quarta-feira, 10 de outubro de 2012

OPINIÃO DO DIA – Cármen Lúcia: ‘o mensalão maculou a República’ (LVXII)


Me causou especial atenção a circunstância de que a defesa, quer na defesa escrita, quer na apresentação feita na tribuna desta casa, haver afirmativa de que houve o ilícito. E que o dinheiro que tinha sido arrecadado não tinha sido comprovado.

A própria defesa assume isso e tenta dizer: ‘Ora, brasileiros, o ilícito é normal’. A ilegalidade não é normal, senhor presidente. No estado de direito, o ilícito há de ser processado e, se comprovado, punido.

Portanto, me causou um profundo desconforto mas, principalmente, significou que, se houve ilícito, e se esse ilícito dizia respeito a um partido, a um grupo, essa afirmativa significou que havia outros envolvidos, entrelaçamento.

Acho estranho e muito, muito grave, que alguém diga, ‘houve caixa 2’. Caixa 2 é crime, é agressão contra sociedade brasileira. Mesmo que tivesse sido isso, não é pouco. Me parece grave, porque parece que ilícito no Brasil pode ser realizado e tudo bem.

Cármen Lúcia, ministra do STF. Na declaração do seu voto na 33ª sessão do julgamento do mensalão, 9/10/2012.

Manchetes dos principais jornais do Brasil

O GLOBO 
A hora da verdade - STF condena Dirceu por comandar o mensalão 
Joaquim será eleito presidente do STF hoje 
PDT apoia Serra, e PT fecha com PMDB 
Chávez quer Evo e Correa no Mercosul 

FOLHA DE S. PAULO 
Culpados 
PMDB vai apoiar Haddad em SP; Paulinho fecha com Serra 

O ESTADO DE S. PAULO 
Supremo condena Dirceu 
PMDB acerta apoio a Haddad, e PDT, a Serra 
PSDB usará falha no Enem na TV 
Vereadores pedem defesa de Kassab 

VALOR ECONÔMICO 
FMI alerta para riscos da forte expansão do crédito 
Seca complica programa de corte de tarifas 
Ampliação de usina traz de volta disputa no Madeira 
José Dirceu é condenado por corrupção 
A rota de dois recordistas das eleições de domingo 

BRASIL ECONÔMICO 
Mantega pede pressa na criação do fundo dos Brics contra crises 
Capital de giro mais barato no fim de ano 
Ação de banco cai com juros e tarifas 
Com unificação, PIS e Cofins terão alíquota de 9,5% 
Grupo Eletrobras acelera ritmo de investimentos 

CORREIO BRAZILIENSE 
Como fica o PT após a condenação de Dirceu 
Greve prejudica estudantes que iriam aos EUA 
MEC detalha cotas 
Indústria já faz governo temer pelo PIB de 2013 
Pressão pela liberação de emagrecedor 

ESTADO DE MINAS 
Condenados 
Médicos param de atender nos planos 
Quando alta votação não dá mandato 
MEC divulga hoje regras para aplicar Lei das Cotas 

ZERO HORA (RS) 
Condenado 
"No lugar de Dilma, eu agiria diferente" 
Projeção indica safra recorde de soja no RS 
Tumulto em camelódromo da Capital 

JORNAL DO COMMERCIO (PE) 
Zé Dirceu é condenado 
PPP da Compesa nem começou e já está atrasada 
Parlamentares fracassam nas cidades

O que pensa a mídia - editoriais dos principais jornais do Brasil

http://www2.pps.org.br/2005/index.asp?opcao=editoriais

A hora da verdade - STF condena Dirceu por comandar o mensalão


Para 6 ministros, ex-chefe da Casa Civil deu ordem para pagar propina em troca de votos no Congresso

Também foram punidos por corrupção ativa o ex-presidente do PT José Genoino, o ex-tesoureiro Delúbio Soares, o operador do esquema, Marcos Valério, e outros quatro réus. O ex-homem forte do governo Lula ainda será julgado por formação de quadrilha

Seis anos após ser apontado na denúncia do Ministério Público como "chefe da quadrilha" do mensalão, o ex- ministro da Casa Civil José Dirceu foi condenado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) por corrupção ativa. A votação ainda não foi concluída, mas seis dos dez ministros entenderam que Dirceu foi o mandante do pagamento de propina a parlamentares da base aliada em troca de apoio em votações no Congresso. Também já há maioria para condenar o ex-presidente do PT José Genoino, o ex-tesoureiro Delúbio Soares, Marcos Valério e mais quatro réus.

Dirceu é condenado

Seis dos dez integrantes do Supremo punem ex-ministro da Casa Civil por corrupção ativa

Carolina Brígido, André de Souza

BRASÍLIA - Apontado como o mentor e comandante do mensalão, o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu foi condenado por seis dos dez ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) por corrupção ativa. Para a maioria dos integrantes da Corte, vinham de Dirceu as ordens para pagar propina a parlamentares em troca de apoio em votações no Congresso Nacional, garantindo para o governo federal uma base aliada fiel.

Até agora, condenaram Dirceu os ministros Joaquim Barbosa, relator do processo, Luiz Fux, Rosa Weber, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes e Marco Aurélio Mello. Absolveram-no os ministros Ricardo Lewandowski, revisor do processo, e Dias Toffoli. Mesmo com a situação definida, a conclusão deste sexto capítulo ocorrerá hoje, 34º dia de julgamento, com os votos de Celso de Mello e do presidente da Corte, Ayres Britto.

Também já há maioria para condenar, pelo mesmo crime, o ex-presidente do PT José Genoino; o ex-tesoureiro do partido Delúbio Soares; Marcos Valério, operador do mensalão; e quatro réus do grupo de Valério: seus ex-sócios Cristiano Paz e Ramon Hollerbach; o advogado Rogério Tolentino; e a ex-diretora financeira da agência SMP&B Simone Vasconcelos.

- Não há como não se chegar à conclusão de que Dirceu, homem forte do governo Lula, encarregado da articulação da base aliada no Congresso, não só sabia do esquema de transferência irregular de verbas entre o PT e os partidos da base aliada, como também contribuiu intelectualmente para sua estruturação - disse Gilmar.

Há também votos suficientes para a absolvição da ex-gerente financeira da agência SMP&B Geiza Dias e do ex-ministro dos Transportes Anderson Adauto.

Proximidade de empréstimos e reuniões

Até agora, só Lewandowski e Dias Toffoli absolveram Dirceu. Mas, para a maior parte dos integrantes do STF, Dirceu negociou com a diretoria de BMG e Rural empréstimos a Valério que seriam usados para comprar apoio de parlamentares. As reuniões, a portas fechadas, teriam ocorrido na presença de Valério, Genoino e Delúbio.

Apesar de não haver documento comprovando que Dirceu influiu na liberação do dinheiro, há proximidade de datas entre a concessão dos empréstimos e as reuniões. A maioria dos ministros considerou esta uma evidência de que a participação do réu foi fundamental para garantir o funcionamento do esquema.

- A ilicitude advém do contexto em que os fatos se entrelaçam, na medida em que o chefe da Casa Civil se reúne exatamente com os dirigentes das instituições financeiras que advogam em interesses privados alheios à competência do ministro e que concedem, inclusive com coincidência temporal, os malsinados empréstimos utilizados para irrigar a corrupção de parlamentares - disse Gilmar Mendes. - Curiosamente, ainda participam dessas reuniões os dois operadores ostensivos do esquema de corrupção, Delúbio Soares e Marcos Valério.

Os ministros listaram uma série de depoimentos de testemunhas e outros réus afirmando que Dirceu tinha como uma de suas tarefas formar uma base aliada no Congresso. A agenda do ex-ministro continha audiências com líderes partidários. Os depoimentos também indicavam que o réu, mesmo na chefia da Casa Civil, continuava gerenciando os interesses do PT.

Também foi considerado o empréstimo que a ex-mulher de Dirceu, Angela Saragoza, conseguiu no Rural por intermédio de Valério. E, ainda, o fato de Tolentino ter comprado com dinheiro vivo um apartamento que Angela vendia em São Paulo. Para Marco Aurélio, Dirceu valeu-se do esquema inclusive para beneficiar a ex-mulher:

- As declarações prestadas demonstram que Dirceu valeu-se da estrutura do grupo para resolver problemas particulares da ex-cônjuge.

