segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

OPINIÃO DO DIA – Hannah Arendt: o significado da política

"Quando, à luz do perigo que os acontecimentos expuseram a humanidade, nos perguntamos se a política ainda tem algum significado, estamos também levantando - em termos vagos e sem levar em conta seus vários possíveis significados – várias outras questões. As perguntas que acompanham a pergunta que foi nosso ponto de partida são: primeiro, terá a política afinal algum propósito, algum fim? E esta pergunta significa: os fins que a ação política pode buscar valem os meios que, sob certas circunstâncias, precisam ser empregados para alcançá-los? Segundo, existirão, dentro da esfera política, objetivos pelos quais podemos nos orientar com segurança? Se sim, não serão seus parâmetros totalmente ineficazes e, portanto, utópicos? Será que todo empreendimento político, uma vez colocado em movimento, não deixa de se importar com objetivos e parâmetros e passa a seguir o curso que lhe é inerente, não podendo ser detido por nada fora dele? Terceiro, não será característico da ação política, pelo menos em nossa época ser destituída de quaisquer princípios, de modo que, em vez de brotar das muitas fontes possíveis de comunidade humana e se alimentar dessas profundidades, ela se aferra oportunísticamente e à superfície dos acontecimentos cotidianos e se deixa jogar em várias direções, de modo que o que se alardeia hoje sempre contradiz diretamente o que aconteceu na véspera? Não terá a ação chegado ao absurdo e enterrado os princípios, ou fontes, que um dia talvez a tenham colocado em movimento?"

Hannah Arendt (1906-1975), filósofa alemã. “A promessa da Política”, p.260. DIFEL, Rio de Janeiro, 2008.

Manchetes de alguns dos principais jornais do Brasil

O GLOBO
Despesa de previdência supera investimentos
MST admite que está enfraquecido

FOLHA DE S. PAULO
Cuba limita tempo de dirigente
Gestão Kassab tem aprovação de um quinto dos eleitores
Inquérito do CNJ revela sumiço de computadores

O ESTADO DE S. PAULO
Sete em cada 10 projetos de habitação ficam só no papel
Governo pagou R$ 4,6 milhões por assessoria a estatal extinta
Doenças parasitárias serão tratadas em massa
Anac cria licença provisória para novos pilotos

VALOR ECONÔMICO
Empresas tentam reduzir endividamento excessivo
Anvisa dá força a genéricos de uso hospitalar
Fed levanta dúvida sobre suas metas
Um freio na importação de orgânicos
Com privatizações, Dilma quebra tabu no PT

CORREIO BRAZILIENSE
Em Havana, Dilma anunciará ajuda de US$ 70 milhões para pequenos agricultores

ESTADO DE MINAS
PF na penúria
Obras públicas: Projetos de Minas estão na fila federal

ZERO HORA (RS)
Crédito para a compra de imóveis cresce 20%
Abertura: Cuba define reformas no regime
Meninos condenados: Ministra prepara plano de socorro

JORNAL DO COMMERCIO (PE)
Mais gente na revisão do INSS

O que pensa a mídia - editoriais dos principais jornais do Brasil

http://www2.pps.org.br/2005/index.asp?opcao=editoriais

Conselho a Cabral:: Ricardo Noblat

"(O desmoronamento) podia ter tido dimensões mais graves se tivesse ocorrido horas antes." (Cabral, pouco inspirado)

Por pouco uma tragédia não surpreendeu o governador Sérgio Cabral fora do estado ou do país. Cabral voou a Paris no dia 19, retornando no dia 24, véspera da queda de três prédios no Centro do Rio. A pergunta que não quer calar: por que Cabral viaja tanto ao exterior? É por que a maioria de suas viagens quase sempre é cercada de mistério?

Não, Cabral não tem o dom de abortar tragédias com a sua simples presença. Dele não se cobraria tamanho prodígio. De resto, manual algum recomenda que o bom governante esteja sempre por perto quando ocorrer uma tragédia. Ou que visite de imediato o local onde ainda se recolhe mortos e feridos.

Lula fazia questão de manter distância de desastres de qualquer porte. Não pôs os pés, por exemplo, em São Paulo quando ali se espatifou no dia 17 de julho de 2007 o Airbus A-320 da TAM, matando as 187 pessoas que transportava e mais 12 em solo. Na ocasião, o comandante da Aeronáutica foi a São Paulo representando Lula.

Eis a questão de fato mais relevante neste momento: em uma democracia, o cidadão tem o direito de saber o que fazem com o seu dinheiro recolhido por meio de impostos. É uma fatia desse dinheiro que paga os frequentes deslocamentos de Cabral e de sua comitiva. Logo, tudo que tenha a ver com o assunto nos interessa. Ou deveria interessar.

Se Cabral viaja ou viajou de graça à custa de empresários amigos, isso também importa - e como! É direito do cidadão conhecer todos os aspectos do comportamento dos seus governantes para poder avaliá-los e fazer suas escolhas. O homem público não tem vida privada, sinto muito. Se quiser ter, que abdique da condição de homem público.

A deputada Clarissa Garotinho (PR) pediu à Assembleia Legislativa do Rio que levantasse todas as informações pertinentes às viagens de Cabral. Queria saber quantas vezes ele viajou desde que se elegeu governador, na companhia de quem, se em voo comercial ou particular e os custos de cada viagem.

O pedido da deputada foi recusado por Paulo Melo (PMDB), presidente da Assembleia e aliado de Cabral, sob o pretexto de que o assunto é da órbita federal. Então o deputado Garotinho fez pedido idêntico à Câmara dos Deputados. Rose de Freitas (PMDB-ES), vice-presidente, rejeitou-o. Decretou que o assunto é da órbita estadual.

Não é. Na verdade, os que podem dispor das informações requisitadas por Garotinho filha e pai são a Polícia Federal e a Secretaria de Aviação Civil da Presidência da República. À Secretaria se vinculam a Agência Nacional de Aviação Civil e a Infraero, que administra os 66 aeroportos brasileiros.

Garotinho recorreu da decisão de Rose à direção da Câmara, mas perdeu. Então, apelou à Justiça. Seu apelo, hoje, repousa empoeirado, à sombra de alguma toga. Uma sugestão: por que Cabral não abre espontaneamente a caixa-preta de suas viagens para mostrar que ali nada se esconde de podre?

Esse Maia...

Na semana passada, Marco Maia (PT-RS), presidente da Câmara dos Deputados, substituto de Dilma depois do vice Michel Temer, voou de Porto Alegre a Brasília e de lá à Alemanha em viagem particular. E secreta. Tão secreta que não avisou a parentes. E não transferiu o cargo para a primeira vice-presidente da Câmara, a deputada Rose de Freitas (PMDB-ES), como manda a lei. Poucos assessores ficaram sabendo que o chefe deixara o país. Quem por acaso lhe telefonou quando ele estava na Alemanha chegou a se enganar, pensando que estivesse em Brasília. Maia apronta cada uma... No ano passado, aprontou uma viagem a Madri só para assistir a um jogo de futebol.

FONTE: O GLOBO

Questão de decoro:: Melchiades Filho

Para uma presidente que busca ser vista como decidida, impressiona a hesitação de Dilma em assumir posições públicas.

Não se trata só da escassez de entrevistas, mas de desapreço geral por justificar medidas, defender políticas e sustentar pontos de vista.

Os exemplos se acumulam neste início de ano, bem no momento em que os elevados índices de aprovação permitiriam ao governo enveredar por uma trilha de afirmação.

Soube-se que Dilma considerou "barbárie" a operação policial que tirou 6.000 pessoas de casa em São José dos Campos. A indignação, porém, ficou intramuros. A presidente até esteve em São Paulo, mas para sorrir diante das câmeras ao lado do neoaliado Gilberto Kassab.

Ela não fala sobre as violações aos direitos humanos em Cuba, que visitará amanhã -segundo o chanceler, o tema "não é emergencial".

