sábado, 12 de maio de 2012

Austeridade e crescimento:: Celso Ming

Depois de muitas semanas de indignação contra políticas de austeridade na Europa e de reivindicação de políticas robustas de crescimento econômico, analistas de várias tendências começam, afinal, a se perguntar de onde seriam tirados os recursos necessários para financiar a retomada da atividade econômica e do emprego.

Ou seja, já há certo contraponto à maré anterior, de forte rejeição às políticas de austeridade. Mas a maior parcela dos críticos continua a argumentar que não tem cabimento impor enormes sacrifícios à população para resolver um problema que, na origem, não é de gastança pública, mas, sim, de estouro de bolhas imobiliárias ou, mesmo, de perda de competitividade da indústria.

Excetuados os casos da Grécia e de Portugal, onde houve inegável disparada de despesas públicas logo após a emissão do euro, os demais países atolados na crise - especialmente Irlanda, Espanha, Itália e França - não podem ser acusados de ser excessivamente gastadores. Dois anos antes do estouro da crise nos Estados Unidos, essas economias apresentavam razoável equilíbrio fiscal. Apenas a Itália estava mais afundada em dívidas, mas seus números vinham melhorando ano a ano 

A crise europeia aconteceu, em grande parte, em consequência da forte redução do custo do dinheiro e da disparada do crédito que, por sua vez, provocaram impressionante boom imobiliário e alta nos salários dos países da periferia da zona do euro.

Essa redução do custo dos financiamentos proveio do lançamento do euro, em 1999. O mercado se comportou como se os títulos de todos os países do bloco tivessem a mesma qualidade dos títulos da Alemanha. Até 2007, os juros pagos pelos ativos da maioria dos países europeus eram apenas ligeiramente mais elevados que os da Alemanha. Hoje estão de 3 a 4 pontos porcentuais mais altos.

O estouro da bolha nos Estados Unidos, em 2007, e a quebra do Lehman Brothers, em 2008, provocaram a rejeição dos títulos de dívida imobiliária, porque os preços dos imóveis desabou para uma fração do valor das hipotecas. Essa situação levou ao estancamento do crédito, à ameaça de quebra em cadeia dos bancos, à recessão e ao alto nível de desocupação.

Foi então que os Tesouros nacionais foram chamados a socorrer as instituições financeiras locais e a aumentar os gastos com seguro-desemprego. Assim, as despesas públicas saltaram e a arrecadação encolheu, como desdobramento da recessão e da quebra da atividade econômica. Aí sim, uma crise essencialmente privada se transformou em deterioração das finanças públicas. Os credores perceberam que havia crescido o risco de calote e deixaram de tratar os títulos da área do euro como se fossem todos de alta qualidade. E os juros cada vez mais altos provocaram a perda da qualidade dos títulos soberanos (emitidos por Tesouros nacionais).

Dessa maneira, vemos que, na base do problema na Europa, não existe desarranjo significativo das finanças públicas (problema fiscal). Esse quadro se configurou depois. Pode-se afirmar também que uma das importantes fragilidades expostas por esta crise é a baixa competitividade da maior parte dos membros do euro, porque a alta dos salários havia aumentado substancialmente os custos de produção e de distribuição. Agora a pergunta: isso quer dizer que exista saída que dispense rígida disciplina fiscal? Provavelmente não.

O que pode e deve ser discutido é a maior utilização dos mecanismos monetários destinados a ajudar a empurrar a atividade econômica e a geração de emprego. Em outras palavras, a hora é de examinar se vale ou não a pena levar os grandes bancos centrais a emitir mais moeda para gerar mais mercado para os títulos públicos e baixar os juros extorsivos hoje prevalecentes, desde que não percam o controle da inflação.

Dada a enorme insuficiência de recursos e a impossibilidade de desvalorizar moedas nacionais para baixar rendas, salários e aposentadorias, será difícil encontrar saída para o atoleiro em que se encontra a área do euro sem a imposição de grandes sacrifícios e a adoção de políticas de austeridade.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

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