quarta-feira, 11 de abril de 2012

OPINIÃO DO DIA – Antonio Labriola: causídicos ou sofistas

Por isso nós, socialistas que de bom grado nos deixamos chamar “científicos” – se não se tentar com tal epíteto confundir-nos com os positivistas, que são nossos hóspedes freqüentes mas nem sempre bem aceitos e a seu bel prazer monopolizam a palavra ciência -, não lutamos para sustentar uma tese abstrata e genérica, como se fôssemos causídicos ou sofistas; nem nos apressamos em demonstrar a racionalidade de nossos objetivos. Nossos objetivos são unicamente a expressão teórica e a explicação pacífica dos dados que nos oferecem a interpretação do processo que se cumpre através de nós e em torno a nós; e que está inteiro nas relações objetivas da vida social, da qual somos sujeito e objeto, causa e efeito, escopo e parte. Nossos objetivos são racionais, não porque se fundamentam em argumentos extraídos da razão da discussão, mas porque são deduzidos da consideração objetiva das coisas; o que equivale a dizer que são deduzidos a partir da elucidação de seu processo, que não é nem pode ser resultado de nosso arbítrio mas, ao contrário, vence e submete nosso arbítrio.

LABRIOLA, Antonio (1842-1904), professor de Filosofia da Universidade de Roma. Ensaio escrito em 7 de abril de 1895. Manifesto comunista, p.92. Boitempo Editorial, São Paulo, 2005.

Manchetes de alguns dos principais jornais do Brasil

O GLOBO
Congresso enfim vai criar CPI para Cachoeira e Demóstenes
Regra três
TRT do Rio investigará dono de R$ 282 milhões
Rede envolvia gabinete de governo do PT no DF
Governo não aceita exigência de bancos
Barreira à China agora é oficial

FOLHA DE S. PAULO
Lula incentiva, e Congresso anuncia CPI do Cachoeira
Polícia Militar gasta R$ 26 mi em tablets que funcionam mal
Bancos fazem exigências ao governo para reduzir juros
Julia Sweig: Dilma reflete o que o Brasil pode levar aos americanos
Tecnologia 'verde' terá prioridade para obter patente

O ESTADO DE S. PAULO
Acordo no Congresso vai permitir CPI do Cachoeira
Dilma cobra Obama sobre Embraer
Governo quer acordo para baratear luz
Neymar leva a Câmara ao delírio
STF julga se é crime aborto de feto sem cérebro

VALOR ECONÔMICO
cos conseguem aliviar o efeito dos compulsórios
Estados não aceitam Selic para dívidas
Usina de Santa Isabel pode sair do papel
Brasil inspira oposição a Chávez
Brasileiro prefere poupança e capitalização
Área militar impulsiona os negócios de TI

CORREIO BRAZILIENSE
Senado e Câmara vão criar CPI do Cachoeira
Dilma quer barrar a crise com empregos
Juros: Bancos pedem garantias

ESTADO DE MINAS
BH tamanho XG
Porque os EUA relutam em abolir o visto para o Brasil
Para cortar juros, banco quer garantia

ZERO HORA (RS)
Soja deve frear avanço da economia gaúcha
STF vota hoje aborto de anencéfalo
Congresso fecha CPI contra Demóstenes

JORNAL DO COMMERCIO (PE)
Brinquedo nacional mais barato
Relações de Cachoeira são alvo de CPI
Supremo vota aborto de bebê sem cérebro

O que pensa a mídia - editoriais dos principais jornais do Brasil

http://www2.pps.org.br/2005/index.asp?opcao=editoriais

Rede envolvia gabinete de governo do PT no DF

Chefe de gabinete do governador do Distrito Federal, Agnelo Queiroz (PT), Claudio Monteiro pediu demissão ontem, após a divulgação de conversas em que integrantes do esquema de Carlinhos Cachoeira discutem o pagamento de propina para ele e para Marcelo Lopes, ex-assessor da Casa Militar, em troca de nomeações para o Serviço de Limpeza Urbana

Chefe de gabinete de Agnelo pede demissão após revelação de grampo

Membros do grupo de Cachoeira falam em dinheiro para agradecer nomeação

BRASÍLIA. Cláudio Monteiro, chefe de gabinete do governador do Distrito Federal, Agnelo Queiroz, pediu demissão ontem à noite, depois que gravações da Polícia Federal mostraram integrantes da organização do bicheiro Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, conversando sobre pagamento de propina e concessão de um telefone especial a ele. Em um dos diálogos interceptados pela Polícia Federal, o grupo promete dinheiro também para Marcelo Lopes, ex-assessor especial da Casa Militar do DF, como revelou ontem o "Jornal Nacional", da TV Globo. Os diálogos estão no inquérito sobre a exploração ilegal de caça-níqueis, jogo do bicho e fraudes em licitações entre outros crimes imputados a Cachoeira.

Entre as conversas gravadas pela Polícia Federal com autorização judicial está um diálogo entre Cláudio Abreu, ex-diretor regional da construtora Delta, e o sargento da reserva da Aeronáutica Idalberto Matias, o Dadá, dois dos principais integrantes da organização de Cachoeira.

"Dá o dinheiro pro cara, meu irmão"

Em janeiro do ano passado, Abreu ligou para Dadá para conversar sobre nomeação para o comando do Serviço de Limpeza Urbana (SLU), no começo do governo Agnelo. A Delta estava interessada em ampliar os contratos com o SLU.

- O Marcelão tá aqui comigo, entendeu? Veio agora de uma reunião com o Cláudio Monteiro. Ele tava falando o seguinte: que é ideal você dar um presente pro cara antes. A nomeação vai sair na terça-feira no Diário Oficial - diz Dadá.

Marcelão seria Marcelo Lopes, que até o início do escândalo era assessor da Casa Militar. Impaciente, Abreu, um dos executivos mais importantes da sétima maior construtora do país, manda Dadá resumir logo a conversa.

- O que que é pra dar pra ele? - pergunta.

Dadá não tem dúvidas sobre o que está em jogo.

- Dá o dinheiro pro cara, meu irmão - sugere.

Dadá é apontado pela Polícia Federal como um dos prepostos de Cachoeira encarregado de cooptar agentes públicos para a organização do bicheiro. Abreu ouve a sugestão e faz uma oferta.

- Faz o seguinte: vamos dar 20 mil pra ele e 5 mil por mês. Pronto. Vinte mil prá ele agora e 5 mil por mês. Entendeu ? - diz.

Dadá reafirma que o "Marcelão" permanece ali e que os dois vão conversar sobre o assunto. Cláudio Monteiro, um dos mais influentes assessores de Agnelo, seria o responsável pela indicação de João Monteiro para o comando do SLU, área cobiçada pela Delta. Cláudio Monteiro confirmou contatos com Dadá, mas negou que tenha recebido dinheiro ou mesmo participado da indicação de dirigentes do SLU.

- Não recebi e nem providenciei a nomeação. Eu não tenho nada, absolutamente nada com isso - disse Monteiro ao Jornal Nacional.

Em outra conversa interceptada pela PF, Dadá e Cachoeira falam em entregar rádios para Monteiro e Lopes. A organização acreditava que rádios Nextel seriam à prova de grampo. O grupo criou o "Clube Nextel", que reunia cúmplices de Cachoeira que só falavam entre si com o rádio habilitado nos Estados Unidos.

FONTE: O GLOBO

Planalto mantém no cargo assessor que conversou com número 2 de bicheiro

Gilberto Carvalho confirma ter pedido esclarecimentos, mas defendeu Noleto

Luiza Damé

BRASÍLIA. O Palácio do Planalto decidiu manter no cargo o subchefe de Assuntos Federativos da Secretaria de Relações Institucionais (SRI), o petista goiano Olavo Noleto, flagrado num telefonema com Wladimir Garcez, ex-presidente da Câmara Municipal de Goiânia e número dois do esquema do bicheiro Carlinhos Cachoeira. Embora o assunto tenha mobilizado os ministros palacianos desde segunda-feira da semana passada, quando a presidente Dilma Rousseff tomou conhecimento do fato, o governo bancou a versão do assessor de que não tem ligação com os negócios ilícitos de Cachoeira.

Em nota ontem, pela manhã, a SRI disse não haver "qualquer indício de irregularidade" na conduta de Noleto que justifique sua demissão. E negou que tenha havido reunião no Planalto para tratar da situação dele. Mais tarde, porém, o ministro da Secretaria Geral, Gilberto Carvalho, confirmou as conversas com Noleto, semana passada, e afirmou que o assunto, para o Planalto, é "página virada". Segundo Gilberto, o governo não teme que a possível relação de Noleto com Garcez respingue no Planalto.

O telefonema entre Garcez e Noleto é conhecido pelo Planalto desde o dia 2 de abril. Foi a ministra da SRI, Ideli Salvatti, quem informou Dilma e Gilberto sobre a situação de seu assessor. O ministro disse que Noleto é seu amigo e contou que falou com ele na semana passada sobre a relação com Garcez.

Segundo Gilberto, Noleto lhe disse que tratou com Garcez de um possível apoio do senador Demóstenes Torres (sem partido-DEM) à candidatura de Dilma Rousseff, em 2010. Esse apoio, disse Gilberto, acabou não ocorrendo, porque o DEM indicou Indio da Costa como vice na chapa do tucano José Serra.

- Ele (Noleto) nos assegurou que o único contato com esse ex-presidente da Câmara tinha sido dessa natureza. Não conhecia o Carlinhos Cachoeira, nunca teve contato com ele - disse Gilberto, salientando que a função do subchefe é receber parlamentares, prefeitos e governadores.

Noleto, em nota, disse que "jamais conversou, não conhece, nem foi apresentado" a Cachoeira, mas que conhece e conviveu com Garcez, quando foi chefe de gabinete do ex-prefeito de Goiânia Pedro Wilson Guimarães (PT), entre 2001 e 2002.

Tanto a SRI como Gilberto negaram que Dilma tenha pedido a demissão de Noleto.

