terça-feira, 13 de março de 2012

Ditadura: MPF quer apurar 'crimes permanentes'

Procuradores discutem possibilidade de denunciar ocultação de cadáver, violação que não seria coberta pela Lei da Anistia

Chico Otavio

No esforço de investigar as violações cometidas no regime militar (1964-1985) sem esbarrar nos limites impostos pela Lei da Anistia, o grupo de trabalho "Justiça de Transição", composto por procuradores da República, deverá trabalhar com a tese dos crimes permanentes, como a ocultação de cadáveres. A interpretação do grupo, explicou o procurador da República Ivan Cláudio Marx (Uruguaiana), é de que os responsáveis pelo sequestro e desaparecimento das vítimas do regime, ao se negarem a fornecer o paradeiro dos corpos, continuam praticando o crime de ocultação até hoje.

Desde ontem, integrantes do grupo estão reunidos em Brasília, para definir estratégias de apuração. Uma delas é a abertura de procedimentos investigatórios criminais, em vez de inquéritos, para os casos de violação. Como o procedimento é uma etapa inicial, conduzida internamente pelo Ministério Público Federal, sem a participação da autoridade policial, os procuradores entendem que a investigação fica menos exposta a eventual pedido de trancamento.

No Rio, o Ministério Público Federal quer investigar, a partir dessa teoria, os casos de quatro desaparecidos políticos: Carlos Alberto Soares de Freitas, o Beto, militante da VAR Palmares - o único procedimento já aberto -, Stuart Edgard Angel Jones (MR 8), Mário Alves (PCBR) e o deputado cassado Rubens Paiva. Criado em novembro do ano passado, com objetivo dar uma resposta à sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos que condenou o Brasil por violações na Guerrilha do Araguaia, o grupo mobiliza procuradores da República do Rio, São Paulo, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Pará. Coordenador do projeto, Ivan Cláudio disse que os participantes ouviram ontem doutrinadores das universidades americanas de Stanford e Harvard para saber o que pensam dos crimes imprescritíveis (quando nunca se esgota a possibilidade de punição dos responsáveis).

O promotor de Justiça Militar Otávio Bravo, responsável pela abertura de investigações sobre 29 casos de desaparecimento no Rio, disse que o trabalho dos colegas do MP Federal não atrapalha o andamento das suas apurações. Se constatar que os sequestros terminaram antes de 15 de agosto de 1979 (data da Lei da Anistia) com a morte das vítimas, ele reconhecerá a prescrição dos casos, mas encaminhará tudo aos procuradores da República, que têm atribuição para investigar ocultação de cadáver.

- É talvez a única possibilidade de ver um militar sentado no banco dos réus.

FONTE: O GLOBO

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