Não fala sobre os integrantes ou a vocação da Comissão da Verdade, à espera de instalação para pesquisar crimes cometidos na ditadura.

Não fala sobre o projeto que limitaria as possibilidades de aborto legal, publicado pelo governo em silêncio e em silêncio reescrito.

Por que houve mudança nas cúpulas da Petrobras e do Banco do Brasil? Por que não saíram os diretores da Caixa envolvidos em fraudes zilionárias? E como Mário Negromonte ainda continua ministro das Cidades? Dilma não explica.

O porta-voz mudou, mas a estrutura de comunicação do Planalto permanece montada para não comunicar. Oficialmente, do palácio saem apenas platitudes e propaganda. Os ministros se pelam de medo de falar, isso quando têm noção do que se passa pela cabeça da chefe.

O contraponto radical ao antecessor loquaz compromete o desejo dilmista de servir de inspiração às brasileiras. Atola a administração em boatos tolos e informações inexatas, empobrece o debate público e sugere uma certa covardia.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

O orgulho de nossos Estados:: Renato Janine Ribeiro

Há um traço curioso na sociedade brasileira: a maior parte das pessoas se orgulha de seus Estados. Num passado recente, passamos por um período de sérias crises econômicas e políticas, no qual se alternavam o orgulho e a vergonha de ser brasileiro. Ele findou graças em parte ao fim da inflação (governo FHC) e em parte ao avanço da inclusão social (governo Lula). Orgulhávamo-nos do país no futebol e nos envergonhávamos da inflação e muitas outras mazelas, a começar pela corrupção que, aliás, disputa com a miséria o título de maior vergonha nacional. Mas esse movimento ciclotímico, como era chamado, reduziu-se. Com a estabilidade monetária e os avanços sociais, ficamos mais estáveis em nossa nacionalidade, que hoje vivemos melhor do que na fase de inflação recrudescida, digamos, os quinze anos de 1979 a 1994. Tivemos um forte pessimismo em relação ao Brasil. Mas o curioso é que mesmo nos períodos máximos de instabilidade em escala nacional, no plano que os militares denominavam "psicossocial" (palavra que felizmente sumiu do vocabulário!) não foi ameaçado esse orgulho de que falei acima - um orgulho estadual. O Brasil podia gerar otimismo ou, em maior dose, pessimismo, a partir de suas realizações ou fracassos, mas os Estados passavam - e passam - incólumes por seu sucesso ou insucesso. Gostamos deles como são.

Isso é ainda mais curioso porque os Estados significam pouco, do ponto de vista do poder, num país cada vez menos federalista e mais unitário. Na verdade, a tradição que a colônia nos legou foi a da autonomia dos municípios, não das - então - capitanias. Pouco após a independência, foram criadas assembleias legislativas nas províncias, mas o poder executivo, nelas, era exercido por nomeação do governo sediado na Corte. Só com a República tivemos autonomia dos Estados - e, por razões difíceis de entender, talvez por importação de costumes norte-americanos, talvez para se contrapor ao centralismo imperial, ela foi exagerada. Basta ler o que Erico Veríssimo escreve sobre as guerras civis gaúchas da República Velha: enquanto tropas de um lado e outro se matam, as guarnições federais permanecem neutras. Hoje, é impossível imaginar que haja uma rebelião contra um governador e o Exército apenas assista, impassível, aos combates.

Desde 1930, vemos um gradual mas constante fortalecimento do poder federal às custas dos Estados. Nos períodos ditatoriais, com Getúlio Vargas ou sob o regime militar, obviamente foram afastados os governantes estaduais que divergissem do poder central. Mas mesmo nos períodos democráticos, como o que vivemos ininterruptamente desde 1985, as competências dos Estados diminuem. Enquanto o controle central se exercia, nas ditaduras, pela força, hoje ele passa pelo papel predominante da política econômica. Esta é competência da União, e determina quase tudo o que se pode fazer na Federação. Daí que a situação dos Estados se torne paradoxal. Por um lado, ser governador ou senador é importante. Aliás, uns e outros, escolhidos em eleições majoritárias, costumam trocar de posições. O Senado é uma casa de ex- ou futuros governadores - ou, pelo menos, eles assim se veem. Não é fortuito que o Senado seja tão mais importante que a Câmara. Lá, os Estados ou seus imaginários futuros ou passados governantes falam alto.

Mas, por outro lado, no poder legislativo brasileiro, haverá órgão menos importante do que as assembleias estaduais, justamente as únicas que portam "legislativo" no nome mas, estranhamente, têm menos assuntos para regular sob forma de lei? O Congresso legisla sobre praticamente todos os assuntos. As Câmaras Municipais decidem o plano diretor e podem regular qualquer tema que afete a vida cotidiana, o que é muita coisa. Aos deputados estaduais, pouco resta. Algumas assembleias fazem esforços enormes de imaginação para ocupar um espaço político. É digno de nota que a assembleia do Rio de Janeiro seja, das 28 que há no Brasil, a que maior presença tem; realiza eventos e até dispõe de uma sigla conhecida de todos os fluminenses, Alerj. Nos demais Estados, a sigla é só para iniciados; no Rio, todos sabem o que é. É curioso que a popularidade da Alerj - onde foram, em junho de 2011, se manifestar os bombeiros revoltados contra o governo local - subsista embora o governador, como mostrou o "Valor", tenha reduzido a oposição a menos de 15% das cadeiras. A Câmara Distrital de Brasília é outra exceção, pois soma às competências estaduais as municipais e por isso conta com muitos assuntos para legislar. É só. Um vereador de capital perde em importância ao se tornar deputado estadual, a não ser que mostre, como os verdes Carlos Minc e Aspásia Camargo (não por acaso, ambos verdes, ambos do Rio), muita criatividade.

Então, por que o orgulho? Um Estado como o Rio Grande do Sul, que há anos enfrenta uma crise econômica e fiscal, é um dos mais altivos quanto a seu modo de ser. E eu, que já estive em praticamente todas as Unidades da Federação, senti em todas elas o orgulho de sua comida, de seu falar, de sua alegria - ou de sua seriedade. Evidentemente, há quem não compartilhe esse orgulho, mas falo de um sentimento majoritário. O curioso é que esse nativismo tardio mal tenha tradução política. É um fenômeno social forte, mas que não resulta em união pelo Estado, em posição única ante os problemas que enfrente, em nada disso - salvo em casos extremos, como o dos royalties que alguns Estados recebem pelo petróleo no mar. Por que será? Será justamente porque, do Estado, não esperamos política econômica e então podemos ser, gostosamente, bairristas?

Renato Janine Ribeiro é professor titular de ética e filosofia política na Universidade de São Paulo.

FONTE: VALOR ECONÔMICO

Educar:: Aécio Neves

Vamos deixar de lado, por um instante, aquilo que a educação no Brasil tem de números, numa matemática cruel que pouco soma e muito subtrai -um dos piores cenários da exclusão social no âmbito da nossa sociedade. E falar de outro tipo de deficit educacional: o deficit da qualidade.

Não existe, sabemos, a menor possibilidade de uma nação figurar entre as grandes do mundo -e esta é uma justa e viável aspiração do povo brasileiro- se os bancos escolares não servirem de ponto de partida para o nascimento de cidadãos plenos, bem informados e academicamente preparados. Mas também cidadãos donos de suas próprias ideias e convicções, resultado de um esforço coletivo aluno-professor-instituição que vá muito além das demandas do mercado de trabalho.

Trato desse tema hoje e escolho essas palavras para fazer uma homenagem ao escritor Bartolomeu Campos de Queirós, falecido neste mês.

Reconhecido internacionalmente, reverenciado em Minas Gerais e respeitado por tantos autores nacionais, Bartô -permitam-me o afeto da amizade- dedicou sua inteligência apurada e sua militância sensível às causas da educação e da literatura.

"O homem é feito de real e de ideal", dizia ele, no depoimento que acompanhou o manifesto fundador do Instituto Brasil Literário, organização não governamental cuja causa ele abraçou com dedicação. Sendo assim, prosseguia, a educação não pode se contentar em informar o que já foi feito e, sim, abrir a porta para a imaginação e a fantasia.