FONTE: O GLOBO

Acordo no Congresso vai permitir CPI do Cachoeira

Um acordo entre Senado e Câmara permitirá a abertura de CPI mista para investigar as ligações políticas do contraventor goiano Carlinhos Cachoeira. Governistas e opositores expressaram apoio. "Temos interesse em apurar tudo", disse o líder do PT no Senado, Walter Pinheiro (BA). "Estaremos firmes na defesa da investigação", afirmou a presidente do PSDB, deputado Sérgio Guerra (PE). Além da CPI, o Senado deu o primeiro passo no processo de cassação de Demóstenes Torres (sem partido), acusado de elo com Cachoeira. O presidente do Conselho de Ética da Casa, Antonio Carlos Valadares (PSB-SE), acolheu a pedido do PSOL, apresentado há 13 dias

CPI mista pode apurar ligação de contraventor com parlamentares

Decisão foi tomada pelos presidentes do Senado e da Câmara e contou com apoio de legendas aliadas e de oposição

João Domingos, Christiane Samarco

BRASÍLIA - Uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Senado e da Câmara investigará as ligações políticas do contraventor Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira. Foi o que decidiram ontem os presidentes das duas Casas, o senador José Sarney (PMDB-AP) e o deputado Marco Maia (PT-RS), com apoio das legendas aliadas e da oposição.

Ficou acertado que Senado e Câmara fecharão um texto comum de convocação das investigações. Para a instalação da CPI, são necessárias no mínimo 27 assinaturas de senadores e 171 de deputados, o que deve ser alcançado com facilidade, dado que o apoio à abertura do inquérito é total. Numa CPI, ao contrário dos processos nos conselhos de ética, sigilos bancário, fiscal e telefônico podem ser quebrados. Os convocados são obrigados a comparecer. E as investigações servem de base para a montagem de processos penais.

"Não há dúvidas de que todos os fatos revelados a respeito das ligações de Cachoeira com os políticos são graves. Por isso, achamos melhor uma CPI mista para investigar as ligações de Cachoeira com parlamentares, e com os Poderes Executivo e Judiciário, além de setores da imprensa", disse o presidente da Câmara, Marco Maia, logo após a reunião com Sarney. O líder do PT no Senado, Walter Pinheiro (BA), disse que até a segunda-feira tinha dúvidas a respeito da abertura da CPI, pois a PF já tinha feito as investigações, o Supremo Tribunal Federal determinara a abertura de inquérito e o Conselho de Ética do Senado abriu ontem processo contra o senador Demóstenes Torres (GO), que trocou 298 ligações com Cachoeira.

Negativa. Ocorre que o STF se recusou a dar ao Senado acesso às fitas gravadas pela PF, segundo Pinheiro. O Senado insistiu, com novo requerimento, citando como precedente processo contra o ex-senador Luiz Octávio (PMDB-PA), em que toda a papelada foi compartilhada com os senadores. "Temos interesse em apurar tudo. Por isso, queremos a CPI", disse Pinheiro.

A oposição também trabalhou pela abertura da CPI. O governador tucano de Goiás, Marconi Perillo, liberou a cúpula do PSDB para que insistisse na CPI. E garantiu à direção partidária que não tem vínculo pessoal com Cachoeira e que não há nada no inquérito que o incrimine.

Com o aval de Perillo, o presidente nacional do partido, deputado Sérgio Guerra (PE), sentiu-se seguro para levar adiante o projeto de investigações. "O PSDB está tranquilo em relação a Marconi e não tem por que vacilar. Estaremos firmes na defesa da investigação e não a reboque dela. Queremos que a CPI investigue todas as ligações de Cachoeira no Executivo, no Legislativo e Judiciário e não poupe ninguém", disse. "Os autores ou cúmplices deverão ser apontados a todo o Brasil e punidos dentro das formas legais", afirmou.

O deputado ACM Neto (BA), líder do DEM, partido ao qual pertencia Demóstenes, disse confiar na instalação da CPI já na semana que vem. "Creio que em menos de 24 horas vamos reunir as assinaturas necessárias." Já o deputado Marco Maia disse que não tem medo de que a CPI atrapalhe o Congresso. "Uma coisa é a pauta da Câmara e do Senado, que tem sua rotina; outra é a CPI. Vamos pedir aos parlamentares candidatos a prefeito que não participem das investigações."

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Planalto e Perillo agem para evitar desdobramentos

Fernando Exman, Yvna Sousa e Juliano Basile

BRASÍLIA - O Palácio do Planalto e o governador de Goiás, Marconi Perillo (PSDB), desencadearam ontem duas operações para tentar afastar as suspeitas de que o escândalo envolvendo o empresário Carlos Augusto Ramos terá novos desdobramentos nos governos federal e goiano.

Conhecido como Carlinhos Cachoeira, Carlos Augusto Ramos foi preso pela Polícia Federal sob a acusação de comandar uma rede ilegal de jogos de azar. A Secretaria de Relações Institucionais da Presidência da República divulgou uma nota negando que o subchefe de Assuntos Federativos da Pasta, Olavo Noleto, seria demitido.

De acordo com o jornal "O Globo", a operação da Polícia Federal que investigou Cachoeira teria encontrado ligações telefônicas de Noleto com um dos integrantes do grupo do empresário. Ainda segundo o jornal, Noleto teria admitido numa reunião com a ministra das Relações Institucionais, Ideli Salvatti, e o secretário-geral da Presidência, ministro Gilberto Carvalho, que conhece Cachoeira, mas negou fazer parte do suposto esquema comandado pelo empresário. Noleto é do PT goiano, e trabalha no Palácio do Planalto desde o governo Luiz Inácio Lula da Silva.

A Secretaria de Relações Institucionais assegurou que são "infundadas" as informações sobre a eventual demissão do assessor de Ideli. "Não existe qualquer indício de irregularidade em relação à sua conduta que possa justificar seu afastamento", sublinhou o comunicado divulgado pela Pasta. "Não existiu uma suposta reunião entre Noleto, o ministro Gilberto Carvalho e a ministra Ideli Salvatti, nos termos relatados pela imprensa."

Marconi Perillo, por sua vez, reuniu ontem seu secretariado, num momento em que o meio político goiano vive momentos de "tensão". Além do senador Demóstenes Torres (sem partido) e integrantes da bancada de Goiás, de todos os partidos, na Câmara dos Deputados, as denúncias envolvendo Carlinhos Cachoeira atingiram a chefe de gabinete de Perillo e o presidente do Detran. Ambos deixaram o cargo, embora neguem ter praticado irregularidades. Na tentativa de criar uma agenda positiva, Perillo pediu que seus auxiliares definam metas e prioridades e acabem com a "dispersão de atividades". A expectativa de interlocutores do governador goiano é que as denúncias relacionadas a autoridades do Estado cessem nos próximos dias.

O jornal "O Globo" também publicou ontem uma reportagem segundo a qual uma ação iniciada pelo Ministério Público de Goiás tramita desde 2005 no Supremo Tribunal Federal (STF) tentando anular uma lei estadual que autoriza a exploração de loterias instantâneas. A lei e o decreto que regulamentou essa norma foram assinados em 2000 pelo então governador Marconi Perillo, que elegeu-se novamente em 2010, e poderia beneficiar Carlinhos Cachoeira.

Relator do processo no STF, o ministro Gilmar Mendes informou que a Corte já tem súmula vinculante contra leis estaduais que tratam do assunto. A súmula inviabiliza qualquer possibilidade de o STF autorizar jogos nos Estados. Ela foi editada, em 2007, após o Supremo proibir jogos em Goiás. Por causa disso, o ministro questionou o MP se há algum interesse em manter a ação no STF. Mesmo que o processo continue em tramitação, os jogos permanecem proibidos e não há chance de o STF autorizá-los.

Ontem, a defesa do senador Demóstenes Torres entrou com uma reclamação no STF pedindo a anulação das gravações em que ele aparece conversando com Cachoeira. Segundo Antônio Carlos de Almeida Castro, advogado de Demóstenes, as gravações são ilegais, pois envolvem autoridade com foro privilegiado (senador) e não foram previamente solicitadas ao STF. A reclamação será analisada pelo ministro Ricardo Lewandowski, que é relator do processo.

FONTE: VALOR ECONÔMICO

Senadores criticam proposta tributária da União

Parlamentares da base e da oposição não querem dívidas dos estados corrigidas pela Selic, como propôs Ideli Salvatti

Cristiane Jungblut

BRASLIA. Apesar do acordo anunciado semana passada pela ministra de Relações Institucionais, Ideli Salvatti, sobre o pacote de medidas tributárias de interesse dos estados, senadores da base aliada e da oposição criticaram ontem a proposta da área econômica de adotar a taxa básica de juros, a Selic, como novo indexador das dívidas dos estados junto à União.

Na quinta-feira, Ideli informou que a Fazenda concordara em substituir o indexador atual, o IGP-DI, pela Selic. Mas os senadores rejeitaram a ideia com o argumento de que essa taxa de juros é definida pelo governo, ou seja, o credor dos estados.

Apoiado por outros colegas, o senador Francisco Dornelles (PP-RJ) defendeu a adoção do IPCA como novo índice de cálculo das dívidas. Mas a área econômica já estaria avançando na negociação com os governadores para a adoção da Selic. Hoje, o assunto será debatido nas comissões de Constituição e Justiça (CCJ) e de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, que começarão a votar as propostas do pacote tributário.

A primeira proposta a ser votada hoje, nas duas comissões, prevê o fim da chamada guerra fiscal, com a unificação da alíquota do ICMS em operações interestaduais com produtos importados.

A questão da dívida dos estados gerou polêmica na reunião de ontem da CAE. O senador Francisco Dornelles foi o primeiro a reclamar da adoção da Selic e apresentou proposta alternativa, afirmando que o governo faz os "senadores de bobos" ao propor uma taxa que a União, que é credora, pode aumentar a qualquer momento.

