sábado, 10 de março de 2012

OPINIÃO DO DIA – Alberto Goldman: Sinal amarelo

Leia a notícia nos jornais de hoje: "A participação da indústria no PIB (Produto Interno Bruto) brasileiro recuou aos níveis de 1956, ano em que o presidente Juscelino Kubitschek (1902-1976) deu impulso à industrialização do país ao lançar seu Plano de Metas, que prometia fazer o Brasil avançar "50 anos em 5".

No ano passado, a indústria de transformação --que compreende a longa cadeia industrial que transforma matéria-prima em bens de consumo ou em itens usados por outras indústrias-- representou apenas 14,6% do PIB. O patamar foi menor só em 1956, quando a indústria respondeu por 13,8% do PIB.

Abatida pelos efeitos da inflação alta e da crise externa, a economia brasileira cresceu apenas 2,7% no ano passado, conforme divulgou o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) na última terça-feira (6).

O PIB per capita ficou em R$ 21.252, uma alta real (ou seja, acima da inflação) de 1,8% em relação a 2010."

Somos, cada vez mais, um país exportador de produtos agrícolas e minerais. Recuamos mais de 50 anos no tempo. Dependemos, cada vez mais, da China, o grande comprador desses produtos. Podemos estar plantando uma grande crise, se a China deixar de comprar o tanto que compra do Brasil, sem que tenhamos tempo para retomar a produção industrial que estamos perdendo.

Pode levar 5, 10 anos, mas pode acontecer.

Alberto Goldman, ex-deputado, ex- ministro, ex-governador e atual vice-presidente nacional do PSDB. Blog do Goldman, 9/3/2012

Manchetes de alguns dos principais jornais do Brasil

O GLOBO
Dilma demite ministro do PT por baixo desempenho
Ministro do STJ solta bicho no Rio
Câmara: 14 dias é pouco para votar urgência
Nova chefe da ANP recebia pela Petrobras
Fifa suspende vinda de Valcke

FOLHA DE S. PAULO
Grupo aprova proposta para aborto com aval de psicólogo
Dilma demite ministro do PT por deficiência
Brasil quer limitar importação de veículos feitos no México

O ESTADO DE S. PAULO
Dilma ignora pedido da Fifa e Valcke adia visita ao Brasil
Comissão do novo Código Penal amplia o aborto legal
Haddad pode perder apoio do PC do B, que negocia com PMDB
Governo tenta acelerar nomeações de 2º escalão

CORREIO BRAZILIENSE
Sem alarde, Dilma troca ministro inexpressivo
Vídeo flagra "caixa dois" para petista
Luta contra o 14º e o 15º no Senado chega ao STF

ESTADO DE MINAS
Governo vai lançar pacote de estímulo
CGU procura R$ 39 milhões em Minas
Dilma demite ministro do PT e faz a 12ª substituição

ZERO HORA (RS)
Piratini promete R$ 172 milhões para reformar 388 escolas
Dilma nomeia Pepe Vargas para questões agrárias
Nova briga opõe governo e indústria

JORNAL DO COMMERCIO (PE)
Fifa suspende a visita ao Estado
Professor do Recife vai receber acima do piso
Desenvolvimento Agrário tem novo ministro
Sem qualificação

O que pensa a mídia - editoriais dos principais jornais do Brasil

http://www2.pps.org.br/2005/index.asp?opcao=editoriais

Quando cumprir a lei é um dilema

Congresso agora diz que prazo de 14 dias é pequeno para examinar casos de urgência

Isabel Braga, Cristiane Jungblut

O recuo do Supremo Tribunal Federal (STF), confirmando a legalidade das medidas provisórias em vigor, não acabou com o mal-estar e a confusão no Congresso. Há dúvidas sobre como cumprir, de agora em diante, a exigência constitucional de criar uma comissão especial com deputados e senadores para analisar, em 14 dias, as medidas provisórias, antes de elas irem para votação nos plenários da Câmara e do Senado. O próprio presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), reclamou ontem. Disse que o Supremo desconsiderou o fator político no debate e na aprovação das medidas provisórias.

Segundo Maia, a aprovação de medidas provisórias é influenciada por questões políticas, como a demora causada pela obstrução da oposição e até do governo, em alguns casos. A série de dúvidas deverá levar à retomada da discussão da chamada PEC das MPs, apresentada pelo presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), já aprovada naquela Casa e em tramitação na Câmara. Mas essa proposta, que acaba com a polêmica comissão mista especial para analisar medidas provisórias, sofre resistências na Câmara. Os deputados temem perder poder, e o Palácio do Planalto não gostou dos prazos estabelecidos para que uma medida provisória perca a eficácia, caso não seja votada.

"STF desconsiderou questão política"

Ao comentar a decisão do Supremo, Maia repetiu várias vezes que o tribunal não levou em conta o debate político e que se ateve a prazos. Na discussão de uma MP, os parlamentares negociam, até mesmo com o governo, possíveis mudanças no texto.

- Ainda há um certa incompreensão sobre o rito das MPs nas Casas. É uma questão política, não é regimental. Não votamos as MPs, muitas vezes, porque a oposição não deixa. As MPs são um instrumento de debate político. O Supremo desconsiderou a questão política. As MPs são usadas para pressionar o governo - criticou Maia. - É óbvio que a decisão (do STF) interfere nesse debate.

Apesar de elogiar o recuo do STF em relação às MPs antigas - que não terão sua legalidade questionada porque foram aprovadas sem a instalação das comissões mistas -, Maia demonstrou contrariedade. Disse que o prazo de 14 dias estabelecido por resolução que disciplina o trâmite das MPs na comissão mista, - e que nunca foi obedecido - pode ser insuficiente:

- Que bom que houve o recuo (da anulação das MPs aprovadas fora do rito). Causaria muita insegurança jurídica. Na decisão tomada, ficaram lacunas: como poderemos obrigar os deputados a participarem das comissões mistas e decidirem em 14 dias? O problema não é de regra e prazos, é político e vai continuar acontecendo! O regramento é claro e não há necessidade de alterar o rito das MPs. A comissão mista terá 14 dias para emitir um parecer único. Depois disso, ele será votado no plenário da Câmara e, depois, no do Senado. A Constituição estabelece as regras gerais, e a resolução determina os prazos. Serei um lutador para que a resolução seja cumprida em sua integralidade. Desmonta a tese de que não há regras claras na tramitação das MPs.

Nesse ponto, ficou evidente ainda a confusão dentro do Parlamento sobre a decisão do Supremo. Segundo regimentalistas da Câmara, o Supremo considerou inconstitucional a resolução número 1 do Congresso, de 2002, que dava prazo para a comissão especial se pronunciar. Isso porque o Supremo considerou que a comissão especial é obrigada a emitir parecer sobre uma medida provisória. A Constituição, no artigo 32, não fixa prazo. A decisão do Supremo, à disposição na página oficial do tribunal, é clara: o plenário do Supremo modificou a proclamação da decisão e declarou a inconstitucionalidade incidental dos artigos 5, caput, e 6, parágrafos 1 e 2, da Resolução 1/2002 do Congresso.

Nove MPs estão na pauta da Câmara

Maia sinalizou ainda que há dificuldades, entre os deputados, em acelerar a votação da proposta de emenda constitucional (PEC) que altera o rito das MPs (PEC70/2011), que já foi aprovada pelo Senado e está parada na Câmara. A PEC está na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e tem como relator o deputado Ricardo Berzoini (PT-SP), eleito recentemente presidente da comissão. Para Maia, Berzoini vai seguir o rito normal de tramitação de PECs na Câmara. Inicialmente, a PEC terá sua admissibilidade apreciada e, se passar na CCJ, o mérito terá que ser votado em comissão especial, antes de seguir ao plenário da Casa.

O líder do governo na Câmara, deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP), disse, na véspera, que poderia aumentar a pressão para se discutir a PEC, mas não mostrou animação pela proposta:

- A decisão deixou dúvidas.

O texto original de Sarney foi alterado, no próprio Senado, pelo relator Aécio Neves (PSDB-MG). Pela proposta, acaba a comissão mista especial. A admissibilidade das MPs, ou seja, se elas têm caráter de urgência e relevância, deve ser analisada pelas Comissões de Constituição e Justiça da Câmara e do Senado (CCJ). Além disso, a Câmara terá 80 dias para analisar uma medida provisória; depois, o Senado terá mais 30 dias; e ainda haverá dez dias para a Câmara reavaliar alterações feitas pelos senadores. No total, são os 120 dias de vigência de uma medida provisória.

A proposta do Senado ainda acaba com os chamados "jabutis". Determinando que uma MP só pode tratar de tema específico, sem inclusão de outros. Há nove MPS na pauta da Câmara; outras três entrarão nos próximos dias. Apesar de a decisão do STF só valer daqui para frente, o PPS vai exigir que o novo rito já seja aplicado para as MPs em tramitação na Câmara.

FONTE: O GLOBO

PPS não vai aceitar votação de MPs que não tenham passado por comissão mista

Por: Assessoria do PPS

O líder do PPS na Câmara, deputado federal Rubens Bueno (PR), anunciou nesta sexta-feira que a bancada do partido não vai participar de mais nenhuma votação de medida provisória que não tenha recebido parecer da comissão mista de deputados e senadores.

