma - é o ingrediente principal do debate, novamente. A pegadinha é que o gosto popular está cada vez mais distante do palato dos críticos. As diferenças de percepção são tão distintas quanto seus instrumentos

; de medida. A confiança do consumi­dor dá picos enquanto as aferições do PIB afundam. Investimentos param ao mesmo tempo que o crédito dispara.

Para cada indicador negativo há um positivo e vice-versa. Depende do gos­to do freguês. A produção de automó­veis caiu pela primeira vez desde 2002? Mas a taxa nacional de desem­prego é a mais baixa desde muito antes disso. Os salários brasileiros crescem duas vezes mais do que a média mun­dial? Mas o capital estrangeiro foge do Brasil para índia, China ou aonde seja.

Economistas dizem que os indicado­res positivos refletem o passado e os negativos, o futuro. Eles devem ter ra­zão, como tiveram ao prever 10 das últi­mas 3 recessões.

A piada é gasta porque não há outro ramo de atividade no qual projetar im­punemente dê tanto prestígio e dinhei­ro quanto a economia. Entre 2000 e 2010, as previsões de crescimento do PIB feitas pelo mercado (e publicadas pelo boletim Focus do Banco Central) tiveram um erro médio de mais de 50%. Nove em 10 erraram. Guido Mantega está em linha com seus pares.

Probabilisticamente, se Dilma aten­desse a The Economist e decapitasse o ministro da Fazenda, a presidente te­ria 90% de chance de trocar seis por meia dúzia.

O que tanto mudou desde 2010, quando a revista inglesa enfiou um fo­guete sob o Cristo Redentor, até a pu­blicação do obituário do PIB brasileiro na semana passada? Foi o PIB ou seu parâmetro de comparação? A bipolaridade eufórico-depressiva parece estar tanto nos olhos de quem vê quanto no objeto da observação.

Aos redatores ingleses resta citar a tirada célebre: "Quando os fatos mu­dam, eu mudo minha cabeça, o senhor não?" A frase é ora atribuída a John Maynard Keynes, ora a John Kenneth Galbraith. Importa menos o nome do que o fato de que o autor é economista.

Economia eleitoral

Nada se correlaciona mais à popula­ridade presidencial do que a confiança do consumidor. Ambas estão ascen­dentes, apesar do pibinho. Como pode ser? Porque o consumidor avalia que sua situação financeira está melhor do que há seis meses, e acha que vai melho­rar ainda mais no futuro próximo - pu­xada por emprego e salários em alta. É portanto um jogo de percepção e ex­pectativa.

O PIB vai seguir a confiança do con­sumidor, como quer o governo, ou o consumidor vai acabar se convencen­do de que o melhor já passou e trocar de canoa, como sonha a oposição? As i expectativas são, em boa parte, autor-realizáveis. Portanto, vencer a batalha de versões sobre a economia é come­çar bem a guerra sucessória.

Chefe do PSB, Eduardo Campos se antecipou dizendo a empresários descontentes com a economia que falta rumo estratégico ao país - im­plícita é sua oferta por nova bússola. Campos morde e assopra. Pode ser o "tertius" que forçaria um segundo turno em 2014, ou o aliado que facili­taria a "eventual reeleição de Dilma. Tudo depende das circunstâncias, ou seja, da economia.

O lançamento de Aécio foi quase um empurrão. Fernando Henrique Cardoso jogou o senador mineiro na arena. Aécio gaguejou, mas não tem opção. Se não mostrar gana pa­ra ser candidato agora, quando o PSDB não tem alternativas, vai per­der o trem da história. Não assumiu o discurso, mas já age como candida­to.

A redução das tarifas de energia elétrica é um ato de campanha de Dilma pela reeleição. Ao gorarem o plano presidencial, as concessioná­rias geridas por governadores tuca­nos defenderam o interesse de seus donos mas alimentaram o discurso petista de que o PSDB é demofóbico quando se trata de economia popu­lar. 2014 já começou, mas passa pela economia de 2013.

