quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Sobram dólares lá fora:: Celso Ming

A forte valorização do real (baixa do dólar), de 7,8%, e a alta da Bolsa brasileira, de 11,1%, em janeiro, são montanhas da mesma paisagem.

O fator mais importante que puxou esses números para cima foi a extinção do principal foco de incêndio na Europa. Os bancos já não correm mais sério risco de quebrar, como se temia até o fim de dezembro.


Foi o despejo de quase meio trilhão de euros pelo Banco Central Europeu em empréstimos de três anos e juros de 1% ao ano para mais de 500 bancos a novidade que removeu a maior fonte de insegurança e turbulência financeira. E, confirmada nova operação no fim de fevereiro que pode alcançar 1 trilhão de euros (conforme estimativas), ficará quase definitivamente sacramentada a percepção de que não se repetirá na Europa catástrofe semelhante à do Lehman Brothers, em 2008 - embora a crise do euro continue sem solução.

Também o Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos) faz de tudo para garantir farta liquidez. Seu presidente, Ben Bernanke, acaba de avisar não só que os juros básicos seguirão perto de zero ao menos até o fim de 2014, mas que pode colocar em marcha nova operação de recompra de títulos do Tesouro americano (afrouxamento quantitativo) - o que implicaria novas emissões de moeda.

Essa atuação dos grandes bancos centrais, que restabeleceu no mercado financeiro internacional o apetite por aplicações de risco, é a principal explicação para o grande afluxo de moeda estrangeira ao mercado de câmbio do Brasil.

Mas não é a única. Contribui para isso o aumento da percepção de que, comparada com as demais, a economia brasileira vem tendo bom desempenho. Não é nada, exibiu em 2011 crescimento das exportações de nada menos que 26,8%, num ambiente paralisado pela crise; avanço do PIB de cerca de 2,7% (os números finais não estão disponíveis); e situação de pleno emprego como nunca se viu por aqui.

Portanto, a baixa do dólar no câmbio interno não é provocada por especuladores que trazem moeda estrangeira para tirar proveito dos juros bem mais baixos - como muita gente ainda pensa.

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, tem repetido não tolerar uma excessiva valorização do real. Em direção aparentemente oposta, o Banco Central já não compra moeda estrangeira como antes. Isso sugere que o barateamento das importações e a consequente redução das pressões inflacionárias causadas pela valorização do real sejam parte do plano do governo que viabiliza a meta dos juros de um dígito (abaixo de 10% ao ano). Assim, a queda dos juros na economia (hoje possível a partir de melhores resultados das contas públicas) atua para atrair mais dólares. Ainda que a agonia do euro vigore em 2012, o despejo de moeda forte no mercado internacional não será reduzido nos próximos meses - tenderá a crescer. Ou seja, a valorização do real deve prosseguir.

Melhorar a competitividade do setor produtivo do País com virada no câmbio é projeto de alta probabilidade de insucesso. E, se está mesmo mais empenhado nisso, Mantega obteria melhores resultados se agisse mais eficazmente para derrubar o custo Brasil. É o caminho das reformas e dos investimentos em infraestrutura.

CONFIRA

Aí está o comportamento da balança comercial nos últimos 12 meses.

Aumentou o rombo. Janeiro teve déficit (importações mais altas do que exportações) de quase US$ 1,3 bilhão. É o maior num mês de janeiro em 21 anos. Não dá para dizer que seja tendência – é preciso tirar a pressão arterial mais vezes antes de concluir que o sujeito está sofrendo de hipertensão. Em 12 meses, as exportações subiram 24,8%; as importações, 23,6%. Mas se pode dizer que a economia enfrenta forte propensão ao consumo. E isso não vem só de um câmbio favorável às compras externas.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

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