- Adotar a Selic é uma loucura. Não dá para você aceitar uma taxa fixada pelo seu credor (da dívida). E Selic é item de política monetária. Hoje, está um pouco acima dos 9%, mas amanhã pode estar em 20%, 30%. Já o IPCA é calculado pelo IBGE e independe da política monetária. O governo acha que somos meio bobos - disse Dornelles, parafraseando Nelson Rodrigues.

Mas a intenção da Fazenda, ontem, ainda era manter a proposta. A ideia é que o próprio líder do governo, Eduardo Braga (PMDB-AM), apresente texto neste sentido hoje nas comissões do Senado.

- Vamos ter que apresentar um projeto de lei complementar, fazendo a alteração e permitindo que os contratos com os estados sejam mudados. A ideia é manter a Selic, que é uma opção neutra, porque é a taxa que a União paga quando toma recursos - disse o senador Romero Jucá (PMDB-RR), que participa das negociações.

A proposta de Dornelles prevê a correção da dívida adotando o IPCA, retroagindo à data da assinatura de cada contrato. Esse projeto determina que os saldos devedores sejam recalculados pelo novo índice de preços até a data em que entrar em vigor esta lei, quando a atualização monetária será extinta.

A partir da vigência dessa norma em lei, seria adotada nos novos contratos uma taxa de juros nominal fixa de 3%, "mesmo tratamento dispensado pelo Tesouro Nacional a bancos e empresas em operações de empréstimo". Dornelles teve apoio de senadores do PT e do PSDB na defesa do IPCA, como o petista Wellington Dias (PI) e o tucano Aloysio Nunes (SP).

Já o senador Lindbergh Farias (PT-RJ) defendeu a adoção da TJLP (Taxa de Juros de Longo Prazo), também utilizada pelo BNDES, e a redução em dois pontos percentuais do patamar estabelecido para os estados para pagamento de dívidas. Segundo ele, apesar de a regra geral ser de 13% das receitas mensais com pagamento de dívida, há estados que comprometem mais.

Ele disse que conversou com o governador do Rio, Sérgio Cabral, que deve ir a Brasília no próximo dia 19. Neste dia, comissão criada na Câmara para discutir a dívida dos estados deve se reunir com governadores. Comandada pelo ex-líder do governo Cândido Vaccarezza (PT-SP), a comissão também tem proposta de adoção do IPCA, mas quer discutir o assunto com o ministro da Fazenda, Guido Mantega.

- Apenas mudar o indexador não reduz a prestação mensal dos estados. Com a redução dos dois pontos percentuais, o Rio de Janeiro, que compromete 13% da receita, economizaria R$ 752 milhões - disse Lindbergh.

Além da Resolução 72, a CCJ já vai discutir as Propostas de Emendas Constitucionais (PECs) que tratam do comércio por venda virtual ou por representantes. A ideia é repartir meio a meio o ICMS, entre o estado da loja virtual e o estado do consumidor. Mas há propostas de repartir 40%/60% o ICMS, com a maior parte para o estado do consumidor.

FONTE: O GLOBO

Oposição é agora alvo da ira mal resolvida do PT durante mensalão

Clima de "vendetta" ocorre porque petistas consideraram injusto tratamento durante escândalo no governo Lula

Como a teia de negócios de cachoeira não é conhecida, é impossível prever que a CPI só atingirá a oposição

Fernando Rodrigues

BRASÍLIA - Em meados de 1992, o então coordenador político do governo federal, Jorge Bornhausen, foi indagado sobre sua opinião a respeito da CPI do Collorgate. "Essa CPI não vai dar em nada", respondeu.

No final daquele ano, o então presidente Fernando Collor -hoje senador pelo PTB de Alagoas- acabou perdendo o mandato depois de um rumoroso processo de impeachment.

No caso da CPI que investigará os negócios de Carlinhos Cachoeira e as traficâncias de políticos de vários partidos com o mundo da contravenção, o governo também está dizendo que nada afetará o Palácio do Planalto. Mas essa é uma afirmação que não pode ser feita de maneira científica.

Quando Bornhausen falou sobre a CPI do Collorgate, estava também tentando fazer o trabalho de esfriamento do clima político.

Até porque, como se ouve há décadas em Brasília, CPIs a gente sempre sabe como começam, mas nunca como terminam.

O que é possível enxergar no caso da "CPI do Cachoeira" é um desejo irrefreável de parte majoritária do PT e de partidos lulistas agregados. Todos consideram a apuração uma chance de ir à forra contra o que restou da oposição.

O clima de "vendetta" ainda existe por causa do tratamento que os petistas e seus aliados mensaleiros consideraram injusto no processo do mensalão -o mais grave caso de corrupção durante o governo Lula e que destruiu a carreira de vários políticos.

Integrantes do PSDB e do DEM são alvo da ira mal resolvida dos petistas.

Também é comum ouvir no Congresso que deve ser convocado para depor o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, responsável pela apresentação da denúncia do mensalão.

Por fim, os governistas vislumbram a possibilidade de usar a "CPI do Cachoeira" para constranger jornalistas que usaram as informações do empresário na apuração de reportagens.

Como a teia de negócios de Cachoeira ainda está longe de ser conhecida, é impossível prever que a CPI prestes a ser instalada será pródiga em encontrar provas só contra políticos da oposição.

Mas os petistas não parecem considerar haver risco real e estão entusiasmados com a investigação.

O clima é de descontrole. O Palácio do Planalto também dá indicação de estar contaminado pela onda.

Como política não é uma ciência exata, a falta de estratégia definida provoca ainda mais incertezas a respeito do desfecho dessa CPI.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Julgamento do mensalão deve ser agilizado, dizem ministros do STF

Declarações ampliam pressão sobre voto do relator Lewandowski

Maria clara Cabral, Felipe seligman

BRASÍLIA - Dois ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) defenderam ontem que o julgamento do caso do mensalão ocorra o mais rápido possível, sob o argumento de que uma demora poderia arranhar a imagem do tribunal.

Gilmar Mendes disse que isso acontecer neste semestre, lembrando que o atual presidente, Cezar Peluso, e seu sucessor, Carlos Ayres Britto, devem se aposentar entre setembro e novembro, quando completam 70 anos.

"É de todo recomendável que julguemos [neste semestre] e posso dizer que bom para a imagem do tribunal não será [não julgar em 2012]", afirmou Mendes, ao participar de uma sessão solene no Congresso em homenagem ao clube de futebol Santos.

Já Ayres Britto não chegou a defender a análise neste semestre, mas lembrou que trata-se de ano eleitoral e que, por isso, "o conveniente seria apressar o julgamento".

"Como o ano é eleitoral e efetivamente há certo risco de prescrição de algumas imputações, isso em tese, o conveniente seria apressar o julgamento sem perda da segurança da análise julgada", disse, após reunião com o presidente da Câmara, Marco Maia.

Ambas as declarações aumentam a pressão para que o revisor do caso, ministro Ricardo Lewandowski, libere seu voto. Em processos penais, existe no STF as figuras do relator (no caso, o ministro Joaquim Barbosa) e do revisor (Lewandowski). O caso só pode ir ao plenário quando ambos estiverem prontos.

No final de 2011, Barbosa liberou seu relatório, passando a responsabilidade de marcar a data ao colega revisor. Lewandowski diz que já iniciou a análise, mas que a elaboração do voto não é tão simples, por se tratarem de muitos réus e diversas acusações presentes em mais de 50 mil páginas de documentos.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

A 'vingança' do PT e a aposta dos tucanos

Christiane Samarco e João Domingos

Sete anos depois da divulgação de um vídeo em que o diretor dos Correios Maurício Marinho era flagrado embolsando R$ 3 mil - o que deu origem ao mensalão -, vem aí a CPI da Vingança. Os petistas triturados pela CPI dos Correios veem no inquérito que vai apurar as relações de Carlinhos Cachoeira a chance de ir à forra contra a oposição.

Já os oposicionistas enxergam na CPI a possibilidade de encurralar o PT e até chegar ao Planalto, porque as empresas e os negócios de Cachoeira ultrapassam as divisas de Goiás. Só a Delta Construções, citada na Operação Monte Carlo, recebeu R$ 4,13 bilhões do governo federal de 2007 para cá. Além do mais, o advogado de Cachoeira é ninguém menos que Márcio Thomaz Bastos, ministro da Justiça do governo Lula. E Cachoeira foi um "parceiro" de Waldomiro Diniz, que habitava a cozinha do Planalto em 2004.

Peemedebistas experientes, como Renan Calheiros (AL) e José Sarney (AP), avaliavam ontem que o PT deu um passo arriscado, pois CPI não é coisa boa nem quando é a favor e o único consenso é o de que ninguém sabe como ela vai terminar. Fala-se em nova "CPI do fim do mundo", com acusações e dossiês por todo lado.

O PT age agora movido pelo trauma da CPI dos Correios, que arrebentou a cúpula do partido e cassou seu ministro mais poderoso. Nesse clima de rancor, os petistas aceitam até abrir uma CPI que pode implicar o governador do Distrito Federal, Agnelo Queiroz. O presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), afirmou que não há muito a fazer se Agnelo estiver mesmo implicado: "Paciência, (ele) sabia dos riscos."

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

BH - Comando do PT e Lacerda afinados

Presidente do partido desembarca em BH para garantir a aliança com o prefeito, que confirmou a presença dos tucanos na coligação

Bertha Maakaroun

O presidente nacional do PT, Rui Falcão, chegará a Belo Horizonte nesta sexta-feira tendo como principal objetivo garantir em Belo Horizonte a aliança do PT com o PSB, de Marcio Lacerda. Na capital mineira os grupos do PT se dilaceram pela posição de vice na chapa e, no caso do candidato a vice e deputado federal Miguel Corrêa, ainda flerta com o vice-prefeito Roberto Carvalho, defensor da tese da candidatura própria. Para o PT nacional, entretanto, o mais relevante não é a discussão de quem será o vice e sim garantir a reedição da coligação entre PT e o PSB. No plano nacional, Belo Horizonte está no centro das negociações de petistas e tucanos que trabalham uma aliança considerada estratégica para a manutenção do governo federal em 2014.