Se a escola é o lugar da transformação, e não somente o da informação, não há como aceitar a redução dos currículos à acumulação estatística de saberes específicos.

Ao liberar o direito de todos de criar, recriar, imaginar e romper o limite do provável- dizia ele- a educação estará exercendo o imprescindível dom da democratização.

Em lugar de impor dogmas, cabe fermentar, no cultivo da dúvida e da inquietação, o direito cidadão de firmar sua trajetória cultural e intelectual. Refletir deixa de ser, assim, um privilégio de classe.

Aprendemos muito com pessoas como Bartolomeu. Ele estava convencido de que a literatura poderia ser o grau zero para o profícuo estímulo da imaginação criadora.

Dirão os céticos: tudo isso é romântico demais quando se trata de reparar, já, agora, deficiências bem pragmáticas no ensino brasileiro.

As prioridades cobram atitudes imediatas, é verdade. Mas que qualquer iniciativa se assente em base humanista, sem desprezar a dimensão que a educação encerra de valores fundamentais ao ser humano.

Como disse nosso escritor: "A gente só suporta o dia de hoje porque tem uma perspectiva do amanhã".

Aécio Neves, senador (PSDB-MG)

FONTE. FOLHA DE S. PAULO

Quadro chocante :: Paulo Brossard

Quem semanalmente pelo jornal se dirige a pessoas que não vê e por elas não é visto, em regra, se ocupa com temas atuais; digo em regra porque pode haver assuntos antigos que, por um motivo ou outro, terão atualidade; dolorosa atualidade é o que não falta ao sucedido no coração do Rio, a alguns metros da Avenida Rio Branco, nas imediações do Theatro Municipal, onde três edifícios, um deles de vários andares, ruíram em minutos, virando destroços; ainda bem que, pela hora, pouco depois das 20h, eram poucas as pessoas que neles ainda se encontravam; foi a razão pela qual o número de vítimas não foi o que seria esperável se a triste ocorrência se desse três ou quatro horas antes.

Não falando nas mortes e nos danos de toda ordem envolvendo alto número de pessoas, o que ressalta é o grau de insegurança que acompanha os que vivem no centro de uma metrópole; se se tratasse de uma calamidade natural, como ocorreu na região serrana do Rio, seria explicável, na medida em que o fenômeno transcendia forças humanas, mas o ruir de prédios em uma noite estival, sem deixar de ser superiores à providência comum dos homens, surgiu de repente como se fosse um fenômeno da natureza e o concreto armado transformou-se em pó.

Nem se diga que os prédios que se desfizeram em minutos fossem cortiços escapados da ação do prefeito Pereira Passos, faz mais de século. Enfim, todas as considerações são inócuas diante das dimensões humanas e sociais tristemente acumuladas e basta notar as repercussões internacionais da incrível e penosa catástrofe. Em verdade, os fatos estão a indicar que a presumida segurança pode converter-se em insegurança onde menos se espera.

Outro fato, de natureza distinta, mas de efeitos envolventes de significativa população, vem atingindo expressiva faixa do Rio Grande do Sul. Culturas permanentes, pastagens, lavouras diversas foram destruídas pela seca. Basta dizer que tamanhos prejuízos já consumados nessas regiões do sul do Estado fazem com que o Rio Grande de 2012 venha a ser diferente do vivido em 2011. Investimentos perdidos, trabalho perdido. É verdade que, semana finda, choveu na área 20 minutos em média. Ou seja, boa, mas obviamente insuficiente em relação à sua carência. Segundo informações de oitiva, teria chovido entre 18 e 22 milímetros. Se voltar a chover tempestivamente, o que ainda não foi efetivamente perdido pode ser parcialmente recuperado. Em poucas palavras, e com base em dados empíricos, este o panorama.

Por falar em tempo, Assis Brasil dizia que o clima do Rio Grande era anárquico. Mas, voltando à seca atual, que já causou danos irreparáveis, repito, é de ser registrado que as secas no nosso chão são cíclicas, umas mais ou menos danosas que nos flagelam no rigor do verão chegando às vezes à boca do inverno. A maior que vi foi a que, tendo começado em outubro de 1942, só terminou no outono de 1943, abril ou maio. Quer dizer, finda a seca desmedida, o inverno estava a chegar. Quem viu, não esquece, ainda que decorridos 70 anos. Talvez por isso desde muito adquiri verdadeira ideia fixa referente a aguadas, açudes onde seja possível fazê-los. Convenhamos, porém, que isso já não interessa ao leitor. Apenas para encerrar, a seca atual não se compara à de 42-43, não só pela maior extensão espacial desta, como de sua duração, dado que não chega a ser consolo para ninguém.

*Jurista, ministro aposentado do STF

FONTE: ZERO HORA (RS)

A boa consciência da França:: Luiz Carlos Bresser-Pereira

Reconhecer como genocídio morte de armênios é obra de políticos oportunistas para agradar a cidadãos

Como compreender a decisão do Parlamento francês de definir algo que aconteceu há quase um século como genocídio dos armênios pelos turcos?

Do ponto de vista político, não faz sentido para a França um conflito com a Turquia -o mais importante país do Oriente Médio e uma potência emergente. Por que, então, esse testemunho oficial sobre algo que aconteceu, mas que hoje nada tem a ver com a França?

Só encontro uma explicação: trata-se de uma manifestação de "boa consciência" de uma França imperial para com seus cidadãos, que são homens e mulheres dotados de elevados princípios morais.

O que significa "boa consciência" nesse caso? Infelizmente, nada de bom. A dominação, o império, as muitas formas de exploração precisam sempre de boa consciência.

Precisam de boas razões morais para seus atos, ou, quando é impossível, exibir para todos sua consciência moral, neste segundo caso configurando-se a boa consciência.

A França, como Reino Unido e EUA, precisa dela porque seu livro de violência imperial com os povos da periferia e, em particular, com o Oriente Médio é longo e tenebroso.

Até a Segunda Guerra, esse imperialismo se manifestou por meio do sistema colonial.

Quando os povos da região lograram sua independência, o imperialismo francês e de seus associados ricos manifestou-se pontualmente pela guerra e, em geral, por meio do "soft power" -conselhos, ameaças e pressões sobre elites locais geralmente aliadas e corruptas.

O prontuário da França nessa matéria no Oriente Médio é lamentável, e é terrível na África. A África subsaariana é, na prática, uma colônia administrada por um banco central comum com sede em Paris.

A participação do governo francês no genocídio dos tutsis em Ruanda é algo que volta e meia é discutido na grande imprensa do país. Com grande pesar dos franceses.

Diante disso, a necessidade de boa consciência torna-se imperativa. Geralmente, ela se manifesta sob a forma de "soft power", sem conflito com os interesses nacionais do país: julgam-se os governantes dos países mais pobres pelos padrões de avanço cultural e político dos países ricos; e, com base nesse julgamento, criticam duramente como "autoritários" e "populistas" os governantes que ousam ser nacionalistas e estabelecer limites aos interesses de suas multinacionais.

Enquanto isso os ditadores amigos são amavelmente esquecidos.

Sob essa forma, a boa consciência coincide com a lógica da dominação. Ela expressa os valores da democracia ao mesmo tempo em que atende a interesses considerados nacionais.

Mas há momentos em que coisa não é tão simples. Que é preciso pensar em termos dialéticos.

Dado que os cidadãos dos países ricos são exigentes em termos de princípios democráticos e de direitos humanos, políticos oportunistas aproveitam alguns momentos para apaziguar a boa consciência dos seus cidadãos com atos "heroicos". É o que acontece com o reconhecimento de genocídio dos armênios.

