segunda-feira, 12 de março de 2012

OPINIÃO DO DIA – Mary Zaidan: partilha do governo

"Não é por puro acaso que a preferência por dar o tombo no governo recai sobre dirigentes das agências. Organismos de caráter estritamente técnico, criados para regulamentar e fiscalizar serviços públicos prestados por empresas privadas, nos governos petistas elas foram tomadas de assalto pelo loteamento político. Portanto, são alvos de cobiça desvairada da base. [...] Sem autonomia, as agências viraram apêndices do governo. Funcionam com obediência cega, deixando no escuro o cidadão que ela deveria proteger. Os apagões de energia e aéreos que o digam. Mas nada disso parece apoquentar o governo. Para aplacar a fúria da base, Dilma trama novas nomeações e fala em liberar emendas parlamentares. Faz tudo no varejo. Distribui migalhas para acalmar famintos. Mas nem de longe acena com maturidade política. E, sem partilhar poder, aperta a corda em seu pescoço."

Mary Zaidan, jornalista "Arrogância e lágrimas", Blog do Noblat, 11 de março de 2012.

Manchetes de alguns dos principais jornais do Brasil

O GLOBO
Senadores multiplicam cargos e despesas em mais 150%
Lula tem alta após sete dias de internação
Fifa escolhe o tatu-bola para mascote da Copa

FOLHA DE S. PAULO
Gabinetes pagam empresa ligada a neto de Sarney
Teto de consórcio de imóveis sobe para R$ 700 mil

O ESTADO DE S. PAULO
Só 6 produtos representam 47% do que o Brasil exporta
Ação sobre desaparecidos reabre debate sobre Anistia
Lula deixa hospital

VALOR ECONÔMICO
Queda do juro forçará novo acordo da dívida de Estados
Exportação à Argentina já está em queda
União insiste nos chips de identificação de veículos
Refis não pode vetar disputas na Justiça

CORREIO BRAZILIENSE
Provas para três cargos do Senado são anuladas
Silêncio na comissão que analisa privilégios
Soldado do EUA “surta” e mata 16 civis no Afeganistão

ESTADO DE MINAS
Titulo de patrimônio mundial ameaçado

ZERO HORA (RS)
Novo plano industrial do RS vai apoiar 22 setores
Ajuste na poupança pode ser antecipado

JORNAL DO COMMERCIO (PE)
Exército entra no combate à dengue hoje
Brasil e EUA vão retirar barreiras comerciais

O que pensa a mídia - editoriais dos principais jornais do Brasil

http://www2.pps.org.br/2005/index.asp?opcao=editoriais

Governo? Que governo? :: Marco Antonio Villa

O rei está nu. Na verdade, é a rainha que está nua. Ninguém, em sã consciência, pode dizer que o governo Dilma Rousseff vai bem. A divulgação da taxa de crescimento do País no ano passado - 2,7% - foi uma espécie de pá de cal. O resultado foi péssimo, basta comparar com os países da América Latina. Nem se fala se confrontarmos com a China ou a Índia. Mas a política de comunicação do governo é tão eficaz (além da abulia oposicionista) que a taxa foi recebida com absoluta naturalidade, como se fosse um excelente resultado, algo digno de fazer parte dos manuais de desenvolvimento econômico. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, sempre esforçado, desta vez passou ao largo de tentar dar alguma explicação. Preferiu ignorar o fracasso, mesmo tendo, durante todo o ano de 2011, dito e redito que o Brasil cresceria 4%.

A presidente esgotou a troca de figurinos. Como uma atriz que tem de representar vários papéis, não tem mais o que vestir de novo. Agora optou pelo monólogo. Fala, fala e nada acontece. Padece do vício petista de que a palavra substitui a ação. Imputa sua incompetência aos outros, desde ministros até as empresas contratadas para as obras do governo. Como uma atriz iniciante após um breve curso no Actors Studio, busca vivenciar o sofrimento de um governo inepto, marcado pelo fisiologismo.

Seu Ministério lembra, em alguns bons momentos, uma trupe de comediantes. O sempre presente Celso Amorim - que ignorou as péssimas condições de trabalho dos cientistas na Antártida, numa estação científica sucateada - declarou enfaticamente que a perda de anos de trabalho científico deve ser relativizada. De acordo com o atual titular da Defesa, os cientistas mantêm na memória as pesquisas que foram destruídas no incêndio (o que diria o Barão se ouvisse isso?).

Como numa olimpíada do nonsense, Aloizio Mercadante, do Ministério da Educação (MEC), dias atrás reclamou que o Brasil é muito grande. Será que não sabe - quem foi seu professor de Geografia? - que o nosso país tem alguns milhões de quilômetros quadrados? Como o governo petista tem a mania de criar ministérios, na hora pensei que estava propondo criar um MEC para cada região do País. Será? Ao menos poderia ampliar ainda mais a base no Congresso Nacional.

Mas o triste espetáculo, infelizmente, não parou.

A ministra Maria do Rosário, dos Direitos Humanos, resolveu dissertar sobre política externa. Disse como o Brasil deveria agir no Oriente Médio, comentou a ação da ONU, esquecendo-se de que não é a responsável pela pasta das Relações Exteriores.

O repertório ministerial é muito variado. Até parece que cada ministro deseja ardentemente superar seus colegas. A última (daquela mesma semana, é claro) foi a substituição do ministro da Pesca. A existência do ministério já é uma piada. Todos se devem lembrar do momento da transmissão do cargo, em junho do ano passado, quando a então ministra Ideli Salvatti pediu ao seu sucessor na Pesca, Luiz Sérgio, que "cuidasse muito bem" dos seus "peixinhos", como se fosse uma questão de aquário. Pobre Luiz Sérgio. Mas, como tudo tem seu lado positivo, ele já faz parte da história política do Brasil, o que não é pouco. Conseguiu um feito raro, na verdade, único em mais de 120 anos de República: foi demitido de dois cargos ministeriais, do mesmo governo, e em apenas oito meses. Já Marcelo Crivella, o novo titular, declarou que não entende nada de pesca. Foi sincero. Mas Edison Lobão entende alguma coisa de minas e energia? E Míriam Belchior tem alguma leve ideia do que seja planejamento?

Como numa chanchada da Atlântida, seguem as obras da Copa do Mundo de 2014. Todas estão atrasadas. As referentes à infraestrutura nem sequer foram licitadas. Dá até a impressão de que o evento só vai ser realizado em 2018. A tranquilidade governamental inquieta. É só incompetência? Ou é também uma estratégia para, na última hora, facilitar os sobrepreços, numa espécie de corrupção patriótica? Recordando que em 2014 teremos eleições e as "doações" são sempre bem-vindas...

Não há setor do governo que seja possível dizer, com honestidade, que vai bem. A gestão é marcada pelo improviso, pela falta de planejamento. Inexiste um fio condutor, um projeto econômico. Tudo é feito meio a esmo, como o orçamento nacional, que foi revisto um mês após ter sido posto em vigência. Inacreditável! É muito difícil encontrar um país com um produto interno bruto (PIB) como o do Brasil e que tenha um orçamento de fantasia, que só vale em janeiro.

Como sempre, o privilégio é dado à política - e política no pior sentido do termo. Basta citar a substituição do ministro da Pesca. Foi feita alguma avaliação da administração do ministro que foi defenestrado? Evidente que não. A troca teve motivo comezinho: a necessidade que o candidato do PT tem de ampliar apoio para a eleição paulistana, tendo em vista a alteração do panorama político com a entrada de José Serra (PSDB) na disputa municipal. E, registre-se, não deve ser a única mudança com esse mesmo objetivo. Ou seja, o governo nada mais é do que a correia de transmissão do partido, seguindo a velha cartilha leninista. Pouco importam bons resultados administrativos, uma equipe ministerial entrosada. Bobagem. Tudo está sempre dependente das necessidades políticas do PT.

A anarquia administrativa chegou aos bancos e às empresas estatais. É como se o patrimônio público fosse apenas instrumento para o PT saquear o Estado e se perpetuar no poder. O que vem acontecendo no Banco do Brasil seria, num país sério, caso de comissão parlamentar de inquérito (CPI). Aqui é visto como uma disputa de espaço no governo, considerado natural.

Mas até os partidos da base estão insatisfeitos. No horizonte a crise se avizinha. A economia não está mais sustentando o presidencialismo de transação. Dá sinais de esgotamento. E a rainha foi, desesperada, em busca dos conselhos do rei. Será que o encanto terminou?

*Historiador, é professor da universidade federal de São Carlos (UFSCAR)

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Sem Lula, campanha de Haddad patina

Ausência do ex-presidente por motivos de saúde privou o candidato de seu principal articular dentro e fora do PT

Fernando Gallo

A candidatura de Fernando Haddad (PT) a prefeito de São Paulo, que navegava em águas tranquilas até o início deste mês, sofreu um revés com a saída de cena de seu principal comandante, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e agora padece de problemas externos e também internos, como a ausência de partidos coligados e a disputa dentro do próprio PT pelos cargos de comando na campanha.

O cenário era bem diferente no final de janeiro, quando o prefeito Gilberto Kassab (PSD) sinalizava a Lula sua disposição de integrar a nau petista na eleição municipal. Na costura traçada, traria junto a fragata socialista do governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), diversos setores evangélicos e o apoio de outras siglas que integram a administração paulistana, além da própria força da máquina municipal. Parecia, então, que uma esquadra navegaria em mar tranquilo até outubro.

A movimentação do prefeito, porém, provocou uma reação forte do tucanato. Aliados do governador Geraldo Alckmin passaram a procurar o ex-governador José Serra para convencê-lo a entrar na disputa. O argumento principal: se Kassab fechasse aliança com o PT, os petistas ficariam em condições muito favoráveis de vencer a eleição municipal, e o PSDB corria o risco de ser aniquilado em 2014.

Serra resolveu concorrer, e os ventos que sopravam na popa do barco do pré-candidato Fernando Haddad (PT) passaram a ventar na direção contrária.

Disputa interna. Lula, o principal articulador político do pré-candidato, caiu doente novamente, abatido por uma pneumonia (leia texto abaixo), o que colocou a política de alianças e a organização da coordenação de campanha em banho-maria em um momento em que a Construindo um Novo Brasil (CNB), corrente majoritária no PT em âmbito nacional, pressiona por mais espaço.

O câncer de Lula até agora impede que o ex-presidente repita com Haddad a tática levada a cabo com Dilma em 2010.

Sem cacife político próprio, Haddad aguarda a convalescença de Lula para resolver as pendências e acalmar os ânimos no partido. O presidente nacional do PT, Rui Falcão, é um dos mais bombardeados por aliados, que o veem como "sectário" e o acusam de agir exclusivamente em prol dos interesses petistas, e não da coalizão nacional.

Irritados com a demora de Dilma em resolver suas voltas ao ministério, PR e PDT dificultam a vida de Haddad. O primeiro ameaça lançar candidato a prefeito o deputado Tiririca. O segundo insiste na pré-candidatura do deputado Paulinho da Força, e ainda ventila que estaria mais próximo dos tucanos do que dos petistas caso a candidatura própria não prospere.

Por sua vez, o PC do B, que apoia o PT na capital paulista desde 1988, ameaça fechar aliança com o deputado Gabriel Chalita (PMDB). De resto, o PT ainda aguarda a entrada da senadora Marta Suplicy (PT-SP) na campanha em São Paulo.

O presidente municipal do PT, Antonio Donato, um dos coordenadores da pré-campanha, afirma que, embora a conjuntura seja desfavorável a Haddad, as questões estratégicas estão a favor do PT. "Sempre soubemos da dificuldade da campanha no início, basicamente porque ele é desconhecido. Mas o potencial continua alto. O prestígio do Lula e da presidente Dilma são bastante altos e o desastre da administração Kassab continua. É um momento mais difícil, mas do ponto de vista estratégico estamos confiantes."

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Subordinação ao PMDB abre crise no PT do Rio

Por Paola de Moura

RIO - Depois de dois meses de disputas internas, de uma tentativa de impugnação de chapa, de mudanças na forma de escolha do candidato e de uma intervenção da direção nacional, no início de março, o PT de Niterói elegeu seu pré-candidato a prefeito. O secretário estadual de Assistência Social e Direitos Humanos, Rodrigo Neves, foi o escolhido, batendo o deputado federal Chico D"Angelo.

A disputa em Niterói mostra como o PMDB tem influência sobre os petistas no Rio. O secretário conta com o apoio do governador Sérgio Cabral (PMDB) que tenta impor o candidato a seu partido. Isto porque, o PMDB, liderado pelo presidente regional Jorge Picciani, quer apoiar o atual prefeito Jorge Roberto do Silveira (PDT).

Na capital fluminense, o PT está fechado com o PMDB mais uma vez. O vereador Adilson Pires (PT) será vice na chapa para reeleição do atual prefeito Eduardo Paes (PMDB). Mas nos bastidores o próprio PMDB tenta chapa puro sangue. Isto porque o candidato à sucessão do governador Cabral é o vice-governador Luis Fernando Pezão. Considerado um bom político, porém sem carisma, seus partidários temem que Pezão não consiga deslanchar na campanha, principalmente se um de seus opositores for mesmo o senador Lindbergh Farias, que foi eleito com 4,2 milhões de votos e já foi prefeito de Nova Iguaçu por dois mandatos consecutivos. Político em ascensão e com carisma, Lindbergh poderia tornar mais difícil a vitória de Pezão.

O plano B do PMDB seria catapultar o prefeito Eduardo Paes, considerando que ele seja reeleito este ano, ao governo do Estado. O problema então estaria na Prefeitura da capital, que cairia de bandeja nas mãos do PT, diz um cacique peemedebista local.

"Na prática, o PT e o PMDB do Rio se detestam. Mas, em nome da aliança nacional, seguem juntos", diz o cientista político da PUC do Rio, Ricardo Ismael. Se o acordo for quebrado, a solução do PT seria o deputado federal Alessandro Molon.

Eleito com 129 mil votos, Molon já disputou a Prefeitura em 2008, último ano em que o PT teve candidato próprio a cargo majoritário na capital. Naquela época, o partido levou uma rasteira do PMDB. O PT havia costurado inicialmente um acordo com o aliado. Mas numa manobra interna do partido do governador, na última hora, o então secretário estadual de Esporte e Turismo, Eduardo Paes, deixou o PSDB e saiu vitorioso numa disputa apertada no segundo turno com o então deputado federal Fernando Gabeira (PV).

