quinta-feira, 3 de maio de 2012

A guerra de Dilma. E a de Hollande:: Clóvis Rossi

O socialista francês politiza o combate que a brasileira prefere limitar à tecnicalidade

PARIS - Já têm algo em comum duas personalidades tão diferentes como Dilma Rousseff e François Hollande, o líder socialista francês que as pesquisas dão como vencedor das eleições de domingo.

Ambos estão em guerra com a banca. Está bem que Gilberto Carvalho, o secretário-geral da Presidência, diga que "não se trata de guerra", mas de "convencer o sistema financeiro de que cada um tem que dar sua cota para que o Brasil sobreviva num momento de crise".

Retórica à parte, é guerra, sim, senhor. Hollande nem trata de disfarçar: é guerra mesmo. Logo que se tornou candidato, deixou claro que seu "verdadeiro inimigo" é o sistema financeiro, que "não disputa eleições, mas governa".

A diferença entre a guerra de Dilma e a de Hollande se deve acima de tudo ao jeito de ser de cada um. Hollande é um animal político por excelência e, por isso, politiza o combate. Politizou-o, ademais, ao lado de dois outros líderes da social-democracia europeia, o alemão Sigmar Gabriel e o italiano Pierluigi Bersani, secretário-geral do Partido Democrático.

"Não aceitaremos que as finanças escapem ao controle da política", afirmaram os três quando se encontraram em janeiro.

Dilma, menos política e mais gerente, prefere circunscrever sua guerra à tecnicalidade dos juros, item relevante, mas que nem remotamente abarca a totalidade do confronto política-banca tal como colocado por Hollande e seus pares.

Se Dilma acha que o problema dos juros obedece a uma "lógica perversa", está dando a ele uma dimensão que deveria ir além da tecnicalidade.

É o que Hollande promete fazer: aumentar 15% o imposto que grava os lucros das entidades financeiras; obrigar os bancos a separar suas atividades tradicionais (captar dinheiro do público e emprestá-lo) de suas operações especulativas; proibir de forma expressa os produtos financeiros ditos "tóxicos" (grandes responsáveis pela crise de 2008); impedir que os bancos francesas tenham atividades em paraísos fiscais; e regular os bônus obscenos que recebem os executivos do setor.

Ou seja, o socialista francês não está seguindo o conselho do social-democrata Fernando Henrique Cardoso que disse à coluna Mercado Aberto desta Folha: "Tem de ir com jeito. Não pode encurralar o sistema financeiro".

Uma cautela que é o exato inverso da posição da social-democracia europeia, resumida na frase "não aceitaremos que as finanças escapem ao controle da política".

Pode parecer bravata, mas pôr efetivamente em prática a promessa é vital para a Europa e para a higidez econômica global. Não dá para esquecer que a crise de 2008 nasceu dos excessos do sistema financeiro e que sua fase atual na Europa -caracterizada pela preocupação com a dívida de tantos países- se deve precisamente ao fato de que os governos, tão criticados sempre, tiveram que socorrer a banca/setor privado, endividando-se até o pescoço por isso (exceto no caso da Grécia, que é outra história).

Tudo somado, Dilma deve estar torcendo para a vitória de Hollande, seu evidente aliado na guerra à "lógica perversa".

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

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