Nesse caso, o preço da boa consciência é uma decisão que não serve à Armênia, ofende a Turquia e não interessa à França. Mas apazigua consciências culpadas.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Cem anos de Herivelto Martins:Trio de Ouro "Adeus, Mangueira" [Herivelto Martins, Grande Otelo]

MST admite que está enfraquecido

Joaquim Pinheiro, um dos dirigentes do MST, admite que o movimento não está conseguindo arregimentar sem-terra graças à oferta de empregos no país e aos programas sociais

Sem-terra: luta no campo sofre "descenso"

Líder do MST admite que programas sociais e emprego estão enfraquecendo mobilizações de movimento

Tatiana Farah

PORTO ALEGRE. Mais emprego e programas sociais e menos reforma agrária. Sob esse cenário, a luta no campo tem sofrido um "descenso", avalia um dos dirigentes nacionais do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Joaquim Pinheiro. Para ele, a oportunidade de emprego nas cidades e os programas sociais, como o Bolsa Família, têm apontado outro caminho para uma parcela dos sem-terra, principalmente aqueles acampados por anos à espera de uma solução do governo por um pedaço de terra no campo.

— Grande parte dessa base social, que antes era o público de reforma agrária, agora tem outras possibilidades. Inclusive, uns recebem Bolsa Família, uns já estão com possibilidade de emprego na cidade.

Segundo Pinheiro, a desmobilização não atinge apenas o MST, mas os outros movimentos sociais brasileiros. Ele negou que seja um processo de cooptação do governo.

— Estamos vivendo uma espécie de descenso desse processo de mobilização e procuramos entender o que está ocorrendo. Isso é fruto de alguns projetos sociais que o governo tem feito. Não é cooptação dessa base social. Apoiamos esses projetos, porque o governo tem a obrigação de atender essas famílias. Mas queremos um programa de desenvolvimento para que as famílias não fiquem reféns desses projetos sociais.

"Se o MST não fizer ocupações, deixa de existir"

Segundo Pinheiro, apesar de ter "bons interlocutores" no Planalto, o MST não deu uma trégua à presidente Dilma. Ele afirmou que as ocupações continuam e que os sem-terra planejam o chamado "abril vermelho", mês de ocupações em massa pelo país.

— Temos feito várias mobilizações para sensibilizar o governo. Fizemos uma marcha, no ano passado, e ocupações de terra em todo o país. O sangue do movimento é exatamente isso, as ocupações. Se o MST não fizer ocupações, ele deixa de existir.

O "inimigo" para o MST, no entanto, é outro.

— Nosso principal inimigo, vamos tratar assim, são as grande corporações transnacionais. São elas que mandam e desmandam nos países e não só no Brasil. No dia 5 de junho, Dia Mundial do Meio Ambiente, vamos iniciar uma mobilização internacional para falar da crise do sistema capitalista — disse o líder sem-terra.

Durante o Fórum Social Temático, em Porto Alegre, o sociólogo português Boaventura de Sousa Santos, ícone da esquerda, fez um apelo público para que Dilma atendesse mais os movimentos sociais e fizesse a reforma agrária. Pinheiro concordou:

— Nunca foi feita a reforma agrária neste país. O que ocorre são assentamentos pontuais de famílias, é bom que se diga, sob forte pressão e mobilização popular.

Pinheiro afirmou ao GLOBO que o MST tem dado apoio aos sem-terra paraguaios e defendeu o assentamento de brasiguaios (brasileiros e filhos de brasileiros que vivem no Paraguai) no Brasil. Ele disse que, por meio da Via Campesina, o MST ajudou na organização desse movimento:

— São latifundiários brasileiros que são donos dessas terras no Paraguai. Somos solidários à luta dos sem-terra paraguaios contra os fazendeiros brasileiros. Mas a grande maioria dos brasiguaios é de trabalhadores rurais que foram para o Paraguai em busca de terra e não conseguiram, acabaram trabalhando nas grandes fazendas de brasileiros. São sem-terra.
Existe muita terra no Brasil e queremos que eles sejam assentados aqui.

Segundo ele, há uma tentativa de criar um conflito entre os brasiguaios sem-terra e os paraguaios:

— Querem colocar pobre para brigar contra pobre. Para nós, é uma saída equivocada.

FONTE: O GLOBO

Fórum Social Temático termina esvaziado

Poucos intelectuais estrangeiros compareceram

PORTO ALEGRE. Como uma miniatura do Fórum Social Mundial (FSM), o Fórum Social Temático (FST) terminou ontem, em Porto Alegre, com críticas à Rio+20, à esquerda e ao próprio evento, esvaziado no que se refere a intelectuais internacionais. Os seis dias de debates foram marcados por uma forte presença governamental, não só com a presidente Dilma Rousseff, mas com ministros, o governador petista Tarso Genro e o pré-candidato do PT à prefeitura, o deputado Adão Villaverde.

Poucos intelectuais, como o sociólogo português Boaventura de Sousa Santos, cruzaram o Atlântico para participar desta edição temática. Entre os brasileiros, destacaram-se os fundadores do FSM, como Chico Whitaker, Leonardo Boff e Frei Betto. Impulsionada pelo tema, a ex-senadora Marina Silva foi uma das convidadas que mais circularam pelas mesas de debates.

No sábado, os movimentos sociais, em assembleia, divulgaram um documento condenando a "economia verde" como "falsa solução" para a crise econômica global. Um dia antes, Boaventura havia afirmado que a única economia verde que interessava ao modelo capitalista era a das "verdinhas", em referência ao dólar.

FONTE: O GLOBO

Para historiador, rigor da presidente é 'pura fantasia'

Marco Antonio Villa diz que ritmo de projetos do governo deixa claro que fama de boa gestora de Dilma é só propaganda

Gabriel Manzano

A ideia de que a presidente Dilma Rousseff é uma boa gestora, como anunciam seus aliados e indicam as pesquisas de opinião, "decorre não de seus méritos, mas da baixa consciência política dos cidadãos", afirma o historiador Marco Antonio Villa, da Universidade Federal de São Carlos (Ufscar). Para ele, "não faz sentido considerar boa gestora uma presidente que está permanentemente em conflito com sua própria equipe, afastando auxiliares e, ao mesmo tempo, deixando de ir até o fim na apuração das denúncias".

Essa mistura de má gestão com alto prestígio ocorre, segundo ele, "porque o Brasil é um país que foge inteiramente dos parâmetros". A participação política dos cidadãos "é mínima e vive de espasmos, depois dos quais tudo volta logo à rotina", acrescenta. Villa entende que, à parte o ato formal de se votar em eleições, a democracia "ainda está muito longe de se consolidar no País".

Dizer que a presidente é uma grande gestora, diz ele, "é apenas mais uma invenção do PT". Sua visão do petismo é que, assim como o partido inventou a falsa ideia de que foi o primeiro partido de trabalhadores, agora inventou que Dilma é uma grande gestora. "O PT tem conseguido construir sua própria história política, porque é o partido das invenções", conclui.

Villa menciona desde iniciativas "importantíssimas" que foram para a geladeira, como o trem-bala, até projetos prioritários como a construção de creches, que praticamente não saiu do papel, além do ritmo lento do Minha Casa, Minha Vida, como "exemplos de uma gestão confusa e ineficaz", que deixam claro que "sua fama de boa gestora é só propaganda". A entrega das creches "revela, se não o desinteresse, a incapacidade do governo, e a construção de casas vai aos trancos e barrancos. Mas, do outro lado, o BNDES repassou bilhões a grandes empresas, para iniciativas nem sempre prioritárias".

