domingo, 11 de novembro de 2012

Crise federativa - Tereza Cruvinel

"Em algum será preciso pôr freio no hiper multipartidarismo brasileiro. A profusão atravanca o funcionamento do Congresso e torna o Executivo cada vez mais dependente de barganhas e concessões para assegurar a maioria"

Quando 25 estados resolvem brigar com outros dois, temos uma crise federativa. Quando pegam em armas, como fez São Paulo em 1932, temos a guerra civil. A crise deflagrada pela aprovação de um projeto de lei que reparte os royalties do petróleo entre todas as unidades federadas decorreu, fundamentalmente, da falta de comando, da falta de articulação política e de relativa omissão do poder central. O governo federal é o guardião da unidade federativa, cláusula pétrea da Constituição.

O governo Lula enviou a proposta original ao Congresso em agosto de 2009, pouco depois da boa nova do pré-sal. Logo ficou claro, pelo apoio à chamada emenda Ibsen Pinheiro-Humberto Souto, que as bancadas dos estados não-produtores estavam determinadas a ampliar a irrisória participação que tinham nos royalties, de cerca de 7,5%, via fundos de participação dos estados e municípios (FPE e FPM). O então presidente Lula anunciou seu veto político mas o substitutivo foi aprovado em 2010 e encaminhado ao Senado. Em outubro do ano passado, já no governo Dilma, o Senado aprovou, com apoio de quase 80% da Casa, o substitutivo do senador Vital do Rego, que foi além de Ibsen. Ele não só incluiu os estados não-produtores na partilha dos royalties dos novos campos de exploração como também avançou sobre os contratos de campos já licitados. Estes, localizados quase inteiramente no litoral dos estados do Rio e do Espírito, pela regra (ainda) em vigor garante aos dois estados receitas anuais de R$ 4 bilhões e R$ 900 milhões, respectivamente.

No Senado, governo, estados produtores e demais interessados podem ter sido surpreendidos. Mas agora, para a aprovação deste texto pela Câmara, e a rejeição do substitutivo do relator Carlos Zaratini, não há explicação, senão a omissão.

Os governadores Sérgio Cabral e Renato Casagrande parecem ter confiado no poder de fogo do Planalto sobre o Congresso. Só na semana da votação começaram a aparecer declarações preocupadas de ambos. Não foram vistos em Brasília. Só na semana anterior à votação, o ministro da Educação, Aloysio Mercadante, reuniu-se com a bancada do PT para dizer que o governo estava de acordo com o relatório de Zaratini, pedindo apenas a destinação de 100% dos recursos à Educação. O relator acolheu. Sua proposta era técnica e juridicamente correta. Ampliava a distribuição mas respeitava os contratos já existentes. Em outras palavras, observava o pacto federativo. De resto, o Planalto confiou na lealdade de sua vasta maioria, apesar de todos os sinais prévios de forte aliança entre os estados não-produtores. Deu no que deu.

A correção de um erro aritmético vindo do Senado atrasará o envio do projeto à presidente da República. Ela pode vetar a nova partilha e enviar uma MP ao Congresso, como fez no caso do Código Florestal. Mas bom mesmo seria zerar o jogo, abrindo-se uma discussão mais consequente sobre a partilha e sobre o destino dos recursos. A educação deve ser contemplada mas também outras áreas, incluindo a ambiental, tão afetada pela exploração petrolífera.

Reforma de três pontos. A reforma política mínima que Dilma combinou com a cúpula do PMDB e do PT, no jantar de terça-feira passada, por falta de tempo e de consenso, seria circunscrita a três pontos: introdução do financiamento público de campanhas; proibição das coligações nas eleições proporcionais; e bloqueio temporário da criação de novos partidos. Ou melhor, poderiam ser criados mas não teriam acesso ao tempo de TV e aos recursos do fundo partidário. Em compensação, seria aberta uma janela temporária de acomodação, um período em que seria permitida a mudança de partido sem perda de mandato.

De fato, em algum momento será preciso pôr freio no hiper-multipartidarismo brasileiro. A profusão atravanca o funcionamento do Congresso e torna o Executivo cada vez mais dependente de acordos, concessões, barganhas e coisas tais, para assegurar a maioria.

Mudanças só em abril. 
Esta semana Dilma encontra-se com o prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, que não vê a hora de embarcar na fragata da base governista. E com isso, seu PSD, possivelmente através da sua pessoa, terá seu quinhão no ministério. Mas terá de esperar. Dilma já sinalizou que vai esperar o ano virar, a eleição das Mesas da Câmara passar e as comissões técnicas serem compostas. Depois, vem o carnaval. Depois de examinar a nova correlação de forças entre os partidos é que ela remontará sua equipe para a travessia da segunda metade do mandato. Aquela que costuma ser consumida apenas com os preparativos da reeleição.

Em falta. 
O Brasil forma 13 mil médicos por ano mas apenas 5 000 especialistas. Faltam pediatras, oftomologistas, gastro-entererologistas, neurologistas, cardiologistas e ortopedistas. Faltam dermatologistas clínicos, pois a maioria dedica-se à “dermatologia estética”, que cuida de rugas e manchas em peles dos mais abonados. O líder do governo no Senado, Eduardo Braga, abordou o problema com o ministro Mercadante, da Educação. Ouviu que, recentemente, foram autorizadas mais 1.500 vagas anuais. Então foi pouco, disse o líder.

Fonte: Correio Braziliense

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