Fonte: O Estado de S. Paulo

A presidência da Avenida Paulista - Paulo Brossard

Meu propósito era escrever sobre problemas internos e externos que ensombram os horizontes próximos do governo da senhora presidente, mas outro tema, também a ela pertinente, me parece de maior atualidade. Os fatos são de ontem e estão vivos na lembrança de todos. O mensalão aproximava-se de seu termo; seus efeitos eram devastadores, quando outro caso, temperado com nitroglicerina, entrou em ebulição, tendo como sede nada mais, nada menos que o escritório paulista da chefe do governo, e desde a administração anterior gerenciado pela mesma pessoa. A excepcional gravidade dos fatos apurados pela Polícia Federal e as pessoas envolvidas causaram imensa repercussão. Basta dizer que a senhora presidente não hesitou em demitir, afastar, investigar a partir da chefe do gabinete instalado na Avenida Paulista, sem falar na prisão de 18 pessoas, salvo engano. Esses fatos, era inevitável, ganharam as ruas e as manchetes nos meios de comunicação. O choque foi de tal monta que todo o mundo passou a reclamar explicações oficiais, e o governo não tardou em escolher o ilustre ministro da Justiça para, em Comissão da Câmara dos Deputados, dar a versão oficial dos acontecimentos. E aqui chegamos ao ponto nodal do caso.

Os jornais informaram que a exposição foi extensa, de muitas horas, mas houve quem atalhasse dizendo que o ministro pecou pela prolixidade. Não tenho como opinar a respeito.

Enfim, o ilustre ministro da Justiça compareceu a uma comissão da Câmara dos Deputados e durante horas falou sobre o escândalo que levara a senhora presidente a afastar ou demitir a então chefe do Gabinete da Presidência em São Paulo e outros, inclusive escolhidos e patrocinados por essa última. E, embora o porta-voz do governo afirme que "a quadrilha não se instalou na Presidência", não esclarece onde ela teria se instalado. A certa altura, surpreende dizendo "não é o resultado da investigação. O que tenho são servidores de um patamar secundário, enquadrados em conduta criminosa". O que era assunto de alta relevância passa a incógnitos "servidores de um patamar secundário". Uma explicação destas não fica bem seja ao governo, seja a seu ministro, notadamente quando prestada à Nação.

Mais estranho ainda é o tecido em relação à ex-chefe de gabinete Rosemary Noronha, ou Rose. Dela se diz é que o que se sabe, segundo Cardozo, é que Rose "tinha contatos ilegais, relações indevidas... mas não participava do núcleo central da quadrilha... O que ela fazia era, usando sua condição de chefe do escritório, facilitar contatos de membros da quadrilha em troca de favores". Céus! Aqui Del Rey! Por isto, fica-se a saber, ela foi indiciada por corrupção, falsidade ideológica e tráfico de influência! Mas não havia por que quebrar seu sigilo... porque, disse o ministro, "a Polícia Federal evita grampear pessoas não diretamente relacionadas ao fato investigado"!!!

Por fim, não se sabe por que, emerge esta confidência: "Lula é íntimo de Rosemary". Mas em que vem ao caso essa suposta intimidade? O ministro não disse.

Muita coisa teria a aditar à exposição ministerial, mas, o leitor há de convir, não disponho como ele de longas horas para expor, nem de páginas de jornal para resumi-las.

* Jurista, ministro aposentado do STF

Fonte: Zero Hora (RS)

Estado e economia: a marcha forçada para o atraso - Marcus Pestana

A formação da opinião pública numa eleição obedece a múltiplos fatores. Às vezes, aspectos acidentais ou secundários podem decidir uma eleição. Mas, em tese, a opção da sociedade é construída a partir da escolha da melhor proposta de governo. Sendo assim, PSDB e PT têm o dever de explicitar suas divergências e suas propostas.

A questão mais importante para a avaliação de um governo é a condução da economia. É o desenvolvimento econômico que gera renda e emprego, sendo o principal instrumento de promoção da cidadania. E aí, PT e PSDB têm visões bastante diferenciadas.