O dia da votação, no primeiro turno, foi bastante conturbado. O Exército ocupou comunidades para evitar venda de votos. Molon não contou com o apoio do presidente Lula que também era disputado pelo senador Marcelo Crivella (PRB) e pela deputada federal Jandira Feghali (PCdoB). Além disso, a esquerda carioca acabou dividida entre o candidato petista, o deputado federal Chico Alencar (PSOL), Jandira e Gabeira. No fim da apuração, Molon ficou em quinto lugar.

"Eu acredito que o PT precisa trilhar seu caminho e não transformar em um subalterno", explica Molon. "Sou contra esta política que está estabelecida no Rio. Nossa origem é de lutas sindicais, em movimentos sociais. E elas se contradizem na forma como estão se dando as remoções nas favelas pela Prefeitura ou na concessão dos hospitais para as organizações sociais (OS) na saúde estadual. O PT sempre combateu isto", afirma.

Agora com o manifesto dos insatisfeitos, líderes do PMDB no Rio voltam a discutir se a aliança que dá uma vaga de vice na chapa de Eduardo Paes venha a vingar. "No Rio, nós somos maioria. É fato que o PMDB não está satisfeito de ter o PT de vice", afirma um deputado peemedebista influente..

A aliança com o PMDB tem também resultado em perda de espaço na política local. Foi no Rio, que Lula obteve seu maior percentual de votação na primeira eleição, 78,97% em 2002. Mas a união do PT com o PMDB não trouxe o mesmo resultado na eleição da presidente Dilma Rousseff: enquanto Cabral foi eleito no primeiro turno com 68% dos votos válidos, Dilma obteve na primeira votação 43,76% e na segunda, 60,48%, sem atingir o percentual conseguido pelo governador.

Na Assembleia Legislativa, o número de deputados permanece praticamente estável. Na eleição de 2010, aumentou de cinco para seis, do total de 70 parlamentares. Já na Câmara dos Deputados, a queda é mais evidente, em 2002, foram sete deputados petistas eleitos pelo Rio. Em 2006, seis, e, em 2010, cinco.

Outro expoente do partido, o senador Lindbergh Farias, que já anunciou oficialmente sua candidatura a governador em 2014, se aproveita de situações de conflito para reclamar e dizer que o PT fluminense tem que ser mais respeitado. Foi o que fez quando Picciani deu entrevista ao Jornal "O Dia" dizendo que não seria sempre aliado do PT no interior em contrapartida do apoio na capital. Picciani chegou a criticar vários prefeitos do partido. Lindbergh então disse que poderia romper o acordo inicial. Mas, depois, chamado a São Paulo para conversar com o presidente nacional do PT, Rui Falcão, silenciou.

Na avaliação de Ismael, não interessa a Lindbergh que Molon cresça politicamente para não se tornar um adversário dentro de seu próprio partido. Além disso, o apoio do PMDB o ajudou a ultrapassar o ex-prefeito Cesar Maia e o próprio Picciani na eleição de 2010 e ser o senador mais votado do Estado. Procurado insistentemente pelo Valor, por duas semanas, o senador Lindbergh Farias não retornou as ligações.

Além disso, políticos do partido e analistas avaliam que expoentes mais antigos do partido estariam em decadência e já não conseguiriam sozinhos sustentar votação sem ter cargos políticos, por isso mantêm a aliança.

A deputada federal, Benedita da Silva (PT), que já teve 2,2 milhões quando foi eleita senadora em 1990 e, na última eleição, recebeu 71.036 votos, não acredita nesta tese. "O eleitorado mudou e nós passamos muito tempo sem nos candidatar. Eu, por exemplo, não concorro há 17 anos. É natural a votação cair", defende. Benedita diz que a aliança com o PMDB faz parte do plano nacional do partido.

"No Rio estamos trabalhando para fortalecer o partido. Temos hoje oito prefeituras e teremos candidatos na cabeça de várias chapas, como Niterói, São Gonçalo, Angra dos Reis e Caxias. Além das oito prefeituras que temos", avalia. "É um partido que cresce em todo o país. Estamos no terceiro mandato presidencial". A deputada diz que hoje o partido vai além do sindicalismo ou das entidades sociais. "Somos evangélicos, católicos, somos congressistas e empresários. O Estado do Rio só ganhou com a aliança".

Benedita afirma que o acordo com o PMDB não é eterno. "Hoje não existe nenhum compromisso firmado para eleições futuras, agora não estamos tratando disso. É muito natural que nos unamos hoje com o prefeito. Mas as alianças são conjunturais. O plano nacional é mais importante".

Mesmo assim, o PMDB não vê com os mesmos olhos as alianças e não defende esta expansão do PT pelos municípios. Além de Niterói, o partido deve ter candidato próprio na maioria dos principais municípios do Estado, como São Gonçalo, Duque de Caxias, Nova Iguaçu, Itaboraí e Campos.

FONTE: VALOR ECONÔMICO

Soninha Francine reforça Jungmann em ato do PPS

Pré-candidata à Prefeitura de São Paulo faz palestra no Recife para postulantes do partido em vários municípios do Estado

Otávio Batista

O pré-candidato do PPS à Prefeitura do Recife, Raul Jungmann, segue tentando viabilizar sua imagem como alternativa para encabeçar uma chapa no campo das oposições. Ele recebeu na tarde de ontem a ex-vereadora e pré-candidata do partido à Prefeitura de São Paulo, Soninha Francine, para um ato de pré campanha que reuniu postulantes do PPS a várias prefeituras do Estado.

A ex-apresentadora de televisão explicou o projeto “Cidades Sustentáveis”, desenvolvido pelo Instituto Ethos e que ela defende pelo Brasil. Os pós-comunistas pernambucanos assinaram uma carta de compromisso garantindo que, caso eleitos, seguirão as diretrizes e metas desse projeto. Subscreveram outros nove pré-candidatos a prefeito presentes ao evento, além de Jungmann.

Bem humorada, Soninha apresentou temas abordados no projeto como mobilidade urbana, coleta de lixo e políticas de moradia, usando como base o caso da São Paulo, onde foi vereadora de 2004 a 2008. Ela defendeu a época de campanha eleitoral como um momento para se pensar profundamente a cidade. “Muitas vezes acontece exatamente o contrário, os políticos são aconselhados por marqueteiros a simplificar o discurso e isso não é positivo”, criticou.

“Você vê que tem como fazer algo concreto com medidas rápidas e de execução simples que poderia melhorar a situação da nossa cidade”, defendeu Jungmann. O pré-candidato adiantou ainda que na próxima semana convidará o secretário de Transportes de Curitiba, Marcos Isfer, para um evento similar. “Também será uma visita técnica, ele vai trazer sua equipe e analisar a situação do Recife”, antecipou.

Pré-candidata na capital paulista, Soninha Francine fez uma análise do cenário eleitoral nessa fase de pré-campanha. Para ela, este ano a cidade viveria uma eleição extremamente incomum quando, antes da entrada de José Serra (PSDB) na disputa, nenhum “medalhão” se apresentava, o que equilibrava bastante o pleito. “Tínhamos um cenário em que as duas vagas no segundo turno estavam totalmente em aberto. Com Serra acredito que fica apenas uma”, especulou.

FONTE: JORNAL DO COMMERCIO (PE)

Com Kassab, PSDB tenta afastar PC do B de Haddad

Fechar aliança com os comunistas é prioridade do PT, que teme isolamento

Tradicional aliado do PT, PC do B coloca na mesa de negociações em SP apoio a Manuela D"Ávila em Porto Alegre

Daniela Lima

SÃO PAULO - Auxiliado pelo prefeito Gilberto Kassab, o PSDB estuda uma forma de afastar o PC do B do pré-candidato petista à Prefeitura de São Paulo, o ex-ministro da Educação Fernando Haddad.

Fechar a aliança com os comunistas é uma das prioridades do PT, que teme o isolamento da candidatura de Haddad.

Tradicional aliado do PT, o PC do B, no entanto, coloca na mesa de negociações em São Paulo o apoio dos petistas à sua campanha mais importante nessas eleições, a da deputada Manuela D"Ávila em Porto Alegre.

O PT, que tem candidato próprio naquela cidade, não sinaliza intenção de ceder.

É nesse impasse que o PSDB aposta para minar as relações de petistas e comunistas em São Paulo. Os tucanos querem fortalecer a candidatura de Manuela, em Porto Alegre, em troca da não adesão dos comunistas ao PT na capital paulista.

Para afastar o PC do B de Haddad, o PSDB quer fortalecer a criação de uma via de esquerda alternativa ao PT em São Paulo, usando a candidatura do deputado Paulinho da Força, presidente estadual do PDT.

A candidatura do PDT funcionaria como um ímã para partidos que, embora façam parte da base do governo federal, não queiram aderir à candidatura de Haddad, nem arcar com o ônus de auxiliar formalmente o projeto do PSDB em São Paulo.

Fundamental para essa articulação, o PDT, insatisfeito com a relação com o Planalto, se aproximou dos tucanos neste ano. Na última sexta-feira, ganhou uma secretaria no governo Geraldo Alckmin, a de Trabalho e Emprego.

Na ponta gaúcha, o PSD, de Kassab, discute se aliar a Manuela. O PSB já aderiu à candidatura da comunista.

Em 27 de fevereiro, Manuela D"Ávila e José Serra, um dos pré-candidatos do PSDB em São Paulo, se encontraram no aniversário do presidente nacional do PC do B, Renato Rabelo.

Na festa, Serra disse a Manuela, em tom informal, que tucanos e comunistas deveriam estar juntos em Porto Alegre. O PSDB tem pré-candidato na capital gaúcha, Nelson Marchezan Júnior, mas a própria cúpula do partido avalia que o nome não é forte nesta eleição.

Em São Paulo, o PC do B sustenta a pré-candidatura do vereador Netinho de Paula.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

O mercadão das eleições

Para obterem o apoio de partidos menores, PT e PSDB leiloam cargos e perpetuam uma prática que está na origem de quase todos os escândalos de corrupção

Otávio Cabral

De tão disseminada, a prática passou a parecer normal. Vejamos. Na semana passada. o governador de Pernambuco e presidente do PSB, Eduardo Campos, reuniu-se com o prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, do PSD, e com emissários do candidato do PSDB à sua sucessão, José Serra. No centro da mesa de negociações, estava o apoio do PSB - e seu precioso 1min30seg na propaganda de TV - a Serra. Em troca, o partido levaria duas secretarias municipais e a promessa de mais cargos em caso de vitória do tucano. No dia seguinte, Campos foi procurado por Rui Falcão, presidente do PT e negociador da campanha de Fernando Haddad. Falcão soube das promessas feitas pelos tucanos e pediu que Campos adiasse para junho a decisão sobre os rumos de seu partido. Até lá, o PT pretende combinar com o governo federal uma oferta mais tentadora aos socialistas, incluindo um ministério e o apoio a candidatos do PSB em cidades como Campinas e Belo Horizonte.

Nas várias horas de diálogo entre dirigentes de quatro grandes partidos, só não se discutiu o que mais conta para a população: o que cada sigla pretende propor para melhorar a vida dos paulistanos e, assim, merecer o seu voto. A eleição em São Paulo é um exemplo pontual do que ocorre de forma geral no resto do país. As negociações para construção de alianças - naturais e saudáveis quando envolvem partidos com afinidades ideológicas ou programáticas - tomaram-se um mercado a céu aberto. Nele, os partidos, para se aliarem uns aos outros, não discutem ideias nem projetos, mas o número de cargos que ganharão e a quantidade de verba e tempo de TV que levarão. Parece normal, mas não é.

Esse comércio a céu aberto é reflexo de uma das mais antigas e resistentes distorções da vida política brasileira. "A formação dessas alianças pragmáticas sem afinidades ideológicas está na origem de todos os escândalos passados, presentes e futuros da política brasileira", analisa o cientista político Rubens Figueiredo. Para começar, para que os partidos querem cargos? Há apenas duas respostas para essa pergunta: 1) para aumentar a sua força eleitoral e, assim, desenvolver projetos que beneficiem a população e rendam votos; 2) para praticar a corrupção, enchendo os próprios cofres e os dos doadores de campanha. Precisamente como se fez no mensalão. Para construir a aliança que levou Lula à Presidência, o PT, tendo José Dirceu como intermediário, ofereceu a Vice-Presidência ao PL (hoje PR) em troca de "financiamento" com dinheiro ilegal. No poder, o partido usou o mesmo modelo para aliciar congressistas.

Em política, há barganhas e barganhas - as do tipo condenável e as do tipo obrigatório, já que conversar, negociar, ceder e compor é da natureza da atividade. Embora a presidente Dilma Rousseff já tenha dado sinais de que ambas as modalidades a desagradam, foi à primeira que ele mais tentou resistir. Na "faxina promovida no ano passado no primeiro escalão, por exemplo; Dilma, na maior parte das vezes, priorizou o critério técnico em detrimento da conveniência política ao escolher os sucessores dos demitidos.

Nas últimas semanas a presidente cedeu aos velhos métodos. Ofereceu o Ministério da Pesca ao senador Marcelo Crivella, do PRB, a fim de reforçar a campanha de Haddad. Na cerimônia de posse, chegou às lágrimas, evidenciando seu desconforto. Por que é tão difícil para um governante não se vergar a essas práticas? Responde o cientista político Rogério Schmin: "Porque o nosso sistema político é um incentivo aos maus hábitos e à corrupção". A fartura de cargos a ser preenchidos, sem nenhuma exigência técnica, pelos aliados de ocasião, a dinâmica eleitoral que não envolve discussões nem propostas e um sistema partidário caótico, em que duas siglas brigam para controlar duas dezenas de partidos que só querem se beneficiar do fato de ser governo, são algumas das características desse modelo deletério. "Se os políticos brasileiros e noruegueses trocassem de lugar, sem mudar as regras do jogo, em pouco tempo os noruegueses iriam se contaminar com as práticas ilícitas. E os brasileiros, mesmo os mais corruptos, teriam dificuldades em andar fora da lei", explica Schmin.

