domingo, 29 de julho de 2012

Dilma adota agenda positiva para se afastar do mensalão

Preocupada com o potencial de desgaste que o julgamento do mensalão pode trazer ao governo, a presidente Dilma Rousseff tentará manter o Planalto longe dos holofotes do STF. Apesar de torcer para que os réus do PT sejam absolvidos, Dilma baixou uma espécie de lei do silêncio. A ordem é blindar o governo do impacto do julgamento, que vai pôr o PT no banco dos réus, e preparar um pacote de estímulo aos investimentos, a "agenda do desenvolvimento"

Dilma se blinda para evitar que julgamento espirre em seu governo

Presidente quer "agenda de desenvolvimento" durante julgamento de seus colegas petistas

Vera Rosa

Preocupada com o potencial de desgaste que o julgamento do mensalão pode causar a seu governo, a presidente Dilma Rousseff deverá fazer de tudo para manter o Palácio do Planalto longe dos holofotes do Supremo Tribunal Federal (STF). Apesar de torcer para que os réus do PT sejam absolvidos, sob o argumento de que uma punição representaria a condenação moral da Era Lula e acabaria se voltando contra ela e o seu partido nas eleições municipais, Dilma baixou a lei do silêncio.

A ordem é blindar o Planalto do impacto do julgamento, que vai pôr o PT e o governo Lula no banco dos réus. Na tentativa de mostrar que sua gestão não será contaminada pelas ruidosas sessões do Supremo, Dilma preparou um pacote de estímulo aos investimentos, a ser lançado em várias etapas, entre agosto e setembro. A "agenda do desenvolvimento" terá medidas populares, como a desoneração de impostos para a redução do custo da tarifa de energia elétrica.

Na semana passada, a presidente quis saber de auxiliares se a repercussão do julgamento do mensalão ocuparia o espaço nobre da imprensa nos próximos meses. Diante da resposta positiva, não escondeu a contrariedade.

Em conversas privadas, Dilma avalia que a denúncia da Procuradoria-Geral da República não fica de pé porque não há provas da compra de votos em troca do apoio parlamentar no Congresso na administração de seu padrinho político, Luiz Inácio Lula da Silva.

O caso que mais a sensibiliza na Ação Penal 470 – um calhamaço com 50 mil páginas, 38 réus e 600 testemunhas – é o do ex-deputado José Genoino. Presidente do PT à época do escândalo de corrupção, Genoino é atualmente assessor do Ministério da Defesa e Dilma já o chamou várias vezes ao Palácio da Alvorada para trocar impressões sobre os rumos do governo.

Alívio. A presidente gostaria de reabilitar Genoino na bancada do PT na Câmara, da qual ele é suplente. Não quer, no entanto, que José Dirceu, seu antecessor na Casa Civil, retorne ao comando do PT, embora deseje que ele seja inocentado. O ex-ministro é descrito na denúncia do Ministério Público como "chefe da quadrilha".

Dilma disse ter ficado aliviada ao saber que só terá de indicar o substituto de Cezar Peluso, ministro do STF que se aposenta em setembro, após o veredicto sobre o mensalão. Tem pavor de que suas ações sejam interpretadas como ajuda a réus do PT.

Amigos da presidente garantem que, embora esteja próxima de forças opostas a Dirceu no mosaico ideológico do petismo, ela jamais entrará em confronto com Lula nem trabalhará pela "faxina" no PT, mesmo de olho no projeto da reeleição, em 2014. Além disso, Lula só concordará em disputar novamente o Planalto contra o PSDB se ela não quiser concorrer a um segundo mandato, hipótese hoje improvável.

Cara nova. Herdeira do pós-mensalão, cristã nova no partido e caloura em eleições, Dilma só chegou à ribalta após a sucessão de crises que dizimou a cúpula petista e abateu candidatos "naturais" à cadeira de Lula, como Dirceu, o todo-poderoso chefe da Casa Civil entre 2003 e 2005, e Antônio Palocci, à época titular da Fazenda.

Então ministra das Minas e Energia, a ex-guerrilheira furou a fila no PT e foi chamada por Lula para substituir Dirceu no período de ruína. Em reuniões que vararam a madrugada no Planalto, Dilma foi uma das integrantes do "núcleo duro" que mais o ajudaram na estratégia de proteção do governo.

Desde que foi eleita presidente, no entanto, ela se distanciou de Dirceu e desenhou uma nova geografia de poder. Sem trânsito no PT, Dilma constituiu um grupo formado por ministros do partido que, em sua maioria, não são ligados a Dirceu, como José Eduardo Cardozo (Justiça), Aloizio Mercadante (Educação), Gleisi Hoffmann (Casa Civil) e Paulo Bernardo (Comunicações), além de Fernando Pimentel (Desenvolvimento), seu amigo de adolescência.

Escudeiros. Foi o próprio Lula quem a orientou a escalar um time de conselheiros políticos. "Monte sua equipe de confiança. Você vai precisar", disse o presidente à afilhada, em mais de uma ocasião. Apesar da fria relação com Dirceu – que a chamou de "companheira de armas e de lutas" ao passar o bastão para ela, em 2005 –, a presidente convidou o ex-ministro, em maio, para a cerimônia de instalação da Comissão da Verdade, que vai investigar violações de direitos humanos cometidos durante a ditadura militar (1964-1985). Ele ficou radiante.

"Acho Dirceu uma pessoa injustiçada", afirmou Dilma, quando ainda comandava a Casa Civil. "Não tenho conhecimento de que ele tenha beneficiado instituição financeira no tocante a crédito consignado." As declarações estão no processo do mensalão.

A principal interlocutora de Dirceu no Planalto, hoje, é a ministra das Relações Institucionais, Ideli Salvatti. É ela quem o informa sobre o andamento da CPI do Cachoeira, as pressões de aliados por cargos e as preocupações palacianas. O governo e a cúpula do PT temem que o julgamento do mensalão, agora, prejudique campanhas prioritárias, como a de Fernando Haddad, em São Paulo, e a de Patrus Ananias, em Belo Horizonte.

"Haverá interferência na eleição, qualquer que seja o resultado, e a decisão tanto pode atingir o PT como a oposição", comentou o advogado Sigmaringa Seixas, ex-deputado do PT. "Alguém pode conceber um julgamento durante o dia e o programa eleitoral à noite? Isso é um absurdo", criticou ele. Dilma, porém, não vai mexer nesse vespeiro.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

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