Ficamos sabendo agora que teremos um crescimento pífio do PIB em 2012, em torno de 1%. Menos que os Brics e que os principais países latino-americanos. A desindustrialização é cada vez mais clara. Os estímulos fiscais e creditícios pontuais não estão funcionando. A infraestrutura se coloca como um gigantesco obstáculo ao crescimento sustentado. O PT, há dez anos no governo, não teve clareza e coragem de empreender a nova rodada de reformas estruturais e, mesmo antes da crise mundial de 2008, perdeu oportunidades e construiu o cenário atual marcado por baixo crescimento, baixa produtividade e uma sombria perspectiva de médio e longo prazo.
 
Por trás disso está uma visão equivocada do PT sobre as relações entre Estado e economia, onde predomina uma anacrônica visão nacional-desenvolvimentista-estatista. Há no PT uma profunda desconfiança em relação à iniciativa privada, à sociedade e ao mercado. E aí, os nós para a construção das necessárias parcerias não são desatados. A visão do PT não enxerga a urgência de atrairmos investimentos privados a partir de um ambiente regulatório saudável. Mesmo quando as parcerias são construídas, é o "Leviatã moderno" que elege ganhadores e perdedores no balcão do BNDES ou nas desonerações fiscais seletivas. A timidez e a falta de convicção se revelam a cada momento no pré-sal, nas concessões e na retórica atrasada.

O PSDB oferece outra perspectiva. Um Estado dimensionado pelas reais necessidades da sociedade. Um Estado mais coordenador, indutor, regulador, do que "fazedor". Um Estado que acredite com firme convicção nas Parcerias Público-Privadas e nas entidades do espaço público não estatal. Um Estado profissionalizado e moderno que faça uma regulação transparente, democrática e republicana. Um Estado que mantenha ferramentas como a Petrobras, Banco do Brasil, BNDES, Caixa e Correios, mas que delegue funções para a iniciativa privada e o terceiro setor, e se concentre na melhoria das políticas públicas sociais e na regulação da economia social de mercado.

Às vezes, as campanhas se desviam para temas absolutamente secundários. Mas, no fundo, o que está em jogo é o bem-estar da população e a definição de se o governo vai ser uma alavanca ou um entrave ao desenvolvimento.

E aí, PSDB e PT propõem horizontes bastante diferentes.

Marcus Pestana, deputado federal (PSDB-MG)

Fonte: Jornal O Tempo (MG)

Mas, porém, contudo... - Melchiades Filho

O governo derrubou os juros ao menor patamar da história, enfrentando o tabu da remuneração da poupança, mas a economia não reagiu como o esperado e crescerá apenas 1% neste ano - se tanto.

Dilma enquadrou os bancos públicos e forçou a queda do spread e tarifas em geral, mas viu o setor financeiro encolher e a inadimplência do consumidor bater recordes.

Lançou linhas de financiamento e desonerou a folha de pagamentos, mas não tirou a iniciativa privada da letargia -os investimentos caíram pelo quinto trimestre seguido.

O Planalto concluiu que o Estado não dará conta das reformas e ampliações e optou pela privatização dos principais aeroportos, mas cometeu equívocos nos editais que levaram a atrasos e à escolha de operadores sem a expertise desejada.

Abriu o setor portuário, desburocratizando a movimentação de cargas, mas alterou tantas regras que a judicialização hoje parece inevitável.

Constatou a alta margem de lucratividade dos concessionários e determinou a redução de 20% na tarifa de energia, mas errou nos cálculos e subestimou o impacto no orçamento dos governos estaduais.

A presidente anunciou novo regime automotivo, com estímulos tributários para o uso de tecnologia nacional, mas as montadoras vivem a primeira retração desde 2002.

Dilma levou a gestão ao centro do debate público, mas os tropeços consecutivos colocam em xeque sua reputação de boa gestora.

Agora releia cada parágrafo acima invertendo o lugar das orações separadas pela conjunção adversativa. "A economia não reagiu como o esperado, mas o governo derrubou os juros ao menor patamar..." e assim por diante. Neste caso, a ordem dos fatores altera o produto.

Por um prisma, vê-se que o governo federal, de modo contínuo e consistente, assenta terreno para a retomada da economia e abre janelas para novos negócios.