A aliança de petistas e tucanos, que elegeu Lacerda em 2008 ao lado do PSB, neste momento está ameaçada. Não faltam interpretações para a resolução aprovada no Encontro de Tática Eleitoral, ocorrido em 25 de março. Segundo Roberto Carvalho, se o PSB não informar ao PT até domingo, data do próximo encontro, se excluirá o PSDB da coligação, a resolução prevê a escolha de um nome para a candidatura própria. "O texto que aprovamos é muito claro. Se o PSB não informar a decisão de tirar os tucanos da coligação e se o PSB não aceitar a coligação proporcional com o PT lançaremos candidatura própria", afirma Carvalho.

Em São Paulo, Marcio Lacerda reiterou ontem a presença formal do PSDB na coligação. Em evento promovido pelo Grupo de Líderes Empresariais (Lide), Lacerda disse, ao lado do governador Antonio Anastasia (PSDB), que espera ter uma ampla aliança este ano. "A coligação que pretendemos ter foi desde o primeiro momento dita, que era com o PSDB e com o PT", considerou Lacerda, lembrando que a sua coligação deverá reunir entre 14 e 15 partidos, assim como ocorreu em 2008. "A cidade aprovou esta aliança, ela está funcionando bem", disse. Ao mesmo tempo, Anastasia afirmou que o apoio do PSDB a Lacerda independe do PT. "Fomos convidados novamente pelo PSB, que conduz e coordena essa aliança, para a coligação formal. Continuaremos apoiando o prefeito Marcio Lacerda."

Ao mesmo tempo, em Belo Horizonte, a executiva municipal do PT recebeu ontem, de Lacerda uma resposta formal aos documentos encaminhados pelo partido. "Mandamos para o prefeito e para o PSB municipal e estadual a íntegra da resolução aprovada no Encontro de Tática Eleitoral e um documento denominado Diretrizes democráticas, populares e republicanas para o PT de Belo Horizonte nas eleições", disse Geraldo Arcoverde, secretário-geral do PT em Belo Horizonte e secretário-executivo do Grupo de Trabalho Eleitoral (GTE). "A resposta de Lacerda aos encaminhamentos feitos na resolução, como a exclusão do PSDB e a coligação proporcional, foi de que caberá ao PSB estadual definir as questões colocadas", acrescentou Arcoverde.

No PT, Arcoverde e Roberto Carvalho mantêm a interpretação de que a resolução só permite a aliança do PT com o PSB se o PSDB estiver de fora. Outros grupos fazem leitura diversa. "O PT de Belo Horizonte optou pela negociação. O que fez foi uma recomendação, que não tem caráter de obrigatoriedade", diz ex-deputado federal Virgílio Guimarães. "A resolução nem é um pacto de adesão incondicional a Lacerda nem é um ultimato. Ela opta pelo diálogo e pela negociação soberana do PT", acrescenta ele. Segundo Virgílio, no encontro de domingo o PT vai escolher quem será o vice na chapa de Lacerda, não estando mais em debate a candidatura própria.

Costura para vice

Em meio ao embate de interpretações da resolução, corre a disputa para a vaga de vice. Em aliança com Roberto Carvalho para o apoio ao seu nome, Miguel Corrêa quase alcança a maioria dos 500 delegados. Ao presidente estadual do PSDB, Marcus Pestana, que defendeu o nome do deputado petista para vice na chapa da coligação, o próprio Corrêa voltou a retrucar, cioso de que é no PT que catará os seus votos: "Essa é uma decisão que caberá ao nosso partido".

Apesar de estar próximo à maioria, Miguel Corrêa enfrenta resistência entre os outros grupos do PT. O deputado estadual André Quintão é o preferido da Articulação. Se ele não se dispor a retirar a pré-candidatura, um nome técnico poderá ser mais facilmente construído. Crescem na bolsa de apostas Marco Antônio Rezende Teixeira, procurador-geral do município, que goza de boa interlocução com o ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Fernando Pimentel, e com o ex-ministro do Desenvolvimento Social e Combate à Fome Patrus Ananias. Mas surgem ainda os nomes dos secretários municipais de Planejamento, Orçamento e Informação, Paulo Bretas, e de Obras e de Infraestrutura, Murilo Valadares.

FONTE: ESTADO DE MINAS

Recife - Mendonça reage ao 'jogo de bastidor'

Sem citar nomes, deputado acusa aliados das oposições de, usando do anonimato, tentarem “macular” não apenas sua pré-candidatura, mas também sua imagem

Débora Duque

Incomodado com os rumores de que seu projeto majoritário no Recife estaria perdendo força, o deputado federal Mendonça Filho (DEM) reagiu, mais uma vez, ao que chamou de “jogo de bastidor” que, segundo ele, tem o objetivo de “macular” não apenas sua postulação como sua imagem pessoal. Ao reafirmar sua candidatura, o parlamentar ainda pregou, em tom de alerta ao campo oposicionista, a manutenção de um diálogo “aberto” e “transparente” entre os quatro pré-candidatos do grupo, que corre o risco de lançar-se esfacelado ao pleito municipal.

A postura defensiva de Mendonça é uma resposta à tese de que até alguns de seus correligionários não estariam entusiasmados com sua candidatura. Sem citar nomes, o democrata cobrou “respeito” à condição de prefeiturável. “Sempre tive a lealdade e solidariedade do meu partido em todas as disputas. Não vou responder a gente que se utiliza do anonimato para fazer intriga de bastidor e atingir meu nome, minha imagem e minha candidatura”, defendeu-se.

Essa não foi a primeira reação pública de Mendonça à versão de que sua postulação estaria enfraquecida. Na semana passada, o democrata fez questão de declarar à coluna Pinga-Fogo, do JC, que não não é de “fugir à luta” e que estaria disposto a enfrentar mais uma campanha majoritária, independentemente de alianças. Ontem, ele voltou a bater na mesma tecla: “Já demonstrei que não fujo à luta. Fui candidato sozinho, em 2008, sou de encarar qualquer desafio. Só não vou deixar que subtraiam meus pré-requisitos como candidato”, assinalou.

Ele ainda lembrou que, mesmo sendo o mais bem colocado entre os oposicionistas nas pesquisas de intenção de voto, nunca colocou sua postulação como algo “incontestável”. “Não é todo mundo que teria esse comportamento se estivesse no meu lugar”, provocou, alegando que muitos estariam “arrotando prepotência”.

Os rumores de que seu ingresso na eleição municipal estaria em risco ganharam corpo com a intensificação das movimentações do deputado federal Raul Henry (PMDB). Se, até o ano passado, a candidatura do peemedebista era tida como incerta, hoje encontra-se praticamente consolidada, o que teria minado as chances de Mendonça de conquistar o esperado apoio do colega. Nos bastidores, comenta-se, inclusive, que os “avanços” sem alarde de Henry teriam chateado o democrata. Questionado se a relação encontra-se, de fato, estremecida, Mendonça preferiu não comentar. “Não quero me manifestar sobre relação de ordem pessoal. Não tem porque fazer avaliações através da imprensa”, desconversou, garantindo, porém, que a relação continua sendo de “solidariedade”.

Embora considere que “turbulências” são “normais” em períodos de decisão, o parlamentar disse que a oposição precisar preservar o mínimo de diálogo se quiser aproveitar o cenário favorável com o racha na base governista. “Precisamos manter o canal aberto e construir esse processo com transparência. Sempre respeitei a individualidade de cada candidatura, mas não posso deixar de me manifestar diante da tentativa de macular minha imagem”, justificou.

FONTE: JORNAL DO COMMERCIO (PE)

Chico Buarque - Sem Compromisso - Deixe a Menina

O papa e o marxismo :: Frei Betto

O papa Bento XVI tem razão: o marxismo não é mais útil. Sim, o marxismo conforme muitos na Igreja Católica o entendem: uma ideologia ateísta, que justificou os crimes de Stalin e as barbaridades da revolução cultural chinesa. Aceitar que o marxismo conforme a ótica de Ratzinger é o mesmo marxismo conforme a ótica de Marx seria como identificar catolicismo com Inquisição.Poder-se-ia dizer hoje: o catolicismo não é mais útil. Porque já não se justifica enviar mulheres tidas como bruxas à fogueira nem torturar suspeitos de heresia. Ora, felizmente o catolicismo não pode ser identificado com a Inquisição, nem com a pedofilia de padres e bispos.

Do mesmo modo, o marxismo não se confunde com os marxistas que o utilizaram para disseminar o medo, o terror, e sufocar a liberdade religiosa. Há que voltar a Marx para saber o que é marxismo; assim como há que retornar aos Evangelhos e a Jesus para saber o que é cristianismo, e a Francisco de Assis para saber o que é catolicismo.

Ao longo da história, em nome das mais belas palavras foram cometidos os mais horrendos crimes. Em nome da democracia, os EUA se apoderaram de Porto Rico e da base cubana de Guantánamo. Em nome do progresso, países da Europa Ocidental colonizaram povos africanos e deixaram ali um rastro de miséria. Em nome da liberdade, a rainha Vitória, do Reino Unido, promoveu na China a devastadora Guerra do Ópio. Em nome da paz, a Casa Branca cometeu o mais ousado e genocida ato terrorista de toda a história: as bombas atômicas sobre as populações de Hiroshima e Nagasaki. Em nome da liberdade, os EUA implantaram, em quase toda a América Latina, ditaduras sanguinárias ao longo de três décadas (1960-1980).

O marxismo é um método de análise da realidade. E, mais do que nunca, útil para se compreender a atual crise do capitalismo. O capitalismo, sim, já não é útil, pois promoveu a mais acentuada desigualdade social entre a população do mundo; apoderou-se de riquezas naturais de outros povos; desenvolveu sua face imperialista e monopolista; centrou o equilíbrio do mundo em arsenais nucleares; e disseminou a ideologia neoliberal, que reduz o ser humano a mero consumista submisso aos encantos da mercadoria.