Cármen Lúcia, que também preside o Tribunal Superior Eleitoral, disse que ficou espantada com a confissão da defesa de que houve crime de caixa dois. Os advogados de alguns réus confessaram o caixa dois no intuito de alegar que não houve compra de votos no Congresso:

- Acho estranho e muito grave que alguém diga, com toda a tranquilidade, que houve caixa dois. Caixa dois é crime, é uma agressão à sociedade brasileira. Dizer isso na tribuna do Supremo, ou perante qualquer juiz, me parece grave, porque fica parecendo que o ilícito no Brasil pode ser praticado, confessado e tudo bem. E não é tudo bem. Tudo bem é estar num país, num estado de direito, quando todo mundo cumpre a lei.

Em seguida, ela foi incisiva ao condenar o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares:

- Ficou comprovado que este réu atuou com desenvoltura, proeminência e permanência de práticas, que foram do início de 2003 até 2005, quando houve a eclosão do que se vinha passando, com uma desmesura impressionante.

"Não estamos julgando histórias"

A ministra também contestou o argumento da defesa de Genoino de que o réu tinha um passado de intensa luta pela democratização do país. Cármen deixou claro que o estava julgando pelo mensalão, não pela história de vida dele:

- Não estamos julgando histórias, porque as histórias são feitas, às vezes, com desvios que seriam impraticáveis em outras circunstâncias.

A maioria do tribunal concluiu que o ex-presidente do PT sabia do esquema e prometeu vantagens a parlamentares. Genoino ainda avalizou um empréstimo do PT no Banco Rural no valor de R$ 3 milhões. Teria ficado a cargo de Delúbio indicar para Valério os beneficiados com os repasses de dinheiro.

Para Gilmar, não há como acreditar na possibilidade de que partidos com ideologia oposta ao PT tenham aceitado integrar a base de apoio do governo sem receber nada em troca. Ainda segundo Gilmar, também não faz sentido a tese de que Delúbio e Valério agiram sozinhos, sem o conhecimento da cúpula do partido:

- Não é crível nem lógico admitir que o acordo político não contemplou uma contrapartida. Extremamente difícil acreditar que alguns partidos, reconhecidamente não conciliados do ponto de vista programático, aceitariam um acordo sem nada em troca. (...) É possível que José Dirceu e José Genoino realmente, após celebrado o acordo, não se ocupassem da operacionalização dos repasses, função que coube a Delúbio Soares e a Marcos Valério. Mas daí dizer que ignoravam por completo o centro de distribuição de recursos, administrado pelo tesoureiro do partido, voltado a beneficiar os parlamentares da base aliada, me parece é menosprezar a inteligência alheia - argumentou.

Marco Aurélio Mello concordou:

- Apontar Delúbio, e parece que ele próprio aceita posar como tal, como bode expiatório, como se tivesse autonomia suficiente para levantar milhões e distribuir ele próprio, definindo os destinatários sem conhecimento da cúpula do PT? A conclusão subestima a inteligência mediana.

Marco Aurélio ironizou a alegação da defesa de Genoino de que ele não tinha conhecimento dos empréstimos:

- Genoino era o interlocutor político do grupo, era o presidente do partido que esteve envolvido nesta tramoia. Poupem-me desse desejo de atribuir a Genoino, com a história de vida que tem, tamanha ingenuidade.

Como votaram os ministros sobre José Dirceu, o chefe da Casa Civil do governo Lula

Joaquim Barbosa "liderança da prática criminosa"

O relator do mensalão condenou Dirceu por corrupção ativa: "Eu considero que o conjunto probatório (...) coloca o então ministro chefe da Casa Civil em posição central, posição de organização e liderança da prática criminosa, como mandante das promessas de pagamentos de vantagens indevidas a parlamentares que viessem a apoiar as votações de seu interesse."

Ricardo Lewandowski não descarto, mas não há provas

O revisor absolveu Dirceu: "Eu não afasto a possibilidade de que José Dirceu tenha de fato participado desses eventos. Não descarto, inclusive, a possibilidade de que ele tenha sido o mentor dessa trama criminosa, mas o fato é que isso não encontra ressonância na prova dos autos. Não há uma prova documental, resultante da quebra de sigilo bancário, telefônico, telemático. Não há nenhuma prova pericial que comprove tal fato. Muito embora o processo tenha se arrastado por quase sete longos anos, o que existem são testemunhos."

Rosa Weber "acima de qualquer dúvida razoável"

Rosa deu o segundo voto pela condenação: "Para mim, existe prova, acima de qualquer dúvida razoável, de que Delúbio não pode ser responsabilizado sozinho. E considero a responsabilidade de José Dirceu, devendo responder por nove crimes de corrupção ativa."

Luiz Fux "o articulador político desse caso penal"

Fux deu o terceiro voto pela condenação: "Pelas reuniões às quais compareceu e pelos depoimentos prestados, o denunciado (Dirceu) figura como articulador político desse caso penal, até pela sua posição de proeminência no partido e posição de destaque no governo. Ele próprio declarou que era responsável pelas alianças políticas, uma de suas atribuições era a formação da base aliada."

Dias Toffoli "sem demonstração inequívoca" do crime

Toffoli deu o segundo voto pela absolvição: "A simples condição de chefe da Casa Civil, sem a demonstração inequívoca de que tivesse oferecido ou prometido qualquer vantagem indevida para a cooptação de apoio político no Congresso Nacional, não conduz automaticamente à tipificação do crime que lhe é imputado."

Cármen Lúcia "houve sim vantagem garantida pelo réu"

Deu o quarto voto pela condenação: "Não tenho como descaracterizada, de maneira comprovada, que houve sim vantagem que tenha sido de alguma forma ofertada ou garantida pelo réu José Dirceu."

Gilmar Mendes não só sabia do esquema como contribuiu

O quinto voto pela condenação: "Não há como não se chegar à conclusão de que José Dirceu, homem forte do governo Lula, encarregado da articulação da base aliada no Congresso Nacional, não só sabia do esquema de transferência irregular de verbas entre o PT e os partidos da base aliada como também contribuiu intelectualmente para sua estruturação."

Marco Aurélio Mello "dirceu teve participação acentuada"

O sexto e decisivo voto pela condenação: "Restou demonstrado que Dirceu realmente teve participação acentuada a meu ver nesse escabroso episódio." (Faltam os votos de Celso de Mello e Ayres Britto hoje)

Fonte: O Globo

Culpados


Maioria do STF condena José Dirceu e cúpula do PT por corrupção; Tribunal conclui que homem forte de Lula comandou compra de votos ex-ministro afirma que foi "linchado"

Sete anos e quatro meses após o ex-deputado Roberto Jefferson (PTB) revelar à Folha a existência do mensalão, a maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal concluiu que José Dirceu (PT), então ministro da Casa Civil e homem forte do governo Lula, comandou o esquema de compra de votos no Congresso.

Chamado de "chefe da quadrilha" pela Procuradoria-Geral da República, Dirceu foi condenado por corrupção ativa por 6 dos 8 ministros que já votaram — faltam outros dois. Para eles, o petista foi o principal responsável por corromper congressistas com o uso de dinheiro público. Lewandowski e Dias Toffoli o absolveram.

Também foram considerados culpados o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares, o ex-presidente da sigla José Genoino e Marcos Valério, o operador do mensalão.

Dirceu alega ter sido "linchado" e ataca o STF, que, segundo ele, agiu "sob forte pressão da imprensa". Para o petista, houve "um juízo político e de exceção". "Vou acatar a decisão, mas não me calarei", afirmou. Genoino disse que, "como inocente", está "revoltado". Em reunião fechada, Lula conclamou petistas a reagir sempre que forem chamados de mensaleiros.

Supremo condena Dirceu por compra de voto no Congresso

Supremo alcança maioria para condenar ex-homem forte e dois ex-dirigentes do PT. Petista afirma que foi "linchado"

BRASÍLIA - O Supremo Tribunal Federal condenou ontem por corrupção ativa o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, 66, e firmou o entendimento de que o governo federal organizou o mensalão. Seis dos dez ministros do tribunal apontaram Dirceu como o responsável pelo esquema que distribuiu milhões de reais para parlamentares que apoiaram o presidente Luiz Inácio Lula da Silva no Congresso em seu primeiro mandato (2003-2006). A existência do mensalão foi revelada pelo ex-deputado Roberto Jefferson em entrevista à Folha em 2005. O STF também condenou por corrupção o ex-presidente do PT José Genoino e o ex-tesoureiro Delúbio Soares.