Fonte: Folha de S. Paulo

Sem palavras – Vinicius Mota

A presidente Dilma Rousseff atolou na resposta ao semanário britânico "The Economist", que na última edição pediu a cabeça do ministro da Fazenda, Guido Mantega. Revista estrangeira não influencia o governo eleito pela população brasileira, parece ter dito a mandatária, em fraseado confuso.

Além de ter mobilizado o velho repertório do nacionalismo bravateiro para contrapor-se a uma simples opinião, Dilma tentou atingir a revista criticando o desempenho da economia na Europa. Como se a "Economist" fosse o órgão central de propaganda da União Europeia.

Esse pequeno vexame foi manifestação eloquente da falta de traquejo com o contraditório por parte da presidente da quarta maior democracia mundial. Como se diz popularmente, o uso prolongado do cachimbo entorta a boca.

Na primeira metade do mandato, Dilma Rousseff expôs-se pouquíssimas vezes a entrevistas com a imprensa, quer individuais, quer coletivas. Sob a batuta dos marqueteiros que administram a imagem presidencial, permanece tempo demais cercada de bajuladores e de gente incapaz de questionar suas decisões.

Daí o despreparo para enfrentar a crítica -e para entender que ela é da natureza do jogo democrático.

O hiperpresidencialismo brasileiro do século 21 avança pouco, para não dizer que retrocede, nesse aspecto. A palavra do chefe de Estado surge quase como uma graça a ser oferecida com parcimônia e benevolência aos súditos -de preferência em ambientes controlados, onde o presidente discursa, mas não dialoga.

Era de esperar o contrário. Prestar contas é uma obrigação do governante, a quem foi concedido o mandato popular, e um direito da sociedade, que o concedeu. Parte dessa prestação de contas precisa ser feita no entrechoque com perguntas críticas às decisões, aos resultados e aos rumos do governo. Do contrário, será mera propaganda.

Fonte: Folha de S. Paulo

PSD vira partido estratégico para 2014

João Domingos

BRASÍLIA - O recém-criado PSD do prefei­to Gilberto Kassab tornou-se um partido estratégico para os três potenciais candidatos principais à Presidência em 2014: a presidente Dilma Rousseff, do PT, que vai disputar a reeleição, o senador Aécio Ne­ves, do PSDB, já lançado à dis­puta pelo ex-presidente Fer­nando Henrique Cardoso, e o governador de Pernambuco, Eduardo Campos, do PSB, que estuda a possibilidade de bri­gar também pelo posto.

O PSD - que, segundo o pró­prio Kassab, não é "nem de es­querda, direita ou centro" - tem vínculos com todos os principais partidos que vão para a disputa daqui a dois anos. Kassab man­tém-se próximo da presidente Dilma Rousseff, de Aécio Neves e de Eduardo Campos. Mas, por ter oferecido um ministério ao partido - por enquanto a ainda não criada Secretaria das Micro e Pequenas Empresas -, a presidente Dilma ganhou a dianteira na disputa, "Eu diria que, nesse mo­mento, a tendência é ficarmos com a presidente Dilma", disse o líder do partido na Câmara, depu­tado Guilherme Campos (SP).

Outros parlamentares do PSD, no entanto, afirmam que os três candidatos podem ganhar a ade­são da nova legenda. Lembram, por exemplo, que o PSB de Eduar­do Campos foi de importância fundamental para a criação do no­vo partido, principalmente em es­tados do Sul e no Nordeste. Por­tanto, a gratidão permanece e não será surpresa se, numa even­tual candidatura do governador de Pernambuco, o PSD venha a marchar com ele, E com o PSDB eles sempre trabalharam juntos com Aécio Neves e com o ex-go­vernador José Serra. Já Dilma Rousseff não quer perder tempo. No dia 29 ela recebeu ; .0 vice-governador de São Paulo, . Guilherme Afif Domingos (PSD), no Palácio do Planalto, juntamen­te com Gilberto Kassab. Na reu­nião, Dilma reiterou o convite pa­! ra que o PSD passe a integrar sua base aliada - oferecendo, em troca, um ministério -, e consultou Afif Domingos sobre uma lei aprovada pelo Congresso que determi­na a discriminação na nota fiscal dos impostos pagos pelo contri­buinte. A presidente disse a Afif Domingos que a opinião dele era muito importante para a decisão.