Hoje, o capitalismo é hegemônico no mundo. E de 7 bilhões de pessoas que habitam o planeta, 4 bilhões vivem abaixo da linha da pobreza, e 1,2 bilhão padecem fome crônica. O capitalismo fracassou para 2/3 da humanidade que não têm acesso a uma vida digna. Onde o cristianismo e o marxismo falam em solidariedade, o capitalismo introduziu a competição; onde falam em cooperação, ele introduziu a concorrência; onde falam em respeito à soberania dos povos, ele introduziu a globocolonização.

A religião não é um método de análise da realidade. O marxismo não é uma religião. A luz que a fé projeta sobre a realidade é, queira ou não o Vaticano, sempre mediatizada por uma ideologia. A ideologia neoliberal, que identifica capitalismo e democracia, hoje impera na consciência de muitos cristãos e os impede de perceber que o capitalismo é intrinsecamente perverso. A Igreja Católica, muitas vezes, é conivente com o capitalismo porque este a cobre de privilégios e lhe franqueia uma liberdade que é negada, pela pobreza, a milhões de seres humanos.

Ora, já está provado que o capitalismo não assegura um futuro digno para a humanidade. Bento XVI o admitiu ao afirmar que devemos buscar novos modelos. O marxismo, ao analisar as contradições e insuficiências do capitalismo, nos abre uma porta de esperança a uma sociedade que os católicos, na celebração eucarística, caracterizam como o mundo em que todos haverão de "partilhar os bens da Terra e os frutos do trabalho humano". A isso Marx chamou de socialismo.

O arcebispo católico de Munique, Reinhard Marx lançou, em 2011, um livro intitulado O Capital – um legado a favor da humanidade. A capa contém as mesmas cores e fontes gráficas da primeira edição de O Capital, de Karl Marx, publicada em Hamburgo, em 1867."Marx não está morto e é preciso levá-lo a sério", disse o prelado por ocasião do lançamento da obra. "Há que se confrontar com a obra de Karl Marx, que nos ajuda a entender as teorias da acumulação capitalista e o mercantilismo. Isso não significa deixar-se atrair pelas aberrações e atrocidades cometidas em seu nome no século 20".

O autor do novo O Capital, nomeado cardeal por Bento XVI em novembro de 2010, qualifica de "sociais-éticos" os princípios defendidos em seu livro, critica o capitalismo neoliberal, qualifica a especulação de "selvagem" e "pecado", e advoga que a economia precisa ser redesenhada segundo normas éticas de uma nova ordem econômica e política."As regras do jogo devem ter qualidade ética. Nesse sentido, a doutrina social da Igreja é crítica frente ao capitalismo", afirma o arcebispo.

O livro se inicia com uma carta de Reinhard Marx a Karl Marx, a quem chama de "querido homônimo", falecido em 1883. Roga-lhe reconhecer agora seu equívoco quanto à inexistência de Deus. O que sugere, nas entrelinhas, que o autor do Manifesto Comunista se encontra entre os que, do outro lado da vida, desfrutam da visão beatífica de Deus.

Escritor, autor do romance Um homem chamado Jesus (Rocco), entre outros livros

FONTE: ESTADO DE MINAS

Manobras:: Merval Pereira

Os diálogos envolvendo o chefe de gabinete do governador petista de Brasília, Agnelo Queiroz, com membros do grupo do bicheiro Carlinhos Cachoeira, revelados ontem pelo "Jornal Nacional", devem ter esfriado um pouco o ânimo da direção do PT, que via na CPMI sobre as relações do bicheiro com políticos um instrumento de pressão sobre a oposição num ano eleitoral.

Embora seja um escândalo multipartidário, os petistas consideravam, até o surgimento das denúncias contra Agnelo Queiroz, que a oposição tinha mais a perder. Como sempre fazem nessas ocasiões, tentam minimizar a participação dos seus e demonizar os adversários.

Ao tomar conhecimento de que um assessor com sala no Palácio do Planalto aparece em conversas com assessores do bicheiro, a presidente Dilma teria dado ordens para uma demissão sumária. Bastaram horas para que tudo se transformasse.

O subchefe de Assuntos Federativos da Secretaria de Relações Institucionais do governo federal, Olavo Noleto, passou de réu a vítima de um mal-entendido. Sua conversa com Wladimir Garcez, um dos principais operadores de Cachoeira, antes que o dia terminasse passou de suspeita a meramente política, para tratar de apoios partidários em Goiás. Uma página virada, na definição do ministro Gilberto Carvalho.

Em contraponto, as relações do senador oposicionista Demóstenes Torres com o bicheiro Cachoeira são transformadas pelos petistas em sinais de que as acusações de corrupção contra o governo não têm credibilidade, e, a partir daí, sonham em desmontar o mensalão, tratando-o como fruto de conspiração contra o governo de Lula.

O problema é a falta de conexão entre causa e efeito, nessa nova versão surgida sete anos depois de aberto o processo, tão tortuosa quanto a intenção de seus fabricantes.

Mesmo que a gravação da propina nos Correios, que gerou a irritação do então deputado federal do PTB Roberto Jefferson com o chefe da Casa Civil à época, José Dirceu, tivesse sido feita a mando de Cachoeira para criar problemas para Dirceu, numa vingança do senador Demóstenes Torres, que fora barrado por ele para um cargo no governo, não haveria como Jefferson criar do nada a história do mensalão.

Não existisse o imenso esquema de compra de apoio político revelado pelas investigações da Procuradoria Geral da República, denúncia acatada pelo relator do processo no Supremo, ministro Joaquim Barbosa, a acusação do petebista seria de outra ordem. Aconteceu naquele momento o que ocorre em muitas quadrilhas, um desentendimento em torno da divisão do butim que provoca um rompimento das lealdades, gerando revelações de segredos que só os componentes do bando conhecem.

Esta não passa de mais uma manobra protelatória para tentar jogar o julgamento para as calendas gregas.

Mas há reações tanto internas quanto fora do Supremo. Ontem, dois ministros declararam-se a favor de que o processo entre na pauta ainda este semestre. Gilmar Mendes disse que a votação tem que ocorrer no primeiro semestre, para evitar a possibilidade de prescrição de algumas penas, e sugeriu até mesmo, se necessário, que a pauta seja suspensa para que o processo possa ser apreciado.

Também o futuro presidente do Supremo, ministro Ayres Britto (que assume o posto no dia 19) se disse favorável a que o revisor do processo, ministro Ricardo Lewandowski, apresse seu parecer "sem a perda da segurança". Britto já declarou que porá o tema em pauta 48 horas após o revisor entregar seu voto.

As redes sociais vêm tendo um papel fundamental na mobilização da cidadania em todo o mundo, e no Brasil não tem sido diferente.

Agora mesmo um grupo que se intitula Queremos Ética na Política se mobiliza pelo Facebook para pressionar o Supremo Tribunal Federal (STF) a julgar o caso do mensalão até o primeiro semestre deste ano para evitar qualquer dúvida quanto a uma eventual prescrição de penas.

Há também o propósito de evitar que a aposentadoria de dois ministros do STF no segundo semestre impeça que o julgamento vá adiante.

A escolha de ministros do Supremo tem sido demorada no governo Dilma, e há um consenso sobre a necessidade de um julgamento tão importante como este ocorrer com todos os 11 juízes no plenário.

No dia 25 de abril o ministro Lewandowski receberá representantes do movimento e da Transparência Brasil. Na audiência, uma ampulheta, o símbolo do movimento para evidenciar o tempo que passa, será entregue ao ministro. O objetivo, além de evitar a prescrição de alguns crimes, é chamar a atenção para o fato de que diversos dos réus poderão se candidatar nas eleições municipais.

Com uma eventual condenação, eles cairão na Lei da Ficha Limpa, e suas candidaturas serão impugnadas.

Os dados sobre o desempenho dos ministros do STF, calculados no projeto Meritíssimos no site da Transparência Brasil (http://www.meritissimos.org.br), dão conta, por exemplo, de que o tempo de espera do relator Joaquim Barbosa para processos criminais é de 48 semanas.

Contudo, o próprio diretor da Transparência Brasil, Claudio Weber Abramo, admite que não dá para comparar o processo do mensalão com a média dos processos criminais que chegam ao STF por causa da quantidade de réus e da sucessão de mecanismos protelatórios que os advogados desses réus mobilizaram.

Num momento em que os defensores dos mensaleiros pretendem se aproveitar da crise política desencadeada pelas acusações contra Demóstenes Torres para tentar desmoralizar as denúncias contra a corrupção, é importante essa mobilização da sociedade civil para que a impunidade não continue imperando no país.

Na coluna de ontem fiz uma ilação política e me antecipei a uma decisão futura do procurador-geral eleitoral, Roberto Gurgel. Disse que ele negara o tempo de TV para o PSD, quando, na verdade, ele negou uma primeira reivindicação, a de distribuição do Fundo Partidário. Seu argumento, de que o PSD não participou de eleições e não tem direito à distribuição da verba, deve ser o mesmo para negar o tempo de TV, mas essa é outra etapa.

FONTE: O GLOBO

Muito além do PSD:: Dora Kramer

O parecer do procurador-geral da República, Roberto Gurgel, contrário ao pedido do PSD de acesso ao dinheiro do Fundo Partidário na proporção de sua atual bancada de 52 deputados na Câmara, responde a uma solicitação específica, mas diz respeito a princípios gerais.

A decisão de Gurgel acompanhou outras duas resoluções, interpretadas como "derrotas" do PSD, mas que nada mais fizeram a não ser seguir a legislação em vigor.

No fim de fevereiro, o ministro Carlos Ayres Britto, próximo presidente do Supremo Tribunal Federal, corroborou em caráter liminar decisão do presidente da Câmara, Marco Maia, de negar participação do PSD nas comissões permanentes da Casa porque a lei leva em conta o tamanho das bancadas eleitas e não as formadas por força das circunstâncias.