Qual a saída, então? Mudanças de fundo que minimizem o campo de ação dos políticos corruptos e seus partidos de aluguel:

Redução do número de partidos. Uma lei aprovada em 1995 determinava que só os partidos que obtivessem 5% dos votos poderiam assumir cadeiras no Legislativo e ter acesso ao tempo de TV e ao Fundo Partidário. É a chamada cláusula de barreira. Mas o Supremo Tribunal Federal (STF) considerou a medida ilegal e o Congresso nada fez para retomá-la. Hoje, 23 partidos têm representação no Congresso. Dezoito fazem parte da base de apoio de Dilma, dezenove dão sustentação ao governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, do PSDB; e vinte estão aliados ao prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, do PSD. Analisa o cientista político Octaciano Nogueira, da Universidade de Brasília: "A maior parte dessas siglas não tem ideologia nem projeto de país. Querem apenas as benesses de ser situação. No nosso sistema, não há vida fora do governo".

Aumento da Fiscalização sobre os políticos eleitos. Para isso, a melhor solução é a adoção do voto distrital, no qual cada município e estado seria dividido em distritos de acordo com o tamanho da população e a quantidade de vagas no Legislativo. Dessa forma, em uma eleição municipal, cada bairro elegeria seu vereador, o que, facilitaria a fiscalização do político eleito e dificultaria a perpetuação de corruptos no poder.

Diminuição do apadrinhamento. O governo federal tem hoje cerca de 23000 cargos de livre nomeação. Nos Estados Unidos, há 8000. Na Inglaterra, quando um governo é eleito, pode nomear apenas 300 pessoas. Isso ajuda a explicar por que, naqueles países. a formulação de maioria no Parlamento se dá principalmente por meio da adesão de grupos a ideias - e não da cooptação. Na última eleição, em 2010, o Partido Conservador de David Cameron, venceu, mas não com votos suficientes para ter maioria e formar o gabinete. Assim, teve de se aliar ao Partido Liberal Democrata, de Nick Clegg, depois de concordarem com um programa de propostas de sete páginas, que incluiu a reforma política e a redução do déficit fiscal.

Fim das coligações. Os partidos seriam proibidos de se aliar nas disputas para deputado e vereador. A permissão hoje favorece o mercado de compra de votos, dado que é usada apenas para burlar a regra segundo a qual só podem ser eleitos partidos que atinjam uma votação mínima .

Aproveitamento da base de apoio no Congresso por parte do Executivo. Os governantes se empenham para obter maioria no Congresso, mas, quando a conseguem, não a utilizam para o que mais importa: aprovar as reformas fundamentais para modernizar o país.

Sobram boas ideias para mudar a política no Brasil. O maior obstáculo, porém, é que também não falta quem daria tudo para manter as coisas como elas são.

FONTE: REVISTA VEJA

Florence usará transmissão de cargo para defender sua gestão

Ex-ministro ataca PT gaúcho e culpa Planalto por atraso na reforma agrária

Evandro Éboli

BRASÍLIA. O agora ex-ministro do Desenvolvimento Agrário Afonso Florence vai usar seu discurso na transmissão de posse e entrevistas, esta semana, para defender sua gestão; rebater as críticas ao seu desempenho na pasta, visto como um fiasco; e mandar recados ao governo. Ainda dará estocadas no PT gaúcho por querer controlar a pasta que cuida da reforma agrária. Florence (PT-BA), que voltará à Câmara, ficou irritadíssimo com a demissão. É um pote de mágoa. A solenidade de transmissão de cargo deve ocorrer amanhã ou quarta-feira.

O sentimento de indignação é o mesmo de seu padrinho político, o governador da Bahia, Jaques Wagner (PT). Os dois reuniram-se neste fim de semana em Salvador. A bronca dos baianos chegou ao Planalto e fez com que a presidente Dilma Rousseff soltasse uma nota, sábado, elogiando Florence. Um afago e agrado a Wagner. Foi a segunda nota em menos de 24 horas.

Florence - que foi pego de surpresa, pois achava que, passado o período de fritura na mídia, permaneceria no cargo - atribui sua queda ao PT gaúcho. Especificamente à corrente a qual faz parte: a DS (Democracia Socialista). A interlocutores, o ex-ministro questionou a razão de sempre ser um petista gaúcho dessa corrente a ocupar o MDA. Tem sido assim desde que o PT chegou à Presidência. Miguel Rossetto e Guilherme Cassel, os dois ministros do MDA no período de Lula, também eram petistas do Rio Grande do Sul.

Em conversas reservadas no fim de semana, Florence também rebateu as críticas do Planalto de que a reforma agrária sob seu comando não andou. Lembrou que os primeiros decretos de desapropriação de terra do governo Dilma só foram assinados pela presidente no final de 2011. E atribuiu o atraso no programa ao modelo que Dilma impôs, priorizando a qualidade nos assentamentos, em vez da quantidade.

Nesse modelo, o governo não aceita adquirir qualquer terra - muito distante de centros urbanos, por exemplo - para destinar ao programa. Florence contou a seus próximos que enviava as propostas de decreto de desapropriação ao Planalto, mas os documentos sempre voltavam. Não era o que Dilma queria. O ritmo lento foi uma escolha da presidente, enfatizou.

Embora o ex-ministro baiano atribua a sua queda às pressões do PT gaúcho, a troca de comando no MDA e a escolha do também deputado federal Pepe Vargas (PT-RS) para comandar a pasta tem outro componente político: beneficiar o PMDB. Para assumir o MDA, Pepe Vargas abriu mão de sua candidatura a prefeito de Caxias do Sul (RS), mesmo aparecendo como favorito nas pesquisas. Ele já administrou a cidade - uma das mais importantes do estado - por dois mandatos, entre 1997 e 2004. E agora vai abrir espaço para o candidato do PMDB, provavelmente o ex-governador Germano Rigotto.

FONTE: O GLOBO

Governo interrompe votações até que 'paz' retorne à base aliada

Valdo Cruz, Gabriela Guerreiro

BRASÍLIA - Na tentativa de evitar novas derrotas no Congresso, a presidente Dilma Rousseff decidiu suspender as votações polêmicas para o governo até pacificar a sua relação com os partidos aliados.

A presidente quer retomar o diálogo com sua base de apoio e atender às principais demandas, especialmente do PMDB, antes de incluir projetos de interesse direto do governo na pauta.

A ordem no Planalto é, por exemplo, não colocar o Código Florestal em votação na Câmara enquanto persistir a crise. Dilma não tem pressa na votação do código e determinou aos líderes governistas que mantenham a votação em suspenso até um acordo seguro com a base aliada.

A crise ganhou força na semana passada, depois que o Senado rejeitou a indicação de Bernardo Figueiredo para a diretoria-geral da ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres).

A presidente quer transformar sua ida ao Senado na terça, sessão em homenagem ao Dia Internacional da Mulher, quando recebe o prêmio Bertha Lutz, num gesto político.

Sem o hábito de participar de cerimônias no Legislativo, a visita ocorre no momento em que o governo tenta ampliar o diálogo com os seus principais aliados.

Em conversas com interlocutores, Dilma avaliou que o momento não é de crise, mas de "turbulência" política. O governo teria entendido o recado do Senado, não pretende retaliar sua base de apoio, mas espera não ser derrotado em matérias que considera essenciais para o país.

Apesar de estar decidida a liberar emendas para apaziguar a base, Dilma determinou que o destino dos recursos seja orientado pelo governo.

Rebelião

A exemplo de Dilma, o vice-presidente Michel Temer negou anteontem que haja uma rebelião na base ao defender a acomodação entre o PT e o PMDB. "A relação vai bem. Não há coisa grave. Há queixas naturais, uma ou outra, que vão sendo acomodadas. Eu patrocino muito essa acomodação", disse o peemedebista à Folha em Cambridge, Estados Unidos.

No primeiro gesto para reconstruir pontes com os aliados, Dilma telefonou para um grupo de senadores -entre eles José Sarney (PMDB-AP), Eduardo Braga (PMDB-AM) e Gim Argello (PTB-DF).

Preocupada com a votação do projeto que cria o fundo de previdência dos servidores, o Funpresp, no Senado, a presidente determinou à coordenação política que amplie o diálogo com a base.

O Planalto quer atenção especial com a bancada do PMDB no Senado, rachada desde o ano passado.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Armadilha aliada

O PMDB impõe derrota ao governo no Congresso para pressionar e constranger a presidente da República

Daniel Pereira

O Senado rejeitou na semana passada, por 36 votos a 31, a recondução de Bernardo Figueiredo ao cargo de diretor-geral da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT). Tramada nos bastidores por partidos aliados, com o bom e velho PMDB à frente da tropa, a decisão pegou de surpresa o governo e representou uma derrota pessoal da presidente Dilma Rousseff. Ao contrário de vários indicados para órgãos reguladores, que são lastreados por acordos políticos, Figueiredo era uma escolha direta de Dilma, que o considera um quadro de confiança desde a gestão do ex-presidente Lula. Era ele quem comandava os esforços oficiais para tirar do papel o trem-bala, um projeto bilionário que é visto com ressalvas dentro do próprio governo, mas que a presidente insiste em executar. Na última quarta-feira, logo depois da votação, Dilma disse a ministros que se sentiu traída pelos senadores governistas. Uma traição com requintes de crueldade. Em vez de dar vazão às reações coléricas que lhe são peculiares, ela recomendou aos auxiliares que agissem para reorganizar a base governista no Senado. Uma tarefa a ser executada sem revanchismos - descontadas algumas exceções.

O veto a Figueiredo foi resultado de uma combinação de fatores. Um grupo de senadores alegou que uma auditoria realizada pelo Tribunal de Contas da União (TCU), a pedido do Ministério Público Federal, apontara uma série de irregularidades na ANTT, o que impediria a recondução do diretor. Essa preocupação republicana só comoveu uma minoria. A maioria votou contra o governo para deixar claro que está insatisfeita com o ritmo de liberação de emendas parlamentares, a demora na nomeação de apadrinhados para cargos públicos e a perspectiva de uso da máquina federal para beneficiar o PT nas eleições municipais. O PCdoB, por exemplo, votou contra porque não consegue emplacar um diretor na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). O PR, porque quer de volta o Ministério dos Transportes. Nenhuma das duas legendas, segundo Dilma, atingirá tais objetivos - ainda mais depois da "traição". "Os senadores estavam indignados com o governo. É aquela história; trair e coçar é só começar", conta o senador Gim Argello, líder do PTB. Mas quem comandou mesmo a operação foi o PMDB.

Há pelo menos duas semanas, integrantes do partido arquitetavam para derrotar a indicação de Bernardo Figueiredo. Na quarta-feira, ao perceberem um quórum considerado baixo para uma votação que se anunciava acirrada, puseram o plano em marcha. "Não acredito que o Romero Jucá não tenha percebido um movimento de quase todo o PMDB contra o governo". critica o senador petista Lindbergh Farias (RJ). Líder do governo no Senado e cacique peemedebista, Jucá entrou na lista negra da presidente, mas não deve perder o posto, ao menos por enquanto. Dilma também ficou contrariada ao saber que o presidente do Senado, José Sarney, disse a pelo menos um senador que dificilmente ocorreria a votação naquele dia, dispensando-o do plenário. Mas o alvo principal da ira é o líder do PMDB no Senado, Renan Calheiros (AL). A presidente suspeita que Renan, valendo-se da votação secreta, não só aderiu à maioria como ajudou a formá-la no plenário. Dilma também acredita que, mesmo se quisesse ajudar, Renan não conseguiria, pois não tem mais controle sobre a bancada peemedebista. Ele perdeu o comando sobre os liderados, conforme relatos dados à presidente, e só trabalha por seus interesses pessoais. Uma das obsessões do parlamentar alagoano é manter o ex-senador Sérgio Machado à frente da Transpetro, subsidiária da Petrobras.

Dilma foi informada da derrota durante uma reunião em que discutia com ministros o atendimento de pedidos de verbas feitos pelos senadores peemedebistas. Surpresa. reagiu com interjeições de espanto. Na quinta-feira de manhã, chamou o vice, Michel Temer, presidente licenciado do PMDB, para uma conversa no Palácio do Planalto. Prometeu trabalhar para melhorar a relação do governo com a base aliada. Comprometeu-se a tratar com mais carinho os pedidos de liberação de emendas e a dar mais autonomia aos ministros que não são do PT. A presidente estendeu a mão, mas também fez uma cobrança a Temer. Ela deixou claro que Renan não representa mais os senadores do PMDB nas conversas com o Palácio do Planalto e que o partido tem de encontrar um novo interlocutor, pois o governo só aceitará negociar com a bancada, não mais com caciques em separado. Resta saber se o vice conseguirá essa proeza. Na ressaca da votação, Dilma terá de escolher um novo comandante para a ANTT. Já Renan vê ainda mais distante o sonho de voltar à presidência do Senado em 2013. "Não há uma matriz única de insatisfação dos senadores", defende-se o senador, garantindo que também ficou surpreso com o resultado da votação.

FONTE: REVISTA VEJA

Elis Regina - Samba do perdão (1968) - (Baden Powell e Paulo César Pinheiro)

Tomara que o problema seja só de pouca prática :: Marco Antonio Rocha

A irritabilidade não é boa conselheira de ninguém. Os artistas, os cantores, os jogadores de futebol e atletas profissionais em geral, os escritores e os jornalistas famosos - todos têm acessos de irritabilidade. Mas por motivo de marketing - é bom para a divulgação.

Políticos, em geral, e governantes, em particular, é bom que se poupem dessa síndrome. Além de não lhes servir para nada, ainda cria problemas desnecessários ou, no mínimo, uma imagem negativa do governante diante do público, pois quem se irrita com um problema que enfrenta é porque não consegue resolvê-lo. E, se um alto dirigente não consegue resolver os problemas que enfrenta, a ponto de se irritar, não deveria ser um alto dirigente. É um fato bem sabido nas empresas mais bem dirigidas.

Diz o noticiário que a presidente Dilma se irrita com frequência. Pode não ser verdade, ou não ser exatamente verdade, pois um simples muxoxo de aborrecimento às vezes é confundido com irritação. De qualquer forma, não é invenção da imprensa. A informação de que a presidente "está irritada...", ou "furiosa", ou "se irritou" é fornecida aos jornalistas por pessoas que trabalham com ela, têm acesso a ela ou convivência próxima.

O fato é que, ultimamente, temos lido que a presidente está irritada com o manifesto do PMDB; que está irritada com o manifesto dos militares; que ficou irritada com as manobras descoordenadas do próprio PT; que se irritou - mais recentemente - com a rebelião das "bases" do governo, no caso da renovação do mandato do presidente da Agência Nacional de Transportes Terrestres. Sem falar da sua visível irritação, na visita que fez à Alemanha, perante a anfitriã, a chanceler Angela Merkel, com o que chama de "tsunami" de liquidez mundial provocado pelos países ricos, que produz, ou ameaça produzir, uma supervalorização das moedas dos países emergentes, com consequências funestas para suas contas de comércio externo e para o controle dos índices de inflação internos.