O historiador descreve como "pura fantasia" a ideia de que Dilma é "muito rigorosa" nas cobranças. "Se fosse, já teríamos gente punida, e a punição tornada pública, na leva das demissões por escândalos que atingiram seis ministérios." Ao contrário, o que se viu, conclui, foram "elogios incabíveis aos demitidos" nas cerimônias de troca.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Sete em cada 10 projetos de habitação ficam só no papel

Auditoria da Controladoria Geral da União (CGU) aponta que, de cada dez contratos firmados na área de habitação popular pela Secretaria Nacional de Habitação entre 2004 e 2011, pelo menos sete não saíram do papel. Até abril de 2011 existiam 4.243 contratos na carteira da SNH, do Ministério das Cidades, envolvendo repasses de recursos para Estados e municípios, num total de R$ 12,5 bilhões. Desse total, 74% estão apenas na promessa. Os contratos fazem parte do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e tratam de casas ou melhorias em conjuntos habitacionais ou favelas. A SNH reconhece o problema e diz que projetos têm problemas de licitação, emissão de licença ambiental, regularização de terras e infraestrutura. O levantamento não inclui o Minha Casa, Minha Vida

Sete em cada dez projetos de habitação popular não saem do papel

Auditoria da CGU indica que 74% do investimento de R$ 12,5 bilhões previsto para projetos da SNH estão apenas na promessa

BRASÍLIA - Por trás do recorde de contratações feitas por programas oficiais de habitação popular nos últimos anos há também um expressivo número de obras paralisadas, atrasadas ou que simplesmente não foram iniciadas.

De cada dez contratos firmados na área da habitação pela Secretaria Nacional de Habitação (SNH) do Ministério das Cidades, envolvendo o repasse de recursos da União para Estados e municípios, pelo menos sete não saíram do papel. É o que aponta auditoria feita pela Controladoria Geral da União (CGU) nos contratos assinados entre 2004 e abril de 2011.

Segundo o levantamento da CGU, até abril do ano passado existiam 4.243 contratos na carteira da SNH, o que corresponde a R$ 12,5 bilhões em investimentos. Deste total, 74% estão apenas na promessa, sendo que uma parcela considerável se refere a contratos antigos.

"Esse fato implica na inexecução das ações do governo e nas sucessivas prorrogações de restos a pagar", destaca o relatório.

Os contratos fazem parte do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), mas tratam especificamente de casas ou melhorias em conjuntos habitacionais ou favelas. Uma técnica do Ministério das Cidades faz questão de destacar que não está incluída nesta lista da CGU os contratos firmados no Programa Minha Casa, Minha Vida.

A CGU informa ainda, em sua auditoria, que os indicadores de gestão dos programas e ações da secretaria não espelham os seus resultados reais. "A SNH continua a considerar que o simples empenho orçamentário já configura uma unidade efetiva executada, "família beneficiada", por exemplo. Essa conduta não permite a avaliação adequada dos resultados realmente obtidos", ressalta o documento.

Favelas. A secretária Nacional de Habitação do Ministério das Cidades, Inês Magalhães, reconhece que o número de obras problemáticas é alto e reforçou que se concentram nas obras em favelas, sobretudo contratos mais antigos. Para ela, muitos dos projetos executados por Estados e municípios, com recursos do orçamento da União, demoram para ser finalizados por causa da necessidade de licitações públicas, emissão de licença ambiental, regularização de terras e de infraestrutura dos governos locais envolvidos.

"Não é incomum um município ter apenas um engenheiro para cuidar de todas as obras feitas na cidade", exemplifica Inês. "A execução tem relação com a complexidade de se fazer urbanização de favelas", acrescenta.

Apesar de ainda não ter um balanço fechado de 2011, ela informa que os números apresentaram melhora no ano passado. Segundo a secretária, uma obra de urbanização de favelas, por se tratar de ação integrada de saneamento, infraestrutura, recuperação ambiental e produção habitacional, agrega maior complexidade. Inês ressalta ainda que a melhoria da gestão é um dos desafios e prioridade do governo da presidente Dilma Rousseff.

Minha Casa, Minha Vida. O relatório da CGU informa apenas que, no último ano de governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, as operações de financiamento executadas pela Caixa Econômica Federal superaram as metas previstas. O desempenho positivo do programa foi utilizado na campanha eleitoral que elegeu a presidente Dilma.

Apesar da auditoria não tratar dos resultados referentes a 2011, balanços recentes divulgados pelo próprio governo mostram que o programa travou no ano passado. A regulamentação só ficou pronta em setembro, comprometendo as contratações para as famílias que têm renda mensal de até R$ 1,6 mil. A expectativa é de que o programa deslanche nessa faixa de renda a partir deste ano.

No ano passado, o governo pagou R$ 7,5 bilhões referentes ao Minha Casa, Minha Vida. O grosso - R$ 6,9 bilhões - está relacionado a compromissos firmados em anos anteriores e quitados em 2011. Se considerado apenas o orçamento de R$ 12,65 bilhões destinado ao programa no ano passado, R$ 10,979 bilhões foram empenhados e apenas R$ 598,9 milhões foram pagos.

De acordo com o balanço da Caixa, até o dia 31 de dezembro foram contratados 1,462 milhão de unidades nas duas etapas do programa Minha Casa, Minha Vida, sendo que as obras de 719.522 moradias já foram concluídas e 540.883 habitações foram entregues.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Governo pagou R$ 4,6 milhões por assessoria a estatal extinta

O Ministério do Esporte pagou R$ 4,65 milhões, sem licitação, para a Fundação Instituto de Administração (FIA) ajudar no nascimento de estatal que foi extinta antes de funcionar. Criada para a Olimpíada do Rio, a Empresa Brasileira de Legado Esportivo Brasil 2016 durou um ano, só no papel: há cinco meses foi decidido que será liquidada. Depois disso, a FIA ainda recebeu R$ 1 milhão

Esporte pagou quase R$ 5 mi em 2011 por consultoria sobre estatal extinta

A Fundação Instituto de Administração (FIA), contratada para desenvolver estudos da Brasil 2016, recebeu pagamentos até 4 meses depois de já ter sido decidido que a empresa seria encerrada

Fábio Fabrini e Iuri Dantas

BRASÍLIA - O Ministério do Esporte pagou R$ 4,65 milhões no ano passado, sem licitação, para a Fundação Instituto de Administração (FIA) prestar um serviço curioso de consultoria: ajudar no nascimento de uma estatal que foi extinta antes de funcionar. Criada em agosto de 2010 para tocar projetos da Olimpíada do Rio de Janeiro, a Empresa Brasileira de Legado Esportivo Brasil 2016 só durou um ano, no papel: há cinco meses foi incluída no Plano Nacional de Desestatização (PND), para ser liquidada.

Conforme o Portal da Transparência, caberia à FIA desenvolver estudos para "apoiar a modelagem de gestão da fase inicial de atividades da estatal". O Esporte fez os pagamentos do contrato em dez parcelas. A primeira e mais cara, de R$ 1,1 milhão, foi transferida à fundação em 4 de março do ano passado. Até 4 de agosto, quando o Conselho Nacional de Desestatização recomendou a inclusão da estatal no PND, foram mais quatro repasses, totalizando R$ 2,4 milhões.

Mesmo após a decisão e o anúncio de que a Brasil 2016 será extinta, a FIA recebeu mais R$ 1 milhão em cinco parcelas, as quatro últimas graças a dois aditivos ao contrato, firmado em 2010. Um deles prorrogou o contrato por quatro meses e o outro corrigiu o valor original em R$ 901 mil. Os desembolsos só cessaram em 27 de dezembro, quatro meses e 23 dias depois de iniciado o processo para dissolver a estatal. Segundo o Esporte, a prorrogação foi para cobrir serviços distintos, sem vinculação com os estudos para criar a empresa pública.

A decisão de extinguir a Brasil 2016 foi tomada após tratativas com o Ministério do Planejamento, com a justificativa de que já havia estrutura suficiente para cuidar da Olimpíada do Rio. Criada por decreto em agosto de 2010, a estatal nunca chegou a ter sede ou empregados, embora o conselho administrativo - formado por oito altos funcionários federais, entre eles a ministra Miriam Belchior (Planejamento) e o ex-ministro Orlando Silva (Esporte) - tenha se reunido algumas vezes.

A empresa tampouco levou adiante obras ou serviços. Na prática, produziu apenas um prejuízo contábil de R$ 109 mil, computado no balanço de atividades de 2010, referente aos jetons (remunerações extras por reuniões) pela participação dos conselheiros em encontros para definir o futuro da estatal. O Esporte explica que, embora presentes no balanço, os valores não foram pagos.

