quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

Entrevista - Alberto Goldman: "Escolha de presidente do PSDB precede a de candidato"

Fernando Taquari

SÃO PAULO - Ausente da reunião de prefeitos do PSDB em Brasília, o vice-presidente do partido, Alberto Goldman (75), vai na contramão dos tucanos que defendem o lançamento imediato da candidatura do senador Aécio Neves à Presidência da República. Em sua opinião, os correligionários devem se preocupar, primeiro, em definir um nome de peso para presidir o partido a partir de maio, quando ocorre a convenção nacional.

Com 40 anos de vida política, Goldman vê o processo interno como a oportunidade de o partido buscar um consenso que faltou nas eleições presidenciais de 2006 e 2010. Ao novo presidente do PSDB, ressalta, caberá o papel de unificar o discurso, liderar a oposição e promover reformas no programa partidário. Aécio, segundo Goldman, pode se consolidar para disputa ao ser testado como líder da oposição.

Apesar do clamor em torno senador tucano, o vice-presidente do PSDB não descarta o nome do amigo José Serra, a quem sucedeu no governo de São Paulo, em 2010, quando o correligionário concorreu e perdeu a eleição contra Dilma Rousseff. A despeito de manifestações a favor de Aécio, tido como candidato óbvio pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, Goldman recorre a um período que marca o início da fase de prosperidade do PSDB para reafirmar o dinamismo na política.

"Depois que li essa declaração pela primeira vez, mandei um e-mail para Fernando Henrique em que questionava se seis meses antes da eleição de 1994 ele era um candidato óbvio. Ele não era candidato a nada, nem ao Senado. De repente, o Plano Real deu uma força e ele virou santo". A seguir, a entrevista, concedida ao Valor no seu escritório no bairro paulistano de Perdizes.

Valor: Como o senhor avalia a reunião do partido que praticamente lançou a candidatura do senador Aécio Neves à Presidência da República em 2014?

Alberto Goldman: Não estive lá. Acompanhei pelos meios de comunicação, mas foi um evento importante. Coloca o partido dentro do jogo político.

Valor: O PSDB acerta em tentar antecipar a escolha do nome para a sucessão presidencial?

Goldman: Acredito que devemos obedecer a um calendário natural que passa, primeiro, pela definição do presidente nacional do partido, em maio. Aécio e José Serra têm todas as condições de exercer esse papel. A presidência do partido, inclusive, pode ser uma oportunidade para o PSDB consolidar o nome de Aécio ou trocar o candidato ao Planalto. O senador, por sua vez, terá um espaço para mostrar suas qualidades, ser testado a nível nacional e se consolidar para a disputa presidencial. Serra, por sua vez, já é conhecido no embate nacional. Não precisa ser provado.

Valor: Serra, então, não deve ser descartado?

Goldman: Não descarto nenhum nome que seja expressivo no partido.

Valor: Mas em sua opinião, quem deve ser o candidato tucano em 2014? Qual é o momento ideal para escolher o nome?

Goldman: Eu prefiro não citar nomes. As coisas vão se sedimentar naturalmente. Vai chegar uma hora que haverá uma candidatura natural. O candidato deve ser escolhido entre o final de 2013 e começo de 2014.

Valor: O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso já disse e repetiu no evento do PSDB que o Aécio é o candidato óbvio ao Planalto.

Goldman: Depois que li essa declaração pela primeira vez, mandei um e-mail para o Fernando Henrique em que questionava se há seis meses da eleição presidencial, em 1994, ele era um candidato óbvio. Ele não era candidato a nada, nem ao Senado. De repente, o Plano Real deu uma força e ele virou santo. Com aquele jeitão conciliador, de quem não entra em bola dividida, ele concordou comigo na ocasião.

Valor: As prévias podem ser uma alternativa caso Aécio e Serra manifestem o desejo de disputar a Presidência da República em 2014?

Goldman: Se pudéssemos fazer algo semelhante às primárias nos Estados Unidos, onde você chama a opinar uma população simpática a um partido, seria positivo. Hoje, no Brasil, os delegados partidários escolhem o candidato na convenção. Você fazer uma prévia é tentar se antecipar a essa decisão dos delegados. Não acho que a prévia seja importante. Acho que, às vezes, você precisa ter um pouco de maleabilidade e flexibilidade para negociações políticas que a prévia não te dá. De qualquer maneira, o importante é que o nome escolhido se consolide e que tenhamos um projeto de país. Precisamos de um projeto do que fazer, como responder a esse aparelhamento do Estado que existe hoje.