Plenário acolhe tese de que ex-ministro criou o esquema

Felipe Seligman, Flávio Ferreira, Márcio Falcão, Nádia Guerlenda e Rubens Valente

BRASÍLIA - O plenário do Supremo Tribunal Federal reconheceu ontem a tese central do mensalão, formulada pela Procuradoria-Geral da República.

Segundo a acusação, agora aceita pelo STF por 6 votos a 2, Dirceu engendrou e colocou em prática, "entre quatro paredes" do Palácio do Planalto, o esquema de compra de parlamentares com recursos públicos desviados e empréstimos obtidos de forma fraudulenta pelas empresas de Marcos Valério Fernandes de Souza e pela cúpula do PT.

A decisão derruba a tese, defendida desde 2005 pelo ex-presidente Lula e por líderes do PT, e usada pelo partido para concentrar as acusações no então tesoureiro da sigla, Delúbio Soares, de que tudo não passou de mero pagamento de dívidas eleitorais por meio de caixa dois.

Com a sessão de ontem, já votaram pela condenação de Dirceu os ministros Joaquim Barbosa, Rosa Weber, Luiz Fux, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes e Marco Aurélio. Ricardo Lewandowski e Dias Toffoli absolveram o ex-ministro, dizendo não terem encontrado provas no processo.

Dirceu ainda será julgado pelo crime de formação de quadrilha. Os ministros do STF só definirão as penas de Dirceu e dos outros condenados no fim do julgamento.

A maioria seguiu o voto do relator Joaquim Barbosa, para quem Dirceu teve no esquema "posição central, posição de organização e liderança da prática criminosa, como mandante das promessas de pagamento de vantagens indevidas aos parlamentares que viessem a apoiar as votações de seu interesse".

Autor do voto que selou a condenação de Dirceu, Marco Aurélio disse que seria "subestimar a inteligência mediana" imaginar que Delúbio tenha sido o maior responsável por engendrar o esquema.

"Ao chegar ao poder, o PT realmente buscou essa base de apoio no Congresso, até mesmo se desfigurando", disse Marco Aurélio. "José Dirceu realmente teve uma participação acentuada nesse escabroso episódio."

O ministro avaliou os favores prestados por Marcos Valério a Maria Ângela Saragoça, ex-mulher de Dirceu, para concluir que o ministro "valeu-se da estrutura do grupo para resolver problemas particulares da ex-cônjuge".

Em seu voto, Cármen Lúcia ressaltou o papel do ex-ministro no objetivo político do mensalão ao dizer que "a ligação de Valério com José Dirceu fica comprovada".

Cármen fez um duro ataque ao fato de o advogado de Delúbio, Arnaldo Malheiros Filho, ter admitido "o ilícito" do caixa dois ao fazer sua defesa oral no STF, uma admissão que a ministra qualificou de fato "inusitado e inédito na minha vida profissional".

"Acho estranho e muito, muito grave, que alguém diga com toda tranquilidade que "ora, houve caixa dois". Caixa dois é crime. Caixa dois é uma agressão à sociedade brasileira... Fica parecendo que isso pode ser praticado e confessado e tudo bem".

Para Gilmar Mendes, o papel de Dirceu no esquema ficou claro: "Diante do contexto, não há como não se chegar à conclusão que Dirceu não só sabia do sistema de irregularidades de verba como contribuiu intelectualmente para sua estruturação".

Na semana passada, os ministros Luiz Fux e Rosa Weber já haviam acolhido a tese de que Dirceu foi o principal protagonista do esquema.

"Principal figura"

Ao denunciar Dirceu, a Procuradoria acentuou seu papel protagonista do esquema. Em manifestação no plenário do tribunal no dia 3 de agosto, o procurador-geral Roberto Gurgel declarou que se podia afirmar, "sem risco de cometer a mais mínima injustiça", de que José Dirceu foi "a principal figura" do apurado no processo.

"Foi o mentor da ação do grupo, o seu grande protagonista. Foi José Dirceu quem idealizou o sistema ilícito de formação da base parlamentar de apoio ao governo mediante o pagamento de vantagens indevidas aos seus integrantes e comandou a ação dos demais acusados para consecução desse objetivo."

Também ontem, por maioria de votos, o tribunal decidiu absolver o ex-ministro dos Transportes Anderson Adauto e Geiza Dias, ex-funcionária de Marcos Valério.

O julgamento deste capítulo deve ser concluído hoje, com os votos dos ministros Celso de Mello e Carlos Ayres Britto, presidente do tribunal.

Fonte: Folha de S. Paulo

Supremo condena Dirceu


Maioria considerou o ex-ministro da Casa Civil culpado por corrupção ativa; Também foram condenados José Genoino e Delúbio Soares; Decisões do mensalão poderão alterar entendimento da Ia instância sobre crimes de quadrilha e lavagem

Mensalão Especial - Sete anos após o início do escândalo do mensalão, a maioria dos integrantes do STF condenou José Dirceu pelo crime de corrupção ativa. Para a Corte, o ex-ministro participou do esquema de compra de apoio político. Dirceu ainda não foi julgado por formação de quadrilha, da qual é acusado de ser o "chefe" pela Procuradoria-Geral da República. Embora sua defesa diga não haver provas de sua participação em compra de voto, o STF concluiu que não havia como Dirceu não saber do esquema que envolvia o PT - partido que ajudou a fundar em 1980 - e mais quatro siglas. Para o STF, a ordem para formar a base de apoio a Lula saiu do Palácio do Planalto. Com isso, os ministros também abrem um novo capítulo no combate à corrupção: a inexistência de um "ato de ofício" não será mais garantia de impunidade para autoridades que praticarem crimes no exercício da função pública. O STF selou também o destino de outros dois réus do PT: José Genoino, ex-presidente do partido, e Delúbio Soares, ex-tesoureiro, foram condenados. Após a condenação, Dirceu publicou nota em seu blog em que diz que "acatará a decisão", mas "não se calará".

Ministros apontam Dirceu como mandante

Por 6 votos a 2 até a sessão de ontem, Supremo condena ex-ministro por corrupção; faltam as decisões de Celso de Mello e Ayres Britto

Felipe Recondo, Eduardo Bresciani

BRASÍLIA - O ex-ministro da Casa Civil José Dirceu foi condenado ontem pelo Supremo Tribunal Federal por corrupção ativa. Para a maioria dos integrantes da Corte, o petista comandou de dentro do Palácio do Planalto um esquema de compra de apoio político no Congresso Nacional durante o primeiro mandato do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Nas palavras dos ministros do STF, Dirceu era "o mentor", "o mandante", "o principal articulador da engrenagem" do esquema que, de acordo com os ministros, comprometeu a autonomia e liberdade do Legislativo.

José Genoino e Delúbio Soares, dirigentes do PT à época do escândalo, também foram condenados por corrupção.

A Corte julgou que Dirceu estava por trás do esquema de captação de recursos ilícitos para financiar o mensalão - seja dos cofres públicos, seja de empréstimos fraudados -, negociava acordos com lideranças partidárias e oferecia recursos em troca de apoio ao governo.

Até a sessão de ontem, seis ministros julgaram haver provas suficientes para responsabilizar Dirceu: o relator do processo, Joaquim Barbosa, Rosa Weber, Luiz Fux, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes e Marco Aurélio Mello.

Dois integrantes da Corte entenderam que o Ministério Público não conseguiu comprovar que Dirceu comandou o esquema: Ricardo Lewandowski, revisor do processo, e Dias Toffoli. Os votos de Celso de Mello e do presidente, Carlos Ayres Britto, na sessão de hoje, encerrarão o julgamento desse item.

Ministros que votaram pela condenação admitiram não haver uma prova documental que incriminasse Dirceu. Não havia no processo, por exemplo, um ofício assinado por ele ordenando a entrega de recursos aos partidos da base do governo.

Reuniões. O encadeamento dos fatos, como montado pelo relator, colocou Dirceu no posto de comando do esquema. A começar pela relação que mantinha com Marcos Valério, operador do mensalão. O empresário intermediava as reuniões de Dirceu com dirigentes do Banco Rural e do BMG. Reuniões que contavam com a participação considerada "incomum" de Delúbio Soares.

Depois dessas reuniões, segundo o relato de Barbosa, os bancos liberavam os empréstimos para as empresas de Valério - dinheiro que era repassado por ordem de Delúbio a líderes partidários e parlamentares do Congresso- estes também condenados no julgamento por corrupção passiva.