É muita irritação para uma só presidente.

Digamos, caros leitores, em benefício da presidente, que um país do tamanho do Brasil, com os problemas do tamanho dos que o Brasil apresenta, pode ser fonte de alimentação permanente da irritabilidade e da neurastenia de qualquer cristão, mesmo de quem tenha passado anos sendo treinado contra isso no alto de um mosteiro do Tibet.

Mas a questão que se apresenta é que as situações que irritam a presidente parecem estar se acumulando de maneira um tanto quanto preocupante já no início, apenas, do seu segundo ano de mandato. E como, à medida que o mandato for levado adiante e se aproxime do seu fim, as pedras no caminho e os quebra-cabeças tenderão a crescer, gerando mais situações de irritação, cabe perguntar se ela realmente terá tutano suficiente e um mínimo de serenidade para essa escalada.

Além disso, cabe perguntar se a personalidade da presidente, seu temperamento, seu modo de agir e as circunstâncias que a levaram ao pódio político brasileiro não estariam contribuindo também para criar situações de irritação, tanto quanto a problemática objetiva do país que ela governa.

Por exemplo: ela foi guindada ao mais alto cargo político da Nação sem ter tido vida política normal, ou seja, sem ter passado sequer pelo jardim da infância da política, que é ganhar liderança num partido qualquer para, depois, ganhar um primeiro mandato eleitoral, ao qual se sucedam outros mais elevados e durante os quais se vai formando a têmpera necessária para negociações torturantes com companheiros e adversários. É verdade que teve uma iniciação política de esquerda, numa organização clandestina. Mas ali o preparo, se havia, era para destruir o regime democrático de partidos políticos, e não para aprender a militar nele.

Outra circunstância recebida foi essa "base" governista, que não foi criada por ela. Os membros dessa base estão mais atentos aos sinais emanados de quem a criou do que à obediência à chefe do governo. E cada qual trata de expandir o seu espaço dentro da base, à custa do espaço do vizinho - como nessa trombada do PMDB com o PT. Que não deveria estar acontecendo, se a chefe da Casa Civil cuidasse de fato da articulação política, que é a sua função, e não só enfeitar as fotos das solenidades oficiais.

Isso nos leva ao time da presidente, decididamente fraco. Um ministro da Defesa que não apazigua os militares nem é ouvido por eles. Um ministro da Pesca que não entende de minhocas. Um, novo, da Educação, que diz que o problema é que o Brasil é grande demais - como se o Brasil tivesse aumentado depois que ele chegou ao Ministério. Um ministro da Fazenda que mais parece o Mestre Pangloss proclamando que tudo vai pelo melhor no melhor dos mundos possíveis.

Todos em volta da barra da saia presidencial, como aios, em vez de estarem conduzindo de fato os programas de suas respectivas áreas. Dá saudade do modelo dos Grupos Executivos, do tempo de JK, que faziam o Brasil funcionar.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Quem fica parado é poste:: Melchiades Filho

Uma série de contratempos ameaça o plano de reeditar com Fernando Haddad o sucesso de Dilma Rousseff, que surgiu do nada e ganhou uma eleição dura.

O ex-ministro da Educação tem atributos semelhantes aos da novata de 2010: experiência no serviço público, reputação de gestor e o fato de não ter passado pelo teste das urnas -algo que, se o faz desconhecido do eleitor e até do militante, dá à candidatura um lustro de novidade. A fina estampa fecha o pacote dos sonhos da marquetagem.

A campanha em São Paulo, porém, não largou bem. Por ora, o tratamento do câncer impede que Lula comande as operações.

A construção de Dilma, vale lembrar, começou com quatro anos de dianteira. Foi em 2007 que Lula apresentou a "mãe do PAC".

Sem o ex-presidente do lado, Haddad tem dificuldade em aparecer. Daí seus números esquálidos nas pesquisas. No Datafolha, são 3% de intenção de voto. Em fevereiro de 2010, Dilma já cravava 28%.

A ausência de Lula ajuda a explicar também o bate-cabeças dentro do PT, que se engalfinha por nacos de poder na campanha, e a dificuldade em reproduzir a coalizão federal em São Paulo. O PMDB, que em 2009 já engatava com Dilma, agora insiste no voo solo. Até aqui, Haddad não amarrou nem o PC do B.

Ao candidato conviria uma aliança ampla, pois o antipetismo na cidade é maior que no Brasil. O PT paulista foi o QG dos grandes escândalos da era Lula. Sua passagem pela prefeitura deixou pouca saudade -a boa avaliação de Marta Suplicy na reta final do mandato acabou corroída pela propaganda adversária.

Dilma, que goza de alta popularidade em São Paulo, poderia ajudar. Mas correrá ela o risco de derrota em um tira-teima contra José Serra?

A sorte petista numa eleição tão "nacionalizada" parece depender de outro fator: os eventuais erros do tucano, numerosos em 2010.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Crescimento? :: Aécio Neves

O anúncio dos indicadores de desempenho da economia brasileira em 2011 inclui recados e lições importantes.

O recado, no campo das relações entre o governo e a sociedade, é o de que não é mais possível vender fantasias. Depois de passar boa parte de 2011 prevendo um crescimento acima de 5%, mesmo sabendo que essa era uma meta inatingível em função de distorções na condução da política econômica e da crise mundial, as autoridades se vêm forçadas a encarar a realidade: um crescimento pífio, perto de um terço do registrado em 2010, 50% menor que as previsões oficiais para o ano passado e aquém dos países emergentes.

Constata-se que, além da crise mundial que tem impacto no Brasil, os equívocos da política econômica funcionaram como freios ao setor produtivo, pondo em risco um dos mais relevantes patrimônios da sociedade brasileira: a indústria nacional, que perde competitividade global de forma contínua e crescente. Ao evoluir apenas 1,6% em 2011, o setor puxou para baixo o crescimento da economia como um todo.

O mais grave é que a indústria de transformação, que tem maior intensidade tecnológica, portanto maior valor agregado e estratégico, cresceu menos ainda -ínfimos 0,1%. Ou seja, nada. Abrir mão de avanços na indústria de transformação equivale a abdicar de inovar e desenvolver tecnologia, configurando um ciclo perverso que nos torna reféns de países que fazem exatamente o contrário.

Por fim, as lições. É preciso esquecer o retrovisor e olhar para o futuro, que, no curto prazo, nos cobra ações que neutralizem os efeitos nocivos da sobrevalorização do real e, no médio e longo prazos, nos exige as reformas estruturais (tributária, previdenciária e de relações trabalhista), cuja postergação mina a competitividade da economia brasileira e, sobretudo, turbina o processo de desindustrialização.

A indústria de transformação, que por longas décadas manteve participação superior a 30% na formação do PIB, hoje oscila ao redor de 15% e com tendência de continuar caindo diante da inação oficial.

É ainda mais grave constatar que 2012 começa como terminou 2011: um dia após o anúncio do "pibinho", confirmou-se a queda de 2,1% na produção industrial em janeiro, comparada a dezembro. A CNI aponta queda de 1,4% no faturamento no período.

Esse cenário afeta a todos e, em especial, setores mais expostos à concorrência externa, bem como economias

regionais voltadas ao comércio internacional. Igualmente preocupante é ver, na contramão do sentido de urgência que a crise exige, que o governo toma medidas anacrônicas e ufanistas, que conduzem à perpetuação das ineficiências, ao encarecimento do custo de vida e ao afastamento dos investimentos.

Aécio Neves, senador (PSDB-MG)

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Da ética e da política:: Renato Janine Ribeiro

No ano que vem, "O Príncipe", de Maquiavel, completará meio milênio de sua primeira difusão em manuscrito. Nesses cinco séculos, a questão mais importante sobre a ética tem sido: como acontece que ela não seja suficiente? Quais são seus limites? O que fazer quando a ética não nos orienta sobre a ação que podemos julgar correta? Maquiavel e os utilitaristas provavelmente são quem mais elaborou essa questão, mas no século XX ela recebeu tratamento sofisticado, entre outros por pensadores do quilate do sociólogo Max Weber ou dos filósofos Merleau-Ponty e Isaiah Berlin. Nosso ex-presidente Fernando Henrique Cardoso citava Weber em profusão, quando discutia as fronteiras entre sua atuação como cientista social e como político. Num caso se procura conhecer; no outro, agir. Weber também servia a FHC para explicar por que este não fez tudo o que prometeu ou quis. O presidente sociólogo assim popularizou, entre nós, termos como ética de princípios e ética da responsabilidade.

Tendemos todos a concordar quanto a alguns preceitos éticos fundamentais: não matar, não furtar, em suma, não prejudicar o outro. Mas podemos divergir sobre o que eles significam. Por exemplo, "não matar" é apenas não tirar a vida de outra pessoa? Ou podemos matar outras pessoas por omissão, se não acudirmos alguém ameaçado por um agressor ou não socorrermos um faminto? Num caso, para eu ser ético, basta não fazer mal algum. Não preciso fazer o bem. É suficiente não fazer o mal. Não fiz nada de errado. Mas desta maneira terei feito o que é certo? Talvez não. Porque a ética é exigente. Nunca serei ético comodamente. A ética me incomodará. A ética exigirá que eu lute contra a fome. E quando começo a pensar desse modo, não paro mais. Para ser ético, precisarei dar comida a quem está esfomeado? E bastará isso, se eu não batalhar pela adoção de políticas contra a fome? E essas, serão eficazes ou contraproducentes? Esse é um ponto essencial da discussão ética. Ela é interminável. Não visa a nos confortar. Está aí para nos questionar. Se não o fizer, será falsa. Uma ética confortável é apenas um álibi.

Mas a discussão importante sobre a ética não é apenas sobre o que ela diz ou orienta, e sim sobre o que ela não pode dizer nem orientar. Há pelo menos cinco séculos que os observadores mais atilados da condição humana sabem que muito se faz à margem, ou mesmo contra, a ética. Maquiavel, tão mal entendido, percebeu que a ação política obedece a uma lógica diferente da moral, digamos, privada ou cristã. O pensador liberal Isaiah Berlin diz: Maquiavel não é anti-ético. Ao contrário, ele é um filósofo da ética: uma ética da cidade, da política, uma ética da vida neste mundo. Berlin a considera uma ética pagã, greco-romana. E por isso, em seu prefácio à edição brasileira d"O Príncipe, FHC apresenta Maquiavel como um cientista político de excelente qualidade, não como quem acharia que os fins justificariam os meios (o que, por sinal, ele nunca disse). Dizer as coisas como são, não como fantasiamos ou desejamos que seriam: isso é lucidez.

O que a ética não pode dizer é, exatamente, o que é mais difícil na vida social e política. Os dez mandamentos cristãos, ou outros princípios éticos, podem orientar em boa medida a vida privada de muita gente. Mas, quando passamos à vida coletiva e em especial quando o demônio do poder entra em cena, eles não dão conta. Os utilitaristas, como Jeremy Bentham, trataram disso com franqueza brutal. Exemplo célebre: seria justo matar uma pessoa para salvar cinco? Na falta de critérios absolutos, revelados por uma suposta divindade, cada vida vale o mesmo que outra. Cinco vidas valem mais que uma. Então, se para o Brasil prosperar é preciso avançar o sinal ético na privatização ou na obtenção de maioria no Congresso (por hipótese), o preço é nojento, mas pequeno. O bem comum assim causado supera de longe os danos.

Quais os problemas, nessa questão? São dois. Nunca se tem certeza de que o que chamamos de bem comum é, realmente, bom. Não há consenso a respeito. Uns aplaudem a privatização, outros não; o mesmo quanto aos sucessos do governo Lula. Os males causados podem ser tangíveis, reais. Mas há divergência sobre o bem comum que terão produzido. Este é o primeiro problema. Na política, não há certezas. Causamos males, indubitáveis, em troca de um bem maior, mas inseguro. Pagamos o preço, mas ganhamos algo em troca? Não sabemos.

O segundo problema é mais grave. É que na política se age como descrevi, mas isso não se discute. Um silêncio terrível paira sobre a generalização da corrupção - no mundo todo. Qualquer observador atento sabe que, na era do marketing, mais e mais dinheiro é preciso para as campanhas eleitorais. Papel vem de árvores; dinheiro, não. Vem de cofres públicos. É difícil um partido fazer sua campanha sem tais meios heterodoxos. Essa corrupção deve ser generalizada, porque todos os partidos necessitam de fartos recursos para suas campanhas. Mas é fácil usar esse fato seletivamente. Acuso o partido de que não gosto. É muito provável que o meu tenha agido da mesma forma, mas sobre isso me calo. Daí que a ética vire arma vil num debate que esconde sua real natureza política. Mas essa realidade sempre existiu; e a questão foi formulada há cinco séculos, por Maquiavel. O que fazer quando a ética usual, a do não-matarás, não basta para nos orientar? Seria melhor discutir isso, expor isso, quem sabe respondê-lo, do que manipular a ética e enganar os ingênuos. Em 2013, "O Príncipe" completa 500 anos. Quem sabe ser honesto e abrir o jogo seria um bom modo de celebrar a data?

Renato Janine Ribeiro é professor titular de ética e filosofia política na Universidade de São Paulo.

FONTE: VALOR ECONÔMICO

Ação sobre desaparecidos reabre debate sobre Anistia

A iniciativa do Ministério Público Federal de preparar ações sobre desaparecimento de presos políticos na ditadura, conforme revelou ontem o Estado, deve engrossar o debate sobre a Lei da Anistia. No meio jurídico, alguns especialistas consideram que há brechas na lei, mas outros lembram que o Supremo terá de rever decisões para haver punição

Investigação de procuradores reabre debate sobre revisão da Lei da Anistia

Iniciativa do MP de apurar crimes cometidos por militares na ditadura, revelada pelo "Estado", motiva grupos ligados aos direitos humanos a pressionar STF, mas ministros da corte e OAB avaliam que alteração é pouco

Roldão Arruda, Denise Madueño e Ricardo Brito

As iniciativas de procuradores do Ministério Público Federal (MPF), que estão prestes a ajuizar ações contra agentes do Estado acusados de envolvimento com crimes permanentes ocorridos durante a ditadura, conforme informou ontem o Estado, estão provocando novos debates em torno da Lei da Anistia, de 1979.