"Não há o que relatar-se no que concerne ao desempenho operacional desta empresa, uma vez que não foram realizadas atividades previstas em seu Estatuto Social, em virtude da inexistência de diretoria executiva, bem como de corpo administrativo que propiciasse o desempenho de suas operações e os seus fluxos de caixa para o exercício findo", assinalou, no balanço, o então ministro Orlando Silva, que presidia o conselho de administração da estatal.

Impostos. O documento, publicado dia 12 de setembro de 2011 no Diário Oficial, registrou que a "não nomeação do representante legal da empresa em tempo hábil" impediu a emissão do Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ). Sem ele, a estatal ficou "impedida de cumprir com suas obrigações tributárias". Ou seja, não pagou impostos, conforme nota emitida por auditores independentes que acompanharam o balanço.

Formada em junho de 1980 por professores da Universidade de São Paulo (USP), a FIA se desvinculou da universidade em 2005 e hoje atua como entidade sem fins lucrativos. Desde 2006, obteve vários contratos com órgãos do governo, que somam ao menos R$ 34 milhões. Só as consultorias ao Esporte, voltadas para eventos como os Jogos Pan-Americanos de 2007, renderam R$ 24,5 milhões, mostra o Portal da Transparência.

Segundo o Planejamento, a inclusão no PND é a forma "legal adequada" para liquidar estatais. Embora a decisão já esteja tomada, há, ainda, a necessidade de uma autorização legal para extinguir a Brasil 2016. O ministério explica que, como a medida provisória que a criou foi convertida em lei pelo Congresso, ainda estuda a forma adequada de fazê-lo. A pasta descartou a possibilidade de privatização.

O Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio informou que o processo da Brasil 2016, que se arrasta há quase meio ano, contém "recomendação de dissolução da sociedade estatal, com a consequente alienação dos seus ativos". A Advocacia-Geral da União (AGU) deu aval jurídico para que os trâmites sigam adiante, disse a pasta. Dados do ministério mostram que empresas privadas em situação regular são extintas em até dez dias no País.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Marina usa fórum para voltar à cena e mira 2014

Ex-presidenciável busca apoio para novo partido e admite candidatura

Ex-senadora critica Dilma, pede veto a mudanças no Código Florestal e diz que eleição é uma "batalha"

Bernardo Mello Franco 

PORTO ALEGRE - A ex-presidenciável Marina Silva usou o Fórum Social em Porto Alegre para tentar romper o isolamento, se contrapor ao governo Dilma Rousseff e buscar apoio para uma nova candidatura ao Planalto em 2014.

Em ritmo de campanha, participou de sete debates e divulgou seu movimento "Nova Política", embrião do partido que, segundo aliados, pretende fundar para disputar a Presidência de novo.

Nas falas, fez várias referências aos "quase 20 milhões de votos" que recebeu em 2010, pelo PV.

A ex-senadora admitiu, na sexta-feira, a intenção de concorrer em nome do lema da sustentabilidade.

"Se para ele continuar sendo relevante for necessário sair em 2014, eu peço a Deus que me dê coragem para fazer de novo, porque não é fácil enfrentar uma batalha como essa", afirmou.

Ela pediu que os movimentos sociais pressionem Dilma a vetar as mudanças no Código Florestal e criticou o governo ao cobrar propostas para a Rio+20. "O Brasil precisa definir qual é a sua posição."

Sem partido e sem mandato, Marina teve ajuda do empresário Oded Grajew, um dos organizadores do fórum, que participou de ao menos três debates ao seu lado.

"PULSAÇÃO DO PLANETA"

Em meio a ambientalistas, hippies e outras tribos, a ex-senadora passou por momentos de constrangimento.

Uma das palestras terminou com um pedido da mediadora para que a plateia fizesse silêncio e fechasse os olhos para sentir a "pulsação do planeta". Marina manteve os olhos abertos.

Em fevereiro, ela viajará pelo Nordeste para fundar novos núcleos de seu movimento com a ex-senadora Heloísa Helena (PSOL-AL).

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

PMDB prepara troco ao governo no Congresso

Líderes dão crise com Planalto por encerrada, mas parlamentares falam em tensão

BRASÍLIA. O Congresso retoma os trabalhos na próxima quinta-feira, ainda sob o impacto da guerra aberta pelo PMDB na semana passada contra o Planalto e à espera do anúncio de mudanças no Ministério das Cidades. Interlocutores do governo sustentam que o pior momento já passou — depois que a própria presidente Dilma Rousseff decidiu manter o peemedebista Sérgio Machado na Transpetro —, mas alertam que o clima ainda é de tensão com setores do PMDB. O Planalto sabe que uma possível vingança não será imediata.
O partido deverá usar a própria lógica dos trabalhos no Congresso para demonstrar eventual reação a conta-gotas.

O PMDB não deverá se mobilizar para evitar a convocação de ministros que estejam sendo alvo de denúncias. Mas está numa saia justa para deflagrar reação na Câmara. Um dos primeiros itens da pauta é a votação do Fundo de Previdência Complementar do Servidor Público (Funpresp) — bandeira de Dilma abraçada pelo ministro da Previdência, Garibaldi Alves, senador do PMDB e primo do líder Henrique Eduardo Alves.

O líder do PT, deputado Paulo Teixeira (SP), conversou com o colega do PMDB e acredita que eventuais problemas não afetarão as votações.

— O PMDB voltará bem, estamos governando juntos. Não tem crise nenhuma.

As mudanças afetaram todos os partidos. O próprio Alves me disse que estava tranquilo.

FONTE: O GLOBO

Oposição vai ao TCU contra desperdício em rodovias

Para líderes oposicionistas, gasto de dinheiro nas obras mostra ineficiência na gestão pública

Geralda Doca, Cristiane Jungblut

BRASÍLIA - A oposição promete ir ao Tribunal de Contas da União (TCU) e ao Ministério Publico Federal, no retorno da atividade nesta semana, contra o desperdício de dinheiro público nas rodovias federais. Reportagem publicada ontem pelo GLOBO revela que as estradas recapeadas têm pouquíssima durabilidade — num reflexo da baixa qualidade dos materiais empregados. O prazo, que deveria ser de dez anos, pela Lei de Licitações, não chega a três anos para novo serviço de tapa buracos.

Para os líderes da oposição, os dados mostraram ineficiência no gasto público, o que compromete a imagem de boa gestora da presidente Dilma Rousseff. A própria presidente tem criticado o ritmo das obras em infraestrutura e dentro do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Depois da "faxina" no Ministério dos Transportes, ela espera agilidade nas obras.

O líder do PSDB no Senado, Álvaro Dias (PR), disse que vai pedir ao TCU um levantamento da situação das rodovias federais que receberam recursos. O objetivo é exigir que as empreiteiras que prestaram o serviço devolvam a verba aplicada indevidamente.

— O que o governo faz para recuperar as rodovias é um prejuízo multiplicado por dois, somando o superfaturamento e qualidade temerária do material usado — disse Álvaro Dias.

A avaliação é endossada pelo líder do DEM no Senado, Demóstenes Torres (GO). Ele destacou que o Ministério Público também deve ser acionado.

— É preciso que o Ministério Público levante o que foi de fato licitado e o que foi entregue, para verificar incogruências, se houve crime ou improbidade administrativa — disse. O líder do PSDB na Câmara, deputado Duarte Nogueira (SP), disse que, além de gastar mal, o governo Dilma vem reduzindo os investimentos.

— O governo investiu 22% a menos do que deve investir. É o nono ano do governo do PT com uma curva declinante dos investimentos e deficiências de gestão — disse Nogueira.

Em nota, o Ministério dos Transportes desafia o professor da UnB Deckran Berberian a apontar onde estão as fraudes que, segundo ele, se multiplicaram por falta de fiscalização. O órgão informa ainda que há contratos de adequação funcional que duram dois anos, e também os que duram dez anos, caso do da BR-174, em Roraima, ainda não concluído.