“Se não passar pela comissão mista, como determina a Constituição, não votamos. O PPS não compactuará com manobras ilegais que poderão ser questionadas no Supremo. Há anos estamos alertando que a Congresso vinha descumprindo o rito de tramitação. Agora, com o desrespeito do Legislativo e a decisão extravagante do Supremo Tribunal Federal, a situação chegou ao limite. É respeitar a Constituição e pronto”, defendeu o parlamentar.

Rubens ressalta que mesmo que o STF tenha decido “de forma inexplicável” que a regra da comissão mista só deve ser respeitada pelas MPs editadas a partir de quinta-feira, a Câmara tem a obrigação de cumprir desde já o que manda a lei.

Atualmente, 13 medidas provisórias aguardam votação na Câmara, entre elas a que reajusta para R$ 85 mil o limite do programa Minha Casa, Minha Vida para incorporações sujeitas a um regime especial de tributação, e a que abre crédito extraordinário de R$ 40 milhões para a reconstrução da base brasileira na Antártida.

Para o líder do PPS, todos os partidos representados na Casa deveriam adotar essa posição. “Já foi um vexame, em um julgamento público, o Supremo apontar que o Congresso não respeita a Constituição. O correto a partir de agora é só votar MPs que cumpram os ritos exigidos pela Constituição. Além disso, a Casa precisa começar a rejeitar os “contrabandos” incluídos nas medidas provisórias e só aceitar a análise de matérias que realmente se encaixem nos requisitos de urgência e relevância”, cobra o líder do PPS, que vai conversar com os demais líderes da oposição sobre o assunto.

PPS já pediu a Maia e Sarney retorno das MPs para comissão mista

O presidente nacional do PPS, deputado Roberto Freire (SP), já enviou ofício aos presidentes da Câmara, Marco Maia (PT), e do Senado, José Sarney (PMDB), solicitando a paralisação imediata da tramitação de todas as medidas provisórias em análise no Congresso Nacional e a remessa das matérias para a comissão mista responsável por suas análises. Freire também sugere que eles convoquem com urgência todos os líderes partidários para discutir as medidas a serem adotadas diante da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a tramitação desse tipo de matéria.

Se o pedido do presidente do PPS for aceito, todas as MPs prontas para análise dos plenários das duas Casas ficam impedidas de serem votadas até a comissão mista se reunir e dar parecer sobre cada uma delas.

“Já foi um equívoco o STF voltar atrás e dizer que a regra só vale para as novas MPs. Erro maior será o Congresso continuar desrespeitando a Constituição”, alerta Freire.

FONTE: PORTAL DO PPS

Para ministros, Supremo foi humilde e evitou crise institucional

Fux e Gilmar justificam recuo do Supremo em relação ao rito das MPs

Chico Otavio

O ministro Luiz Fux, relator do julgamento da ação de inconstitucionalidade do Instituto Chico Mendes, disse que o Supremo Tribunal Federal (STF) agiu com "patriotismo e humildade judicial" ao recuar da decisão e evitar a revisão de cerca de 500 Medidas Provisórias (MPs) que não seguiram o rito obrigatório.

Fux disse que, se o Congresso Nacional não concorda em submeter as futuras MPs a uma comissão mista formada por senadores e deputados, como o SFT decidiu, que "revogue a Constituição ou faça uma emenda":

- O que não pode é descumprir - lamentou.

Gilmar diz que decisão estimula o debate

O ministro Gilmar Mendes, também defensor do recuo, acrescentou que a comissão mista democratizará o processo e evitará a inclusão de emendas sem qualquer relação com o tema da MP, prática já condenada em decisões anteriores do Supremo.

Luiz Fux alertou que, com a decisão de quinta-feira, o Supremo não aceitará mais medidas aprovadas à revelia do Artigo 62, parágrafo 9 da Constituição, que estabelece prazo de 14 dias para a comissão mista analisar as MPs.

Em vez disso, o Congresso criou um atalho ao submeter o voto do relator da medida diretamente ao plenário, alternativa que agora passa a ser considerada inconstitucional pelo STF.

-Não tínhamos ideia que as MPs eram aprovadas assim. No primeiro julgamento, o advogado-geral da União (Luís Inácio Adams) não nos trouxe nada. Não noticiou que outras 500 leis foram aprovadas como a MP do Instituto Chico Mendes e que a declaração de sua inconstitucionalidade geraria um apagão - disse Fux.

Ao explicar que tipo de apagão o país sofreria, Fux afirmou que haveria uma avalanche de Ações Diretas de Inconstitucionalidade (Adins) no STF motivadas pelo caso do Instituto Chico Mendes. Ao recuar, segundo ele, os ministros seguiram uma doutrina americana:

- Hoje, se discute nos Estados Unidos e na Alemanha, duas referências para o Direito brasileiro, a doutrina da humildade judicial. E foi assim que o STF agiu, com patriotismo. Uma postura de preservação do país.

O ministro sustenta que, ao rediscutir uma decisão que causaria gravíssimos danos por falta de informação, o Supremo não pode ser criticado por ter voltado atrás:

- Como poderíamos presumir que o Congresso não vinha cumprindo a Constituição? O Supremo foi grandioso ao evitar que o país mergulhasse numa crise constitucional.

Para Gilmar, se a primeira decisão prevalecesse, com o entendimento de que só as MPs levadas à comissão serão válidas a partir de agora, "nem em 2025" o Congresso terminaria a revisão das 500 medidas aprovadas anteriormente.

Gilmar disse que, além de estimular o debate e evitar "a medida ônibus, onde cabe tudo", a comissão mista reduz ainda o que chama de superpoderes dos relatores:

- O processo agora será público, terá registro, análise da admissibilidade e debate aberto. Não ficará concentrado nas mãos dos relatores.

Fux concorda:

- Vamos ter um jogo político verdadeiro. O que estava acontecendo até então não tinha o menor sentido.

FONTE: O GLOBO

Mudança de decisões do Supremo pode causar instabilidade social :: Joaquim Falcão

O Supremo Tribunal Federal levou quatro anos para decidir se o Instituto Chico Mendes era constitucional. Decidiu que não. Menos de um dia depois, mudou. Decidiu que é constitucional. Isso é bom ou ruim para o país?

Uns acham que foi bom. A decisão provocaria efeito dominó. Anularia cerca de 400 leis aprovadas, inclusive a que fixa o salário mínimo. Todos teriam as vidas afetadas.

Outros acham que não. Argumentam que o STF aumentou a insegurança jurídica da sociedade. Imaginem se tribunais mudassem de ideia a cada dez horas, reavaliando, com argumentos fora dos autos, as consequências da decisão? O STF errou e tentou corrigir o erro.

Quais as consequências quando o Supremo erra? Primeiro, deixa claro para todos que, ao contrário do que dizem alguns de seus ministros, é sensível sim a pressões políticas, sociais e econômicas. Sobretudo, como no caso, quando estão certas.

Segundo, o STF com o mesmo artigo e com o mesmo fato pode decidir que sim e que não. Sua interpretação varia. A corte faz política também.

Corrigir erros e atualizar as decisões é bom. O ministro Carlos Alberto Direito (1942-2009) dizia que jurisprudência existe para ser mudada. O problema é como se muda. Não é a primeira vez que a corte tenta reabrir uma decisão. Na famosa discussão entre Joaquim Barbosa e Gilmar Mendes, o problema foi este.

O risco é o STF, a longo prazo, em vez de ser um fator de estabilidade, ser de instabilidade. A volatilidade decisória traz instabilidade social.

Duas perguntas: como o Congresso aprova 400 leis sem obedecer as regras que a lei manda? A origem desse acidente foi a reiterada desobediência do Congresso às próprias leis. Como, depois de levar quatro anos para julgar, o STF não avalia as consequências de sua decisão? Ninguém alertou os ministros do efeito dominó?

Tudo indica que algo precisa ser mudado. Mais coordenação e debate prévio, respeitoso e construtivo entre os ministros parece necessário. Sobretudo no STF dividido, onde ministros divergem em público, por meio da mídia, opinando sobre quase tudo.

Esse foi um acidente. Não deverá se repetir. Mas traz em si alguns alertas. Não basta Judiciário e Legislativo deterem o poder de fazer e interpretar leis. É preciso exercê-lo com prudência e dentro dos limites da lei.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Hora de acabar com a farra das MPs – Editorial: O Globo

Não é usual a mais alta Corte da Justiça voltar atrás num veredicto de inconstitucionalidade. Mas, da maneira como aconteceu, poderia ser previsível. O curto-circuito ocorreu no julgamento da medida provisória de criação do Instituto Chico Mendes, emitida e aprovada sem cumprir ritos legais, daí ter sido suspensa pelo Supremo Tribunal Federal, na quarta-feira. Mas poderia acontecer em qualquer outro julgamento semelhante, tamanho o acúmulo de irregularidades acumuladas há muito tempo na edição e tramitação de medidas provisórias.

Constatado o tamanho do problema institucional criado pelo veredicto, com o surgimento de uma enorme zona de insegurança jurídica, não houve saída a não ser o recuo. Por oito a um, o Supremo determinou ao Congresso fazer o rito processual correto de aprovação da MP do Instituto, e, por sete a dois, teve de estabelecer que a decisão passaria a valer apenas para medidas provisórias editadas a partir de quinta-feira. De então para a frente, precisarão ser admitidas por comissão especial mista de senadores e deputados.