A maioria do STF entendeu que não seria possível que o ex-tesoureiro tivesse operado com autonomia absoluta o esquema, como sugeriu a defesa de Dirceu. Na sessão de ontem, o ministro Gilmar Mendes disse que Delúbio não teria força política, por exemplo, para viabilizar o desvio de recursos do Banco do Brasil para o mensalão.

"O que não é crível é a pretensa e absoluta dissociação do ministro, desde sua posse, de interesses partidários", afirmou Gilmar Mendes. "O ministro (Dirceu), além de cuidar dos assuntos da pasta, tinha responsabilidade de coordenação política do governo Lula". Para Mendes, a atuação de Dirceu ia além e misturava o crescimento do PT e a formação da base aliada. "Não só sabia do esquema como contribuiu intelectualmente para sua elaboração", afirmou.

Ex-assessor da Casa Civil na época do mensalão e advogado das campanhas eleitorais de Lula, o ministro Toffoli votou pela absolvição de Dirceu, argumentando que ele não poderia ser condenado por estar no comando da Casa Civil. Ele acrescentou que o Ministério Público não exibiu provas de que Dirceu participou da compra de apoio político.

Para ele, as acusações do MP levariam, no máximo, à condenação de Dirceu por outros crimes, como tráfico de influência. Nas próximas semanas, o tribunal julgará a acusação com poder simbólico e que pode elevar a pena de Dirceu e obrigá-lo a cumprir a pena em regime fechado: a eventual formação de quadrilha para a prática dos crimes. / Colaboraram Mariangela Gallucci e Ricardo Brito

Fonte: O Estado de S. Paulo

Como fica o PT após a condenação de Dirceu


Mesmo condenado pelo STF por corrupção,o poder de Dirceu é tão grande dentro do PT que ele deve continuar influenciando os rumos do partido, inclusive em 2014, ainda que tenha de cumprir pena na prisão. Muitos petistas graduados atribuem a ele a eleição de Lula. Mas há quem preveja também uma perda de espaço pelo ex-ministro e aliados dentro do próprio PT e no governo Dilma. "O cara vai para a cadeia. Como é que vai ter força?", pergunta uma liderança petista. Na sessão de ontem, a mais emblemática desde o início do julgamento do mensalão, Genoino e Delúbio também foram considerados culpados pelo Supremo. Em nota, Dirceu diz acatar a decisão, mas afirma que não se calará: "Continuarei a lutar até provar minha inocência".

Dirceu, o mentor da corrupção

Maioria dos ministros do Supremo condena o ex-ministro da Casa Civil de Lula pela compra do apoio parlamentar no Congresso. Petista diz que foi "prejulgado e linchado" pela sociedade


Diego Abreu, Ana Maria Campos, Helena Mader

"Minha sede de justiça, que não se confunde com o ódio, a vingança, a covardia moral e a hipocrisia que meus inimigos lançaram contra mim nestes últimos anos, será minha razão de viver"
José Dirceu, em manifesto divulgado em seu blog

Entre quatro paredes do Palácio do Planalto, José Dirceu corrompeu deputados e assessores parlamentares para manter o controle sobre a base aliada do governo e, assim, garantir o projeto político do Partido dos Trabalhadores. Essa é a conclusão da Suprema Corte brasileira, que condenou ontem o ex-ministro Chefe da Casa Civil pelo crime de corrupção ativa. Após oito dos 10 ministros votarem, formou-se maioria de seis votos pela condenação do todo-poderoso ministro do primeiro mandato do governo de Luiz Inácio Lula da Silva. Também foram considerados culpados pelo mesmo delito o ex-presidente do PT José Genoino e o ex-tesoureiro do partido Delúbio Soares, além de Marcos Valério e mais quatro réus do núcleo publicitário. Ainda votarão hoje o decano do STF, Celso de Mello, e o presidente da Corte, Carlos Ayres Britto.

Ex-assessor jurídico de José Dirceu na Casa Civil, o ministro Dias Toffoli absolveu o antigo chefe. Assim como o revisor, Ricardo Lewandowski, o magistrado alegou não haver provas suficientes do envolvimento do ex-ministro com o mensalão. "Não se pode simplesmente imputar a um agente público a responsabilidade dos atos praticados por seus subordinados. A simples condição de chefe da Casa Civil, sem a demonstração inequívoca de que tivesse oferecido ou prometido vantagem indevida para a cooptação de apoio político no Congresso, não conduz automaticamente à prática do indício que lhe é imputado", concluiu Toffoli.

Para o ministro, as acusações trazidas pelo Ministério Público de que Dirceu teria atuado para beneficiar o Banco Rural e para evitar fiscalizações do Banco Central não caracterizam o crime de corrupção ativa. "Essas imputações, a meu ver lançadas sem o mínimo lastro probatório, se verazes, ensejariam denúncia por distintos crimes", afirmou Toffoli, admitindo que Dirceu poderia até ter sido denunciado por corrupção passiva, advocacia administrativa ou tráfico de influência.

No começo da sessão, Dias Toffoli votou rapidamente pela condenação de Delúbio Soares e de quatro réus do núcleo publicitário, absolvendo apenas o advogado e ex-sócio de Valério Rogério Tolentino e a ex-gerente financeira Geiza Dias. "Não soa crível que Delúbio não soubesse das irregularidades", afirmou.

Na sequência, Toffoli surpreendeu ao condenar Genoino. O ministro frisou que não há dúvida de que o ex-presidente do PT conhecia o esquema. Ele citou depoimentos que apontam que líderes do PP e do PTB cobraram recursos de Genoino. "Como justificar as cobranças que lhes eram dirigidas por líderes de algumas agremiações?", questionou.

Dias Toffoli (E) e Lewandwonski deram os dois votos pela absolvição de Dirceu

Caixa dois

Segunda a votar na sessão de ontem, Cármen Lúcia reconheceu que não há documentos que mostrem a participação de Dirceu, mas condenou o petista com base na teoria do domínio do fato. A ministra lembrou que Delúbio sustentou em depoimento ter o respaldo de Dirceu para tomar empréstimos e fazer repasses a lideranças partidárias. "Houve reuniões que não eram simplesmente audiências", frisou Cármen.

A ministra fez uma dura crítica à defesa dos réus que confessaram a prática do caixa dois de campanha. "Acho estranho e muito grave que alguém fale com toda a tranquilidade que houve caixa dois. Ora, caixa dois é crime, é uma agressão à sociedade brasileira. E isso não pouco", afirmou Cármen.

O ministro Gilmar Mendes seguiu integralmente o relator, Joaquim Barbosa. Para ele, o ex-ministro José Dirceu manteve ingerência sobre o PT, mesmo depois de ter deixado o partido para assumir a Casa Civil. "O réu José Dirceu não perdeu o controle do PT, protagonizando encontros com diversas lideranças partidárias", assegurou o magistrado. "Não é crível que o tesoureiro do partido lograria articular essa fonte de recurso estatal sozinho", justificou. O magistrado frisou, entretanto, que não condenou Dirceu por conta das reuniões que ele manteve com réus como Marcos Valério. 

"Evidentemente não é ilícito realizar reuniões em caráter reservado ou receber dirigentes de instituições financeiras. As ilicitudes vêm da maneira com que os fatos se entrelaçam."

Último a se pronunciar ontem, Marco Aurélio Mello deu o voto que definiu o destino de Dirceu. O magistrado alertou que Delúbio não pode ser considerado "bode expiatório" como se tivesse autonomia para levantar dezenas de milhões de reais. "Ficou demonstrado que José Dirceu realmente teve uma participação acentuada nesse escabroso episódio."

Poucos minutos após o encerramento da sessão de ontem, José Dirceu divulgou uma nota a respeito de sua condenação. No texto, publicado em seu blog, o ex-ministro discorre sobre o seu passado de combate à ditadura e de "luta pela liberdade do povo brasileiro". Condenado por corrupção, Dirceu afirmou que o processo do mensalão não passou de uma "ação orquestrada e dirigida pelos que se opõem ao PT e seu governo" e garante que foi "prejulgado e linchado" pela sociedade. "Lutei pela democracia e fiz dela minha razão de viver. Vou acatar a decisão, mas não me calarei". Na sessão de ontem, os ministros também absolveram o ex-ministro dos Transportes Anderson Adauto e Geiza Dias da acusação de corrupção ativa.

