domingo, 22 de abril de 2012

No alvo!:: Amir Khair


O governo acertou em cheio ao erigir como prioridade o ataque às altas taxas de juros cobradas pelos bancos. Acertou também na estratégia de dar o exemplo, fazendo suas instituições financeiras rebaixarem expressivamente suas taxas, com ampla divulgação pela mídia. Avalio que finalmente foi dado importante passo para balizar a taxa de juro da economia capitaneado pelas instituições oficiais.

Parabéns à presidente Dilma Rousseff, que identificou o principal freio à economia e ousou enfrentar o poderio dos bancos. A redução do juro abre espaço decisivo para o crescimento.

Análises do mercado financeiro, no entanto, repetem velho argumento usado quando foi adotada estratégia semelhante na crise de 2008, que é a perda de lucro e aumento da inadimplência do Banco do Brasil e da Caixa por rebaixarem suas taxas de juros. Na realidade ocorreu o inverso. A estratégia vitoriosa foi a troca de margem alta (spread) e baixo volume de crédito por margem menor e ampliação do mercado de clientes. Além dos ganhos de escala há a possibilidade da oferta de outros produtos aos novos clientes. Essa estratégia poderá novamente dar certo, mas o que importa não é tanto o maior ou menor lucro bancário e sim um sistema racional, mais competitivo e em linha com o crescimento do País.

Nesse sentido é fundamental a campanha de divulgação do rebaixamento das taxas de juros para a ampliação da clientela. Os bancos privados temendo a perda de clientes anunciaram a redução nas taxas, seguindo a decisão do Banco do Brasil e da Caixa.

Resta ver como se dará na prática essa redução nos bancos privados. Se não for para valer, vão tomar na cabeça. No entanto, para atingir o objetivo da redução, o governo deve acionar outras medidas, pois esses bancos começaram mal ao apresentar 22 medidas que não mexiam em nada no exagerado spread bancário e afirmar que a bola estava com o governo. De fato, a bola foi para o governo que fez o ataque e marcou o gol. Não deve ser desprezada a vigorosa atuação dos clientes, que vão à luta para reduzir seus custos bancários.

Ao governo parece claro que não é qualquer redução dos juros nos bancos privados que vai resolver, mas sim forçá-los à prática de taxas de juros civilizadas. Para isso tem poderosas armas e a presidente já falou que vai acompanhar pessoalmente esse processo.

Armas. A mais importante das armas é a queda da Selic. A mina de ouro das aplicações em títulos do governo vai minguando à medida em que a Selic cai. Todos os títulos governamentais vão tendo rentabilidade menor, pois se balizam na Selic e, assim, empurram os bancos para aumentar a oferta de crédito. Aí é mais difícil a prática de taxas elevadas, pois a concorrência tende a se acirrar dificultando tentativas de cartelização.

Resta ver se o governo continuará a reduzir a Selic ou se vai parar neste ano nos 9% para evitar possíveis problemas com a caderneta de poupança em ano eleitoral. Creio que deveria ir adiante, pois ainda há espaço para redução sem risco de deslocamento de aplicações em títulos para a caderneta. As elevadas taxas de administração cobradas pelos bancos tendem a ser reduzidas e esse espaço pode acomodar a redução da Selic. Outra possibilidade é a redução da tributação sobre os ganhos em títulos públicos ou ainda, o que prefiro, efetuar a rolagem com emissão monetária. Enfim, existem alternativas a serem usadas em prol da redução da Selic com expressivos ganhos fiscais ao governo federal na rolagem da sua dívida mobiliária e na redução do carregamento das reservas internacionais.

Essa é a mais poderosa economia nas despesas, que poderia ser usada para forte ampliação dos programas sociais e dos investimentos em infraestrutura, bem como na desoneração tributária para a sociedade. Os recursos são expressivos: em 2011, o governo federal torrou R$ 181 bilhões com juros e mais de R$ 100 bilhões com o carregamento das reservas internacionais. Neste ano, pode torrar mais, pois a dívida e as reservas são maiores. Não faltam, pois recursos para ativar a economia. O importante é não desperdiçá-los com juros.

Outra arma poderosa é o estabelecimento de regra de depósito compulsório dos bancos no Banco Central (BC) de acordo com a taxa de juro praticada pelo banco. O depósito compulsório é formado por porcentuais dos depósitos à vista e a prazo do banco. Na nova regra, o porcentual seria tanto menor quanto menor fosse a taxa de juro praticada pelo banco. Como Banco do Brasil e Caixa operam com taxas menores que os bancos privados, teriam aumento do volume de recursos para ampliação do crédito, o que está em linha com a estratégia de ganhar maior participação no mercado.

Sugestões. Indo adiante, o governo poderia efetivar duas medidas de forte efeito sobre a economia. A primeira é a redução das tarifas bancárias. Elas constituem poderosa bomba de sucção de dinheiro das pessoas e empresas para os bancos. Os serviços bancários têm custos e devem ser remunerados, mas o que se vê no País é um exagero. Além de serviços precários, com recordes de reclamações dos clientes, o montante dessas tarifas chega a superar todo o custo administrativo dos bancos. Ocorreu padronização desses serviços em abril de 2008, mas nada avançou em matéria de redução dessas tarifas. Está na hora de fazê-la, ampliando assim os recursos em poder das pessoas e das empresas, o que permite maior consumo e poupança.

A segunda sugestão traz forte impacto nas contas públicas e no câmbio. Trata-se de ampliar a liquidez da economia, ou seja, emitir moeda. Explicando: para cobrir o déficit nas contas do governo federal, a compra de dólares pelo BC para ampliar as reservas internacionais (operações compromissadas) e o aporte de recursos para o BNDES, o Tesouro emite títulos da dívida e, bem menos, ocorre a complementação com a emissão de moeda pelo BC. A emissão líquida de títulos em 2011 atingiu R$ 179 bilhões (!), pois a dívida mobiliária interna federal cresceu de R$ 1.604 bilhão para R$ 1.783 bilhão no ano. A sugestão é emitir moeda em vez de engrossar a dívida com títulos que oneram juros. A crítica é que isso gera inflação. Não creio, pois o fio condutor da inflação é externo e os preços internacionais estão estagnados ou em queda, induzindo as empresas a conterem seus preços.

A oportunidade para isso é agora, pois além da redução expressiva da despesa com juros, tem efeito decisivo sobre o câmbio, o que influi poderosamente na competitividade das empresas. Os países desenvolvidos vêm usando essa estratégia para ampliar exportações e não registraram inflação, mesmo com juros praticamente nulos. O excesso de liquidez criado pelas economias desenvolvidas só pode ser combatido com eficácia usando a mesma estratégia, que é emitir moeda, ampliando a base monetária. Liquidez se combate com liquidez. É bom mirar nesses novos alvos, pois o Brasil tem potencial para crescer bem mais e de forma saudável.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

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