Segundo o Dnit, os serviços na BR-474, em Minas Gerais, realizados nos últimos três anos, não apresentaram defeito prematuro. "Ocorre que esta rodovia possui trechos que ainda precisam de serviço de manutenção, com execução prevista para o corrente ano", diz o Dnit.

Sobre a BR-405, no Rio Grande do Norte, o órgão diz que a estrada está em boas condições. "Quanto ao programa de manutenção de rodovias para os próximos cinco anos, incluindo pistas e obras especiais, os técnicos do Dnit estão em permanente contato com os técnicos do TCU, de modo a lançar editais com custos considerados aceitáveis pelo tribunal e que ofereçam conforto e segurança ao usuário".

FONTE: O GLOBO

Projeto prevê plebiscito para destravar reforma política

Segundo a proposta, população decidiria em 2014 sobre sistema de escolha de congressistas e sobre financiamento de campanhas

Paulo Gama

SÃO PAULO - A Câmara dos Deputados volta do recesso nesta semana com mais uma proposta para tentar destravar o debate da reforma política: um plebiscito sobre dois pontos centrais das regras eleitorais, a ser realizado em 2014.

O projeto, encabeçado pelo deputado Miro Teixeira (PDT-RJ), prevê duas perguntas, uma sobre o modo de escolha de deputados e vereadores e outra sobre o financiamento das campanhas.

Os eleitores decidiriam entre o financiamento público, em que são proibidas as doações de empresas e pessoas físicas, e o privado, em que essas doações são permitidas. Haveria também uma opção por um sistema misto.

Hoje, o Brasil adota o financiamento privado, mas as legendas podem usar recursos públicos do fundo partidário para quitar dívidas de campanha. Além disso, os candidatos têm direito ao horário eleitoral gratuito, pelo qual o governo reembolsa emissoras de rádio e TV.

Para que o plebiscito ocorra, o projeto tem de ser aprovado por deputados e senadores. Mas, segundo líderes ouvidos pela Folha, ainda não há entendimento para que sua tramitação avance.

O PT não está entre os apoiadores da proposta, porque tem receio de que ela esvazie ainda mais o relatório elaborado pelo petista Henrique Fontana (RS) em comissão especial sobre o tema, criada na Câmara em 2011.

O partido defende que o relatório de Fontana -que prevê voto em lista e a criação de um fundo para o financiamento das campanhas- seja primeiro aprovado no Congresso e só depois submetido a um referendo. Na consulta, a população confirmaria ou rejeitaria o que foi decidido pelos parlamentares.

O relatório, no entanto, não conseguiu reunir apoio suficiente de outras legendas.
Para Miro Teixeira, o plebiscito é importante para que as mudanças não pareçam ter sido aprovadas em benefício próprio dos legisladores.
Segundo Virgílio Afonso da Silva, professor de direito constitucional da USP, ainda que a consulta popular não seja uma exigência para as alterações, ela pode ser uma maneira de "romper o impasse" que existe sobre o tema.

Já o cientista político Vitor Marchetti, da Universidade Federal do ABC, diz que a consulta pouco acrescentaria. "Há um conjunto de elementos complexos que vão confundir o eleitor e fazer com que o plebiscito não contribua para esse debate."

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

PF com o chapéu na mão

Uma das mais respeitadas do país, corporação tem prestígio ameaçado pelo orçamentoreduzido a cada ano e por operações limitadas aos estados. Em 2012, o corte será de 5%

Maria Clara Prates

Os tempos áureos da Polícia Federal já têm cheiro de passado. A agitação do primeiro governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2006), quando a PF se transformou em um importante pilar político de sua gestão por investigar grandes escândalos, ficou para trás. Embora em pesquisas de opinião pública apareça como uma das instituições mais respeitadas do país, a corporação vê seu orçamento encolher ano a ano. Para 2012, mesmo com o aumento das contas de custeio, seus recursos sofreram um corte de 5% em relação ao ano passado. Sobre a cabeça dos federais, ainda pende uma navalha, que pode vir com o anúncio de mais cortes em razão do decreto de contigenciamento que deve ser anunciado pelo governo Dilma no mês que vem.

Enquanto os recursos minguam, as operações da PF também têm a importância política e a abrangência diluídas. Em quantidade, têm crescido apenas as ações regionais, que vêm substituindo as grandes operações nacionais. Para se ter ideia do tamanho do prejuízo, basta considerar que, em 2007, do orçamento total da PF, foram destinados à Polícia Judiciária, unidade responsável pelas apurações dos crimes, 18% dos recursos. No ano passado, eles caíram para 14% do bolo, de acordo com levantamento da Associação dos Delegados de Polícia Federal (ADPF).

A regionalização das investigações teve como marco a Operação Satiagraha, desencadeada em junho de 2008, para apurar desdobramentos do escândalo do mensalão, atingindo empresários, políticos e investidores. A repercussão política da investida abriu uma crise sem precedentes na corporação, que terminou causando importantes mudanças na atuação na PF.

Hoje, a área administrativa da corporação — responsável pelos serviços administrativos, como expedição de passaportes e controle de produtos químicos, por exemplo — tem recursos superiores aos destinados às investigações. Ainda assim, houve redução. O levantamento da associação revela que, em 2007, o setor recebeu 29% do destinado à PF, enquanto, no ano passado, o montante diminuiu para 21%.

O diretor de Comunicação Social da ADPF, delegado federal Marcos Leôncio, afirmou que, em 2011, considerando o contingenciamento de verba, os federais perderam 35% dos recursos. "No ano passado, o corte nos gastos do governo nas diversas áreas foi de R$ 50 bilhões. Para este ano está prevista a redução de R$ 60 bilhões. Daí a nossa preocupação." No atual orçamento, estão destinados ao Ministério da Justiça, ao qual a PF está subordinada, R$ 12,4 bilhões, mas, até o momento, não se sabe quão profundo será o corte.

Contas abertas

O delegado Lêoncio explica que, se forem considerados apenas os valores absolutos do orçamento da corporação, a impressão que o governo dá é a de que os recursos cresceram ao longo do ano. Ele explica que, há quatro anos, a PF recebeu R$ 705 milhões. Em 2011, o valor atingiu a casa de R$ 1,138 bilhão, mas não acompanhou o aumento da demanda de atuação da corporação.

"Este ano, além da perda de 5% no orçamento, tivemos perda com o aumento real de 14% do salário mínimo, em razão da grande terceirização da corporação. Soma-se a isso o aumento de pelo menos 6% das tarifas públicas, como telefone, luz e água. Não existe forma de cortar em despesas correntes, que são crescentes", contabiliza o delegado. Marcos Leôncio incluiu na conta o alto custo das passagens aéreas, outro gasto difícil de ser reduzido. "Temos um contingente de pessoal reduzido e, por isso, temos que ter grande mobilidade para deslocamentos por todo o território nacional", completa.

Diante de uma conta difícil de fechar, o delegado acredita que a Polícia Federal tem ficado em segundo plano no plano de investimentos, especialmente nos últimos anos. Ele avalia que isso se deve ao enfraquecimento político da corporação. "Os fatos têm demonstrado isso."

A direção do Departamento de Polícia Federal adotou o silêncio e não quis falar sobre a situação. Por meio de sua assessoria de comunicação, afirmou que não comenta seu orçamento e que não tem qualquer informação oficial sobre cortes.

FONTE: CORREIO BRAZILIENSE

Indústria teme efeito da crise europeia

Pesquisa da Fiesp mostra que maioria das empresas pode cortar investimentos e vagas se forem afetadas por problemas externos

Marcelo Rehder

Sete em cada dez empresas industriais paulistas acreditam que o agravamento da crise na Europa provocará retração da demanda interna neste ano. Esse quadro, na visão empresarial, levaria à revisão de planos de investimentos e à demissão de funcionários.