Valor: A escolha do presidente nacional do PSDB deve ser pensada junto com a definição do nome do partido para eleição presidencial de 2014?

Goldman: Não. Deve ser trabalhada de forma separada. O que disse é que há um calendário a cumprir. É natural que tudo que se consolide agora tenha resultado na eleição do presidente do partido e em 2014, mas acho que não pode juntar as duas coisas agora. São processos distintos. Um envolve só questões internas do partido. Já a escolha do candidato a presidente da República envolve toda a sociedade e outros partidos. Apesar da lógica de nós termos o candidato, já que somos o maior partido de oposição, a discussão ainda está aberta. Os demais partidos também têm o direito de propor uma alternativa.

Valor: Como o senhor vê o encaminhamento que Aécio Neves dá à sucessão no PSDB? Como o senhor vê a ideia da caravana?

Goldman: É bom que seja feita a caravana, mas como uma coisa de partido. O mínimo de personalização possível. É natural que o presidente do partido seja a testa disso. Como já disse, acho que o Serra tem qualidade para isso e o Aécio também tem. No fundo isso é uma forma de agitar. Nos meus velhos tempos de política estudantil, no Partido Comunista, chamávamos isso de agitação e propaganda.

Valor: Como o senhor acha que Aécio tem exercido o papel de liderança nacional do partido?

Goldman: Você via os artigos dele no começo e era tudo muito conciliador. Agora, está bem mais agressivo, como uma parcela do partido que fazia uma oposição muito leve, mas que ficou mais guerreira nos últimos tempos.

Valor: Falta união ao partido?

Goldman: Em todo lugar do mundo há rachas em partidos. Em alguns casos, os rachas são mais duros do que com os adversários normais. Acho até que os conflitos hoje no PSDB não são tão fortes assim. Você tem personalidades, mas não há diferenciação do ponto de vista da visão política.

Valor: Como senhor vê uma aproximação com o governador de Pernambuco, Eduardo Campos? É possível uma dobradinha?

Goldman: Não é impossível. Acho difícil. O PSB está no governo com ministérios, assim como outros partidos. São todos muito amarrados nos esquemas de poder, dependentes. Acho difícil que esses partidos tenham fôlego e coragem suficiente para poder confrontar o poder hoje do PT. É claro que isso tudo depende da evolução da economia. Se a economia for mal, nossa competitividade aumente e, portanto, cresce a atração de grupos que hoje estão pendurados no governo.

Valor: O PSDB sentiu o golpe da derrota em São Paulo. O senhor parece, seja por entrevistas ou blog, um dos poucos ativos no Estado de São Paulo a exercer o papel de oposição. Há uma inércia no ninho tucano?

Goldman: Não se trata de inércia. Há uma fragilidade que está presente em todos os níveis, municipal, estadual e federal. Quando você fala em renovação, não se trata das pessoas em si por conta da idade. Precisamos reestruturar direções que deem importância ao partido. Caso contrário, nossas políticas administrativas se perdem, pois a ação do partido é frágil. É o PSDB que tem que transformar sua atividade positiva em ganho político. Isso não cabe ao governador. O partido não fez isso na cidade e faz muito mal no Estado. Tem que capitalizar o trabalho administrativo que é feito.

Valor: E no plano nacional?

Goldman: Se quisermos fazer oposição, temos que ter uma direção dedicada a isso, com as melhores figuras do partido para fazer oposição. Não se pode trabalhar com o terceiro time. As melhores figuras do PSDB, que são Serra e Aécio, devem ocupar a presidência do partido numa composição política, independentemente do nome que for escolhido para o cargo. Não podemos nos dar ao luxo de nos dividirmos ainda mais. Já somos frágeis. A maior bancada de oposição hoje, do PSDB, é de 10% da Câmara. Se somar tudo que tem de oposição, se chega a 15%. Não houve um número tão baixo assim nem na ditadura.

Valor: O partido não aprendeu a fazer oposição?

Goldman: A verdade é que falta clareza ao partido quanto a suas posições. Temos um programa que foi feito em 1989. Nunca houve revisão. E não se tem um programa de oposição, já que naquela época nem éramos oposição exatamente. Precisamos mostrar à população no que divergimos do atual poder. Isso tem que ser explícito. Se não tiver essa clareza em temas como exploração de petróleo e cotas raciais, você fica igual aos outros.

Valor: O que deve ser feito?

Goldman: O programa e o estatuto devem ser atualizados. Podemos fazer um congresso para promover essas mudanças, que podem ter início antes ou depois da convenção que escolherá a nova direção, em março. Temos 2013 para arrumar tudo isso. Assim, entramos em 2014 com a casa arrumada. Com postura afirmativa, na defesa de nossas teses, sem receio de assumir bandeiras. Até porque essa questão de esquerda e direita está muito diluída hoje.