De acordo com informação de petistas que têm conversado com Dilma sobre o quadro partidário e sobre 2014, a presidente traba­lha com a possibilidade de Eduar­do Campos entrar mesmo na dis­puta à Presidência daqui a dois anos. Em uma conversa que ela teve um grupo de petistas, Dilma comentou: "O Eduardo gosta muito do presidente Lula e da gen­te, de forma individual, mas não gosta de nossa família (o PT)".

•Tamanho
49 deputados e dois senadores, além de 497 prefeitos eleitos em outubro, fazem parte do quadro do PSD, partido criado em março de 2011

Fonte: O Estado de S. Paulo

PMDB tenta se blindar contra crescimento de Eduardo Campos

Partido luta para manter a vice presidência, com a repetição da chapa Dilma Rousseff/Michel Temer em 2014

A disputa por espaço político na base de apoio da presidente da República e na consolidação das legendas como indispensáveis para a governabilidade defla­grou uma guerra nos bastidores entre PMDB e PSB. O PMDB quer manter a vice presidência, comum repeteco da dobradinha Dilma Rousseff/Michel Temer em 2014, mas sabe que o cresci­mento do PSB do governador de Pernambuco, Eduardo Campos, é uma ameaça real e imediata a essas pretensões.

Gomo resultado da descon­fiança mútua os dois partidos entraram numa guerra e passaram a disputar palmo a palmo cada espaço dentro ou fora do gover­no. Na votação dos" royalties do petróleo, por exemplo, seus líde­res ficaram em posições opos­tas. Henrique Eduardo Alves, do PMDB, acatou parte do pedido do governo para que os royalties fossem destinados à educação; Sandra Rosado, do PSB, votou contra o projeto, defendido pelo governo. Os dois são do Rio Grande do Norte.

A disputa entre os dois partidos chegou também à presidência da Câmara. Henrique Alves trabalha para arregimentar o maior núme­ro possível de votos a seu favor, para que possa presidir a Casa do ano que vem a 2015. Ele tem o apoio dos principais líderes do PT. Mas o PSB está na disputa. Com autorização velada de Eduar­do Campos, lançou a candidatura do deputado Júlio Delgado (MG) contra a do peemedebista.

Em retaliação, o PMDB abriu uma disputa pelo Ministério da In­tegração Nacional, hoje nas mãos de Fernando Bezerra Coelho, ho­mem de confiança de Eduardo Campos. O partido considera-se sub-representado no governo de Dilma Rousseff. Reclama de que seus ministérios - Agricultura, As­suntos Estratégicos, Minas. e Energia, Previdência e Turismo -não estão à altura da força que os peemedebistas têm dado à presi­dente. O da Integração Nacional cairia bem, insinuam.

Embate. Até nos despachos com a presidente Dilma Rous­seff os dois partidos vivem em disputa. No dia 6, a presidente reuniu-se com a cúpula do PMDB. Dilma louvou as alianças entre os dois partidos também na eleição municipal que, segun­do ela, permitiu vitórias em todo o País. No dia seguinte, de surpre­sa, ela teve um jantar com a dire­ção do PSB para falar, também, sobre a eleição municipal. Como o partido de Eduardo Campos disputou com o PT em cidades importantes - e venceu a exem­plo de Recife, Fortaleza e Campi­nas, Dilma procurou adotar um

tom de conciliação. Afirmou que o clima de disputa havia passado e que era hora de o PSB reforçar a base governista. Procurando se contrapor ao PMDB - e sabendo do apetite do partido por ministérios -, o PSB estocou o adversário logo que a eleição terminou. Divulgou nota - algo inédito na política - para dizer que está muito satisfeito com as pastas que tem e que não quer nenhuma outra. Além da In­tegração, o partido comanda a Secretaria Nacional dos Portos.