Enquanto setores do MPF, militantes de direitos humanos e políticos de esquerda defendem a existência de brechas na lei que poderiam levar à condenação de civis e militares, do outro lado porta-vozes dos militares e especialistas em questões jurídicas consideram o debate encerrado desde 2010 – ano em que o Supremo Tribunal Federal (STF) definiu que a lei beneficiou tanto perseguidos quanto perseguidores no regime militar.

O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Ophir Cavalcante, disse ontem que vê com "simpatia" a ação dos procuradores da República que desejam processar os agentes públicos envolvidos em casos de sequestro e ocultação de cadáver, considerados crimes permanentes. Mas ele considera pouco provável, porém, que a tese prospere por causa da decisão do Supremo.

"Se o Supremo não rever sua decisão, me parece que a tese não vai vingar", afirmou o presidente da OAB.

Sob coordenação do Grupo de Trabalho Justiça de Transição, da 2.ª Câmara Criminal do MPF, em diversas partes do País procuradores investigam casos de sequestro e ocultação de cadáver ocorridos na ditadura. Trabalham com a premissa de que tais crimes, considerados permanentes, não foram abrangidos pela Lei, que cobre de 1961 a 1979.

Para o coordenador do grupo, Ivan Claudio Marx, legalmente esses crimes continuam sendo perpetrados enquanto não se esclarece o que aconteceu.

Militares da ativa e da reserva ouvidos pelo Estado a respeito das ações do MPF consideraram o debate estéril. Para eles, o acordo de perdão foi aprovado pelo Congresso em 1979 e confirmado pelo STF há quase dois anos.

Área cível. Outra linha de trabalho percorrida pelo MPF é a investigação de crimes na área cível. Na avaliação de alguns juristas, as possibilidades nesse campo são maiores que na área criminal. Um deles é o professor de direito constitucional Pedro Estavam Serrano, da PUC-SP. "A Lei da Anistia tratou só de questões criminais", observou.

Na avaliação dele, os procuradores podem mover ações contra policiais e militares cujos procedimentos resultaram na condenação do Estado, em casos de morte e tortura. "A Constituição é clara quando diz que, em caso de dolo ou culpa, o servidor tem que indenizar o Estado. Ora, se a Comissão da Verdade apontar um agente de Estado como responsável pela tortura de um cidadão, com a consequente indenização paga pelo erário público, é obrigação do Ministério Público mover ações para recuperar aquilo que foi pago. Isso ocorre normalmente quando um funcionário é responsável por um acidente com danos ao patrimônio público." Esse tipo de crime, lembra o professor, é imprescritível. "Basta ler a Constituição e começar a mover as ações", diz ele.

No STF, os ministros Gilmar Mendes e Luiz Fux também vem sustentando a ideia de que o assunto está encerrado. O deputado Miro Teixeira (PDT-RJ), que participou do debate da Lei da Anistia, quando exercia mandato pelo MDB, tem outra avaliação. "Os casos de desaparecidos políticos não estão prescritos", disse ontem. Ele disse que, no debate de 2010, o ministro Ricardo Lewandowski citou vários delitos que não estariam incluídos, entre eles os de sequestro e ocultação de cadáver.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

'É uma página virada', sustentaram ministros

Felipe Recondo

BRASÍLIA - Dois ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) sustentaram, em entrevistas recentes ao Estado, que a definição sobre a Leia da Anistia, em 2010, encerrou a possibilidade de punir militares que cometeram crimes durante a ditadura. Um deles, Luiz Fux, afirmou que a Lei "foi uma virada de página". Para Gilmar Mendes, o modelo de anistia estabelecido pelo Brasil e julgado pelo STF faz parte do processo constituinte.

Eles não trataram especificamente do MPF, mas indicaram que as teses dos procuradores devem encontrar resistências no Supremo. Os agentes do Ministério Público entendem que os chamados desaparecimentos forçados - com sequestro e ocultação de cadáver - ocorridos na ditadura militar e até hoje não esclarecidos devem ser tratados como crimes permanentes.

A decisão do STF já esgotou a questão, resumiu Fux. "A mim me parece que o Supremo deu um equacionamento adequado no debate ao dizer que esse modelo de anistia fez parte do processo constituinte", disse Gilmar Mendes. E acrescentou: "A emenda que convoca o processo constituinte e que dá legitimidade à Constituição de 1988 estabeleceu esse modelo de anistia."

Apesar desse entendimento, partilhado por outros ministros, o STF voltará ao debate da questão. Isso ocorrerá no julgamento de um embargo de declaração apresentado pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) relacionado à decisão anterior.

O presidente da entidade, Ophir Cavalcante, questiona desta vez o entendimento de que, pela lei, estariam prescritos todos os crimes cometidos por agentes do Estado.

O acórdão do julgamento teria, de acordo com a OAB, firmado que "eventual persecução criminal está fadada ao insucesso em decorrência da aplicação da prescrição". A tentativa de processar agentes seria estéril por conta disso.

No embargo, a OAB se alinha com o MPF, ao argumentar: "Inexistindo data da morte, não há incidência do fenômeno prescritivo." O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, deu parecer contrário, por entender que não houve contradições no julgamento. O relator, Luiz Fux, deve analisar o caso em breve.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

PSDB já tem filiados em três centrais sindicais

Por Raphael Di Cunto

SÃO PAULO - Depois de ter dificuldades de angariar sindicalistas em seu início, o núcleo sindical do PSDB conseguiu fincar o pé em mais uma central: a Nova Central Sindical de Trabalhadores (NCST), quarta maior do país, com quase mil sindicatos filiados. Os tucanos já estão fortemente presentes na União Geral dos Trabalhadores (UGT) e na Força Sindical, onde tomaram o lugar do PDT em muitos Estados - segunda e terceira maior centrais, respectivamente.

Com a filiação, o PSDB dá mais um passo para enfrentar o PT e a Central Única dos Trabalhadores (CUT), maior das centrais, no movimento sindical. Os tucanos farão um congresso em São Paulo no dia 27 de abril para definir a pauta sindical do partido, que incluirá a redução da jornada de trabalho, de 44 horas para 40 horas semanais, o fim do fator previdenciário e do trabalho escravo - temas que nunca estiveram entre as prioridades da legenda.

O presidente do núcleo sindical do PSDB, Antônio de Souza Ramalho, admite que, mesmo com a filiação de vários sindicalistas e um programa partidário para o movimento dos trabalhadores, será difícil fazer os deputados e senadores tucanos defenderem o movimento. "É possível que, dentro do PSDB, muita gente não concorde com a redução da jornada de trabalho, por exemplo, mas são coisas que teremos de conquistar", afirmou.

Em reunião há uma semana, Ramalho acertou a filiação de cerca de 57 presidentes de sindicatos da Nova Central ao PSDB. O movimento será coordenado pelo presidente da Federação dos Funcionários Públicos Municipais do Estado de São Paulo (Fupesp), Damázio Sena, um dos diretores da NCST em São Paulo e que está filiado ao partido desde o fim do ano passado.

Damásio Sena, que é presidente do Conselho Fiscal da Confederação Nacional de Servidores Públicos (CSPB), também filiada à Nova Central, articulará para atrair sindicalistas para o PSDB em todo o país - a expectativa é filiar quase 400 dirigentes que representam o setor público.

Sena diz que ingressou no PSDB, um partido que historicamente não apoia o movimento sindical, por causa da mudança de postura da legenda. "Se um partido como o PSDB está se esforçando para atrair os trabalhadores, temos que aproveitar essa vontade deles para demarcar o nosso espaço", argumentou.

Essa "mudança de postura" também atraiu muitos representantes da Força Sindical e UGT, segundo Ramalho, que é vice-presidente da Força. Da UGT, que tem representantes no PPS e no PSD, como presidente da central, Ricardo Patah, saíram os presidentes do núcleo sindical do PSDB de Pernambuco e Tocantins.

O PDT perdeu espaço na Força Sindical de vários Estados com a investida do PSDB. No Piauí, Sergipe e Minas Gerais - apoiado pelo senador e pré-candidato à Presidência, Aécio Neves (PSDB) -, a mudança atingiu praticamente toda a central. Em Goiás, administrado pelo tucano Marconi Perillo, 75% dos pedetistas da Força foram para o PSDB.

As trocas ocorreram com consentimento do presidente nacional da Força, o deputado federal Paulo Pereira da Silva (PDT). Em conflito com o governo federal e sem conseguir indicar o novo ministro do Trabalho, Paulinho tem se aproximado dos tucanos.

Não deve desistir de ser pré-candidato à Prefeitura de São Paulo, mas tende a ficar do lado do ex-governador José Serra (PSDB) em um eventual segundo turno da eleição, e já garantiu apoio à reeleição do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), com a nomeação de um representante da Força Sindical e do PDT para a Secretaria Estadual de Emprego e Relações de Trabalho.

FONTE: VALOR ECONÔMICO

Poema do medo::Graziela Melo

Dobrei os becos da vida,
busquei a infância perdida,
no fundo do poço
na escuridão...

Fuji do medo
das trevas,

palmilhando
as tortuosas
trilhas do coração...

Lavei a alma
na chuva,
sequei o pranto
no vento,

na branca
areia da praia
aqueci
o coração!

Caminhei
de encontro
ao sol,
espantando
a solidão...

Pois entre o céu
e a terra

existe
um mar
de paixão!!!

Graziela Melo

Memória da política democrática – 4

Março, 90 anos do PCB: Resolução Política do CE da Guanabara do PCB (Março de 1970)

Apresentação Armênio Guedes

Em 1970, o Partido Comunista Brasileiro (PCB) vivia um momento de grandes dificuldades políticas. E não era diferente a situação dos comunistas da antiga Guanabara, cujo Comitê Estadual havia sido eleito em 1967, na conferência preparatória do VI Congresso do Partido.

A derrota do movimento de massas em 1968/69 e a promulgação do AI-5, que liquidou os últimos restos de liberdades existentes no país após o golpe de 1964, colocaram as correntes políticas e o movimento operário e popular perante uma situação nova e complexa. As formas de luta e de organização que as forças democráticas deviam adotar a partir de posições necessariamente defensivas, de resistência, impostas por derrotas sucessivas após 64 e principalmente no período que se seguiu ao insucesso político de 68, nem sempre foram assimiladas com a rapidez que a situação do país exigia. Faltaram para isso a todas essas organizações – e entre elas o PCB – lucidez e agilidade políticas.

Muitos – pessoas e organizações –, levados pelo desespero e pela falta de perspectiva, se deixaram arrastar, com base numa análise falsa, para as posições da luta armada e do uso indiscriminado da violência, como formas únicas e exclusivas de ação política no combate para liquidar a ditadura. A um tal comportamento não estiveram alheios militantes e setores do PCB, que posteriormente dele se desligaram.Em 1970, apesar da condenação do VI Congresso ao "foco guerrilheiro" e a outras formas de luta que não apresentavam caráter de massa, ainda tinham influência nas fileiras do PCB muitas das idéias defendidas pelos "foquistas". 

Parcialmente influenciados por tais idéias, muitos membros do PCB vacilavam em realizar esforços para reconstruir o movimento de massas e, assim, colocar em prática a linha de resistência ao processo de fascistização do país, executado pelo regime mais abertamente após a adoção do AI-5. Essa não era certamente uma tarefa simples nas condições de repressão e terror então existentes; mas era o único caminho possível e viável para a resistência e o gradativo avanço das forças democráticas.

Foi para reagir a esse momento de dificuldades e confusões que a Comissão Política do CE da Guanabara decidiu lançar o documento de março de 1970. Tratava-se, de um lado, de um esforço para colocar em prática a linha aprovada pelo VI Congresso; e, de outro, para dar continuidade à tradição do Partido no Estado de ligação com as massas e de alianças com um amplo arco de forças democráticas e liberais.

Para a elaboração do presente documento, de minha autoria, foi decisiva a participação que pude ter nas discussões realizadas no interior da Comissão Política do CE, integrada também, entre outros, por Élcio Costa e João Massena de Mello, ambos eliminados pela ditadura durante os anos da repressão sangrenta de 1974/76. Depois de elaborado, o documento foi aprovado por unanimidade na Comissão Política e no Comitê Estadual, praticamente sem qualquer emenda.

Ao republicá-lo hoje, é relevante observar que algumas das teses nele defendidas só seriam levadas em consideração pela direção nacional do PCB alguns anos mais tarde, em 1973. Pode-se constatar, também, o acerto da análise e das previsões, o que é mais significativo quando se pensa que aquela era praticamente a primeira intervenção dos comunistas no novo quadro inaugurado com a edição do AI-5 e com o início do "milagre brasileiro", com todas as suas conseqüências e características. O texto resistiu ao tempo, dez anos após sua publicação.

Exatamente por isso, o documento não pode deixar de ser lido se se deseja conhecer um pouco da história da ação e das concepções do PCB durante os anos mais negros do regime criado pelo golpe de 64. Vem daí a idéia de republicá-lo.

Ao fazer isso, cumpre registrar, alto e bom som, que o documento não existiria sem a atividade do conjunto do Partido na Guanabara, em particular de seus organismos dirigentes e de base. Foi em nome dessa atividade, integralmente voltada para a organização da classe operária e das amplas massas do Brasil e para a conquista de uma democracia que se abrisse para o socialismo, que diversos companheiros foram presos, torturados e mortos, amargaram o exílio e tiveram suas vidas destroçadas. A eles, pois, e em particular a Élcio Costa e João Massena de Mello, deve ser sempre dedicado o documento que se segue.

São Paulo, março de 1981.

I) O período transcorrido da promulgação do AI-5 até agora foi marcado, politicamente, pelo avanço do processo de fascistização do país. Para levar avante seu programa antinacional, antidemocrático e antipopular, o regime criado pelo golpe de 64 vem, sucessivamente, a partir do AI-1, restringindo as liberdades civis, concentrando o poder nas mãos de uma minoria militar e usando o arbítrio e o terror como métodos de governo para dar solução aos problemas políticos na ordem do dia. Isso não constitui, evidentemente, um traço peculiar à modalidade brasileira do fascismo.

Aqui, como em todas as partes, ele se caracteriza por surgir e definir-se, antes de tudo, como um ataque violento, armado, contra as organizações e instituições democráticas, em geral, e contra as associações de trabalhadores, em particular.

Fazemos questão de insistir nesse ponto. Isto é, fazemos questão de estar sempre alertando para a mudança do regime político ocorrido no Brasil em resultado do golpe de abril de 1964.