Fonte: Correio Braziliense

Dirceu faz História - Merval Pereira


O dia histórico em que o ex-todo-poderoso ministro petista José Dirceu foi condenado por corrupção ativa pelo Supremo Tribunal Federal foi marcado pelas atitudes de dois ministros, ambas marcantes no transcurso do julgamento. Dirceu entra para a História desta vez pela porta dos fundos, enquanto a ministra Cármen Lúcia diz que não está a julgar o passado de Genoino, também condenado, mas sua atuação nos crimes relatados nos autos.

Cármen Lucia, de quem Dirceu tinha esperanças de receber a absolvição, não apenas o condenou como registrou sua estupefação diante da defesa do advogado Arnaldo Malheiros, que tratou o que chamou de caixa dois eleitoral como se fosse uma coisa normal na atividade política.

O STF destruiu a trama, que o ex-presidente Lula defendeu até recentemente, de que o caixa dois explicaria a distribuição de dinheiro feita pelo PT, e ontem Cármen Lúcia, que por coincidência preside agora o Tribunal Superior Eleitoral, chamou a atenção para a desfaçatez do advogado que, diante da Corte mais alta do país, confessou crime de seu cliente como se tal fato não gerasse consequências:

"Não pode chegar aqui e dizer: "Ora, não declarou porque era ilícito." O ilícito não é normal. Ora, caixa dois é crime, é uma agressão à sociedade brasileira", reagiu com indignação a ministra, que disse que essa atitude a convenceu de que o esquema que havia sido montado era muito maior do que aparentava.

Já Marco Aurélio Mello demonstrou a sua indignação através da ironia, como vem fazendo em vários momentos neste julgamento. Ele voltou a desmontar a tese do revisor Ricardo Lewandowski, segundo quem não havia assinatura de José Genoino em conjunto com Marcos Valério nos empréstimos. Marco Aurélio citou a página do processo em que havia o fac-símile do documento em que os dois aparecem juntos, Valério avalizando um título do PT assinado por seu presidente, Genoino.

A certa altura, sem resistir aos argumentos pífios do revisor que transformara Delúbio Soares em maior responsável pelo esquema - nem mesmo Dias Toffoli, que também absolveu Dirceu, absolveu Genoino, elevando um pouco acima o nível de responsabilidade pelos crimes -, Marco Aurélio comentou: "Tivesse Delúbio Soares a desenvoltura intelectual e material a ele atribuída, não seria somente tesoureiro do partido. Quem sabe teria chegado a um cargo muito maior. Apontar Delúbio como bode expiatório como se tivesse a utonomia suficiente para levantar R$ 60 milhões - já não sei mais a quantia e distribuir esses milhões -, ele próprio definindo os destinatários, sem conhecimento da cúpula do PT? A conclusão subestima a inteligência mediana".

Definida a culpabilidade de Dirceu, Genoino e Delúbio, o chamado núcleo político do PT na ocasião dos crimes, ficará para o final a decisão sobre a pena de cada um. Quando chegar a ocasião em que o Tribunal definirá os critérios, serão levadas em conta normas do Código Penal, que manda analisar a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do agente.

É agravante, por exemplo, o fato de o crime ser cometido "com abuso de poder ou violação de dever inerente a cargo, ofício, ministério ou profissão".

Outro tipo de crime, pelo qual o núcleo político petista ainda será julgado, é o de formação de quadrilha. Já há quatro votos, em item anterior, contra a tese da quadrilha em relação aos políticos de partidos aliados envolvidos no julgamento. Caso se mantenha a posição dos demais ministros, Dirceu, Genoino e Delúbio deverão ser condenados por 6 a 4, o que lhes permitirá, em tese, embargos infringentes para questionar a decisão. Mas Dirceu, apontado pelo Ministério Público como o "chefe da quadrilha", pode ter a pena agravada, pois há uma disposição na legislação criminal em relação a quem "promove ou organiza a cooperação no crime ou dirige a atividade dos demais agentes".

O maior problema dos condenados por corrupção ativa é que eles foram acusados de "concurso material", o que significa que as penas são somadas.

Dirceu, por exemplo, foi condenado por nove crimes. Assim, se pegar a pena mínima de dois anos (a máxima é de 12) - o que é improvável pela importância do cargo que exercia na ocasião -, deverá ser condenado a 18 anos e terá que cumprir pena em regime fechado por pelo menos três anos.

Fonte: O Globo

Fabulações do mensalão - Hélio Schwartsman

Para os petistas, o julgamento do mensalão representa um golpe da direita contra uma administração popular que, pela primeira vez na história deste país, promoveu mudanças de verdade.

Para seus adversários, se há uma revolução em curso, ela virá com a condenação dos principais réus, que romperá o ciclo da impunidade de políticos e lançará o Brasil numa nova era de moralidade administrativa.

Ambas as versões, em especial a primeira, não passam de fabulações com fins políticos. Urdi-las faz parte do jogo democrático, que não bane a tentativa de influenciar magistrados e eleitores, mas reconhecer isso não implica que devamos acreditar nelas.

Se há algo notável e até certo ponto inesperado nessa história é que as instituições estão funcionando. A PF, subordinada a um ministro petista, investigou o caso, colheu provas e as levou ao Ministério Público. O procurador-geral, nomeado pelo próprio Lula, viu uma série de crimes e apresentou a denúncia. E o STF, de cujos 11 integrantes originais 8 chegaram ao cargo por indicação de presidentes petistas, vem, após análise individualizada de cada caso, condenando a maior parte dos acusados. Se, diante desse histórico, o PT ainda insiste na tese do golpe, em vez de acusar a direita, deveria procurar um sabotador em suas próprias fileiras.

Isso significa que o Brasil mudou, como quer o devaneio tucano? É claro que não. As instituições funcionaram aqui porque a situação era atípica, explosiva demais para ser ignorada. Só que boas instituições funcionam sempre, independentemente de quem sejam os envolvidos. E, nesse quesito, nossa Justiça é muito ruim, como o prova o caso do mensalão mineiro, cronologicamente anterior ao do PT, mas ainda não julgado.

Nesse contexto, os petistas poderiam queixar-se de estar pagando por ter agido como todos os outros. Pode ser, mas o mundo é muitas vezes cruel e, por definição, só podemos punir os que se deixam apanhar.

Fonte: Folha de S. Paulo

Indevida salvaguarda - Dora Kramer


Liquidada a questão na Justiça, resta a José Dirceu e José Genoino tentar equilibrar as coisas no campo político.

O instrumento é o mesmo ao qual eles vêm recorrendo há algum tempo: a confrontação de suas trajetórias de vida com os votos condenatórios no Supremo Tribunal Federal, a fim de criar uma atmosfera de cruel linchamento.

O PT inclusive prepara um desagravo público a ser realizado após o fim do julgamento do mensalão, com a finalidade de deixar consignado que político com "história" não pode ser tratado como um molambo qualquer.

Faz sentido? Depende de como se vê a cena. Se o princípio é o de que os fins justificam quaisquer meios, até faz.

O partido continuará insistindo na história dos "erros pontuais" cometidos em nome de um projeto em prol da justiça social, jurando que não houve desejo deliberado de obter vantagens pessoais indevidas.

O PT se vê de forma muito diferente daquela com que enxerga a constelação de "vendidos" que cooptou para formar maioria: nada fez de má-fé. Agiu por ideologia nas melhores das boas intenções. Injusta, portanto, punição tão pesada.

Mas há outra maneira de olhar que subtrai todo e qualquer cabimento da ideia de uma absolvição virtual dando os mesmos pesos e medidas aos bons propósitos e aos atos nefastos.

Nem com muito esforço de boa vontade é possível esperar que daí resulte algum equilíbrio.

Por um motivo muito claro e simples: as "trajetórias de lutas", sejam quais forem elas, não podem servir como salvo-conduto a más condutas escoradas na ilicitude.

Argumenta-se, para lamentar as condenações, que José Dirceu e José Genoino são homens com "história". Verdade incontestável, ninguém discute esse ponto. Neles, aliás, reside a grande incoerência.

Políticos donos de substancioso histórico têm a obrigação de se comportar melhor que os demais - os desprovidos de semelhante bagagem. Pela lógica seria inerente a seres tão especiais a sensibilidade para distinguir entre o que está dentro ou fora dos marcos da legalidade.

Não uma qualidade, mas um dever de militantes forjados na ideologia. De valdemares e companhia espera-se qualquer coisa, mas do PT o País esperava maior apreço pelo ofício.