Se assim não decidisse o Supremo, 560 medidas provisórias poderiam ter o mesmo destino, e com os seus efeitos revogados, algo impensável. Seriam atingidas MPs de todos os governos, desde o de José Sarney. Da administração Fernando Henrique, por exemplo, a que fixou o salário mínimo de 2002. Na Era Lula, o Bolsa Família poderia ser revogado, e o mesmo aconteceria com Minha Casa, Minha Vida.

Embora espantoso, o recuo do Supremo tem respaldo em lei federal (9.868, de 1999), cujo artigo 27 faculta a Corte a "restringir efeitos" de declarações de inconstitucionalidade caso haja "razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social". É o caso.

Passado o susto, é tratar de aproveitá-lo para se moralizar o uso de MPs. Filho legítimo do decreto-lei da ditadura militar, o instrumento surgiu na Constituição de 1988 para o Executivo não perder agilidade administrativa na redemocratização. A intenção foi desvirtuada, e a medida provisória se converteu em instrumento de uso excessivo e também descabido, como são as MPs "árvore de Natal", cheias de penduricalhos diversos, sobre vários assuntos sem relação entre si, uma indiscutível ilegalidade.

No plano político mais amplo, a MP passou a servir para o Executivo avançar sobre espaços institucionais do Congresso. O Planalto começou também a legislar, de baixo para cima, sem pruridos. Lula, que na oposição abria fogo contra a emissão de MPs por Fernando Henrique Cardoso, editou 419 delas, nos dois mandatos, contra 365 nos também oito anos de poder do adversário tucano.

A tentação de governar sem o Congresso é grande no Brasil. E o próprio Legislativo ajuda, na sua leniência. Até os generais demonstraram mais pudor no manejo de decretos-lei do que governos civis nas medidas provisórias.

A culpa é democratizada nesta crise, como declarou o ex-ministro e ex-presidente do STF Nelson Jobim: presidentes do Senado, líderes de governos no Congresso e ministros de articulação política. Tem-se de aproveitar o momento e trabalhar para o Congresso deixar de ser cartório carimbador de decisões do Executivo. Já aprovada no Senado, está na Câmara proposta de emenda constitucional do senador José Sarney, com algum disciplinamento na apreciação de MPs no Congresso. É preciso recolocá-la em discussão.

Dilma demite ministro do PT por deficiência

A presidente Dilma demitiu o ministro do Desenvolvimento Agrário, Afonso Florence (PT). Ela estava insatisfeita com a lentidão da reforma agrária. Ele será substituído pelo deputado Pepe Vargas, também do PT. Florense é o 12º titular a deixar a Esplanada.

Má avaliação derruba 12º ministro de Dilma

Afonso Florence (Desenvolvimento Agrário) caiu devido ao entendimento do Planalto de que ele produziu resultados "pífios"

Substituto será o deputado Pepe Vargas (PT-RS), que afirmou ter sido convidado para o cargo na quarta-feira

BRASÍLIA - O governo anunciou ontem que o deputado Pepe Vargas (PT-RS) será o novo ministro do Desenvolvimento Agrário, em substituição ao também petista Afonso Florence, 12º titular a deixar a Esplanada dos Ministérios no mandato de Dilma Rousseff.

Apesar de, em nota, a presidente ter agradecido aos "inestimáveis serviços" de Florence, ela estava insatisfeita com o rendimento do baiano, que há meses constava da lista de ministros que perderiam o cargo.

Florence produziu resultados considerados pífios por grupos de sem-terra, que têm historicamente influência nesse setor do governo.

A maior crítica era em relação à lentidão da reforma agrária no ano passado.

Em fevereiro, a Folha revelou que a expansão do programa foi a pior desde ao menos 1995, com menos de 22 mil famílias assentadas.

Segundo membros dessas organizações, o maior defeito de Florence era desconhecer a área em que atuava.

Outro programa cuja baixa velocidade Dilma chegou a criticar é o Terra Legal, que tenta regularizar milhões de hectares na Amazônia.

Um bom rendimento da pasta é essencial para que a presidente possa cumprir sua promessa de erradicar a pobreza extrema até 2014.

Isso porque boa parte das ações do Brasil sem Miséria, criado para executar o objetivo, é tocado pelo ministério.

A Folha não conseguiu falar ontem com Florence. Assim como o antecessor, o novo ministro é da Democracia Socialista, corrente minoritária do PT que chefia a pasta há anos.

À Folha, Pepe Vargas disse que foi chamado para o cargo na quarta.

Segundo ele, seu conhecimento da área agrária vem de quando foi prefeito de Caxias do Sul por oito anos.

Paulo Ferreira, ex-tesoureiro do PT, vai assumir a vaga deixada por Vargas na Câmara dos Deputados.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Planalto não quer Palocci na campanha

Catia Seabra

BRASÍLIA - O Planalto desestimulou a participação de Antonio Palocci na campanha de Fernando Haddad em SP.

A Folha revelou que o prefeito de Osasco, Emidio de Souza, foi sondado para ser tesoureiro da campanha por sua proximidade com Palocci, que o recomendaria aos doadores.
Após a revelação, integrantes do governo procuraram dirigentes do PT para desencorajar a operação por receio de que isso venha a prejudicar Haddad.

Este negou que Palocci tenha sido indicado e disse que não sondou Emidio.

Do lado tucano, José Serra sondou dois aliados do governador Geraldo Alckmin para a tesouraria: o presidente da Imprensa Oficial, Marcos Monteiro, e o diretor de serviços da CPOS, Felipe Sigollo. Isso seria um sinal do apoio de Alckmin à sua campanha.

Colaborou Uirá Machado, de São Paulo

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

PDT entra no governo Alckmin e se afasta do PT

Paulo Gama

SÃO PAULO - O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), empossou ontem o pedetista Carlos Ortiz na Secretaria do Trabalho. O evento, marcado por críticas ao governo federal, sela a entrada do PDT no governo paulista e chancela seu afastamento da órbita petista na disputa municipal.

Aliado do PT nas eleições de 2008 e de 2010 em São Paulo, o PDT pretende lançar na disputa deste ano o deputado federal Paulo Pereira da Silva, o Paulinho da Força.

A candidatura do pedetista é vista com bons olhos por tucanos. Seria uma maneira de siglas aliadas ao governo federal, como o PSB, abandonarem a candidatura do petista Fernando Haddad sem se unirem formalmente ao PSDB -o que reduziria o custo político de não seguir a orientação do Planalto.

Paulinho, que preside a Força Sindical e o PDT-SP, participou da cerimônia. Sentou-se no palanque ao lado de Alckmin e do ex-governador José Serra, pré-candidato do PSDB à prefeitura.

Em seu discurso, o pedetista criticou o governo de Dilma Rousseff por demonstrar "pouco empenho" na defesa dos trabalhadores.

Serra minimizou o efeito eleitoral da nomeação, mas disse que existe uma "ligação amistosa" entre PDT e PSDB.

Ortiz substitui Davi Zaia (PPS), que assumirá a Secretaria de Gestão.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Haddad pode perder apoio do PC do B, que negocia com PMDB

A crise na base aliada que o governo Dilma Rousseff enfrenta deve provocar baixas na campanha do petista Fernando Haddad à Prefeitura de São Paulo. Depois de PDT e PR, o PC do B, o mais tradicional aliado do PT, ameaça fechar aliança com o PMDB, do deputado Gabriel Chalita.

PC do B ameaça petistas em São Paulo e negocia apoio à candidatura de Chalita

Fernando Gallo, Julia Duailibi

A crise na base aliada que o governo federal enfrenta no Congresso passou a respingar na campanha do pré-candidato petista Fernando Haddad à Prefeitura de São Paulo. Depois do PDT e do PR, agora o PC do B, o mais tradicional aliado do PT nas disputas paulistanas, ameaça fechar uma aliança com o PMDB, do deputado Gabriel Chalita.

Líderes do PC do B foram procurados há cerca de 10 dias pelo vice-presidente Michel Temer, principal articulador da pré-candidatura de Chalita, para conversar sobre a sucessão. Temer se encontrou recentemente com o presidente nacional do PC do B, Renato Rabelo, e com o ex-ministro do Esporte Orlando Silva.

"Até duas semanas atrás era um namorico, agora está virando namoro sério", diz um comunista, elevando a pressão sobre o PT, num momento em que a costura das alianças em favor de Haddad patina com a ausência do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva das articulações - o petista postergou a volta ao cenário político após diagnóstico de pneumonia semana passada.

Assim como os demais partidos da base aliada de Dilma Rousseff, o PC do B reclama do tratamento dado pelo PT. Afirma não conseguir emplacar indicados em cargos na Esplanada e diz não ver contrapartida na relação com a sigla aliada, já que lançará candidatos em 10 capitais, mas não tem garantia de que terá o apoio do PT em nenhuma delas. Além disso, a sigla ainda guarda a mágoa da demissão de Orlando Silva do ministério por suspeitas de fraudes e desvios de recursos a ONGs conveniadas à pasta.

O flerte do PC do B com o PMDB agrava a situação na campanha de Haddad, que assiste a uma rebelião dos potenciais aliados que podem garantir ao petista tempo de TV na propaganda eleitoral gratuita. Oficialmente, o PC do B mantém a pré-candidatura do vereador Netinho de Paula à Prefeitura paulistana.