Diante desse clima, o PMDB se mexe. O ministro de Assuntos Estratégicos, Moreira Franco, um pensador do PMDB, entende que em 2014 a chapa Dilma/Te­mer será repetida, porque os dois partidos têm atuado muito bem em conjunto.

"PT e PMDB podem exibir re­sultados afirmativos da aliança de sustentação da presidente", disse. "Nós entendemos que é necessário manter essa coliga­ção para 2014 e que deve ser re­petida a chapa Dilma Rousseff e Michel Temer. Não há por que mudar." Em 2018, sonha Morei­ra Franco, o PMDB estará prepa­rado para lançar um candidato próprio à Presidência da Repú­blica. "O PMDB tem uma heran­ça muito forte para mostrar. Es­tá presente em todo o Brasil e não tem dono"./j.d.

Fonte: O Estado de S. Paulo

Neorrealismo - Rubens Ricupero

Crise atual dá força à teoria segundo a qual crescimento rápido é exceção, não regra na experiência humana

Ou será neopessimismo? O fato é que, no bojo desta crise interminável, ganham ar de verossimilhança as previsões de que o crescimento rápido é mais uma exceção do que regra na experiência humana.

Contrariando a crença dos iluministas num progresso infinito e eterno, os dias felizes da expansão acelerada não voltariam mais.

Houve uma onda parecida logo após os choques do petróleo que puseram fim aos "30 anos gloriosos" depois da Segunda Guerra Mundial. O retorno da estagnação e a instalação na Europa do desemprego estrutural alimentaram então especulações sombrias sobre o futuro.

A fase coincidiu, não por acaso, com os chamados "anos de chumbo" do terrorismo europeu. Escrevendo nessa época, Fernand Braudel se perguntava em "Le Temps du Monde" se o primeiro choque petrolífero (1973) não marcaria o início da longa descida de um dos seus ciclos seculares de expansão.

Passada a ascensão, iniciada em 1896, o ciclo declinaria por umas duas gerações até atingir o fundo do poço, mais ou menos meio século a partir de 1973.

O que não se imaginou, foi o impacto que teria o vertiginoso crescimento da China por mais de 25 anos e o efeito dinamizador trazido pela revolução dos computadores, das telecomunicações e da internet.

Tampouco se calculou, no lado negativo, o agravamento dos limites ocasionados pelo aquecimento global, subestimando-se igualmente a perda de dinamismo consequente ao colapso da demografia e o envelhecimento da população.

Dos estudos recentes, o que mais faz pensar é "Is U.S. Economic Growth Over?", do professor Robert J. Gordon, que pode ser facilmente acessado na internet. A primeira versão é de 2006, não sendo assim produto da crise financeira.

O autor estabelece vínculos entre períodos de expansão rápida e as inovações características das três revoluções industriais: 1ª) a das ferrovias, vapores e indústria têxtil, de 1750 a 1830; 2ª) a da eletricidade, motor de explosão, água encanada, banheiros e aquecimento dentro de casa, petróleo, farmacêuticos, plásticos, telefone, de 1870 a 1900; 3ª) a dos computadores, internet, celulares, de 1960 até hoje.

A segunda teria tido importância superior às outras, garantindo 80 anos de acelerado avanço na produtividade. Desta vez Gordon receia que os Estados Unidos não sejam capazes de aproveitar o impulso de futuras inovações devido a seis problemas graves: demografia, desigualdade, educação deteriorada, obstáculos ambientais, competição da globalização e o peso da dívida dos particulares e do governo.

O autor se limitou aos EUA e convidou estudiosos a compararem os resultados com suas experiências nacionais. No caso do Brasil, é óbvio que só agora a maioria da população começa a ter acesso às inovações da segunda e terceira revoluções industriais. Só isso nos garantiria boas décadas de expansão.

Por outro lado, muitos dos obstáculos dos EUA nos afetam de modo agudo. Sem falar em educação, desigualdade ou competitividade, basta lembrar que o envelhecimento da população será aqui mais fulminante não só que nos EUA, mas até na Argentina e no Uruguai!

Fonte: Folha de S. Paulo