Condenados Dirceu e Genoino, o PT pode até se sentir injustiçado. Mas não pode dizer que a cigana o enganou. Sabia onde pisava quando optou por comprar facilidades.

Se o partido imaginou que a cobrança da conta não era uma possibilidade, só lhe resta lamentar ter caído na armadilha preparada pelo autoengano.

Fim do caminho. Ao condenar José Dirceu por maioria inequívoca, o Supremo encerrou uma carreira política que começou a se desmilinguir no dia em que Roberto Jefferson olhou para as câmeras que transmitiam ao vivo a sessão da CPI dos Correios e provocou o todo poderoso ministro chefe da Casa Civil: "Sai daí, Zé".

Toda diferença. O ministro Celso de Mello, único remanescente da composição da Corte que julgou Fernando Collor em 1994, tem dito que o Supremo não mudou o entendimento sobre o ato de ofício que caracteriza, ou não, a responsabilidade criminal de autoridades públicas.

Por isso mesmo não é demais repetir: não há dois pesos, os casos é que são diferentes. Na época, o Ministério Público não apontou qual o interesse dos empresários extorquidos por Paulo César Farias, condenado por corrupção ativa, nos atos incluídos entre as atribuições do presidente, absolvido da acusação de corrupção passiva.

Agora a Procuradoria-Geral da República foi clara na denúncia: o governo Lula deu dinheiro aos partidos em troca dos atos inerentes às atribuições dos parlamentares no Congresso.

Fonte: O Estado de S. Paulo

Dirceu, o ‘mentor’ do mensalão, quer se transformar em ‘mártir’


Um dia após condenação, ex-ministro da Casa Civil cogita ir a reunião do PT para dizer ter sido ‘vítima de julgamento político’ e fazer do encontro um ato de desagravo

Fausto Macedo e Vera Rosa

José Dirceu, que o Supremo Tribunal Federal condenou como mentor do mensalão, passou o dia alimentando a ideia de ir nesta quarta-feira, 10, à reunião do Diretório Nacional do PT para reiterar que é vítima de um julgamento político. Os velhos companheiros o receberiam como a "um mártir".

A ida do réu ao PT, que ainda não está certa, poderá se transformar na primeira reação do ex-ministro chefe da Casa Civil que, por esses dias, tem demonstrado forte abatimento.

Perdeu-se no tempo a imagem daquele jovem ousado que não se curvou em Ibiúna, nos idos de 1968, quando a polícia política varreu o famoso congresso da União Nacional dos Estudantes (UNE). Restaram-lhe os cabelos longos, agora grisalhos.

Desde que o Supremo passou a condenar, um a um, os réus da ação penal 470, Dirceu foi se convencendo de que também não escaparia.

Aos poucos, ele perdeu a eloquência do ministro mais poderoso do primeiro governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

A esperança por uma absolvição, amparada nos argumentos de sua defesa e na esperança de que ainda teria alguma influência na toga, logo virou decepção ante o voto do ministro Joaquim Barbosa, que lhe atribui o papel de mentor de organização criminosa.

No domingo, quando foi votar em um bairro de classe média de São Paulo, escoltado por uma militância hostil que não permitiu a aproximação dos jornalistas, o ex-ministro já carregava com clareza a condenação - uma sanção contra a qual não caberá recurso, exceto embargos que podem atenuar eventual medida restritiva de liberdade.

À noite, ele retornou a Vinhedo, onde possui residência e tem recebido amigos e familiares. Seu filho, Zeca Dirceu, deputado federal pelo Paraná, lhe tem feito companhia.

O que mais angustia o ex-ministro é o silêncio a que se impôs, orientação expressa de seus defensores, José Luís Oliveira Lima e Rodrigo Dall'Aqua.

Prudência. Os advogados agem com prudência. Eles não querem que um eventual pronunciamento de Dirceu soe como uma afronta à Corte. Amordaçado, é como afirma se sentir, logo ele, que se notabilizou como um contestador aguerrido.

Fonte: O Estado de S. Paulo

Um ano decisivo no meio do caminho - Rosângela Bittar


A presidente Dilma Rousseff e o ex-presidente Lula tratam em perfeita dobradinha da eleição presidencial de 2014, a partir de agora. Para o segundo turno das eleições municipais, a estratégia posta é conhecida e em execução: será a mesma da primeira etapa. Dilma se empenhará em São Paulo, porque é um posto estratégico para o PT e ela própria. E, como no primeiro turno foi a Belo Horizonte, também estratégica, por vontade e escolha, tendo ali um adversário da disputa sucessória, no segundo vai a Salvador e a Manaus, pelo critério nacional: são cidades onde o PT não disputará com partidos aliados e terá como adversários o PSDB e o DEM, oposicionistas federais.

Longe ficará a presidente de localidades onde os aliados se chocam, como ficou, no primeiro turno, da disputa em Porto Alegre. Fugiu de Recife, de onde se afastou também o ex-presidente Lula, como revelam só agora alguns petistas tirando do ex-presidente responsabilidade naquela confusão. Lá, como no extremo Sul, Dilma e Lula ainda não teriam entendido o que houve com o PT que perdeu a chance de ficar com os candidatos vitoriosos para imporem nomes que sequer desejavam entrar na disputa. Adão Villaverde, em Porto Alegre, poderia ter sido vice de José Fortunati (PDT), ex-petista ainda querídíssimo no partido, mas Tarso Genro, o governador, empurrou-o à disputa solitária. Maurício Rands poderia ter sido candidato em Recife, com apoio de Eduardo Campos, mas o PT não quis e impôs Humberto Costa. Colocou como vice dele o nome mais popular do partido na cidade, ex-prefeito, e achou que ia dar um passeio.

Nas hostes de Dilma nada se atribui, no cômputo dessas dificuldades para o PT, ao voluntarismo do ex-presidente Lula. Estão juntos e os acertos mais substantivos com a imensa base de apoio da presidente ocorreram antes da primeira votação.

Três Ms e um P na embolada da reeleição

Assim, o segundo turno vai repetir o modelo e ela não se sente pressionada a premiar aliados que se integrem às candidaturas petistas porque os acordos políticos foram todos feitos antes do primeiro turno. Por exemplo, foi dado um ministério para o bispo Marcelo Crivella, aliado de Russomano, e um posto de comando para um indicado de Paulo Maluf, todos na empreitada da conquista da Prefeitura de São Paulo. O PMDB manteve a candidatura de Gabriel Chalita que, agora, seguirá com o candidato Fernando Haddad, do PT. Sem ganhar ministério no governo Dilma.

A negociação com o PMDB também ocorreu antes do primeiro turno. Dilma já deu seu apoio, e portanto a adesão de sua ampla aliança, ao domínio do partido em um dos Poderes da República, o Legislativo, onde vai presidir as duas casas do Congresso. Retirou obstáculos à eleição de Renan Calheiros para a presidência do Senado e avisou ao PT, que estava resistente, principalmente ao atual presidente Marco Maia, que apoiará o cumprimento do acordo para eleger Henrique Eduardo Alves presidente da Câmara. Portanto, tudo amarrado antecipadamente com o presidente de honra do partido, o vice-presidente Michel Temer. Se Dilma entregar algo mais ao PMDB será uma surpresa, inclusive para seus mais próximos.

Dilma irá a palanques, programas de TV e comícios contando que os aliados se juntarão ao partido no segundo turno sem exigências adicionais. Até porque, entre conselheiros da presidente, as condições de realização das disputas municipais, nesta fase, são mais políticas e menos pragmáticas.

A avaliação que faz o Planalto, e não poderia ser diferente em se tratando de integrantes do governo, é que Dilma foi bem no seu primeiro teste eleitoral. Cumpriu à risca o que determinou previamente, a decisão de não trombar com os partidos da base, e pesou a mão em São Paulo e Belo Horizonte, pelo convencimento de que eram eleições estratégicas.

Agora, é tratar da nova meta, o ano de 2014. A eleição municipal, para o governo, desfez o que aliados de Dilma estão chamando de falso dilema: o conflito entre o PT de Lula e o PT de Dilma, um trabalhando para um lado e outro para o outro. Na análise que apresentam, eles pensam o mesmo e agem em conjunto. Funcionou bem nas eleições municipais e o modelo será agora permanente para o próximo objetivo: manter o poder federal do PT, na Presidência da República, e conquistar governos estaduais.