A verdade é que o movimento militar que derrubou o governo de João Goulart mudou a forma estatal de dominação de classe: o regime de democracia burguesa foi substituído por outro, de tipo fascista. As peculiaridades assumidas pelo tipo brasileiro de fascismo, nesta segunda metade do século XX, não devem confundir ninguém. A percepção disso é um mérito que não se pode negar ao nosso partido.

Há muito que batemos nessa tecla, e fomos nós os primeiros a mostrar a diferença entre o golpe de 1964 e os demais golpes militares realizados no Brasil, depois do fim da II Guerra Mundial. O fato, entretanto, nem sempre é visto com clareza pelas várias forças e correntes políticas de oposição ao governo. E essa falta de compreensão leva, freqüentemente, a ilusões que, de um lado, favorecem o processo de fascistização e, de outro, entorpecem a unificação e a combatividade das forças políticas e sociais que a ele se opõem.

É ela, igualmente, que impede a visão global do processo e induz certos analistas políticos a encarar as sucessivas crises do governo assinaladas depois de abril de 1964 como episódios isolados, e não como marchas e contramarchas, provocadas, de uma parte, pelo esforço fascista para dar vida ao seu projeto de um Estado autoritário, militarista e tecnocrático, e, de outro, pela resistência das forças democráticas à realização de tal projeto.

Se conseguirmos, com nossas constantes advertências, esclarecer a opinião pública sobre o caráter do regime será mais fácil estimular a resistência ao seu avanço: não se trata de oposição apenas ao governo de Médici ou de outro general qualquer; o que se pretende é barrar e liquidar o processo de fascistização, restaurar e renovar o regime democrático, de forma a permitir que os trabalhadores e a maioria do povo, vencida a contra-revolução de 64, voltem a impulsionar o Brasil no sentido de sua completa emancipação nacional.

Visto nesse contexto, o ano de 1969 foi um ano de recuo das forças democráticas e de avanço da ditadura. As medidas tomadas a partir do AI-5 (supressão do habeas-corpus, fortalecimento dos órgãos de repressão, emprego da violência e do terror abertos para o combate à oposição ao governo e ao regime, etc.) criaram maiores dificuldades para a manifestação das massas.

O fortalecimento do caráter repressivo do Poder atual foi a forma encontrada pela contra-revolução para enfrentar as dificuldades políticas que lhe são criadas, tanto pela resistência democrática como pelos conflitos surgidos no seio das forças governamentais.

É uma solução que, embora dê vantagens temporárias ao regime, cria, a médio e longo prazo, premissas para novas crises, que lhe podem ser fatais. Mas esta afirmação não deve ser compreendida, de forma alguma, como um fatalismo positivo. Dados de ordem objetiva e subjetiva determinam que os fatores temporários favoreçam o avanço do processo de fascistização; o mesmo não se dá em relação aos fatores permanentes que atuam em sentido contrário.

E é por causa disto que certos círculos das classes dominantes, que levaram os militares fascistas ao Poder, passaram, do apoio ao Governo, à neutralidade, e, agora, já começam a inquietar-se com os excessos da ditadura, excessos que comprometem o futuro político de quem os pratica ou, mesmo, de quem se mantém omisso ante suas conseqüências. A correta avaliação desses fatores temporários e permanentes revela-nos, paradoxalmente, que o avanço do processo de fascistização, na medida em que vai se afirmando na estruturação de um Estado autoritário, militarista e tecnocrático, através dos três governos que se seguiram ao golpe de abril de 64, tende, ao mesmo tempo, a esgotar suas potencialidades. É fácil entender. O processo, para avançar, tem que se afastar de alguns dos seus sustentáculos iniciais, isto é, cortar seus vínculos mais estreitos com as correntes liberais do centro ou da direita da antiga "classe política". Ao fazer isso, se é verdade que limpa a sua área, tornando-a cada vez mais impermeável a qualquer tipo de pressão nacional e democrática, não é menos certo que se condena a um certo tipo de isolamento político, pois o espaço deixado vazio pela liquidação de uma parte de seu sistema de sustentação não é ocupado, a não ser em escala reduzida, por novas forças. O esforço realizado pelo atual Governo, tentando substituir a parte da "classe política" alijada (Magalhães Pinto, Pedro Aleixo, Cordeiro de Farias, Daniel Krieger, etc.) por quadros tecnocratas, ilustra o que antes afirmamos. É oportuno dizer que a falta de uma base de massas (um partido fascista de massas) e o apoio fundamental no núcleo reacionário das Forças Armadas são peculiaridades marcantes do regime atual e do processo de fascistização instaurado no Brasil. Essas duas facetas do regime atual, ao lado de outras que merecem análise e estudos precisos, têm de ser bem ponderadas quando tentamos elaborar um plano de ação para a resistência das forças que se opõem ao processo contra revolucionário aberto pelo golpe de 1964.

Como conclusão do que foi dito antes, gostaríamos de assinalar que continua como objetivo central de nossa ação política a luta pela liquidação do regime do golpe de abril de 1964. Não se trata, repetimos, de fazer oposição apenas a este ou outro governo, a um ou outro aspecto de suas políticas, e sim de subordinar quaisquer desses esforços à estratégia geral para deter o processo de fascistização do País e, em seguida, derrotar o regime atual e liquidar, politicamente, as forças decisivas que lhe deram vida e o sustentam.
O que foi realizado até aqui, em matéria de resistência, apesar do baixo nível de organização da oposição à ditadura, revela que a consolidação do regime não é uma fatalidade.

E mais ainda: mostra que ele é vulnerável, que são limitados e temporários os seus suportes. Qualquer ilusão sobre o caráter do regime, quer em nossas fileiras, quer entre as forças da oposição, deve ser combatida. E toda e qualquer ação, não importa a sua importância ou extensão, deve ser orientada de forma a somar forças contra a ditadura, de modo a impulsionar o movimento histórico em direção à contestação global, direta e indireta, do regime e da sua política.

Vejamos, a seguir, as condições nacionais (aqui não trataremos da situação internacional, apesar de sua importância), em que temos hoje de conduzir a resistência à ditadura.

II) As crises políticas que culminaram na indicação do Gal. Garrastazu Médici para a Presidência da República ganharam intensidade na segunda metade de 1969. Essas crises foram geradas por conflitos de naturezas diversas e se deram em diferentes planos da vida política.
As soluções encontradas, quer com as medidas tomadas pela Junta Militar, quer com a eleição do novo presidente militar, apenas atenuaram (ou adiaram) os seus efeitos.

E justamente porque persistem tais conflitos é que é importante examiná-los. Antes de tudo, assinalemos que as últimas crises, ao lado de suas especificidades, apresentaram pontos comuns com as demais crises sofridas pelo regime atual.

Entre os fatores causadores de desgastes da ditadura, opondo-se a seus esforços para fazer avançar o processo de fascistização, encontramos sempre dois tipos de resistência: a do movimento nacionalista e a do democrático. Certo, esses dois elementos do processo político brasileiro tendem, historicamente, à convergência: há entre eles um condicionamento mútuo muito estreito. Mas, em determinadas situações concretas, um deles pode assumir maior importância como acelerador do processo revolucionário brasileiro. 

De qualquer forma, direta ou indiretamente, eles sempre estiveram no centro das crises que vêm abalando o regime. Ou se originando de um choque direto entre o governo e a oposição (AI-2, novembro de 1965), ou de um conflito no seio do sistema de forças do governo (afastamento de Costa e Silva, constituição da Junta Militar e indicação de Médici), os golpes sucessivos, a partir de 64, foram sempre desencadeados para precaver o processo contra revolucionário contra o seu desgaste pela resistência nacionalista e/ou democrática.

A maior ou menor instabilidade dos governos da ditadura (razão das crises) tem sido em função de sua maior ou menor permeabilidade às pressões oriundas daqueles dois movimentos.

A contradição a que acabamos de nos referir dá origem a outras menores, secundárias e subordinadas, mas que nem por isso deixam de assumir importância decisiva em determinados momentos. É o caso, por exemplo, do conflito entre um Poder de fato, constituído por um núcleo de oficiais superiores das Forças Armadas (ideologicamente afinados com as doutrinas político-militares da ESG, mas de difícil identificação física), e o governo do momento. Cabe esclarecer que os diferentes governos do regime de abril (Castelo, Costa, Junta e Garrastazu) surgiram sempre como frutos de acordos entre aquele Poder militar de fato e as velhas forças políticas integradas nos quadros da ditadura. Produtos de tais acordos, sujeitos muitas vezes a pressões colidentes, vimos os vários governos de regime oscilar, pendularmente, entre as duas forças, até um momento em que o aumento das tensões desemboca em crises políticas, que geram novos pactos, já que as forças em choque não tiveram, até aqui, possibilidade de terminar com o impasse. Nesses pactos, os contendores disputam posições e vantagens que os coloquem em condições favoráveis para enfrentar a nova crise.

É esse, precisamente, o panorama do governo do Gal. Garrastazu Médici. Dele dizia recentemente o jornalista Carlos Castello Branco: "Chegamos aí a outra curiosidade da situação brasileira, que é o fato de não estar o Poder totalmente e, às vezes, substancialmente nas mãos dos seus titulares, que o representam, mas não o empolgam. A força invisível está por trás de tudo, definindo critérios, selecionando virtudes e impondo normas às quais devem obediência os que a representam ostensivamente".

Já se desenha nitidamente a formação de focos de atrito no novo governo.

Apesar das medidas que, em 1969, aumentaram ainda mais o autoritarismo e o arbítrio do regime, dos atos e leis que dificultaram em alto grau a atividade da oposição e a manifestação da vontade das massas, e talvez por tudo isso, a situação política do governo Garrastazu se apresenta instável. Ele se esforça para cobrir os claros deixados por certas forças afastadas do Poder, após a última crise, chamando técnicos para sua equipe, numa tentativa de dar ao seu governo uma imagem tecnocrática. Poderá, com isso, substituir uma parte da velha "classe política" alijada do poder, criando um novo elo de ligação com as classes dominantes, evitando o isolamento e prolongando o bonapartismo atual por mais tempo. O difícil é avaliar até onde irão as possibilidades desse bonapartismo sem um Bonaparte.

Ao lado das contradições já referidas, cabe, finalmente, assinalar mais uma. Em nível mais elevado que os seus antecessores, o governo de Garrastazu sofre as conseqüências da divisão do suporte militar da ditadura.

À medida que passam os dias e que as Forças Armadas continuam como centro das decisões políticas importantes, maiores são os conflitos que as dilaceram. Grosso modo, a parte mais ativa da oficialidade, que participou do golpe de 1964, principalmente do Exército, divide-se hoje em dois grupos principais: um deles, englobando talvez a maioria, é formado pelos partidários de um nacionalismo autoritário, e o outro, que dispõe de maior parcela de poder, reúne os que se mantêm aferrados aos dogmas entreguistas e reacionários da ESG. O primeiro grupo tende a crescer e a romper, de dentro, a unidade do bloco militarista reacionário. Isto determinará, obviamente, uma convergência da ação dessa força com a do movimento nacionalista democrático da oposição. É necessário, no momento de uma apreciação mais concreta, não esquecer que, entre um grupo e outro, existem, nas Forças Armadas, correntes de várias nuances, além de uma enorme massa – possivelmente a maioria – de oficiais indecisos e indiferentes.

É dentro desse quadro que o Gal. Garrastazu terá de enfrentar as próximas eleições de governadores, para o Congresso Nacional, Assembléias Estaduais e Câmaras Municipais. "A disputa eleitoral – diz o JB – não será evidentemente capaz, por si mesma, de aplainar as contradições; muito pelo contrário. Pode-se esperar que as dificuldades se criem".

Em alguns dos Estados mais importantes – SP, GB, MG, BA – o partido oficial, a Arena, até agora não conseguiu unir suas forças, e o General-Presidente ameaça impor seus candidatos, vetando aqueles que não lhe agradam, numa ação que já se convencionou chamar de "cassação branca". O governo, que num arroubo demagógico prometeu fazer o "jogo da verdade", age com cautela nesse terreno, a fim de não provocar desarranjos no precário sistema de forças políticas em que se apóia.

As correntes de oposição – e, claro, entre elas, o nosso Partido – têm, com as eleições, um grande campo para potencializar a resistência à ditadura. Nada nos leva a crer que as próximas eleições, cercadas como estão pelas medidas coercitivas da ditadura, possam ser decisivas para a liquidação do regime – é uma advertência que não podemos deixar de fazer.

Mas não tenhamos dúvidas de que elas vão concorrer, e muito, para a nova crise em gestação. Daí a sua importância para a oposição.

Ninguém pode dizer, com segurança, o resultado de uma nova crise, se haverá alguma abertura (não entramos aqui na discussão sobre a extensão de tal abertura, mas consideramos apenas que o alargamento da faixa das liberdades, por menor que seja, ajuda a organizar a resistência ao avanço do fascismo), ou se serão ampliadas as medidas repressivas, com novas restrições às já quase inexistentes liberdades civis. O que não se pode é ficar à margem, acatar o desejo do General-Presidente. Isto é, participar das eleições sem contestar o regime. A oposição, particularmente as forças de esquerda e o nosso Partido, não pode, como quer o atual Presidente, permitir que a opinião pública, em hipótese alguma, seja confundida a ponto de admitir as medidas repressoras do regime como necessárias à defesa da democracia. O regime de abril, por sua essência de classe (serviçal das velhas classes dominantes, do imperialismo, etc.), por suas vinculações antinacionais e por sua ideologia reacionária, pode, tranqüilamente, ser classificado como de tipo fascista.
Enfim, o Gal. Garrastazu, no primeiro trimestre de existência de seu governo, revela, em nível diferente, dificuldades semelhantes às dos outros dois governos que o antecederam: mostra-se incapaz de montar um sistema político compatível com o poder militar que lhe deu origem, um sistema que legalize este poder – razão de sua força e fraquezas.

III) Nossa preocupação principal nesta discussão é, partindo de um momento concreto, ampliar o conhecimento sobre a natureza do regime, a maneira de combatê-lo e derrotá-lo, e, com base nisso, traçar as perspectivas para depois de sua queda. Nada melhor para isto do que a apreciação da política econômica do regime e da situação atual dela resultante.