Cotado para indicar o vice do petista, o PR se recusa a fechar o apoio até que o governo troque o titular do Ministério dos Transportes. O PDT também quer emplacar novo nome na pasta do Trabalho e, assim como o PSB, ameaça ir para a órbita do PSDB.

Sinais. Enquanto os comunistas veem falta de "jogo de cintura" do PT em negociações eleitorais pelo País, Temer deu sinais de que o PMDB pode apoiar a candidatura do senador Inácio Arruda (PC do B-CE) em Fortaleza e, mais importante para o PC do B, desistir de se aliar à reeleição de José Fortunati (PDT) em Porto Alegre. Lançaria Ibsen Pinheiro como candidato, beneficiando, assim, a candidatura da deputada Manuela D"Ávila (PC do B-RS).

A direção comunista hoje avalia que, a se concretizar a sinalização feita pelo vice-presidente, o apoio à candidatura de Chalita seria mais provável do que à de Haddad. "Não é possível que o PT não possa apoiar uma candidatura nossa nem em Macapá", esbraveja um dirigente.

Apesar da aproximação do PC do B com o PMDB, os petistas dizem que haverá solução para o impasse com o aliado, que desde 1988 apoia o PT em São Paulo. O PT sinaliza ceder em pelo menos uma capital: Florianópolis.

Além de Netinho, Inácio Arruda e Manuela D"Ávila, o PC do B tem outras sete candidaturas colocadas em capitais. Por decisão da direção nacional, elas serão mantidas até o fim deste mês, quando o partido fará uma reavaliação do quadro eleitoral.

"O PC do B tem uma resolução que diz que até o fim de março mantém 10 candidaturas nas capitais. Não adianta fazer nada agora", diz o presidente do PT paulistano, vereador Antonio Donato. "Mas não tem canal obstruído." Procurado, o presidente nacional do PT, Rui Falcão, disse que não poderia atender.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Favorito na prévia, Serra já comanda as costuras com o PDT

Pré-candidato do PSDB participou ontem, no Bandeirantes, da posse de secretário filiado ao partido da base de Dilma

Bruno Boghossian

O ex-governador José Serra assumiu as negociações com o PDT para a formação de uma aliança em torno de sua pré-candidatura à Prefeitura de São Paulo. O partido ganhou ontem uma vaga no secretariado do governador Geraldo Alckmin, mas a equipe de Serra acredita que precisará se empenhar para fazer com que a sigla desista de sua candidatura própria para apoiar o PSDB.

Serra participou ontem da posse do novo secretário do Trabalho do Estado, Carlos Ortiz (PDT). Sua presença foi uma tentativa de demonstrar prestígio à legenda e a seu presidente, o deputado Paulo Pereira da Silva, o Paulinho da Força.

O PDT, que integra a base de Dilma Rousseff em Brasília, tem manifestado convicção sobre o lançamento do nome de Paulinho à Prefeitura da capital paulista. O espaço aberto na secretaria estadual ao PDT precede a pré-candidatura de Serra e foi uma tentativa de atrair o partido para apoiar a reeleição de Alckmin em 2014 - sem vínculo com a eleição municipal.

"(A posse de Ortiz na secretaria) não tem relação com a questão da eleição de 2012. Nós já tínhamos conversado com o PDT em janeiro", declarou Alckmin.

A entrada de Serra no circuito é uma tentativa de abrir uma segunda frente de negociações com os pedetistas. Apesar do discurso firme de Paulinho, a equipe tucana não desistiu de uma aliança com o PDT em favor de Serra. Eles cogitam ceder espaço ao partido na equipe de campanha ou em uma eventual gestão do PSDB em São Paulo.

Ligação amistosa. No evento de ontem, Serra adotou discrição mas fez um aceno aos trabalhistas. "(A possibilidade de uma aliança) é um assunto não ligado a essa secretaria. Mas uma ligação amistosa com o PDT existe", disse o ex-governador.

Em público, ele nega que tenha assumido negociações com líderes partidários e as atribui a aliados, como o prefeito Gilberto Kassab (PSD). No entanto, desde sua entrada na disputa Serra manteve contatos com os presidentes do PPS, Roberto Freire, e do PV, José Luiz Penna.

Trabalhando desde já para fortalecer o apoio ao ex-governador, sua equipe pretende manter as conversas partidárias nos bastidores até a prévia do PSDB, no dia 25. Entende-se, na equipe, que anunciar acordos seria sinal de "arrogância" do ex-governador e ex-prefeito.

Moderação. Alckmin não quis comentar o comportamento de seu secretário de Energia, José Aníbal, na campanha da prévia do partido. Ele havia pedido ao pré-candidato que moderasse as críticas a Serra. "A prévia do dia 25 é um respeito a toda a nossa militância, que dará enorme legitimidade a quem for escolhido", limitou-se a dizer Alckmin.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

PV ensaia apoio ao tucano, mas mantém pré-candidatura

Bruno Boghossian

O PV está próximo de fechar apoio à candidatura de José Serra à Prefeitura. Em uma reunião marcada para segunda-feira, os líderes paulistas do partido devem aprovar uma aliança pela eleição do tucano, mas querem esperar a prévia do PSDB antes de formalizar o acordo.

Antes da entrada de Serra na disputa, o PV mantinha planos de lançar a candidatura de Eduardo Jorge ou procurar o PPS para uma coligação. Os verdes, no entanto, devem seguir o caminho trilhado pelo prefeito Gilberto Kassab (PSD), que apoia a candidatura do ex-governador.

Serra começou a negociar há cerca de dez dias, em jantar com o presidente do PV, José Luiz Penna. Anteontem, dois vereadores do PV lhe declararam apoio formal, com aval de Penna. Oficialmente, o partido mantém Jorge na disputa, mas admite que a candidatura Serra "interessa à sociedade e à política do País".

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Recife: Oposição avalia tese da “tríplice aliança”

RECIFE - DEM, PMDB e PPS estudam a possibilidade de se unirem em torno de uma só candidatura para a sucessão de João da Costa. PSDB não abre mão de lançar Daniel Coelho

Débora Duque

Com a candidatura do deputado estadual Daniel Coelho (PSDB) à Prefeitura do Recife sendo encarada como um fato consumado, a via encontrada pelo DEM, PMDB e PPS para não perder o protagonismo na disputa é a formação de uma tríplice aliança. O acordo ainda não foi selado. Mas, em que pese as variáveis políticas que podem contribuir ou não para o fechamento do grupo, os líderes dos três partidos demonstram simpatia pela estratégia sugerida pelo ex-governador Gustavo Krause (DEM).

A começar pelo deputado federal e também prefeiturável Mendonça Filho (DEM), que considera que as legendas (DEM, PMDB e PPS) estão “afinadas”. “Não há acordo porque isso pressupõe algo já celebrado, mas existe uma disposição dos três partidos de marcharem juntos”, reconhece. A avaliação do democrata tem o respaldo de Raul Jungmann (PPS) – o JC tentou contato com Raul Henry (PMDB) mas não obteve retorno – que referendou a “disposição” para a união do trio, apesar das pendências que podem travar o processo.

Uma delas é o fato de o próprio Henry ainda não ter batido o martelo sobre intenção de disputar a Prefeitura, pela segunda vez. O peemedebista tem confessado a interlocutores que está à espera de uma sinalização de apoio – político e, principalmente, financeiro – da Executiva nacional do partido para definir se colocará o time em campo. Enquanto isso não acontece, o acordo entre as três legendas permanecerá em banho-maria.

Até porque somente após essa definição, seria possível escolher o candidato capaz de representar o grupo. A avaliação interna é de que o posto de vice não deve ser ocupado por nenhum dos três.

Ao mesmo tempo em que aposta na tríplice aliança, o DEM tem se articulado nacionalmente para atrair o apoio do PSDB às suas postulações, tanto no Recife como em Salvador, em troca da adesão a José Serra (PSDB) em São Paulo. O assunto, segundo Mendonça, é tratado pela cúpula nacional do partido. “Não estou me envolvendo nisso”, desconversou. Presidente nacional do PSDB, Sérgio Guerra confirmou o diálogo, mas disse que a disputa no Recife não está em questão e que o partido já lançou seu candidato, Daniel Coelho. “O que esperamos é o apoio das outras legendas ao nosso candidato, como já fizemos em eleições anteriores”, insistiu.

FONTE: JORNAL DO COMMERCIO (PE)

Jungmann faz advertência às oposições

Líder do PPS cobra definição até o próximo dia 30

Débora Duque

RECIFE - Em meio à indefinição a respeito do rumo que as oposições irão tomar nas eleições do Recife, o presidente estadual do PPS, Raul Jungmann, lançou ontem um ultimato com vistas a acelerar o processo. Com o ingresso do deputado estadual Daniel Coelho (PSDB) na disputa pela Prefeitura praticamente consolidado, o recado do pós-comunista se dirige aos colegas do DEM e do PMDB. Ou se bate o martelo (em um acordo), até o dia 30 deste mês, ou o PPS oficializará sua candidatura majoritária, independentemente dos demais.