O prefeito de São Paulo reivindica no Tribunal Superior Eleitoral, além do acesso ao Fundo, tempo de televisão também na proporcionalidade da bancada.

As leis sobre ambos os temas são claras ao estabelecer como critério a quantidade de votos e, portanto, de cadeiras obtidas na última eleição.

Criado no ano passado, o PSD não passou ainda pelo chamado "teste das urnas". Questão resolvida?

Não necessariamente, porque seus advogados alegam, e há no TSE quem concorde com a tese, que se a Justiça permitiu troca de partidos sem perda de mandato em casos, entre outros, de fundação de nova legenda, o PSD estaria amparado legalmente em sua reivindicação.

Ocorre que a exceção é relacionada à perda ou não de mandato do parlamentar, nada dizendo sobre tempo de televisão ou distribuição de verbas para partidos.

Desse modo o que está em jogo na futura (e para breve) decisão da Justiça Eleitoral é muito mais que a circunstância de um partido. É o destino do princípio geral da fidelidade partidária.

Por fluido que seja ainda é um parâmetro, mas pode virar letra morta.

Autoexplicativo. A impossibilidade de o PMDB encontrar alguém disposto a presidir o Conselho de Ética do Senado ou a assumir a corregedoria da Casa para que o atual ocupante pudesse presidir o conselho, fala sobre as idiossincrasias ali existentes.

Desde os telhados de vidro até o receio de escolher senadores de respeitabilidade reconhecida, passando pelo compadrio do qual nos dá notícia o fato de o colegiado estar acéfalo.

Se um ato em tese simples como a escolha da presidência do Conselho de Ética encontra obstáculos, quem dirá uma CPI para investigar o alcance dos tentáculos das organizações Cachoeira de contravenções ilimitadas.

A abertura do processo no conselho chega a ser irrelevante, pois só a comissão de inquérito pode requerer informações protegidas pelo segredo de Justiça.

É o tipo da ação iniciada em clima de êxtase investigatório, mas fadada à agonia como tantas outras em que houve choque e ao mesmo tempo convergência de interesses entre os partidos envolvidos.

Barco a vagar. Perdido por um, perdido por mil, parece ser agora o lema do senador Demóstenes Torres. Morto politicamente, só lhe resta tentar se beneficiar das prerrogativas do mandato para lutar na Justiça.

Partindo desse princípio, explica-se sua recusa à renúncia. Perderia o foro especial e a cadeira de senador que, convenhamos, não é uma posição exatamente má mesmo quando é necessário sentar nela em silêncio.

Muita gente no Senado exerce a atividade na encolha. Para não citar os que o fazem por outras razões, há quem tenha no dito segundo o qual em boca fechada não entra mosca a motivação. Jader Barbalho, por exemplo.

A renúncia para preservar o direito de voltar a se candidatar não se aplica ao senador Demóstenes, construtor da carreira sob o pilar da ética a quem o eleitorado não perdoará, diferentemente do ocorrido com outros parlamentares sobre os quais não pesavam expectativas positivas.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

A realidade impõe celebração contida:: Rosângela Bittar

Regozijo legítimo, até porque pode, pela popularidade, facilitar sua convivência com a heterogênea, intragável e amazônica base aliada no Parlamento, a satisfação com o resultado da pesquisa Ibope que apontou crescimento de aprovação da presidente Dilma Rousseff de 72 para 77%, no espaço de três meses, guardou um certo recato.

O círculo político da presidente gostou, mas conteve um pouco o foguetório, deixando a efusividade para a imprensa. As informações produzidas no mesmo levantamento sobre os atos do governo da popularíssima presidente, recomendaram-lhe cautela.

As avaliações da execução das políticas públicas fundamentais, de ações objetivas e transformadoras, não permitem a Dilma registrar a virada da página de um paralisante primeiro ano de governo para uma marcha ritmada de administração.

Há dados curiosos a se destacar na enquete, que podem ser vistos tanto do lado positivo como do negativo. Por exemplo, o sucesso da presidente nas viagens internacionais. Dos assuntos mais lembrados sobre o governo Dilma, as viagens da presidente à Cuba e à Alemanha estão em segundo lugar, com 7%, perdendo apenas para "programas sociais voltados para mulheres", com 9%. Não se sabe propriamente o que são esses programas, mas podem não passar de lembranças das solenidades comemorativas do dia da mulher, período em que a pesquisa foi a campo.

Não se explica, também, a forte presença das viagens internacionais na memória dos entrevistados. Uma possível razão: no exterior, a presidente tem-se mostrado mais falante e assertiva em seus pronunciamentos e entrevistas, com uma presença mais forte do que a que exibe no isolamento do Palácio.

Persistente também é a contradição dos entrevistados: ao mesmo tempo em que cresce sua admiração por Dilma, desaprova o governo e aumenta suas críticas a áreas específicas que, no ano passado, hibernaram para dar lugar à crise aguda de corrupção.

Voltaram a se manifestar os descontentes com os principais serviços que o Estado lhes presta: educação, segurança e, sobretudo, saúde e impostos.

O percentual dos que consideram o governo Dilma ótimo ou bom manteve-se em 56%, índice que fica a uma distância de 21 pontos percentuais com relação aos 77% que aprovam a presidente. E a nota para as ações da administração tem ficado nessa média desde o início do governo. O congelamento da avaliação foi considerado um dado positivo pelos otimistas. Como também tenta-se, desse conjunto de problemas, extrair uma visão benévola, destacando-se que as avaliações por área de atuação foram melhores agora que na pesquisa anterior de dezembro de 2011.

Ocorre, porém, sem querer jogar realismo excessivo no otimismo alheio, que de nove áreas avaliadas, apenas três tiveram saldo positivo, ou seja, o percentual de aprovação superou o de desaprovação: combate à fome, ação no meio ambiente e combate ao desemprego.

Os especialistas em leitura desse tipo de pesquisa, que não foi feita para partido político ou candidato em eleições, o que lhe dá maior credibilidade, defendem que o saldo é o que importa, e esse é negativo em pelo menos quatro assuntos que, no momento, focalizam o desgosto da população. O melhor saldo, entre os quatro piores, ficou com a educação. O percentual de aprovação da política educacional aumentou cinco pontos percentuais, levando quase ao empate entre os que aprovam e desaprovam o governo (49% aprovam e 47% desaprovam, pequeno porém ainda positivo).

Cresceu também o percentual dos que apoiam a política de saúde, reduzindo a diferença entre os que a aprovam e a desaprovam, mas aqui o fosso ainda é grande e permaneceu negativo em 29 pontos percentuais, com 63% desaprovando o governo. Quanto maior a renda e o grau de instrução do entrevistado, mais aumenta o saldo negativo: Nas capitais a desaprovação à saúde chega a 72%, e nas cidades com mais de 100 mil habitantes é de 70%.

Com relação à política de segurança pública, a pesquisa revela avaliação negativa estabilizada desde o ano passado: 61% desaprovam e 35% aprovam a política. O percentual de desaprovação é maior nas capitais (65%) e nas cidades grandes (66%). Entre os que têm nível superior, a desaprovação sobe a 73%.

Quanto à política de impostos, continua com avaliação ruim da população: apenas 28% aprovam essa política, enquanto 65% a desaprovam. Se for considerado o contingente com nível superior, a desaprovação vai a 81%.

Portanto, faz bem ao governo conter seus eufóricos para não aprofundar a exposição. A reforma ética parou em meados do ano passado e não seguiu adiante, levantamentos recentes mostram que mais da metade dos cargos de confiança dos ministérios cujos ministros saíram permanecem com o mesmo dirigente.

O partido da presidente continua esperando melhor momento para exigir de sua base aliada a aprovação de mais impostos, inspirando-se no desejo do Ministério da Fazenda, inconformado com a derrota sucessiva de propostas de taxações adicionais, seja para o que for, mesmo com a promessa presidencial de redução da carga tributária. De um lado, porque de outro, o Palácio do Planalto comanda os ministérios do Planejamento e da Fazenda a fazer os cortes orçamentários deste ano incidirem até sobre a saúde. A população percebe esse não mais acabar de contradições, só comparáveis às do eleitorado.

Nesse, porém, reina o desgosto generalizado com os serviços de saúde (os SUS, gratuitos, a rede privada, paga, os planos desenquadrados).

O governo, pelo que mostra até aqui, parece decidido, porém, a manter-se no alto e pleitear a reeleição só com a performance na economia que, nas análises internas, ainda tem a admiração da maioria do eleitorado, excetuados os já citados impostos abusivos e também a política de combate à inflação. Essa apresentou saldo negativo de oito pontos percentuais entre os que a aprovam e a desaprovam, na mesma pesquisa. Mas como o dono do voto não se preocupa em superar a incoerência, o alvo do voto se dá o direito de não complicar. A opção pela discrição foi puro realismo.

FONTE: VALOR ECONÔMICO

Ih, São Paulo ainda pode surpreender muita gente! :: José Nêumanne

Nenhuma cidade brasileira é tão grande, nem tão cosmopolita, nem tão complexa para administrar como São Paulo de Piratininga. Seu eleitor se deixa levar pela emoção como qualquer outro, mas mais do que qualquer outro presta atenção no fato biológico de que a mão que vota é a mesma que põe no bolso para guardar ou sacar dinheiro e também a que usa para cumprimentar, persignar-se, pedir ou dar. Vai ver que é por isso que seu comportamento é tão sutilmente peculiar que nem os mais habilidosos políticos conseguem entendê-lo por inteiro. Para tanto nem precisa ter nascido aqui, como Jânio Quadros, de Mato Grosso, seu alcaide no começo e no fim da carreira. Há, contudo, que lhe dar atenção, até mimá-la um pouco. Raros entenderam isso como Jânio, um dos poucos que partiram dela para um voo federal, embora de galinha. O mais frequente dos adversários de Jânio, Adhemar de Barros, por exemplo, ganhou e perdeu eleições para prefeito e governador e nunca governou o País.