Porta-vozes oficiais estão constantemente proclamando com insistência os êxitos da política econômica do regime. Apresentam, em apoio a essas afirmações, dados quantitativos sobre o crescimento do país. O crescimento é um fato, e seria uma estultícia negá-lo.Um dos elementos essenciais da política do Partido é dado pela análise dos fatos. Há muito que ele se esforça para superar aquele tipo de primarismo que vê as esperanças do êxito de uma política revolucionária unicamente no caos e na catástrofe da política econômica das classes dominantes.

Certo, os índices de desenvolvimento de alguns setores apresentam-se bem positivos quando feita a comparação entre os anos de 1963 e 1969: aço, 75% de aumento; energia elétrica, 61% de aumento da capacidade instalada e 56% do consumo; cimento, 52%; produção de petróleo, 71%; rodovias pavimentadas, 89%; unidades de habitação construídas, 120 mil nos vinte e seis anos anteriores e, nos últimos cinco anos (1964/69), 519.490. A essas cifras, sempre tomando os anos 63/69, podemos acrescentar a elevação do número de alunos matriculados nas escolas (aumento de 40% no curso primário, de 12% no grau médio e de 158%no ensino superior), o aumento das exportações (de 60%) e dos incentivos fiscais para o desenvolvimento das regiões atrasadas do Norte e do Nordeste.

O fato de haver crescimento, de não haver uma crise profunda, não significa que a política econômica não contrarie os interesses da maioria da Nação e, mais particularmente, das grandes massas trabalhadoras.
O que nos cabe discutir, portanto, é o tipo desse crescimento, ou, se se deseja uma expressão mais em moda, o modelo de desenvolvimento atualmente aplicado. Claro que não vamos discutir aqui, em profundidade, esta questão. Desejamos apenas dar algumas das suas características básicas, que mais ou menos nos indicam as linhas de resistência e as alternativas à política econômica de regime e à situação dela resultante.

Antes de tudo, vamos esclarecer a filosofia do modelo.

Ela visa, antes e acima de tudo, a vincular "a economia brasileira a um determinado sistema econômico de perspectivas mundiais". "Essa grande estratégia... pretende opor ao avanço do mundo socialista e capitalista independente uma crescente coalizão de interesses econômicos, capaz de colocar os 'sagrados' princípios da propriedade privada acima de quaisquer considerações, até mesmo da soberania nacional". Outro elemento importante desse modelo é manter o crescimento dentro de limites que dispensem, obviamente, as reformas de estruturas, substituindo-as por mecanismos que racionalizem o desenvolvimento capitalista dentro da linha preferida (ou imposta) pela matriz imperialista.

Orientada por essa doutrina, a política econômica do regime criou uma situação que se caracteriza:

- Pelo crescimento dos setores monopolistas da economia. O desenvolvimento está sendo feito em benefício da grande empresa e do grande capital monopolista, principalmente estrangeiro. Nesse sentido, para citar apenas dois exemplos, estão os casos do setor bancário (entre 1964 e 1969 foram incorporados 51 bancos e 5 se fundiram) e da indústria automobilística. Esta orientação é, ao mesmo tempo, monopolista e entreguista, pois a centralização e a capitalização servem principalmente à grande empresa estrangeira e estão minando a capacidade de resistência de grande úmero de empresas menores, pequenas e médias. No Rio, em São Paulo e outros centros importantes tem aumentado grandemente, nos últimos anos, a partir de 1964, o número de falências e concordatas, sem falar nas empresas que se deixam absorver pelo grande capital. Os teóricos do regime justificam o fato alegando que só não resistem às medidas do governo "as empresas marginais do sistema, que não possuem estrutura adequada e dimensionam mal a inflação futura" (Delfim).

A orientação monopolista dá margem à organização de uma importante linha de resistência à política econômica e ao regime autoritário que a patrocinam. Ou melhor, possibilita a criação de uma frente antimonopolista, como parte da frente única antiditatorial.

- Pelo confisco salarial. Segundo a FGV, o salário mínimo real (usando-se os preços por atacado como deflator), a preços de 1964, caiu de 42 cruzeiros novos naquele ano para 32,77 atualmente, ou seja, uma queda de 1/4 (vinte e cinco por cento). Isto quer dizer que a taxa de acumulação está sendo aumentada mediante o confisco salarial.

É a política de compressão de salários, tornada possível em virtude da repressão governamental, que reduziu, na prática, os sindicatos à impotência, e transformou a luta dos trabalhadores em caso de polícia. Este é um ponto da política econômica do governo que exprime, sem margem a dúvidas, a essência de classe do processo de fascistização inaugurado em 1964.

A organização da resistência ao confisco salarial dá margem, principalmente, a organizar-se o antagonista histórico do regime, a classe operária, força capaz, pelo papel social que desempenha, de resistir e impedir sua consolidação, para depois derrubá-lo. Mas a organizar não somente a classe operária, como todos os trabalhadores assalariados.

- Pelo confisco tributário.A política de progressividade do imposto de consumo e do aumento das incidências, assim como o número de pessoas físicas tributadas pelo imposto de renda afetou, grandemente, o nível de vida das massas trabalhadoras e funciona como mecanismo de distribuição da renda em favor do grande capital, beneficiado pelo governo com isenções e subsídios diretos e indiretos. Este confisco, pelo número de pessoas que atinge, desperta grande oposição. É uma linha de oposição ainda difusa e que deve ser estimulada e organizada.

- Pelos critérios adotados para os investimentos estatais. Em geral, não é – ao contrário do que aconteceu com a Petrobrás, Volta Redonda, Vale do Rio Doce, etc. – o interesse nacional que comanda, hoje, os grandes investimentos do Estado brasileiro, como, em parte, aconteceu antes de abril de 1964.

As empresas e os investimentos públicos, como está acontecendo em outros países, estão crescentemente atendendo ao amplo campo da criação das economias externas e da manutenção e melhoria da infra-estrutura básica da indústria e dos serviços, imprescindíveis às empresas dominantes.

A orientação atual – com a exclusão de alguns casos em que o resíduo nacionalista de antes de 64 se faz presente - implica, assim, numa contradição total às finalidades teoricamente assinaladas pelo movimento nacionalista para os investimentos e empresas públicos.

A gritaria contra o estatismo, ainda presente na grande imprensa, visa apenas a confundir a questão e a quebrar certas resistências que, ou em setores isolados do governo, ou em grupos das Forças Armadas, sintonizam com a opinião pública contrária ao rumo pró-monopolista e antidemocrático imprimido aos investimentos e empresas estatais.

Continua válida, nesse terreno, a defesa das empresas e investimentos públicos surgidos como alternativa ao capital estrangeiro. Devemos, portanto, distinguir entre os dois tipos de investimentos, antes de fixarmos qualquer posição ante casos concretos.

- Pela adoção de um tipo de relações econômicas internacionais altamente danosas aos interesses brasileiros.

A subordinação de nossa economia aos planos da grande estratégia norte-americana veio acentuar de forma marcante nossa dependência ao imperialismo, cortando as tendências a um desenvolvimento autônomo que se manifestaram na política de relações econômicas internacionais do Brasil antes de 1964.

O resultado da política atual foi continuar com o endividamento do país, a acentuação a desigualdade nas relações de troca (aumento do preço da tonelagem importada e diminuição do da exportada) e o aumento das remessas financeiras a título de lucros, juros, comissões, royalties, seguros e serviços. São claros os dados oficiais a este respeito.

Há um sentimento generalizado contra o aumento da espoliação do país, que pode tomar forma na medida em que se organize a resistência à política entreguista da ditadura.
O campo econômico, social e político para este trabalho é o mais amplo, inclusive nas Forças Armadas.

- Pela desnacionalização crescente da economia brasileira. A política oficial de "incentivos" à entrada de capital estrangeiro está propiciando a crescente desnacionalização da economia brasileira. O capital monopolista estrangeiro está ocupando pontos básicos da economia do país, transferindo para o exterior muitos de seus centros de decisão. A reação de empresários nacionais dos setores mais atingidos por esta invasão serve como indicador da profundidade do fenômeno.

É uma linha de resistência que já existe, mas que precisa ser melhor coordenada.

- Pela limitação de crescimento do mercado nacional. A obstinação da oposição do regime a qualquer reforma de estrutura está condenando o mercado interno a um crescimento lento e desequilibrado. A reforma agrária – pedra de toque da posição de qualquer política ante as reformas –, sobre a qual os governos da ditadura tantas vezes foram obrigados a falar, por pressão da opinião pública, vai sendo substituída, na linguagem oficial, por uma pretensa e vaga colonização de terras (veja-se entrevista recente do Ministro da Agricultura ao JB). O resultado de tudo isso é que parcela considerável da população fica fora do mercado consumidor, por falta de emprego e falta de renda, enquanto a parte empregada tem seu poder aquisitivo empurrado para baixo, em virtude dos confiscos salariais e tributários já referidos. Assim, o desenvolvimento econômico ou se volta para uma pequena faixa de S% da população, de poder aquisitivo razoável, ou se destina à exportação. (Dados do IBGE dão conta de que metade da população ativa do país, 14 milhões em 28 milhões de pessoas, é constituída de desempregados totais ou parciais). A limitação do mercado sugere várias linhas de resistência. Seria difícil, no momento, determinar concretamente essas linhas.
Em conclusão, diremos que o tipo de desenvolvimento que a ditadura está tentando imprimir ao país, antes de mais nada o afasta das grandes opções. O modelo por ela esboçado, de inspiração externa, em lugar de possibilitar a transformação de sociedade brasileira, deseja apenas ordenar o crescimento nacional e evitar os momentos de tensão, mediante a modernização do sistema e o emprego de técnicas sofisticadas.

É difícil, hoje, com o precário instrumental de análise que temos, predizer até que ponto irá o regime atual. Mas uma coisa podemos desde já afirmar: serão altíssimos os custos sociais de qualquer resultado que ele venha a obter.

IV) Para uma avaliação correta do momento político, avaliação indispensável ao trabalho do Partido a curto, a médio e a longo prazos, um dado a ser examinado é a situação em que se encontra a oposição à ditadura, após o AI-5.

O movimento de oposição experimentou, em 1968, um considerável avanço, em termos de dinamização de suas forças sociais e políticas.Essa dinamização, que era apenas início de formação de uma oposição de massas, não chegou a ter tempo de se traduzir em organização, embora, àquela época, não fossem poucos os que a superestimassem, partindo daí para a conclusão de já haver então chegado a hora da ofensiva geral contra a ditadura. Os fatos posteriores mostraram a falsidade dessa apreciação.

O AI-5 foi um rude golpe contra a oposição. A resistência ao processo de fascistização do país se faz agora de posições mais difíceis, em virtude do recuo do movimento de massas, em 1969. As medidas de repressão, depois de 13 de dezembro de 1968, atingiram particularmente a luta dos trabalhadores, dos estudantes e da Igreja Católica.

Essa retração do movimento de massas influiu negativamente em toda a oposição e aumentou a sua dispersão: as correntes burguesas e pequeno-burguesas, principalmente as suas cúpulas, se retraíram. Os focos de resistência criados na ascensão de 68 (nos sindicatos, nas escolas, na imprensa e no parlamento), em defesa da liberdade de manifestação, contra a censura e o terror cultural, em defesa das riquezas naturais do país, contra a desnacionalização da indústria, etc. foram praticamente liquidados ou reduzidos a um mínimo. O movimento de resistência ainda busca, neste momento, novas formas e caminhos para se expressar, para criar, enfim, os seus novos focos de irradiação.

Cabe aqui, finalmente, uma observação especial sobre a situação das esquerdas dentro da oposição. Para essas forças, a pior conseqüência da inflexão do movimento de massas foi o rápido incremento das posições radicais. Não foram poucos os grupos revolucionários pequeno-burgueses que não souberam recuar ante o avanço da contra-revolução, passando do radicalismo verbal às posições de desespero e aventura. Iniciaram essas correntes uma série de atos que se explicam, antes de tudo, pela sua incapacidade para enfrentar a tarefa de reestruturar o movimento de massas nas condições difíceis criadas pelo avanço da repressão fascista. Os assaltos a bancos, os golpes de mão e outras formas de ação postas em prática por pequenos grupos desligados das massas, enfim, o emprego indiscriminado da violência, embora compondo objetivamente o quadro da oposição, não deixam, apesar de seu suposto caráter revolucionário, de desservir à resistência e de dificultar a organização da frente única de massas contra a ditadura. Em uma palavra, enfraquecem a oposição.

O trabalho paciente, cauteloso e demorado de organização da classe operária e do povo, de sua preparação para enfrentar uma luta prolongada, se assim for preciso, que constitui para o nosso Partido uma alta virtude revolucionária, não passa, para aqueles grupos, de um pecado mortal oportunista.

É esse o quadro da oposição. Quadro que explica porque a ditadura, apesar de suas fraturas e instabilidade, ainda encontra meios e formas para avançar no processo de fascistização. Quadro que se modificará, com maior ou menor ritmo, a partir do momento em que o processo político, permitindo uma reflexão mais profunda da oposição sobre sua experiência, indique-lhe a maneira de usar sua imensa potencialidade para organizar os combates e a batalha final contra a ditadura.

V) o exame até aqui feito sobre as forças presentes e em conflito na sociedade brasileira induz a um otimismo realista em relação à formação de uma frente antiditatorial. Essa conclusão, juntamente com a de que não é fácil a consolidação do regime atual, não autoriza, porém, qualquer atitude política alicerçada na subestimação dos suportes da ditadura. Quando dizemos que a ditadura se isola de determinadas forças políticas, não estamos, ipso facto, prevendo a sua queda imediata.

Queremos tão-somente significar que surgiram novas dificuldades para o regime, que podem aumentar ou desaparecer, em dependência dos erros ou acertos de seus opositores.

O dimensionamento das dificuldades atuais do regime, em confronto com a capacidade de ação da oposição, indica que elas não são de natureza a prever a derrocada da ditadura em curto prazo. E os fatos decisivos que conduzem a tal conclusão são o retraimento do movimento de massas e a dispersão da oposição. 

Usando uma outra fórmula, diremos o seguinte: se os fatores temporários ainda favorecem o processo de fascistização, a nossa tática só pode necessariamente ser defensiva, de resistência tenaz e, se preciso, prolongada. Temos, portanto, que trabalhar com essa perspectiva, afastando de nosso Partido e, se possível, das demais forças da oposição, quaisquer ilusões sobre uma vitória fácil sobre a ditadura.

Os dados de que dispomos não nos autorizam a prever o tempo de duração do regime atual.
É claro que o nosso problema não é ficar especulando abstratamente sobre a vida mais curta ou mais longa da ditadura, não é subordinar nossa luta de resistência aos resultados dessa indagação.

