quarta-feira, 14 de novembro de 2012

Alta tensão nas relações internas - Rosângela Bittar

Quem está pensando que o PT busca traçar um plano de recuperação de imagem para voltar a ser identificado com a cidadela da moralidade como antigamente, vai se surpreender com o problema em que se enreda o partido no momento: a travessia das fissuras no relacionamento interno, em processo célere de esgarçamento, para se ser exato, desde a apuração do segundo turno das eleições municipais até ontem.

É como se em vez de estar terminando a agonia do PT com a fase conclusiva de julgamento do mensalão, ela estivesse apenas começando. Os condenados não sabem se haverá nota oficial contra o Supremo Tribunal Federal, se a mobilização da CUT e da UNE será possível e emulada pelo partido, se tomarão as ruas para expor indignação, se o ex-presidente Lula sairá do seu silêncio e das recomendações de discrição que fez ao partido. É isso o que esperam e não estão tendo: "solidariedade". Cada um foi tratar de sua vida e a luta interna tornou-se aguda e atiçou a revolta.

A evolução da estratégia ocorreu ao longo de todo o processo. Marcado o julgamento, o primeiro movimento definido pelo partido foi separar os dois fatos, tirá-lo da coincidência com a campanha eleitoral. Com esse objetivo, foram feitas várias incursões, sendo a mais visível, tanto quanto desastrada, a que reuniu Lula e o ministro Gilmar Mendes numa conversa de ameaças veladas sobre a qual o ex-presidente nada explicou até hoje. E que acabou por consolidar a coincidência do julgamento com as eleições, abortando outras iniciativas com o mesmo fim.

Dia 19 o PT tenta sair do novo labirinto

Iniciado o julgamento, a direção do PT avisou a todos que pesquisas encomendadas indicavam ao partido que o mensalão não atrapalharia o bom resultado eleitoral em todo o país, à exceção de São Paulo, onde tinham domicílio eleitoral os réus políticos principais.

Uma vez condenados José Dirceu, José Genoíno, Delúbio Soares e João Paulo Cunha, o diretório nacional convocou uma reunião, entre o primeiro e o segundo turnos das municipais, em que o próprio Dirceu, presente, manifestou-se e pediu que esquecessem o mensalão porque, naquele momento, a prioridade era ganhar a eleição no segundo turno da cidade de São Paulo.

Apurado o resultado, o PT viu iniciar-se um novo movimento dos acusados. Inquietavam-se com a demora da reação do partido, esperavam uma nota oficial da direção, contundente, em sua defesa e em ataque ao Supremo e à imprensa. O presidente do PT, Rui Falcão, chegou a anunciar a nota de véspera, mas não a divulgou.

O ex-presidente Lula entrou novamente em campo para, desta vez, baixar a temperatura. Achou inconveniente a divulgação de uma nota com tal teor, entre outras razões, porque o julgamento não havia terminado: faltava a importante dosimetria e o partido, a seu ver, poderia acirrar o Supremo.

Nesse ambiente começaram a vazar informações sobre depoimentos do Marcos Valério ao Ministério Público, em busca de delação premiada, nos quais, inclusive, citava Lula, Antonio Palocci, o assassinato de Celso Daniel e outros fantasmas partidários. O ex-presidente opinou, achava que não se devia ainda mexer no assunto. Lula pediu paciência para esperar o julgamento acabar.

O imobilismo do partido, porém, provocou a insatisfação dos condenados, e o próprio PT se assustou quando viu José Dirceu reclamar. Causou especial comoção a manifestação de suas ex-mulher, Clara Becker, mãe de seu filho Zeca Dirceu, que faz política no Paraná. Ela foi fotografada ao seu lado, no sítio em Vinhedo, e deu entrevista afirmando que tudo o que José Dirceu fez foi em função e em favor de Lula. Soou explosiva a declaração, o gongo no partido foi acionado. Dirceu vinha poupando Lula, enfrentando o processo sozinho. Dirigentes do PT tomaram o gesto como um recado claro de sua revolta com a falta de solidariedade. Não houve ninguém que não tivesse visto naquela entrevista as palavras do próprio Dirceu. Aumentaram o tom das queixas João Paulo Cunha, José Genoíno e, com grande barulho no partido, Delúbio Soares. O PT passou a temer, também, as mulheres de cada um deles que, segundo informações à direção, estão tomadas pela emoção.

É o que mostra o termômetro de anteontem, ontem, hoje e amanhã, provavelmente, sob o efeito dos 10 anos e 10 meses para Dirceu, 6 anos e 11 meses para Genoíno, e 8 anos e 9 meses para Delúbio. Faltam os embargos infringentes, os embargos de declaração, a decisão do Supremo sobre crime continuado e tudo o mais que pode mudar o quadro daqui para a frente, na sessão final de ajustes, inclusive.

O PT trabalha com algumas hipóteses, mas não tem decisão. Continuar em silêncio e ir tocando a rotina até tudo ficar definido no Supremo é uma delas. Ontem, o presidente do partido, Rui Falcão, deu uma entrevista das mais lights entre todas as suas manifestações até hoje.

Outra hipótese é, diante da pressão dos condenados, que estão revoltados com Lula, Gilberto Carvalho, tudo e todos, divulgar finalmente uma nota mais violenta. Mas a direção sabe que não basta acalmar os mais afoitos, é preciso ter uma estratégia para os condenados. Se deixar que cada um defina a sua, acredita o partido que haverá do mártir à greve de fome, do pedido de indulto ao recurso à corte internacional.

Na semana que vem um fato novo ocorrerá e começou a ser acionado com a visita do ministro Joaquim Barbosa à presidente Dilma para convidá-la à sua posse, anteontem. O PT parou de pressionar para ela não comparecer, acha agora inevitável que vá, mas imagina a direção que haverá constrangimento. Com os ministros que ela nomeou, como Luiz Fux e Rosa Weber, considerados traidores porque votaram com o relator, assim como os nomeados por Lula, como Joaquim Barbosa, Ayres Brito e Carmem Lúcia, que também condenaram petistas.

Será também na semana que vem, dia 19, a reunião do diretório nacional para os balanços da eleição municipal e do julgamento do mensalão. Sob a atenção total, ainda que fora da sala, do ex-presidente Lula.

Uma certeza tem o PT: José Genoíno assumirá o mandato de deputado federal dia 2 de janeiro de 2013, depois de aberta a vaga com a posse como prefeito de São José dos Campos, Carlos de Almeida. Com o Congresso em recesso, começa a trabalhar em fevereiro.

Fonte: Valor Econômico

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