Nunca se deixando conduzir, mesmo quando não conduz, conforme determina o dístico de suas armas e barões assinalados, São Paulo comporta-se de forma singular em relação ao restante do Brasil. Também tem certa predileção irônica pela contrariedade. Quando os idiotas da objetividade concluíram em conjunto que seu eleitorado era mais conservador do que a média nacional, talvez pela prosperidade, a maior cidade brasileira deu o triunfo a uma sertaneja pobre, solidária, desvalida e desprovida de encantos físicos, Luíza Erundina de Sousa, contra um paulistano milionário e oportunista, Paulo Maluf, 22 anos antes de Dilma Rousseff chegar à Presidência pelo voto. Repetiu a dose com uma sexóloga da alta sociedade, militante do Partido dos Trabalhadores (PT), Marta Suplicy. Da mesma forma como, quatro anos depois, não lhe permitiu a reeleição, sufragando o adversário, oriundo do bairro proletário da Mooca, José Serra, no mesmo dia em que pesquisa de opinião registrava o apoio da maioria do eleitorado à prefeita como gestora. Vai entender! Quatro anos depois, um militante anônimo praticamente sem currículo se reelegeu para o cargo que ocupou com a vacância do titular (que o deixou para ser governador), derrotando um ex-governador e de novo a ex-prefeita.

São Paulo, a comoção da vida do poeta Mário de Andrade, é uma caixinha de surpresas e nada indica que tudo vai ser diferente na temporada que se está abrindo para escolher o sucessor de Gilberto Kassab (PSD). Do topo de seus 80% de popularidade à saída do segundo governo presidencial, o pernambucano Luiz Inácio Lula da Silva, de seu QG em São Bernardo do Campo, resolveu ungir candidato próprio e estranho à militância petista na capital paulista para nele erigir as bases de um projeto político unívoco, a começar pela conquista da Prefeitura e continuar pela subida das colinas do Morumbi. Recorreu até à comiseração pelo diagnóstico de um câncer na laringe para retirar a renitente Suplicy do caminho e ungir seu ex-ministro da Educação Fernando Haddad.

Durante cinco meses, com Lula preso ao hospital pelos achaques do tumor, o candidato único do PT desfilou pelo Planalto de Piratininga como único herdeiro do Padim Padre Cícero da periferia do Ó, mas até agora não conseguiu ultrapassar humilhantes 3% nas pesquisas de intenção de voto. E isso com o PSDB fazendo de tudo para asfaltar seu caminho para o Viaduto do Chá: três secretários municipais e um deputado estadual se prepararam por um tempo interminável para disputar uma prévia que, no final, foi vencida por José Serra. Vencida? Bah! Os tucanos levaram cinco meses para entender o óbvio: que a intenção do governo federal e de Lula era federalizar a campanha municipal em São Paulo e só engoliram o óbvio depois de verem a boiada de todos indo definitivamente para o brejo sem um candidato apoiado por um prefeito com R$ 7 bilhões em caixa para tornar a cidade um canteiro de obras em ano eleitoral. Aí, apelaram para a velha regra-três. E lá veio Serra ganhar a prévia adiada por 15 dias pela margem de 2,1% de votos a mais que os dados a José Aníbal e a Ricardo Tripoli. Se alguém ainda tiver alguma dúvida quanto ao que significa a expressão "vitória de Pirro", está convidado a perscrutar o ânimo dos vencedores daquela memorável "prova da democracia interna do PSDB". Enquanto o velho mito da cara nova patina nos 3%, o melhor candidato que a oposição ao governo federal tem para encarnar o "comigo não, violão" da orgulhosa São Paulo contra os planos de dominação do PT ostenta esse triunfo esquálido de dar dó.

Ah, mas nós não perdemos por esperar! Este jornal já deu em manchete que Brasília descerá em peso para engordar os índices indigentes do professor Haddad. E ansiamos pela recepção espetacular que a Vila Carrão dará a Gleisi Hofmann, a virada do eleitorado do Jardim Ângela quando souber em quem votará Gilberto Carvalho e, sobretudo, o esmagamento das pretensões tucanas pela imensa popularidade desfrutada por Ideli Salvatti na Vila Brasilândia. Quem duvida que será um deus nos acuda?

Não que Serra não esteja cuidando de ajudar o adversário: não chamou de "papelzinho" o recipiente de sua promessa de que não renunciaria à Prefeitura para disputar o Estado ou a Presidência dois anos depois? A vitória do vice Kassab após a quebra de promessa desidrata um pouco as esperanças de quem pensa que esse deslize do ex-governador lhe pode ser fatal nas pretensões este ano. É um erro de cálculo que se assemelha talvez ao de Lula, que faltou à aula de História em que teria aprendido que seu adversário-mor teve maioria dos votos paulistanos contra ele próprio em 2002, Marta em 2004, Mercadante em 2006 e Dilma em 2010. Como advertiu Garrincha ao técnico Feola em 1958, é bom consultar os russos antes de contar com os próprio dribles. Isso vale também para o tucanato em flor, esquecido das noções de aritmética na prévia.

Jornalista, escritor, é editorialista do Jornal da Tarde

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Novo patamar:: Míriam Leitão

A relação com os Estados Unidos está subdesenvolvida, e essa visita mostrou que o Brasil precisa intensificar e modificar a natureza dessa relação. A presidente Dilma não foi recebida como foram os governantes da Índia e da Coreia do Sul, com jantar de gala na Casa Branca. Os Estados Unidos não entenderam ainda o nosso tamanho e importância, e nós continuamos achando que temos que provar independência.

Quem é realmente independente não precisa provar que é. A política externa independente do Brasil vem de muito tempo, não é preciso procurar cada encontro para reafirmar as diferenças. Vem de longe a decisão brasileira de pensar com sua própria cabeça no cenário internacional e não tentar acertar seu passo com o passo de Joãozinho algum.

Na diplomacia, é preciso ler os sinais. O fato de o governante do Brasil ter sido recebido com menos pompa e circunstância do que os da Índia e Coreia do Sul tem significado. Isso sem falar obviamente do presidente chinês, que foi recebido com fanfarra dado o tamanho do país. Os Estados Unidos continuam sem perceber que o Brasil mais do que uma potência regional caminha para um lugar de ainda mais destaque internacional. É por isso que tem feito eloquente silêncio sobre a ambição brasileira em relação ao Conselho de Segurança da ONU e já demonstrou apoio à pretensão da Índia ao mesmo posto.

Do ponto de vista estritamente comercial o Brasil tem muita munição. Tem o argumento de que triplicou as compras no mercado americano nos últimos oito anos, exatamente quando eles mais precisaram. Aqui fica um mercado importante para produtos de alta tecnologia e alto valor agregado na exploração de áreas relevantes, como o pré-sal. Com tudo isso, é possível brigar contra suspensão sem maiores explicações das nossas vendas de aviões da Embraer.

Há pontos externos em que nossa divergência não precisa ser reenfatizada. É o caso do Irã, por exemplo. O governo brasileiro insiste em defender o direito de o Irã desenvolver seu projeto nuclear, mas passa um recibo de ingenuidade quando dá como certo que é um programa com fins pacíficos. Sobre isso, há controvérsias.

Já a briga pelo fim do embargo a Cuba tem a ver diretamente conosco. Essa é uma antiga posição do Brasil e está correta. O embargo não faz sentido algum, e é provinciano. Se os americanos tivessem mais visão estratégica entenderiam que com mais abertura econômica eles empurrariam a ilha para uma economia de mercado mais rapidamente, o que tornaria mais fácil a caminhada para a democracia.

E justamente quando o governo dos irmãos Castro está dando sinais de senilidade é que é momento de estreitar a relação. Em vez disso, o lobby anticastrista está escalando. O que é uma burrice perigosa. Veja a reportagem de capa do "Valor Econômico" de ontem: uma lei que está aprovada na Flórida vai limitar investimentos locais com empresas que tenham negócios com Cuba. Isso bate direto nos projetos da maior construtora brasileira na Flórida, que é a Odebrecht. Nesse caso, é preciso mais do que nunca insistir na posição brasileira porque o embargo à Cuba afeta diretamente nossos interesses. A política imposta na Guerra Fria já caducou mas continua fazendo vítimas.

A Odebrecht tem um histórico de grandes obras na Flórida, como uma parte do aeroporto, e está entrando em outras concorrências, como a ampliação do Porto de Miami, e está também em Cuba ampliando o Porto de Mariel.

A conversa entre Obama e Dilma foi ampliada para além do horário marcado e isso é um sinal de deferência, mas já houve essa hora extra em outros encontros entre governantes do Brasil e Estados Unidos. Mas o Brasil pode e deve querer mais que isso, sabendo, no entanto, que a atitude reivindicatória não faz mais sentido dada a importância e o tamanho do país.

O Brasil vai crescer e se expandir em diversas áreas em que os Estados Unidos terão interesse em fornecer equipamentos e produtos de alto valor agregado, como, por exemplo, na exploração do pré-sal. Por isso é que o presidente Barack Obama, de olho nos negócios, falou em redução da exigência do conteúdo nacional. O Brasil tem enorme déficit comercial com os EUA, aumentou as compras, tem mercado para novos produtos e empresas americanas. Pode usar esse poder de barganha para fazer propostas concretas que ampliem espaço para nossas empresas e produtos.

É preciso, no entanto, estar pronto para aproveitar as oportunidades. O caso do etanol mostrou despreparo. Brigamos tanto pela derrubada da barreira ao etanol e quando conseguimos o Brasil estava com escassez do produto e passou a importar.

O programa cumprido pela presidente Dilma Rousseff ontem foi da maior relevância: estreitar relações nas áreas de educação, ciência, pesquisa. Apoiar estudantes brasileiros na sua ambição de passar por universidades americanas. Tudo isso que a presidente Dilma deu ênfase será fundamental para o projeto que o Brasil quer.