Mas a especulação é válida, desde que dê à oposição um elemento de referência – as probabilidades de maior ou menor duração da ditadura – para que ela possa determinar o ritmo e a intensidade de sua ação.
Se não prevemos uma queda fácil e imediata da ditadura, temos, como Partido revolucionário, de subordinar nossa ação política e o trabalho de organização a uma tal realidade.

A perspectiva é a de nos prepararmos, tanto no plano da atividade política como no da organização, para um trabalho em profundidade, cujos resultados só serão colhidos depois de um período de maturação. Um trabalho adaptado a uma situação de violenta reação política, em que a luta de resistência surgiu como decorrência de uma série de derrotas e desgastes impostos ao movimento revolucionário, nacional e democrático.

Nossa idéia de resistência apoia-se no fato de existir no Brasil um sentimento generalizado de repulsa à ditadura, abrangendo as mais diversas classes e camadas sociais,mas disperso e desorganizado.

Devemos partir de ações parciais, em todos os níveis do movimento de massas ou dos acordos de cúpula, a fim de conseguir que aquele sentimento passivo vá tomando forma, pouco a pouco, até se transformar num grande movimento nacionais, em frente únicas, que englobe os sindicatos, o movimento estudantil, a Igreja Católica, os partidos e os políticos da oposição - um movimento que expresse, em nível superior, a rebeldia brasileira contra o processo de fascistização do país. Cabe salientar, em relação ao esforço destinado a impulsionar a luta de resistência, nas condições atuais, a valorização a ser dada às pequenas ações, mesmo nos casos em que estas só indiretamente se oponham às medidas da ditadura. O que não podemos é condenar a oposição ao imobilismo, na espera das grandes tarefas ou do dia supremo. A constante preocupação em descobrir e organizar a resistência concreta das massas contra determinados atos do regime ditatorial é o melhor antídoto para evitar os apelos à luta abstrata ou à resistência indeterminada. Desses apelos ao palavrório radical desligado de qualquer objetivo real, basta apenas dar um passo.

Os protestos contra o ato do governo que instituiu a censura prévia à publicação de livros e periódicos são um exemplo atual e palpitante de resistência concreta.

Há, na luta de resistência limitada da fase atual, o risco de o Partido desprezar sua estratégia. Mas isto será evitado desde que subordinemos as ações de resistência ao objetivo central de formação de uma frente única nacional antiditatorial. Assim, o Partido será resguardado e não incorrerá no erro de minimizar sua idéia estratégica, "diluindo-a em uma tática quase cotidiana".

Trata-se, agora, de incrementar e multiplicar o aparecimento de focos políticos de resistência, a fim de romper com a passividade das massas e passar da defensiva à ofensiva, até atingir o ponto em que se coloque na ordem do dia o ataque geral contra a ditadura.

É nesse momento que se dará o fim do processo de fascistização, com a liquidação da ditadura:

- ou através de um movimento irresistível que mobilize a opinião pública, atraia para o seu lado uma parte das Forças Armadas e organize um levantamento nacional (com maior ou menor emprego da violência);

- ou através da desagregação interna do Poder, sob o impacto do movimento de massas e depois de crises sucessivas, forçando uma parte do governo a facilitar a abertura democrática;

- ou pela predominância e vitória, nas Forças Armadas, da corrente nacionalista, capaz de superar e liquidar o conteúdo entreguista do regime, nos moldes concebidos pela ESG e aplicados pelos altos chefes militares no mando do país, a partir de 1964.

Em relação à terceira hipótese, cabe um esclarecimento. No caso de surgir uma situação semelhante, é de se prever que a corrente nacionalista vitoriosa, mesmo negando o traço fundamental do regime atual – sua subordinação à estratégia americana de controle do mundo capitalista –, tentará manter o poder militar autoritário, como instrumento para a realização de seu projeto de afirmação nacional. Mas esse poder, penetrado de um novo conteúdo, na medida em que aguce seu confronto com o imperialismo, tornar-se-á carente de amplo apoio popular e permeável, por isso mesmo, às reivindicações de ordem democrática.

É claro que as saídas acima apontadas são, como não poderiam deixar de ser, bastante esquemáticas. São hipóteses para o trabalho político, tanto mais úteis quanto expressem com maior rigor as tendências reais do processo político em curso.

De qualquer forma, a queda do regime atual poderá assumir o caráter de uma verdadeira revolução antifascista, com a derrota e afastamento do poder das forças e camadas políticas e sociais mais reacionárias do país.

VI) O AI-5 teve profundas conseqüências na Guanabara. Podemos dizer que um dos seus objetivos primordiais foi esmagar o movimento político das massas, em oposição aberta ao regime, que ganhou corpo no Estado a partir do início de 1968. O mesmo já ocorrera por ocasião do AI-2, que teve como finalidade contrabalançar o golpe que o povo carioca desfechou contra a ditadura nas eleições de 1965. Isto significa que a GB tem sido, até aqui, o mais importante foco de resistência ao processo de fascistização do país. Mostra, simultaneamente, a grande responsabilidade, de caráter nacional, das forças antiditatoriais do Estado. Os êxitos ou fracassos na organização de uma oposição de massas ao regime na Guanabara repercutem rapidamente em todo o território nacional.

A primeira e mais importante conseqüência do golpe de 13 de dezembro de 1968 foi a dispersão do bloco oposicionista estadual. Abateu-se sobre o povo da GB a mais feroz reação: recesso forçado da Assembléia Legislativa, cassações e prisões de líderes políticos de trabalhadores e estudantes, controle policial dos sindicatos, fortalecimento dos órgãos de segurança estaduais e federais e terror cultural contra os intelectuais.

O movimento de massas foi obrigado a recuar e, só aos poucos, vai encontrando novas formas para se expressar na situação de extrema reação criada pelo AI-5.

O Partido sentiu também esses golpes e, como é natural, teve que introduzir modificações na organização de sua atividade política e de sua vida interna. Seu trabalho decresceu, como não podia deixar de acontecer, e só aos poucos ele vai conseguindo romper com as dificuldades criadas pelo AI-5. Além disso, as dificuldades políticas do Partido (e de toda a oposição) são acrescidas pela atividade desorganizadora e anárquica dos grupos radicais que, através de ações isoladas de pequenos grupos de conspiradores e em dissonância com o estado de espírito das massas, motivam o terrorismo do governo (fornecendo argumentos para justificar a chamada "guerra revolucionária"), confundem a opinião pública e, assim, entorpecem os esforços que, juntamente com outras forças, realizamos para estruturar a frente antiditatorial.

Ao lado das medidas repressivas, o povo da GB é um dos mais sacrificados pela política econômica do regime. Basta atentar, neste sentido, para o que vem ocorrendo no Estado: diminuição do número de empregos industriais (caindo de 201 mil para 199 mil pessoas entre janeiro e outubro de 1969), aumento dos preços da alimentação (subiu 30%) e dos serviços públicos (aumento de 31%), aumento progressivo das falências e concordatas a partir de 64, elevação brutal do número de despejos, aumento da carga tributária, etc.

Outro ponto da política econômica do governo que atinge a GB é a sua orientação pró-monopolista, e isso em virtude, principalmente, do dimensionamento médio e pequeno da maioria esmagadora das empresas industriais do Estado. Essas indústrias se ressentem fortemente com os favores oficiais concedidos aos setores monopolistas da economia. E é nisso, talvez, que se encontra uma das razões para explicar o chamado esvaziamento da Guanabara.

Dentro desse panorama surgem, na GB, duas importantes questões políticas: as próximas eleições e a sua fusão com o Estado do Rio.

Nos próximos pleitos serão escolhidos, em eleição indireta, o governador, e, em eleições diretas, os deputados estaduais, federais e senadores. A ditadura está adotando uma série de medidas fascistas para evitar, em torno das eleições, os contatos e a movimentação políticos que certamente determinarão um impulso para o acordo de pontos de vista e a ação comum das forças de oposição. Acautela-se contra a possibilidade de as eleições se transformarem em elemento de contestação do regime, mesmo em escala reduzida. As eleições apresentam, assim, nas condições atuais, um duplo aspecto: de um lado, são mantidas porque o processo de fascistização não teve força para suprimi-las totalmente; de outro, porque ajudam a mascarar o caráter fascista da ditadura e a diminuir certas tensões políticas (conflito aberto com a direita libera!), que poderiam ser fatais ao regime atual.

Conscientes de tudo isso é que vamos trabalhar nas eleições.

Os obstáculos à atividade política em tomo das eleições tornam-se ainda mais evidentes quando consideramos a imensa apatia popular em relação às mesmas.

O fato é que temos de empenhar-nos, desde já, junto às forças de oposição no Estado, para pôr em andamento nossa tática eleitoral.

Levando em conta a força da ditadura, julgamos difícil colher de imediato grandes lucros políticos das eleições. Mas não podemos subestimar sua importância: abrem-se respiradouros, por .menores que sejam, para a manifestação da vontade das massas e ampliam-se as possibilidades de criação de novos focos de resistência à ditadura.

Devemos, por isso, preparar imediatamente as candidaturas que apresentaremos ou apoiaremos, intensificando, ao mesmo tempo, as alianças políticas, organizando os contatos com líderes e cúpulas políticas e selecionando os quadros e recursos materiais para sustentar esta atividade. Agindo, é claro, sem perder de vista que o trabalho eleitoral é apenas um momento, e nada mais do que isto, do nosso esforço para a formação, na GB, da frente antiditatorial. É uma atividade que deve reforçar e ser reforçada pelas demais frentes de trabalho: sindical, estudantil, favelas, cultural, etc.

Chamamos, em último lugar, a atenção para a possibilidade que as eleições abrem para se estimular as crises e cisões no sistema de forças do governo, crises que minam e enfraquecem os seus suportes políticos.

A questão da fusão não pode, hoje, ser discutida academicamente, no plano técnico e histórico. Quanto a esses aspectos da questão, os menos relevantes no momento, diremos apenas que a fusão, por si só, não representaria um meio Ou garantia de solução para os problemas econômicos, sociais e administrativos dos dois Estados.

No contexto político atual, porém, a ótica de exame do problema é outra, completamente diferente. Diremos, de forma sintética, que, na medida em que a fusão signifique um ato da ditadura, com a finalidade de diminuir a potencialidade política da GB como grande foco de resistência ao processo de fascistização do país, ela deve ser denunciada e tenazmente combatida. A denúncia e a mobilização das forças políticas do Estado podem paralisar a ação da ditadura. Se isto não acontecer e a fusão for arbitrariamente realizada, ainda assim aquela ação não terá sido em vão: o ato será catalogado como mais um passo do regime para implantar, na vida nacional, o regime do partido único. Pois tudo indica que, com a fusão, deseja-se, na realidade, extinguir o mais dinâmico centro do partido da oposição no país.

As linhas aqui traçadas exigem modificações na organização e na forma de trabalho do Partido na GB. Algumas dessas modificações e adaptações são sugeridas no plano de trabalho de nosso Partido para o Estado. Outras questões essenciais, como o velho problema da criação do Partido nas grandes empresas, de sua propaganda, do emprego racional de seus quadros, dos critérios de concentração, etc. devem ser confiadas a grupos de trabalho, em virtude das pesquisas e estudos que exigem para ser solucionadas.

O importante, no momento, é quebrar a passividade e a apatia que se apoderam de vários setores do Partido, despertando-os para organizar a resistência do povo ao avanço do processo de fascistização do país. Indicamos, nesse sentido, as linhas de trabalho que se seguem.

1. Na frente sindical: luta contra o "arrocho salarial", contra a intervenção aberta ou mascarada nos sindicatos, contra o aumento dos impostos e contra a liquidação dos direitos e garantias existentes.

2. Na frente estudantil: luta para dar aos estudantes o direito de gerirem suas organizações e de realizarem livremente suas reuniões e assembléias nos locais de estudo; luta pela revogação do 477 e contra o terror dentro das Universidades e colégios; luta pela libertação dos estudantes presos.

3. Na frente econômica: resistência à política de privilégios para o setor monopolista da economia (principalmente os estímulos ao capital estrangeiro); resistência à entrega das riquezas naturais brasileiras, resistência à desnacionalização das empresas brasileiras; e luta em defesa da Petrobrás e das empresas estatais.

4. Na frente cultural: luta pela liberdade de criação e de pesquisa; resistência ao terror cultural e à censura ao trabalho de criação artística, de divulgação e de informação.

5. Na frente eleitoral: luta para dar aos partidos políticos liberdade para escolher seus candidatos, livres da interferência do governo e da pressão dos órgãos de informação; luta para assegurar a liberdade de propaganda para os candidatos, com a realização de comícios e garantia de acesso aos meios de informação de massas; luta para estabelecer contato com todas as correntes, partidos e grupos de oposição na GB e, antes de tudo, com o MDB e os católicos.

6. Na frente de solidariedade: organização de ajuda aos presos e suas famílias; denúncia sistemática das torturas; luta para garantir a assistência jurídica aos processados.

7. Na frente das liberdades civis: luta pelo restabelecimento do habeas-corpus.
Aferrando-nos a essas linhas, iremos pacientemente reestruturando e recriando, nas difíceis condições atuais, as grandes correntes do movimento político de massas da Guanabara, o movimento operário e sindical, o movimento estudantil, o movimento cultural e o. movimento de funcionários públicos e empregados.

Essa atividade deve ter como suporte um trabalho de propaganda forte e bem estruturado. Isto é indispensável ao aprendizado político das massas e concorrerá para despertar no povo um estado de ânimo favorável à organização da resistência ao processo de fascistização. Deve, então, ser uma propaganda que desvende o caráter antinacional e antidemocrático do governo atual, uma propaganda que torne os trabalhadores conscientes de serem eles a força política e socialmente mais qualificada para liquidar o regime criado pelo golpe de 1964. Uma propaganda, enfim, capaz de esclarecer, nos mínimos detalhes, que, sem a liquidação do poder autoritário e militarista, são praticamente nulas as possibilidades de ascensão dos trabalhadores à vida política e social da Nação, acentuando-se a situação de marginais da sociedade brasileira em que foram colocados depois de abril de 1964.

É claro que não há nenhuma organização do Partido capaz de, sozinha, engajar-se, nas presentes condições, na realização desse elenco de tarefas. Cabe a cada uma fazer suas opções, levando em conta suas possibilidades e as situações que se apresentem.