A data-limite estipulada por Jungmann coincide com a vinda do presidente nacional do partido e deputado federal, Roberto Freire (PPS-SP), ao Recife. O desembarque do dirigente na capital pernambucana tem como pretexto a participação num evento partidário junto com o PMN, fiel aliado do PPS. “Esperamos que até lá, haja uma definição sobre o bloquinho. Não podemos ficar engessados, esperando o tempo passar”, avisou Jungmann.

O objetivo do pós-comunista é impedir que a definição acerca da estratégia a ser adotada pela oposição seja adiada para o mês de abril. Apesar da pressão exercida sobre os aliados, Jungmann ressalta que permanece disposto a encontrar um denominador comum aos três partidos. “Estamos completamente disponíveis, o que não dá é para ficar paralisado”, afirma. O debate sobre candidaturas no seio da oposição, no entanto, deve permanecer em “banho-maria”. Tanto Mendonça Filho (DEM) como Raul Henry viajaram, ontem, para Nova York e Boston (EUA), respectivamente, e só retornam no final da semana que vem.

Pré-campanha com Soninha Francine

Numa demonstração de que pretende capitalizar ao máximo sua condição de pré-candidato, Raul Jungmann traz ao Recife outro pré-candidato, só que à Prefeitura de São Paulo. Soninha Francine (PPS), ex-vereadora da capital paulista, participará, amanhã, de um evento interno do PPS com todos os prefeituráveis e postulantes a mandatos legislativos no Estado, filiados ao PPS.

O objetivo da reunião será garantir a adesão de todos ao programa Cidades Sustentáveis, idealizado pelo Instituo Ethos e uma das bandeiras de Soninha. “Todos os nossos candidatos irão assumir o compromisso de apresentar ações de preservação do meio ambiente e de sustentabilidade”, explicou Jungmann.

Antes do encontro – marcado para às 15h, no Sindicato da Polícia Federal –, Jungmann acompanhará a correligionária num passeio pelo rio Capibaribe e, posteriormente, num almoço no mercado da Boa Vista, onde pretende conversar com alguns transeuntes sobre os problemas da cidade.

FONTE: JORNAL DO COMMERCIO (PE)

Elis Regina - Águas de março (Tom Jobim)

Armênio Guedes: Março. PCB, 90 anos: só para não esquecer – 2

Deixo aqui para os leitores o perfil de Armênio Guedes, um lindo homem. (publicado na Folha Ilustíssima.

Foi um século fantástico

Aos 92 anos, Armênio Guedes espera duas biografias e uma indenização de R$ 1,4 mi

Quem costuma ir aos concertos da Sala São Paulo tem grande chance de encontrá-lo no mezanino superior, na última fileira. Armênio Guedes é um homem miúdo, calvo, o corpo já curvo, de gestos econômicos e elegância discreta.

Aos 92 anos, o último dos figurões do velho Partido Comunista Brasileiro -além de Oscar Niemeyer- não chama especialmente a atenção, durante o intervalo, caminhando a passo lento em meio a tantos casais. E, no entanto, é uma figura central no pensamento democrático brasileiro.

Por ele, José Serra, que o conheceu no exílio chileno, foi capaz de deixar seu gabinete de governador para ir pessoalmente à gravação do “Roda Viva”, na TV Cultura, prevendo que o amigo ficaria nervoso, desacostumado com os holofotes. “Ele sabe que eu gosto dele e do seu jeito de ser e de pensar”, diz Serra. “E eu sei que ele me aprova, concorda com o que faço no atacado, mesmo à distância. Sempre foi assim desde que convivemos por alguns anos no exílio.”

Não está só. O velho comunista tem, entre seus admiradores, políticos de variadas matizes da esquerda, muitos dos jornalistas que dirigem as principais redações do país e alguns de seus principais intelectuais.

Conviveu com muitos deles, seja quando militava no Partidão nas décadas de 40 e 50, seja no exílio, durante a ditadura, ou após deixar o PCB, na década de 80. Um deles notou jamais ter conhecido alguém que não gostasse de Armênio. “Se existe um ser humano que deu certo, foi Armênio Guedes”, resume o historiador Ivan Alves Filho.

FAMÍLIA - Armênio Guedes nasceu em Mucugê (BA), em 1918 (“um ano depois da Revolução Russa”, como gosta de frisar), no seio de uma família de 11 irmãos cujo pai, lapidário, se preocupava com a educação dos filhos. Para isso foram a Salvador e ali, coisa raríssima naqueles dias, quase todos fizeram curso superior. Foi ali também que Armênio vibrou pela primeira vez com a política.

O pai comprara um aparelho de rádio e, à noite, muitos vizinhos se reuniam para ouvir as notícias sobre a Revolução de 1930. Entrou para o PCB pouco depois de ingressar na Faculdade de Direito da Bahia, em 1935. “Era a época da frente mundial contra o fascismo”, lembra. “Eu participei daquilo.”

Setenta e cinco anos depois, em 20 de julho deste ano:

-O que você não esperava que tivesse acontecido?

- O fim da União Soviética. Que ia desmoronar daquele jeito.

- O que é ser comunista hoje?

- Uma pessoa de cultura socialista, também antifascista, internacionalista, contra a xenofobia, pela melhoria da situação do povo. Uma pessoa impregnada desses valores que só podem se desenvolver na democracia.

TEIMOSO - Armênio Guedes está ao volante do seu Honda 99, dirigindo com zelo pelo centro de São Paulo. É teimoso, faz questão de levar a repórter e outro acompanhante de carona até um ponto melhor para cada um, mesmo que seja fora do seu trajeto de volta para o apartamento onde mora, em Higienópolis.

No encontro com a repórter, em julho, ao volante do seu carro, não teve dúvidas: “Olha, se precisar de um carro emprestado é só falar, eu empresto”. Era a terceira vez que a encontrava.

Antes, na segunda vez, preocupado em chegar atrasado à entrevista no seu apartamento, avisou que deixaria a chave na portaria. O Armênio é assim.

“Tenho um ódio disso!”, diz, meio brincando, meio séria, a mulher, Cecília. “Tenho medo de ele ser enganado, mas ele não é uma pessoa enganável. Não é burro, de jeito nenhum. Ele empresta dinheiro pra as pessoas, ajuda o cara que foi torturado e ficou sem dente, paga o dentista…”

Não é sempre que ele se perde no caminho, pelo contrário. Faz questão de guiar seu carro todos os dias para o trabalho – no escritório da Imprensa Oficial, onde edita uma agenda cultural. Leva a mulher, Cecília, 26 anos mais jovem, aonde ela precisar.

Vai conversando, sua principal arte: “Foi um século fantástico, esse. Vi a coletivização da agricultura na União Soviética, a ascensão do fascismo, a Segunda Guerra Mundial, o franquismo na Espanha, aqui no Brasil o Estado Novo, a ditadura…”.

Armênio ingressou para o núcleo do partido em 1943, quando ajudou a organizar a histórica Conferência da Mantiqueira, que decidiu pelo apoio a Getúlio Vargas na guerra. Nunca mais saiu, mas permaneceu a maior parte do tempo como suplente por causa de suas posturas “liberais”, em busca de alianças e do caminho político (“a arte do possível”, costuma lembrar). Foi membro efetivo do Comitê Central apenas entre 1975 e 1980.

PRESTES - Em quase tudo, sua atuação foi antagônica à do imponente Luís Carlos Prestes – que entrou na história com alarde, à frente da coluna batizada com seu nome.
Já Armênio foi marcando sua passagem aos poucos, escutando, conversando, um “comunista sem pressa”, como foi descrito certa vez: “Não se pode conseguir hegemonia à força”, ensina.

Não que fossem inimigos; houve até um período de amizade, lembrado com carinho. Quando Prestes foi libertado, em 1945, Armênio tornou-se seu secretário, indo morar com ele numa casa próxima ao largo do Machado, no Rio. “Ele tinha passado esses anos todos segregado, então tinha necessidade de falar, falar, fazia sabatinas todo dia. E em casa, conosco, ele falava muito, sobre a coluna, sobre a vida dele na União Soviética. Fiquei muito ligado a ele.”

Armênio estava presente quando Prestes soube da morte da mulher, Olga Benário, e quando conheceu a filha Anita Leocádia. “Eu era da segurança dele, apesar de ser um intelectual franzino. Eu era tão magro que o revólver escorregava para dentro da calça. Era uma farsa”, ri.

Mas havia pontos de discórdia. Enquanto Prestes sempre foi um fiel seguidor das diretrizes do PC soviético e da ortodoxia marxista, Armênio sempre teve uma “intuição” democrática.

Um dos documentos que mais se orgulha de ter escrito é a resolução do Comitê Estadual da Guanabara, de março de 1970, quase um ano e meio após o Ato Institucional nº 5. A resolução foi um dos primeiros documentos a condenar a luta armada e a defender a aliança com o MDB, então único partido de oposição consentida -estratégia que seria bem- sucedida.“A figura que mais influiu na orientação política do partido durante várias décadas foi exatamente ele”, diz o ex-deputado pecebista Marco Antônio Coelho.

A cisão alargou-se. “Em política, Prestes era um comandante militar. Foi um militar de muito talento, muito criativo. Mas acho que não foi um político talentoso”, avalia Armênio. No último encontro com Prestes, em 1983, nem uma palavra. “Era o velório do Gregório Bezerra. Ele chegou ali, apertou a mão de todo mundo, não me olhou. Eu também não olhei. Quer dizer, olhei, vi que não ia falar comigo, eu também não me dirigi a ele. Ele era assim, firme.”