A abertura das fronteiras aos turistas e viajantes é importante para os dois lados. Apesar de a embaixada americana no Brasil estar apresentando estatísticas de avanços, fatos absurdos continuam acontecendo com brasileiros que vão aos Estados Unidos. Alguns sentiram melhoras, outros vivem ainda situações desrespeitosas.

FONTE: O GLOBO

A competição entre os bancos :: Fernando Rodrigues

A presidente Dilma Rousseff mandou e o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal baixaram os juros ao consumidor. O objetivo do governo é produzir um efeito em cascata também entre os bancos privados, aumentando a competitividade no setor.

Forçar uma queda de juros é uma boa medida, embora possa se discutir a forma. Mas, se for, de fato, para estabelecer a concorrência entre os bancos, uma outra ação adicional relevante terá de ser tomada: a portabilidade de contas-correntes, da mesma forma como já ocorre com números de telefone.

O maior transtorno para quem decidia abandonar uma empresa de telefonia era abdicar de seu número. Era um pesadelo pensar no trabalho de avisar a todos os amigos, pessoas da família e contatos profissionais sobre o novo telefone. Esse problema foi eliminado quando veio a norma da portabilidade.

No caso dos bancos, a competição será muito maior no dia em que os correntistas puderem levar suas contas para uma outra instituição sem ter de fazer novamente todos os cadastros de débitos automáticos para pagar despesas com energia, água, TV a cabo, celular, cartão de crédito, crediário e outros.

Clientes bancários não querem apenas pedir empréstimos e ter juros baixos. Desejam também ser bem atendidos e não ter de pagar tarifas escorchantes pelos serviços.

Como a indústria bancária brasileira se jacta de ter um dos mais sofisticados e modernos sistemas de automação do planeta, é possível encontrar uma saída. Com a portabilidade de contas bancárias, os gerentes indelicados pensarão duas vezes antes de não atender a chamadas de seus clientes. Nesses casos, bastará dizer: "Vou mudar para o concorrente ao lado".

Os bancos, por óbvio, só adotarão a portabilidade à força. Mas o governo nem cogitou essa hipótese no pacote da semana passada.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

A grande cruzada de Dilma:: Rolf Kuntz

A presidente Dilma Rousseff levou à Casa Branca sua cruzada contra a política monetária dos bancos centrais dos Estados Unidos e da Europa Ocidental, como se o presidente Barack Obama pudesse mandar o presidente do Federal Reserve (Fed), Ben Bernanke, parar de emitir dólares. Não pode, mas, se tivesse autoridade para mandar, provavelmente daria mais atenção a seu compatriota Paul Krugman, ganhador do Prêmio Nobel de Economia. Krugman defende uma política monetária frouxa até a recuperação econômica se firmar. É preciso continuar emitindo, segundo ele, mesmo com o risco de uma inflação de 3% ou 4% (a taxa está em torno de 2%). Ele expôs essa opinião num artigo publicado na sexta-feira, três dias antes da peroração da presidente brasileira em Washington. Ela havia apresentado a mesma reclamação à chanceler Angela Merkel, como se a chefe do governo alemão tivesse autoridade para comandar o Banco Central Europeu. Merkel poderia batalhar, se quisesse, por um aumento do gasto público em seu país, mas teria de conseguir apoio num Parlamento avesso à expansão fiscal.

Obama enfrenta problema semelhante num Congresso dominado pela oposição e, além disso, o orçamento americano já embute um déficit previsto de US$ 1,3 trilhão, pouco mais de 8% do Produto Interno Bruto (PIB). Apesar de tudo, a mensagem levada à Alemanha poderia ter algum sentido prático. No caso da visita aos Estados Unidos, a história é diferente e a cobrança foi um ato retórico e um tanto despropositado.

O discurso da presidente mereceria mais atenção se ela cuidasse um pouco mais de seu quintal, tratando mais seriamente do volume e da qualidade do gasto público. Também isso afeta a competitividade.

O ministro de Relações Exteriores, Antônio Patriota, acompanhou o tom da presidente. É preciso, segundo ele, examinar a questão do déficit brasileiro no comércio com os Estados Unidos. A secretária de Estado Hillary Clinton poderia ter respondido com uma pergunta: por que o governo americano deveria discutir esse problema? Afinal, ninguém se mostrou preocupado com o saldo comercial entre 2000 e 2008, quando o Brasil foi superavitário.

O ministro Patriota mencionou também a mudança na composição das exportações brasileiras. Tem aumentado a importância das commodities no valor das vendas ao mercado americano e, segundo ele, é preciso "analisar muito seriamente" esse dado. De fato, a composição mudou, mas os manufaturados ainda representaram, no ano passado, 45,3% do valor das exportações para os Estados Unidos. Haviam correspondido a 51,6% em 2010, 59,8% em 2009 e 58,7% em 2008. Juntando-se os semimanufaturados, obtém-se o total das exportações industriais - 65,6% do valor global em 2011.

O Brasil tem tido problemas comerciais importantes com os Estados Unidos, mas ninguém pode acusar o governo americano de haver criado obstáculos à expansão do comércio bilateral nem de haver imposto, nos últimos anos, barreiras importantes aos manufaturados brasileiros. A indústria brasileira simplesmente perdeu oportunidades nos Estados Unidos - assim como em outros mercados desenvolvidos - porque Brasília deu prioridade a entendimentos comerciais com os parceiros emergentes e em desenvolvimento.

O governo disfarçou os custos dessa escolha usando a retórica da diversificação. Pura embromação, porque o Brasil é há muito tempo descrito como um "global player". A multiplicação dos parceiros ocorreria mesmo sem o palavrório ideológico. Além disso, o governo brasileiro, ao negligenciar Estados Unidos e Europa, desprezou mercados importantes para a indústria nacional. O novo parceiro número um do Brasil, a China, consome vorazmente matérias-primas e compra quase nada de manufaturados.

Como complemento, a política industrial tem sido formada por muito discurso, muita fumaça e pouquíssima substância. O Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) avança muito devagar e seus números são inflados com os financiamentos habitacionais. As obras de infraestrutura estão estagnadas. Mas o ministro da Fazenda insiste - e ontem voltou a esse tema - em apontar o "subsídio cambial" dos países concorrentes como o grande problema do Brasil. Nem ele parece acreditar nisso, porque continua criando uma porção de medidas - quase todas pontuais - na tentativa de animar a indústria e aumentar um pouco seu poder de competição.

O ministro de Relações Exteriores está certo quanto a um ponto: é preciso, sim, examinar os números recentes do comércio com os Estados Unidos. Mas é inútil procurar lá fora as causas dos problemas. Os obstáculos mais importantes são produzidos no País. Nesse campo, a autossuficiência brasileira é incontestável.

Jornalista

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Mudança de estação na finança:: Vinicius Torres Freire

Passada a euforia do início do ano, mercado "realiza lucros" e nota que mundo ainda está emperrado

Faz uma semana que os donos do dinheiro grosso no mundo "realizam lucros", pelo menos nas Bolsas maiores. Ou seja, vendem papéis valorizados na euforia do primeiro trimestre do ano, euforia graciosa embora indiretamente financiada pelo Banco Central Europeu, o BCE.

O que houve de novo? Umas poucas notícias ruins, embora pontuais, sobre o estado da economia americana e sobre os riscos de naufrágio do barco espanhol.

Em março, o número de novos empregos criados nos Estados Unidos decepcionou os rapazes previsores do mercado. Mas o número ruim de apenas um mês não faz um inverno, assim como as estatísticas boas de dois meses não faziam um verão, a não ser na propaganda oficial, de governo ou "otimistas" do mercado.

Mesmo o banco central dos Estados Unidos, o Fed, observa mensalmente que a recuperação do mercado de trabalho é frágil. O número de pessoas empregadas cresce pouco, os salários médios não crescem, o desemprego cai em parte (50%) porque muita gente desistiu de procurar trabalho, aposentou-se etc.

Nas últimas semanas, ficou mais claro o tamanho que terá a recessão espanhola neste ano (talvez de uns 2%), e o desemprego foi a 23%.

Isto é, caiu a ficha de que o governo da Espanha pode não arrecadar o suficiente para atingir suas metas fiscais (superavit) e pode, talvez, entrar na UTI financeira onde vivem Grécia, Portugal e Irlanda. Mas a gente sabe que a situação espanhola é preocupante faz tempo.

Mas os povos do mercado estavam se aproveitando de algumas notícias de fato boas (mas não muito) nos Estados Unidos e do grande despejo de dinheiro do Banco Central Europeu, que desde dezembro emprestou € 1 trilhão para os bancos da eurozona a taxas de juros reais negativas (ou seja, deu dinheiro para os bancos).

O dinheiro do BCE azeitou um pouquinho o enferrujado mercado financeiro europeu, baixou o nível de tensão e, assim, incentivou mais gente a colocar dinheiro para rodar nas praças financeiras do mundo.

Aliás, diga-se de passagem, era e é uma tolice dizer que o "dinheiro do tsunami financeiro" europeu não havia circulado pelo mundo ainda. O presente do BCE para os bancos desencadeou uma reação em cadeia que reabriu pelo menos em parte as comportas da liquidez (dinheirama) mundial.

Porém, o problema de fundo, endividamento excessivo de governos e de famílias, permanece e é saliente em países como a Espanha, "grande demais para quebrar". Decerto a situação não é tão crítica como o era no ano passado. Talvez seja crônica, remediada.

No fim das contas, a elite europeia se desdisse e tomou providências para atenuar a crise. Lembre-se que, a partir do fim de 2009, a União Europeia dizia que não haveria socorro para países falidos (houve), que o BCE não compraria títulos de governos problemáticos (comprou), que não haveria calote de país endividado (houve), para ficar apenas nas maiores contradições.

Mas os problemas de base continuam. Como os EUA vão crescer bem sem emprego e bons salários, sem novo ciclo de investimentos? Com uma bolha nova? Quando vai acabar o ciclo recessivo talvez deflacionário na Europa? Quando acabar, os países "periféricos" serão mais produtivos?

FONTE: FOLHA DE S. PAULO