Nesse caminho da reeleição, em 2014, tem o ano de 2013, em que a candidata Dilma Rousseff e seus mais próximos conselheiros políticos reputam fundamental principalmente para a definição dos adversários dentro do mesmo campo político. Cenário em que se distingue a expectativa em torno de uma definição de suas relações e as relações do ex-presidente Lula com o governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB).

Não se considera necessária uma definição agora do governador, nem para barganhar espaço de poder nem para ter melhor posição na aliança. Ele apoia a presidente Dilma, continua integrando o governo e o próprio Lula já disse, a mais de um petista exaltado de seu staff, que passadas as eleições tudo se restabelecerá com Eduardo Campos.

O que se imagina é, se Dilma estiver bem em 2013, com seus 70% de popularidade, e o Brasil impermeável à crise internacional, que Eduardo Campos pode simplesmente decidir permanecer do tamanho que está e seguir rumo a 2018. Se a presidente se enfraquecer, Campos tanto pode querer mexer na chapa, tomando a vice do PMDB, ou ganhar musculatura maior lançando-se candidato. Porém, candidato do lulismo. Não se admite, nem como hipótese, a saída de Eduardo Campos desse espectro.

Outra equação que se desenrolará também em 2013 é a definição da candidatura do PT ao governo de São Paulo. O partido vai mostrar se continuará fazendo da disputa interna sua destruição ou se Lula terá força para determinar. Estão na disputa os três EMES - Marinho, Marta e Mercadante - o primeiro reeleito prefeito com o suor do ex-presidente Lula e os dois outros ministros de Dilma em postos avançados, ideais para uma campanha eleitoral. Até aqui, tudo igual. Há quem ainda coloque um P entre eles, o também ministro Padilha. Se o partido sobreviver a essa ameaça de torrencial tempestade, Dilma poderá seguir em segurança para 2014.

Fonte: Valor Econômico

Quatro vitórias em São Paulo - Fernando Rodrigues


Apenas um será o prefeito da cidade de São Paulo, mas os quatro primeiros colocados na disputa de domingo acumularam expressivo capital político. Cada um a seu modo decidirá agora como utilizar esse ativo adquirido nas urnas.

José Serra (PSDB), aos 70 anos, foi durante semanas dado como possível ausente no segundo turno.

Teve um de seus piores desempenhos entre os paulistanos. Enfrentou a má vontade de parte de seu partido, inclusive do governador Geraldo Alckmin. Acabou indo para a rodada final como primeiro colocado.

O tucano pode fracassar no dia 28. Ainda assim, terá se mantido em evidência. Continuará influente sobre parcela grande do PSDB. É improvável que a legenda escolha seu candidato a presidente em 2014 sem ouvir Serra, sendo ele prefeito ou não de São Paulo.

Fernando Haddad teve a terceira pior votação histórica do PT entre os paulistanos. Só que foi também o candidato petista menos conhecido do público em todas as eleições locais. Sua arrancada para ir ao segundo turno é uma das maiores já vistas entre petistas numa reta final.

Se ganhar, Haddad torna-se a nova opção do PT para o governo paulista e para voos mais altos no futuro. Mesmo numa eventual derrota, ao ter ido para o segundo turno, já está credenciado para novas disputas.

Celso Russomanno teve 21,6 % dos votos válidos. Há dois anos, em 2010, sua marca na capital foi de 6,7% ao disputar o governo paulista. Triplicou sua votação. Apesar de pertencer a um micropartido (PRB), marcado por influência religiosa, ganhou relevância como ator político na maior cidade do país.

Por fim, Gabriel Chalita e seus 13,6% deram ao PMDB o que mais faltava ao partido: votos. A renovação oxigenou a sigla detentora de um curioso paradoxo: é gigante no Brasil e nanica em São Paulo.

Tudo somado, houve quatro vitoriosos na eleição de São Paulo.

Fonte: Folha de S. Paulo

Lula, maior vencedor e maior perdedor do pleito - José Nêumanne


Nunca antes na História deste país aconteceu o que se registrou nesta eleição municipal de domingo: um protagonista absoluto que nem sequer foi candidato e saiu das urnas como o grande vencedor. Mas pode vir a ser o maior perdedor, a depender do que ocorrer em São Paulo daqui a três domingos, no segundo turno. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva conseguiu o que muitos, inclusive de sua grei, consideravam impossível: levou aos trambolhões o jejuno ex-ministro da Educação Fernando Haddad à disputa final contra o conhecido e experiente adversário tucano, José Serra. Se Haddad ganhar em 28 de outubro, a oposição será desalojada de seu penúltimo bastião de poder relevante, a Prefeitura de São Paulo, o que pode dificultar a reeleição de Geraldo Alckmin para o governo do Estado em 2014. Se perder, será retirado de Lula o condão de fazedor de reis.

Do êxito da "tucanada" desunida dependerá o futuro imediato do outro grande vencedor do primeiro turno dos pleitos municipais: o neto de Miguel Arrais, governador de Pernambuco e presidente nacional do Partido Socialista Brasileiro (PSB), Eduardo Campos, aliado federal de Lula e seu desafeto vitorioso em duas praças importantes. Pois o triunfo do petista em São Paulo poderá tirar das costas do padim Ciço de Caetés o peso representado pelos erros sesquipedais que ele e seus seguidores cometeram no Recife e em Belo Horizonte por soberba e ignorância. O que o eleitor paulistano decidirá é um mistério incapaz de ser constatado pelos institutos de pesquisa, conforme foi revelado na disputa deste domingo. Nunca antes houve divórcio tão grande entre pesquisas de intenção espontânea e por indução quanto na reta final da semana passada em São Paulo: dos eleitores entrevistados, quase 40% não tinham um nome para enunciar e terminaram queimando a língua das pesquisas. Os números recordistas de abstenção e de votos nulos e em branco superaram o total dos dados a Serra. Somados aí os votos dos candidatos retirados do pleito, os dois ponteiros tiveram 1,3 milhão de sufrágios menos.

Serra ficou com o tradicional terço do reduto do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), assim como Haddad se aproximou do terço do Partido dos Trabalhadores (PT), restando-lhes agora a árdua missão de convencer mais da metade do maior eleitorado municipal brasileiro a desalojar o adversário do posto cobiçado. Sim, porque mais do que nunca em São Paulo será escolhido o menos rejeitado, restando ao vencedor a glória do poder e também a tarefa de descascar as batatas que lhe cabem de tal forma a superar a barreira óbvia da desaprovação aos estilos de gestão e política adotados recentemente pelo partido no governo e pelo principal polo de oposição na União, nos Estados e municípios.

Numa óbvia demonstração de que o que lhe sobra em sorte falta em juízo e conhecimento de causa sobre o Estado onde nasceu, Lula patrocinou uma bobagem sem tamanho que jogou por terra anos de boa gestão administrativa e proveitosa parceria com o governador na prefeitura do Recife. O bem avaliado prefeito João da Costa ganhou a convenção do PT e foi impedido de disputar o cargo por uma intervenção brutal e pouco astuta dos dirigentes nacionais de seu partido. Do topo do recorde de preferência no Estado, o governador pernambucano simpatizava com a candidatura do deputado Maurício Rands, também retirada da disputa por decisão vinda do alto. Rands saiu do PT e Campos partiu para voo solo tirando do bolso do colete um candidato ainda mais jejuno do que Haddad em São Paulo, seu ex-secretário de Planejamento Geraldo Julio. Este venceu no primeiro turno e tudo indica que o aliado socialista livrou o PT de uma evidência vexaminosa: o candidato imposto por Lula, o ex-ministro Humberto Costa, também foi superado pelo poste tucano Daniel Coelho. O terceiro lugar do petista reafirmou a rebeldia do Recife, que o presidente nacional petista, Rui Falcão, cobrará do diretório municipal. Uau!

A vitória dos aliados PSB em Belo Horizonte e Partido Democrático Trabalhista (PDT) em Porto Alegre logo no primeiro turno ocultou uma constatação exata do tamanho dos desastres petistas em praças que dominava sem sustos na companhia de aliados. Adão Villaverde foi o primeiro candidato do partido da presidente Dilma Rousseff, que votou não se sabe em quem na capital gaúcha, a não disputar o turno decisivo do pleito. Mas este não haverá e, por isso, o fato histórico pode passar ao largo. Em Belo Horizonte a disputa dual não levaria a segundo turno mesmo, mas a presidente quis se aproveitar da condição de mineira para tirar da frente um tucano forte para enfrentá-la na eleição, Aécio Neves, que apoiava, juntamente com o PT, o prefeito Marcio Lacerda. Com gestão aprovada e a força tucana no Estado, o candidato do partido de Campos, e mais uma vez Campos, não tomou conhecimento do favorito da chefona, Patrus Ananias. Também é o caso de Lula e Dilma comemorarem a óbvia transformação da campanha em carne de vaca em 28 de outubro, quando os olhos da Nação só estarão voltados para São Paulo.