MILITÂNCIA - Em 50 anos, dedicou-se tanto à militância que, se fosse escrever uma autobiografia, dividiria os capítulos de acordo com as fases do partido. Quando saiu do PCB, em 1983, passara menos de quatro anos na legalidade.

No início, quando se mudou para São Paulo, em 1947, ainda pôde tomar o vapor com seu próprio documento, mesmo com o partido na ilegalidade; não havia um sistema de segurança nacional que cruzasse dados, coisa que seria aprimorada na ditadura militar. No final daquela década, sofreu um processo, a perseguição apertou.

Foi por ali que conheceu sua primeira mulher, Zuleika Alambert. “Quando fomos morar juntos, nosso casamento foi aprovado pelo Marighella”, lembra.

Em 1968, com o AI-5, cada um precisou ir para um lado: Zuleika em casa de amigas, ele pingando de casa em casa. “Nos primeiros meses, chegava umas seis da tarde, eu pensava: ‘Onde eu vou dormir?’ Tinha a casa da minha tia, tinha a casa do fulano… Eu simplesmente não sabia pra onde ir.”

Às vezes, os dois passavam meses sem se ver. Nunca puderam ter filhos.

Armênio teve muitos nomes e muitos passaportes: foi “Marcos”, “André”, “Vítor”. Hoje até se confunde.

Em Paris, onde viveu entre 1973 e 1980, o nome do passaporte era Lásaro Feitosa Alexandre, mas, na comunidade, era conhecido como “Júlio, representante do Partidão”. Foi lá que conheceu Cecília, sua segunda mulher, que até hoje o chama de “Júlio”.

Hoje o nonagenário tem uma casa confortável e uma indenização mensal que lhe dá um bom padrão de vida. É a primeira vez em uma vida de apertos. Abriu a primeira conta bancária aos 64 anos. Próximo dos 70, ainda morava numa quitinete.

-O que mais te marcou na clandestinidade?

-Viver na casa dos outros. Me relacionar bem com as pessoas. Eu aprendi muito o valor da solidariedade… E observava também, fazia tudo para não ser uma carga, não comprometer as pessoas que me davam guarida e também não desorganizar a vida deles. Acordava bem cedo, antes deles, para não atrapalhar e eles não notarem minha presença.

LIVROS - Agora sua trajetória começa a ser recontada em dois livros. Desde o final de 2009, o jornalista Sandro Vaia, ex-diretor de Redação de “O Estado de S. Paulo”, está fazendo uma longa série de entrevistas para uma biografia, a pedido da editora Barcarolla.

A outra, escrita pelo amigo Mauro Malin, começou a ser elaborada em 1980, mas só agora ganha forma. “Eu, no começo, não queria, não, mas se eles querem tanto, eu conto”, diz Armênio.

“Na verdade, acho que ele foi um comunista por acaso”, arrisca Sandro Vaia. “Ele vai ficar bravo comigo, mas é isso. Era um momento histórico no Brasil, em que estar no PCB era símbolo dos melhores valores da época. Se o comunismo virou o que virou, isso não diminui as pessoas, porque era um valor humanista.”

Vaia, que está longe de ser um simpatizante da ideologia, quer entender por que Armênio se manteve no partido por tanto tempo. “É uma questão metafísica.”

Já a outra biografia está sendo escrita por um simpatizante, o historiador Mauro Malin, que conhece Armênio desde o exílio em Paris. O projeto, que estava parado, foi retomado a pedido de Serra. Ventilou-se a possibilidade de sair pela Imprensa Oficial. Agora está sem editora definida.

Ao lado de Leandro Konder, Milton Temer e Carlos Nelson Coutinho, Malin fez parte do grupo que se formou em Paris em torno de Armênio, defendendo a democracia não como meio, mas como fim da luta pelo socialismo. Mantinham contato com o PC francês e PC italiano de Enrico Berlinguer.

“EUROCOMUNISTAS" - A direção do PCB rapidamente nos desqualificou como ‘eurocomunistas’”, lembra Carlos Nelson. “Armênio, com seu agudo senso de humor, dizia que éramos, na verdade, ‘neurocomunistas’.” Até hoje alguns dos amigos do grupo se reúnem todo mês, na casa do cineasta Zelito Viana, no Rio.

Com o mesmo carinho com que sempre ouviu as histórias alheias, agora Armênio cuida de recontar a sua. Revisa cuidadosamente os esboços escritos por Malin e chegou a ligar mais de uma vez para esta repórter, pedindo para não deixar de fora um detalhe, para excluir outro.

Só depois de muita insistência topou contar, hesitante, a história do copo que guarda na sua cristaleira, um pequeno vaso arredondado, de cristal: “Roubei na datcha do Stálin, numa reunião do Comitê Central, em 74. Eu estava em Paris, mas o Comitê Central se reunia em Moscou, né?”. A Datcha Kuntsevo era a casa de veraneio em que Stálin morou nas duas últimas décadas da sua vida, nos arredores de Moscou. “Ele recebia os amigos, tomava sua vodca… Eu tava lá na casa, abri a cristaleira, tirei e guardei. Pra ter uma lembrança daquele lugar.”

IRMÃO - Nas entrevistas, raramente entra num tom mais pessoal. Aprendeu a ser discreto e quase invisível na clandestinidade, sob muitos nomes, em casas que ninguém sabia onde ficavam. Suas diversas narrativas parecem sempre seguir um mesmo roteiro, aquele que ele escolheu – a história do partido.
Pouco fala da maior tristeza da sua vida, causada justamente por um vacilo do Comitê Central: a morte do irmão mais novo, Célio, durante a ditadura. “Meu irmão era dessas coragens de que a gente tem medo. Ele dizia: se eu for preso eu não vou ser torturado, vou partir com uma violência tamanha pra cima dos torturadores”.

Celito também dedicou boa parte da vida ao partido. “Ele era um ponto de apoio para a direção. Foi ele que levou o Prestes para sair do Brasil, em 1970.”

Em agosto de 1972, o irmão tinha ido buscar um militante que trazia dinheiro da URSS. A polícia sabia da empreitada, e o Comando Central sabia que a polícia sabia. Mas manteve a ordem. “Eles não precisavam mandar ele fazer isso”, lamenta o irmão.

Presos na fronteira, os dois foram levados para o 1º Distrito Naval do Rio, onde Célio morreu em 15 de agosto de 1972. Teria “se jogado” do sexto andar, segundo a versão oficial. “Ele se sentiu culpado da morte do irmão. Mas não tem culpa nisso”, diz Cecília. Na volta ao Brasil, Armênio tentou abrir um processo pela morte de Celito no PCB.

AVULSO - Sentia-se cada vez mais isolado no partido, avesso a alianças e apegado ao centralismo: o novo Comitê Central, sob Giocondo Dias, tampouco se mostrava inclinado à democracia.

Armênio acabaria saindo após uma demonstração de autoritarismo. Em 1983, foi chamado a dar explicações por ter contado a um colega que ele estaria sofrendo processo de expulsão. Um puxão de orelha. Saiu da sede e jamais voltou. Nunca mais entrou em partido nenhum. Tornou-se um “comunista avulso”, diz.

Não é bem assim: ele segue sendo um interlocutor para muitos políticos. “Seja José Serra ou Dilma Rousseff, o processo histórico de uma revolução passiva, de uma modernização do país, vai se dar”, dizia, durante a campanha eleitoral. “Não que eu ache que dá no mesmo. Acho o Serra muito mais capaz. Mas, na realidade, a diferença entre esses partidos é tão grande. Talvez, quem sabe no futuro, venham a ser um partido só, um partido social-democrata brasileiro realmente forte.”

Nos últimos anos, Armênio tem se reaproximado do PPS por iniciativa do presidente Roberto Freire. Até hoje mantém a amizade com os que constituíram o “Grupo de Armênio”, embora sejam de variados partidos: Ivan Alves Filho trabalha na Fundação Astrojildo Pereira, do PPS; Carlos Nelson Coutinho é do PSOL, assim como Milton Temer. Aloysio Nunes Ferreira, recém-eleito senador pelo PSDB, também era do grupo: “Armênio é uma espécie de superego meu em matéria de política”.

GAZETA - Quando saiu do partido, Armênio foi ser jornalista. Levado por companheiros do Partidão, foi trabalhar na revista “IstoÉ” e depois fez longa carreira na “Gazeta Mercantil”. Entrou já septuagenário e ficou lá por 17 anos. Editava a página de Opinião, secretariava a Redação e foi editorialista. “O primeiro emprego de carteira assinada dele foi lá”, diz Roberto Müller Filho: “É um grande jornalista”.

Quando a “Gazeta Mercantil” começou a se desmilinguir, ele se manteve firme. Foram anos sem receber em dia até que veio uma decisão trabalhista do novo dono, Nelson Tanure -um dos poucos contra quem Armênio não hesita em praguejar- que acabaria provocando sua demissão, em 15 de março de 2005. Tinha 87 anos.

“Foi muito difícil, desarticulou a vida dele”, lembra Cecília. Na Justiça, o final melancólico virou processo e pode, quem sabe, render uma riqueza tardia: Armênio está a um passo de ficar milionário.