Valor: Qual o balanço que o senhor faz das eleições municipais de 2012? O PSDB elegeu menos prefeitos no Brasil e no Estado de São Paulo na comparação com 2008. A que se deve esse resultado?

Goldman: Basicamente, você teve uma pulverização partidária muito grande nesta eleição. Vários partidos se constituíram. De outro lado, houve forte atração do poder central. O PT cooptou muitos partidos. Tivemos menor espaço de atuação. Apesar disso, nos municípios acima de 200 mil habitantes, o partido foi melhor do que em 2008. Além disso, estamos mais bem distribuídos pelo Brasil. Se não fosse a derrota em São Paulo teríamos tido um grande sucesso.

Valor: A que pode ser atribuída a derrota de José Serra na cidade onde o partido nasceu e no Estado que o PSDB domina há 20 anos? O que faltou na campanha?

Goldman: A cidade de São Paulo é sui generis. Ganhamos aqui uma vez só, com Serra, em 2004. Não vencemos nem quando éramos MDB e PMDB. A eleição aqui nunca foi tranquila. A cidade tem muito essa característica de eleger a oposição, seja ela qual for. Aconteceu com Erundina, Marta, Maluf e Serra. O PT ainda teve um momento muito forte, com campanha bem sustentada e certo prestígio. A população, por sua vez, se sentiu contrariada com o fato de Serra ter deixado a prefeitura para, anos depois, ser candidato ao cargo que abandonou. O curioso nessa história é que depois da renúncia Serra foi candidato a governador e a presidente e, nas duas oportunidades, venceu na cidade e no Estado. E agora, quando quis ser candidato a prefeito, a população disse não. Não teve nada de ideológico nisso.

Valor: Mas ninguém considerou essa possibilidade antes da campanha? E quanto à rejeição, que ganhou corpo ao longo da disputa?

Goldman: Ninguém levou em conta esse componente antes da campanha. Isso teve grande influência na derrota, além da avaliação ruim do governo de Gilberto Kassab, que considero injusta. A rejeição do Serra no começo girava em torno de 30%, o que era normal, considerando que era o voto petista. O que não estava no cálculo era esse salto de 30% para 40%. Somos inconsistentes como partido e não podemos trabalhar só na época eleitoral. Tínhamos que ter pesquisas internas para medir isso. Esse deve ser um trabalho permanente. O PT faz isso.

Valor: O Serra era o melhor nome para a disputa, uma vez que a cidade demonstrava uma carência por novas lideranças políticas?

Goldman: O problema não era o nome. O problema era marca do nosso governo, taxado como da elite pelo PT. Talvez, não tivéssemos o desgaste da saída do Serra. Em compensação, não teríamos o crédito de uma personalidade que já demonstrou sua capacidade. Se fosse outro candidato, não acredito que teríamos terminado o primeiro turno na frente.

Valor: Foi um erro explorar o julgamento do mensalão na campanha eleitoral?

Goldman: O julgamento teve um efeito positivo muito pequeno para o partido. A população estava discutindo a prefeitura e não questões nacionais. Depois o PT foi suficientemente hábil para não colocar na disputa uma figura com qualquer tipo de semelhança com o seu próprio passado, nem com o grupo dominante, apesar de o Haddad ter sido ministro. A votação do PSDB foi inversamente proporcional às regiões onde fez grandes investimentos. Ou seja, nas áreas mais carentes. Algo absolutamente contraditório.

Valor: O que está por trás dessa aparente contradição?

Goldman: Somos um partido sem estrutura política capaz de transferir o trabalho na administração para ter um resultado político-eleitoral. A população não identifica nossas ações. Por isso, o PT fez uma campanha contrária à realidade dos fatos ao afirmar que o PSDB é o partido dos ricos. Valor: O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva representa um risco à reeleição de Geraldo Alckmin em São Paulo? O marqueteiro João Santana defendeu a candidatura de Lula no Estado.

Goldman: Ele não lançou Lula. Disse que o melhor candidato para ganhar a eleição é o Lula. Certo ou errado é a opinião dele. Acho difícil. Lula está levando muita pancada nos últimos meses, sobretudo pela forma como montou o governo. Não tem controle de ninguém lá dentro. Todos buscam seu espaço de poder. Não há razão para ficar metendo a cara em campanha. O PT já tem o governo nacional, com poder imenso no país.

Fonte: Valor Econômico

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