De acordo com pesquisa sobre as perspectivas para a economia, feita pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), 58% das empresas entrevistadas pretendem reduzir o quadro de pessoal, caso a demanda por seus produtos seja afetada pela crise dos países da zona do euro.

A entidade ouviu 398 empresas do setor, entre os dias 1.º de dezembro de 2011 e 6 de janeiro deste ano, em todo o Estado de São Paulo, principal centro industrial do País.

Além do corte no número de trabalhadores, as empresas indicaram outras medidas que podem adotar num cenário de retração do mercado doméstico provocada pela crise externa.

Entre as alternativas está a revisão dos planos de investimentos: 56% dos entrevistados informaram que reduziriam os investimentos em aumento ou manutenção da capacidade produtiva, 33% aumentariam os investimentos voltados à redução de custos e 20% aumentariam os gastos com inovação de produtos.

Outros 19%, segundo a enquete da Fiesp, reduziriam os investimentos em inovação, enquanto 14% afirmaram que optariam por importar produtos mais baratos para a revenda no mercado brasileiro. Só 10% buscariam mercados no exterior e 5% não tomariam nenhuma medida ou acreditam que a empresa não seria afetada.

Para o presidente da Fiesp, Paulo Skaf, além do receio de a crise internacional atravessar o oceano, o pessimismo dos empresários do setor reflete o mau resultado de 2011 e uma certa desconfiança em relação à capacidade do governo da presidente Dilma Rousseff resolver os problemas que afetam a competitividade das empresas brasileiras.

"O governo fez promessas durante todo o ano passado, mas não cumpriu muita coisa", argumenta Skaf. "Enquanto continuar a guerra fiscal , as importações desenfreadas e a defesa comercial fraca, entre outros problemas, não se pode ter nenhuma expectativa positiva, mesmo", afirma o empresário.

Sobrevivência. Pressionada pela concorrência das importações de produtos chineses, a fabricante de componentes eletrônicos Tecnotrafo pretende recorrer à redução de custos para manter sua sobrevivência caso o quadro interno se agrave com a crise lá fora.

"Não acho que será preciso, mas se não houver outra alternativa vamos ter de enxugar o número de funcionários", diz o empresário José Carlos Fialho, um dos donos da empresa. Nos bons tempos, a Tecnotrafo chegou a ter mais de 300 funcionários. Hoje, emprega 170 pessoas na capital paulista.

A produção industrial pode ser afetada também por uma eventual redução do crédito no País. A principal medida que seria adotada pelas empresas, nessa situação, seria a adaptação da produção ao crédito disponível no País, apontada por 40% dos participantes da pesquisa da Fiesp.

Para as operações da empresa, 51% dos entrevistados indicaram que a taxa de câmbio de conforto seria de até R$ 1,80 por dólar. De acordo com a Fiesp, o resultado foi afetado pelas empresas de pequeno porte. Para 61% das empresas desse segmento, esta seria a taxa de conforto, enquanto 74% das empresas de grande porte indicaram uma taxa de câmbio acima de R$ 1,80 por dólar.

"Para nós, o complicado da crise tem sido o câmbio", diz Rodrigo Alvarenga, gerente comercial da Top Cau, empresa de médio porte fabricante de chocolate.

Alvarenga informa que a empresa trabalha com brindes para ovos de Páscoa importados da China, o que demanda de seis a sete meses para desenvolvimento, produção e chegada dos produtos ao País. "O problema foi que trabalhávamos com um câmbio de R$ 1,60 e tivemos de fechar quase tudo a R$ 1,85."

Desaceleração. A pesquisa realizada pela Fiesp aponta ainda para uma desaceleração da atividade industrial no primeiro semestre deste ano. As expectativas das empresas, embora igualmente divididas entre crescimento, estabilidade e queda, indicam menor crescimento da produção e das vendas quando comparadas aos resultados dos anos anteriores.

A tendência de desaceleração é reforçada pela queda do porcentual de empresas que pretendem contratar mão de obra no primeiro semestre. Em 2010, 51% dos entrevistados informaram que pretendiam ampliar quado de pessoal no primeiro semestre. No ano passado, o porcentual baixou para 42% e, neste ano, caiu ainda mais, para apenas 31%.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Em Roma, Aggio tem seminário com o PD

Tilda Linhares

A convite do Departamento de Relações Internacionais do Partido Democrático da Itália (resultado da fusão da maior parte do PCI com outras forças reformistas, inclusive de orientação católica), Alberto Aggio — professor da Unesp/Franca e colaborador deste site — participa no dia 2 de fevereiro de seminário em Roma, cujo tema central será “A crise da União Europeia vista do Brasil”. Para uma plateia de dirigentes e parlamentares do PD, Aggio vai tratar dos acontecimentos que abalam a Europa, em particular a Itália, a partir de um ponto de vista brasileiro, bem como transmitir uma imagem dos processos em curso na sociedade brasileira, a partir dos governos que se sucederam após a promulgação da Carta de 1988.

Aggio encontra-se ainda com Francesca D’Ulisse, responsável pelos contatos do PD com o Brasil, e com Giuseppe Vacca, presidente da Fundação Instituto Gramsci, com a qual a Fundação Astrojildo Pereira, o site Gramsci e o Brasil e a Editora Contraponto têm trabalhado em conjunto, organizando a série Brasil & Itália.
Desta série constam seis livros, a saber: 1) Giuseppe Vacca. Por um novo reformismo; 2) Marco Mondaini. Berlinguer: democracia, valor universal; 3) A. Aggio, L. S. Henriques e G. Vacca (Orgs.). Gramsci no seu tempo; 4) Giorgio Baratta. Leonardo entre nós; 5) Luiz Werneck Vianna. A modernização sem o moderno. Análises de conjuntura da Era Lula; 6) Marco Mondaini. Palmiro Togliatti. Do stalinismo à democracia. No encontro com Giuseppe Vacca, em pauta a edição de novos livros que tragam os desenvolvimentos mais recentes da pesquisa gramsciana.

FONTE: GRAMSCI E O BRASIL

Discurso do Capibaribe - João Cabral de Melo Neto

Aquele rio
está na memória
como um cão vivo
dentro de uma sala.
Como um cão vivo
dentro de um bolso.
Como um cão vivo
debaixo dos lençóis,
debaixo da camisa,
da pele.

Um cão, porque vive,
é agudo.
O que vive
não entorpece.
O que vive fere.
O homem,
porque vive,
choca com o que vive.
Viver
é ir entre o que vive.

O que vive
incomoda de vida
o silêncio, o sono, o corpo
que sonhou cortar-se
roupas de nuvens.
O que vive choca,
tem dentes, arestas, é espesso.
O que vive é espesso
como um cão, um homem,
como aquele rio.

Como todo o real
é espesso.
Aquele rio
é espesso e real.
Como uma maçã
é espessa.
Como um cachorro
é mais espesso do que uma maçã.
Como é mais espesso
o sangue do cachorro
do que o próprio cachorro.
Como é mais espesso
um homem
do que o sangue de um cachorro.
Como é muito mais espesso
o sangue de um homem
do que o sonho de um homem.

Espesso
como uma maçã é espessa.
Como uma maçã
é muito mais espessa
se um homem a come
do que se um homem a vê.
Como é ainda mais espessa
se a fome a come.
Como é ainda muito mais espessa
se não a pode comer
a fome que a vê.

Aquele rio
é espesso
como o real mais espesso.
Espesso
por sua paisagem espessa,
onde a fome
estende seus batalhões de secretas
e íntimas formigas.

E espesso
por sua fábula espessa;
pelo fluir
de suas geléias de terra;
ao parir
suas ilhas negras de terra.

Porque é muito mais espessa
a vida que se desdobra
em mais vida,
como uma fruta
é mais espessa
que sua flor;
como a árvore
é mais espessa
que sua semente;
como a flor
é mais espessa
que sua árvore,
etc. etc.

Espesso,
porque é mais espessa
a vida que se luta
cada dia,
o dia que se adquire
cada dia
(como uma ave
que vai cada segundo
conquistando seu vôo).