O primeiro processo, já julgado, lhe confere uma indenização de R$ 1.405.135,21. O outro aguarda julgamento, mas deve superar os R$ 2 milhões. “Vai sair em um ou dois anos” diz, confiante, o advogado Wladimir Durães.

CORAÇÃO - Aos olhos da mulher, Armênio envelheceu há poucos anos. Tem poucos problemas de saúde; na semana passada, uma dor forte no peito o levou ao hospital. Foi internado, examinado, e a conclusão é que não tem nada de errado no coração do velho comunista.

Ele só agora começa a brigar com a memória. Faz ginástica, continua lendo (grande parte do apartamento é forrada de livros), come pouco e bem. É difícil encontrá-lo sozinho em casa sem que esteja ouvindo música clássica ou jazz.

Casaram-se no final de 2007. Assim, ele garante que a sua aposentadoria vá para ela. “Vou morrer antes dela, certamente. Uns três ou quatro anos de vida aí, se tiver. Eu trabalho com cem anos, que eu chegue aos cem. Assim mesmo é daqui a oito anos…”

Extrovertida e enérgica, Cecília esmera-se em planejar belas viagens e aniversários marcantes. Quando ele fez 90, organizou uma festa-surpresa: “Eu não sabia se o Armênio ia viver mais, entendeu? Cada ano, cada aniversário é sempre uma incógnita”, diz ela. “Isso é uma coisa angustiante de vez em quando. Depois eu esqueço, vou trabalhar.”

Este ano, passaram dez dias em Nova York para celebrar os 92 anos, e quase um mês na Alemanha – entre o primeiro e o segundo turno da eleição, aos quais ele faz questão de comparecer. “Acho que ele merece tudo isso e muito mais. Porque ele se privou de muitos anos da vida dele em função do país”. Só agora que começam a chover pedidos de entrevistas, perfis, homenagens, conta Cecíia.

E olha para a repórter: “Ninguém conseguiu captar a essência do Armênio”.

FONTE : FOLHA ILUSTÍSSIMA, 25/12/2010

A pós-modernidade e as leis:: Merval Pereira

O estudo de dois professores americanos que mostra que a Constituição dos Estados Unidos deixou de ser um modelo na política internacional, em benefício de outros documentos, como a Constituição do Canadá ou da Lei de Direitos Humanos da África do Sul, tem provocado discussões nos meios jurídicos e chamado a atenção de constitucionalistas brasileiros para o fato de que a Constituição brasileira de 1988, tão criticada, agora parece ter as qualidades apontadas nesses novos documentos: abrange os direitos difusos, é mais específica, não deixa tanta margem a interpretações quanto a americana.

A pesquisa empreendida por David Law, da Universidade Washington, em St. Louis, e Mila Versteeg ,da Universidade de Virginia, revela, a partir de dados empíricos e estudos analíticos, a redução da influência daquela que não apenas é a primeira Constituição escrita da História da Humanidade, mas a que se encontra em vigor há mais tempo.

Em 1987, no bicentenário da Constituição americana, a revista "Time" calculou que, dos 170 países existentes então, mais de 160 escreveram seus documentos constitucionais tendo por modelo, direta ou indiretamente, a Carta americana. Hoje, 25 anos depois, o modelo americano parece estar perdendo a atração, diz o estudo de Law e Mila, que será publicado em junho pela "Revista de Direito" da Universidade de Nova York.

Os dois classificaram e estudaram 729 constituições adotadas por 188 países, de 1946 a 2006, e constataram a perda de prestígio, por razões que vão desde ser a Constituição americana curta e superficial até o fato de garantir poucos direitos específicos, especialmente por ser um documento de 1787 que não abrange questões hoje fundamentais para as sociedades pós-modernas.

Mila me disse por e-mail que estudou com algum detalhamento a Constituição brasileira, que faz parte de sua base de dados sobre o assunto.

Utilizando o mesmo critério de análise que usaram para a Constituição americana, os professores se debruçaram sobre a Constituição brasileira, e Mila diz que a Constituinte de 1988 fez com que momentaneamente nossa Carta parecesse menos semelhante às demais.

Mas, nos anos seguintes, as constituições mundiais se tornaram mais parecidas com a brasileira, tendo inclusive sido identificada uma tendência semelhante com a Carta do Canadá de 1983.

Esse fato sugere, diz Mila, que a brasileira pode de fato ter se tornado modelo para outras mais recentes, embora seja difícil traçar linha direta de causalidade nesses casos.

Dois constitucionalistas brasileiros, Luís Roberto Barroso, professor titular de Direito Constitucional da Uerj, e Gustavo Binenbojm, professor adjunto da Faculdade de Direito da Uerj, analisaram essa relativa perda de influência da Carta americana e a proeminência de documentos constitucionais modernos que tratam mais especificamente de direitos difusos e garantias individuais dos cidadãos.

Barroso concorda com a tese e considera que a Corte Constitucional alemã, que teve papel decisivo no reerguimento moral germânico, foi a primeira grande concorrente da Suprema Corte americana.

Os aliados, vencedores da Segunda Guerra, impuseram à Alemanha Ocidental uma Constituição democrática da qual constava um rol amplo de direitos fundamentais (maior e mais explícito do que o da Constituição Americana, ressalta Barroso) e, sobretudo, a previsão de criação de um tribunal constitucional cujo papel era controlar os excessos e desvios do processo político e proteger os direitos fundamentais.

Interpretando o princípio da dignidade da pessoa humana e outras cláusulas constitucionais, o Tribunal Constitucional Federal alemão foi granjeando prestígio nacional e internacional, aproximando-se paulatinamente do prestígio desfrutado pela Suprema Corte Americana, atesta.

Barroso destaca também que a Suprema Corte do Canadá começou a ganhar expressão a partir da aprovação da Carta de Direitos e Liberdades, de 1982. "Desde então, é possível contabilizar inúmeras decisões importantes, proferidas por juízes intelectualmente qualificados e com menos viés político do que os da Suprema Corte Americana", diz Barroso.

Para ele, a Corte canadense tem um conjunto de decisões muito importantes envolvendo aborto, descriminalização de drogas, suicídio assistido, criminalização da pornografia infantil, ilegitimidade de manifestações antissemitas.

Barroso diz que não seria correto pôr a Corte Constitucional sul-africana como uma influência mundial. Algumas decisões da Corte, porém, em matéria de direitos sociais - acesso a habitação e água - tornaram-se emblemáticas.

Gustavo Binenbojm concorda em que há, no meio acadêmico internacional, voz corrente que aponta para o declínio da outrora mítica e influente Constituição dos Estados Unidos da América como modelo para as democracias constitucionais mundo afora.

Os motivos mais evidentes, segundo ele, têm a ver com circunstâncias históricas. Em vigor há 225 anos e tendo sido emendada apenas 27 vezes, o texto da Carta americana, em sua linguagem e seu espírito, já exibe os sinais da passagem do tempo, diz Binenbojm.

"Em alguns casos, a definição de alguns direitos e institutos jurídicos é simplesmente antiquada, merecendo atualização", sinaliza, ressaltando que há trechos extremamente lacônicos e vagos, gerando incerteza e insegurança jurídica.

Em outros casos, o problema é mesmo de concepção filosófica, claramente datada e dirigida a um mundo que não mais existe. "Disposições como a que assegura o direito de guardar e carregar armas, que tem similar apenas no México e na Guatemala, parecem fora de moda". Além disso, ampla gama de novos direitos, como os atinentes a minorias de gênero, orientação sexual ou origem étnica, ao meio ambiente e aos consumidores, para citar alguns exemplos, não foram e nem poderiam ter sido originalmente contemplados, mas tampouco foram acrescentados por via de emendas", lembra Binenbojm.

Outra dificuldade apresentada pela Constituição americana é seu complexo e dificultoso processo de reforma. "Assim, outras Constituições ou declarações de direitos, mais atualizadas em termos jurídico-ideológicos e vernaculares, acabaram por exercer o papel paradigmático antes desempenhado pela Constituição de 1787", analisa Binenbojm.

(Amanhã, a experiência brasileira)

FONTE: O GLOBO

Constituição provisória :: Fernando Rodrigues

O Supremo Tribunal Federal cometeu uma de suas maiores lambanças nesta semana. Na quarta-feira, pronunciou inconstitucional a forma como foi aprovada a medida provisória que havia criado o ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade). No dia seguinte, revogou sua decisão por clara pressão política e por vislumbrar consequências devastadoras na estrutura jurídica do país.

Não é novidade nem é proibido o STF mudar de opinião. Às vezes é até bom, e alguns ministros usam um eufemismo ao votar de maneira diferente. "Eu não mudei. Evolui", já me disse um deles. Mas chamou a atenção agora a velocidade com que a decisão foi reformada.

Para resumir, na quarta-feira o STF achou que o Congresso desrespeitou a Constituição ao não submeter as medidas provisórias a uma comissão mista de senadores e deputados. A regra existe desde 2001. Por consequência do julgamento, a MP do Instituto Chico Mendes tornou-se inconstitucional.

No dia seguinte, notou-se o óbvio: se a MP do Instituto Chico Mendes foi aprovada de forma inconstitucional, todas as outras cerca de 500 MPs editadas desde 2001 também passariam a ser irregulares. Ou seja, o Brasil em breve seria alvo de um tsunami de ações judiciais contestando leis vigentes.