Eleições municipais não costumam alterar o panorama das estaduais e da federal, de dois anos depois. A trágica realidade da oposição, et pour cause da democracia no Brasil, é que, mesmo quando perdeu, o PT foi vencido por aliados. Principalmente Campos. E o PDT, ao qual não faz muito tempo a presidente era filiada. A maior vitória oposicionista foi do governista Marcio Lacerda. Resta Serra, que enfrentará uma rejeição monumental, a avaliação negativa do aliado Kassab e a invejosa indiferença dos companheiros de partido para garantir um local de onde alguma dissidência possa levantar a voz contra o aniquilante poder das bancadas de apoio ao governo federal. Se Serra vencer, os tucanos ficarão na trincheira, no aguardo do embate de daqui a dois anos pelo maior Estado da Federação. Se Haddad vencer, Dilma só poderá ser derrotada pela economia e Campos esperará a vez chegar à sombra e água fresca do poder.

Jornalista, escritor, é editorialista do Jornal da Tarde

Fonte: O Estado de S. Paulo

Lula carregou seu segundo poste - Elio Gaspari


Lula levou seu poste ao segundo turno na disputa pela prefeitura de São Paulo. Apesar de a eleição ter ocorrido enquanto o Supremo Tribunal Federal julga um dos maiores escândalos políticos da história nacional, o PT saiu da rodada inicial como o partido mais votado nos municípios, com 17,3 milhões de votos (um crescimento de 4%), elegendo 624 prefeitos, 12% a mais que em 2008. Levou oito das 83 cidades com mais de 200 mil habitantes que fecharam a conta. Isso num dia em que o ministro Joaquim Barbosa era festejado na seção onde votou. "Cana neles", disse-lhe um eleitor. Seu colega Ricardo Lewandowski, adversário no julgamento do mensalão, entrou pelos fundos. O comissário José Dirceu, depois de ter trocado de endereço, chegou acompanhado por uma centena de companheiros parrudos.

O PMDB continua sendo o partido com maior número de prefeituras (1.025), mas, pela primeira vez, perdeu na soma dos votos. O PSDB elegeu 693 prefeitos com 13,9 milhões de votos, perdendo 13% dos municípios e 4% dos votos.

Qualquer projeção de resultado eleitoral com base em resultados do primeiro turno é uma ousadia aritmética e as especulações nacionais a partir de números municipais são exercícios de quiromancia. Os números de domingo fixam três personagens vitoriosos: o mineiro Aécio Neves, o pernambucano Eduardo Campos e o carioca Eduardo Paes, mas falta São Paulo.

Se Nosso Guia eleger Fernando Haddad, sairá desta eleição maior do que entrou. Se perder, pobre Lula. Assim como ninguém poderá dizer que o PT perdeu a eleição tendo vencido em São Paulo e saído do pleito com mais de 14 milhões de votos, os companheiros terão dificuldade para cantar vitória tendo perdido também em Porto Alegre, Belo Horizonte e Recife.

A ascensão de Celso Russomanno mostrou que costuras partidárias, marquetagens e tempo no horário de propaganda gratuita são incapazes de decidir um pleito. Sua implosão provou que pesquisa é uma coisa e eleição, outra. A de domingo mostrou as limitações da futurologia. Noutro aspecto, indicou as limitações da passadologia. Continua em vigor a sabedoria convencional do cinturão petista da periferia de São Paulo. Haddad conseguiu recuperar os votos da periferia que escorregavam na direção de Russomanno e ficou com o maior pedaço desse eleitorado. Não existe cinturão petista. Se existisse, nas pesquisas de setembro, Russomanno não teria conseguido 38% das preferências na região. O que existe é um pedaço da cidade onde, depois de oito anos de exercício da prefeitura, o tucanato ainda não se fez ouvir. Há dez anos havia no Rio de Janeiro o fator passadológico da Zona Oeste. Nela políticos como Anthony Garotinho e Cesar Maia, com oito anos de poder estadual e doze na prefeitura, estariam protegidos. Pois no domingo o candidato Rodrigo Maia (filho de Cesar), que tinha como vice Clarissa Garotinho (filha de Anthony e de Rosinha, sua sucessora), conseguiu 5,4% dos votos, com 0,91% em Campo Grande. O cinturão carioca também não existia. Tanto na periferia de São Paulo como na Zona Oeste do Rio concentram-se eleitores de baixa renda.

Fonte: O Globo

PMDB vai apoiar Haddad em SP; Paulinho fecha com Serra


PMDB anunciará apoio de Chalita a Haddad

Partidos já negociam cargos na prefeitura em caso de vitória; PRB de Russomanno resiste a selar acordo

Peemedebistas selaram aliança em encontro de Lula e Temer; Chalita deve anunciar adesão hoje em ato com petista

Catia Seabra, Bernardo Mello Franco e Luiza Bandeira

SÃO PAULO - O ex-presidente Lula e o vice-presidente Michel Temer fecharam ontem o apoio do PMDB ao candidato do PT, Fernando Haddad, no segundo turno da disputa pela Prefeitura de São Paulo.

Os petistas se comprometeram, em caso de vitória, a dar ao partido aliado um espaço na prefeitura semelhante ao que os peemedebistas têm hoje em Brasília. O partido controla cinco pastas no governo Dilma Rousseff.

A aliança deve ser anunciada hoje em ato com as presenças de Haddad e do candidato derrotado do PMDB, Gabriel Chalita, que ficou em quarto lugar na eleição com 13,6% dos votos válidos.

O PRB de Celso Russomanno, que ficou em terceiro com 21,6% dos votos, ainda resiste a aderir a Haddad. Dirigentes dos dois partidos se reuniram ontem à noite, mas não fecharam acordo.

A aliança com o PMDB foi selada ontem de manhã em reunião na casa de Temer, no Alto de Pinheiros (zona oeste). Além da entrega de secretarias municipais, foi negociada a participação de vereadores da sigla em subprefeituras caso Haddad se eleja.

O PMDB também cobrou apoio petista em Natal e Florianópolis, onde tem candidatos no segundo turno.

O partido ainda pediu a incorporação de cinco pontos do programa de Chalita à plataforma de Haddad, incluindo a implantação das UPAs (Unidades de Pronto-Atendimento) no setor de saúde.

"Nossa aproximação vai ser com base em propostas. Chalita defendeu a questão das UPAs, da educação integral, e nós vamos estudar essas questões", disse Haddad.

A exigência foi feita pelo candidato derrotado do PMDB para justificar a aliança à sua base eleitoral.

Ele temia que seus aliados ligados à Igreja Católica rejeitassem um acordo por causa da cartilha anti-homofobia elaborada para o Ministério da Educação na gestão de Haddad. O material foi apelidado de "kit gay" e gerou forte reação no meio religioso.

O tema atrasou o acordo com o PMDB, previsto inicialmente para domingo.

O comando da campanha também evitou um anúncio ontem para que a aliança não desaparecesse em meio ao noticiário sobre a condenação do ex-ministro José Dirceu por corrupção ativa no julgamento do mensalão.

A aliança começou a ser costurada anteontem em encontro entre Temer e Dilma. Ela pediu que a negociação fosse conduzida com Lula.

Russomanno

Antes da reunião com o PRB, o secretário-geral do PT, Elói Pietá, disse à Folha que Dilma não dará outro ministério ao partido em troca de apoio a Haddad. "Se ela não deu um ministério ao PR no primeiro turno, não tem por que dar ao PRB no segundo."

Em junho, Dilma rejeitou trocar o ministro dos Transportes, Paulo Sérgio Passos, para atrair o PR. A sigla encerrou a negociação e deu apoio a José Serra (PSDB).

A presidente, no entanto, fez duas mudanças em sua equipe para ajudar Haddad. Entregou uma secretaria do Ministério das Cidades ao ex-prefeito Paulo Maluf (PP) e deu o Ministério da Cultura à senadora Marta Suplicy.

"Não pedi e não pedirei espaço no governo", disse à noite o presidente do PRB, Marcos Pereira.

Fonte: Folha de S. Paulo