Aí o STF enveredou por um caminho perigoso. Declarou ser constitucional o que foi, de fato, inconstitucional de 2001 para cá. O recuo se deu, em tese, para evitar instabilidade jurídica. Só que os magistrados determinaram também que, daqui para a frente, o Congresso deverá mudar seu ritual e votar MPs de acordo com a Carta Magna.

Tudo somado, o Supremo inaugurou uma nova era no Brasil. De 2001 até esta semana, o país teve uma espécie de "Constituição provisória". Valia pela metade. Agora, será para valer. Alguém acredita?

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Inflação ainda forte:: Celso Ming

A inflação de fevereiro medida pela evolução do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) mostra desaceleração, mas não dá para confiar em que esse ritmo seja sustentável nos próximos meses, como ontem sugeriu o presidente do BNDES, Luciano Coutinho.

O IPCA não importa não só por dar ideia de como evolui a renda real do brasileiro, mas também porque é a medida de inflação usada como referência pelo Banco Central para definir sua política monetária (política de juros).

São dois os fatores positivos nos números do IPCA de fevereiro: (1) redução das pressões do chamado núcleo de inflação, a estrutura de preços menos sujeita a grandes variações, como ocorre com os alimentos; e (2) menor índice de difusão, ou seja, os preços subiram em menor número de itens (apenas 58,2%) do que nos meses anteriores, especialmente em janeiro (64,7%).

Em compensação, a esticada dos preços dos serviços e dos preços no mercado atacadista não autoriza ninguém a se desarmar em relação ao avanço da inflação neste ano.

Dentro do cestão de preços do IPCA, os serviços têm um peso de 30%. Uma das peculiaridades do segmento é de que quase nunca pode ser substituído por artigos importados. O preço da roupa fabricada no Brasil, por exemplo (que não é serviço, mas mercadoria), não pode disparar, porque importados fazem concorrência. Isso não se dá com os preços do transporte, da escola, dos serviços pessoais (barbeiro, manicure, consultas médias). E o que se tem sobre a mesa é um avanço dos preços dos serviços de 1,25% em fevereiro (foi de 1,05% em janeiro). Em 12 meses, saltaram 9,35%, enquanto, no período, a inflação foi de 5,85% (veja o gráfico). Esse fator concorre decisivamente para manter a pressão sobre a inflação.

O avanço nos preços do atacado foi realçado ontem pelo Índice Geral de Preços do Mercado (IGP-M), como se vê no Confira. Em fevereiro, esse indicador apontou evolução negativa de preços (queda de 0,06%). Mas a primeira prévia de março já indica avanço positivo de 0,23%. Como o que acontece no atacado (cujos preços pesam 60% na cesta de preços do IGP-M) tende a se espraiar também para o varejo (custo de vida), é preciso contar com nova fonte de tensão no IPCA.

Essas observações podem parecer áridas, ainda mais num fim de semana. Mas ganham importância quando analisadas sob a ótica da política de juros do Banco Central.

Somente a desaceleração da inflação de fevereiro não chega a justificar o aumento da dose no corte dos juros decidido pelo Comitê de Política Monetária (Copom) na última quarta-feira.

Em março, abril e maio, a evolução do IPCA em 12 meses ainda deve mostrar desaceleração. No entanto, a partir de junho, a tendência de avanço para os 6,0% ao ano tende a se acentuar.

Isso significa que o governo Dilma deverá enfrentar uma puxada mais forte dos preços justamente nos meses mais próximos às eleições municipais que se realizarão em outubro, quando cresce o uso político desse indicador.

CONFIRA

No gráfico acima, a evolução do IGP-M, que embute uma alta dos preços no atacado

Fica para depois. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, avisou nesta sexta-feira que o governo não pretende enviar para o Congresso projeto de lei que altera as regras da remuneração das cadernetas. Seu argumento é de que as aplicações amarradas aos juros básicos (Selic) são mais altas que as da caderneta. Mas a verdadeira razão é política. O governo federal não quer ser acusado de confiscar a poupança às vésperas das eleições.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Sentimentos mistos:: Míriam Leitão

O dia na Europa foi de comemoração e apreensão. A Grécia atingiu o nível de adesão necessário para fechar o acordo com os credores privados e acionar a cláusula que força a minoria a concordar com os termos da troca da dívida velha por nova: 96% da dívida será trocada no maior calote da História. A Associação dos Swaps e Derivativos passou a tarde reunida e no final disse que as empresas de seguro terão que pagar certos papéis.

Por muito tempo se buscou o momento que a Grécia atingiu ontem: 75% dos bancos disseram que concordavam em receber metade, ou menos, do valor do que tinham emprestado para a Grécia. Ao chegar nesse nível, uma cláusula dos contratos dos empréstimos é automaticamente acionada, a collective action clause (cláusula de ação coletiva). Isso força o consenso, a minoria tem que concordar com a maioria. Quem ainda hesitava teve que aderir ao acordo que perdoará US$ 130 bilhões de dívida.

O acordo inteiro envolve dívida no valor total de 206 bilhões (US$ 270 bilhões), ou 87% do PIB grego. Isso é só a dívida privada. Tudo nesse caso é exorbitante. Ao todo o país deve uma Grécia e meia.

Os bancos foram empurrados para a mesa de negociação por duas forças: a Alemanha e a realidade. Quando elas se juntam é impossível resistir. A França tentou evitar, mas a presidente da Europa (sim, é isso mesmo que eu quis dizer), Angela Merkel, exigiu dos bancos uma cota de sacrifício. Por isso eles foram negociar com a Grécia. Pode-se ver daí que as expressões "adesão" ou "troca voluntária" usadas pelos negociadores, analistas, imprensa e autoridades não condizem com os fatos.

Na madrugada de ontem os gregos anunciaram que haviam atingido os 75% de adesão para a troca voluntária da velha dívida com valores reduzidos e novos prazos e termos contratuais. O nível de 75% é o ponto a partir do qual os outros têm que aceitar, e rapidamente se chegou aos 96% de adesão, ficando de fora títulos muito específicos.

Os ministros de finanças da Zona do Euro anunciaram um empréstimo de US$ 47 bilhões à Grécia. Com isso, os gregos fazem um pagamento à vista que foi negociado com os bancos. Nada ficará com a Grécia. É para entrar por uma ilha e sair por outra e ir direto para os cofres dos bancos.

Era isso que se buscava em todas essas idas e vindas dos últimos meses: que os bancos aceitassem dar um desconto à Grécia, para que a Europa emprestasse uma parte que retornasse aos bancos. Agora só falta a Grécia ser capaz de honrar o que resta da sua dívida, cumprir as metas fiscais impostas pela troica (FMI, Banco Central Europeu e Comissão Europeia). Para isso, ela precisa de crescimento econômico para aumentar suas receitas. E é exatamente isso que está cada vez mais distante. Ontem mesmo veio o anúncio de que no último trimestre do ano eles tiveram 7,5% de recessão. A Grécia está em recessão profunda. Na quinta-feira a taxa de desemprego de dezembro foi anunciada: 21%. País fraco assim não paga dívida alguma, isso sabemos nós aqui desde os anos 1980.

O momento de tensão começou quando se reuniu a Associação Internacional dos Swaps e Derivativos. Horas depois ela saiu com o veredito: como alguns bancos foram forçados a entrar no acordo, então eles podem exigir o pagamento do seguro que compraram para se proteger exatamente do risco de um calote grego. A dúvida era se a cláusula que força a entrada no acordo era um "evento de crédito". Se fosse classificado assim pela associação então o seguro teria que ser pago. Foi classificado assim. Quanto será pago e por quais instituições? Não se sabe ainda. Ontem, o número mais falado era US$ 3 bilhões, mas havia previsões de ser muito mais. O mercado na segunda-feira deve abrir com informações mais precisas, ou dúvidas mais agudas sobre o tamanho do custo que terá que ser pago por quem vendeu o chamado CDS (Credit Default Swap), ou mais popularmente o seguro contra o calote grego. A decisão de hoje também abre um precedente para outros acordos que possam vir a ser feitos no futuro. Os CDS terão que ser pagos. Há vários outros países com dificuldades com suas dívidas na Europa. A Grécia tem sido considerada um teste.

Além disso há o risco de que a Grécia não consiga, pelas dificuldades da sua própria economia, pagar os novos papéis que estão sendo emitidos agora para serem trocados pelos velhos títulos. São obrigações de até 32 anos. Se ela ficar no euro por esse tempo todo, se conseguir retomar o crescimento, se receber novos aportes, se cumprir as metas fiscais, a nova dívida será paga. Mas o risco de um novo calote na dívida nova não está descartado. Só que os juros que ela está sendo obrigada a se comprometer a pagar são tão altos que mesmo se ela não pagar tudo terá sido um grande negócio para os credores.

Há dúvidas sobre vários outros países. A Espanha não cumprirá a meta fiscal e precisa de mais dinheiro. Os juros exigidos de Portugal subiram fortemente nos últimos meses provando que o país é visto como o segundo da fila. A comemoração de ontem tem pouco fôlego. Há muitos outros riscos pela frente e muitos desafios para todos os europeus. A crise da Europa continua.

FONTE: O GLOBO