terça-feira, 3 de janeiro de 2012

Além dos números:: Merval Pereira

Mais importante que definir que ter o sexto Produto Interno Bruto (PIB) do mundo não significa ter um país melhor - estamos em 84º lugar no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH); em 88º no Índice de Desenvolvimento Educacional; ainda somos um dos mais desiguais na distribuição de renda do mundo, apesar dos avanços recentes - é entender que, para deixarmos de ser o 73º país no ranking de renda per capita, temos que encarar as reformas estruturais de que o país necessita para crescer sustentavelmente, principalmente na educação.

Mesmo porque a previsão de que passamos o Reino Unidos se baseia em expectativas de crescimento e câmbio que estão sujeitas a alterações que podem mudar novamente o ranking, embora a crise financeira internacional torne quase inexorável a ascensão dos países emergentes.

A Goldman Sachs, que "inventou" o acrônimo Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) para tornar palpável o crescimento dos emergentes, considera que é possível que dentro de 18 anos a economia da China venha a ser tão grande quanto a dos Estados Unidos.

Desde o início da crise financeira internacional, em 2007, os Brics respondem por cerca de 45% do crescimento global.

A soma do PIB dos Brics pode alcançar a dos países que compõem hoje o G-7 por volta de 2032, sete anos antes do previsto inicialmente.

Com relação ao Brasil, um estudo do empresário Paulo Cunha mostra que, se a renda per capita brasileira tivesse crescido até hoje à mesma taxa do período de 1900 a 1980, estaríamos com 35% da renda dos americanos - próximos do Chile e melhores que o México.

E se tivéssemos crescido mais aceleradamente, ao ritmo registrado entre 1950 e 1980, quando crescemos a uma média anual de 7%, (nosso PIB registrou médias asiáticas: 7,15% de 1950 a 1959; 6,12% de 1960 a 1969; e 8,78% de 1970 a 1979), estaríamos hoje com 48% da renda americana, semelhante à de Portugal.

Ao contrário, se de 1900 a 2004 a renda per capita tivesse crescido no ritmo dos últimos 25 anos, nossa renda seria equivalente a 18% da renda atual, o que corresponderia às rendas do Quênia e da Nigéria - estaríamos entre os 15 países mais pobres do mundo.

O PIB per capita do Brasil em 1980 equivalia a 30,5% do dos Estados Unidos; em 2009, essa relação caiu para 22,7%.

Ao contrário, no mesmo período, o PIB per capita da Coreia do Sul em Paridade de Poder de Compra (PPC) equivalia a 18,8% do norte-americano, quase a nossa situação hoje, e era 60% menor do que o PIB per capita brasileiro naquela ocasião.

Mas nesses 30 anos a Coreia do Sul conseguiu aumentar o percentual em relação aos Estados Unidos para 60,3%. Esse avanço tem a ver principalmente com o salto de qualidade no ensino que o país deu nos últimos anos.

Até 1980, o Brasil cresceu mais que a média mundial: de 1900 a 1980, a renda per capita brasileira cresceu em média 3,04%, enquanto a renda mundial cresceu 1,92%.

O período de maior crescimento foi o de 1950 a 1980, que alguns classificam como os "anos dourados", quando o país cresceu em média 4,39% sua renda per capita, para um crescimento médio mundial de 2,83%. Nesse período, o Brasil figurou entre os dez países mais dinâmicos do mundo.

A partir daí, assistimos a uma redução de 90% do ritmo de crescimento per capita - de 4,39% para 0,43% de 1980 a 2004.

No trabalho "Redução da desigualdade da renda no governo Lula - Análise comparativa", o professor Reinaldo Gonçalves, do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro, mostra que no período de 2001-10 o Brasil teve uma taxa média anual de crescimento do PIB real per capita de 2,2%, inferior à média de um painel composto por 12 países da América Latina: Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Equador, Honduras, México, Paraguai, Peru, Uruguai e Venezuela.

O crescimento médio anual do país no período de 1995 a 2009 foi de 2,9%, fazendo com que a elevação da renda tenha sido de apenas 22%, contra 100% na Índia e 226% na China no mesmo período.

Mesmo crescendo a apenas 3% ao ano (previsão que já está sendo reduzida pelos especialistas), o PIB brasileiro aumentará mais que o dos países europeus e o dos Estados Unidos nos próximos anos, o que coloca o país no G-6 da economia mundial.

Mas crescerá menos que emergentes como China e Índia. Devido ao baixo índice educacional e à falta de infraestrutura, Brasil e Índia crescerão em velocidade menor que Rússia e China nos próximos 20 anos, segundo estudo da Goldman Sachs, criadora dos Brics.

Mas, mesmo a lista das dez maiores economias do mundo devendo ser bastante diferente da de hoje nos próximos anos, há um detalhe fundamental: as maiores economias, medidas pelo Produto Interno Bruto (PIB), provavelmente continuarão não sendo as mais ricas em termos de renda per capita.

Pelas projeções, os cidadãos dos Brics continuarão sendo mais pobres na média que os cidadãos dos países do G-6 de hoje, com exceção talvez da Rússia.

O Brasil, se conseguir manter uma média de crescimento do PIB de 3,5% ao ano, chegará a 2050 com uma renda per capita de US$26.500, próximo à de Portugal hoje, muito longe do que já têm hoje França e Alemanha (cerca de US$44 mil), menos do que o Japão (cerca de US$45 mil) e os Estados Unidos hoje (cerca de US$48 mil).

Para piorar a perspectiva, mesmo com a crise financeira internacional, o PIB per capita dos maiores países continuou crescendo, mesmo o do Japão, que está em recessão há quase 20 anos.

Portanto, mesmo que chegue a ser a 5ª economia de um mundo conturbado, o país continuará tendo desvantagens competitivas sérias.

Os países que fazem parte da OCDE, os mais avançados do mundo, aplicam cerca de 7% do PIB em pesquisa e desenvolvimento. O Brasil não passa de 1%, sendo suplantado largamente por Coreia do Sul e China, países que estavam atrás de nós nesse setor nos anos 1980.

A participação brasileira na produção mundial caiu de 3,1%, em 1995, para 2,9%, em 2009, o que denota falta de competitividade. No mesmo período, a China saltou de 5,7% para 12,5%, e a Índia foi de 3,2% para 5,1%.

Em 1960, a Coreia já tinha escolaridade média superior à do Brasil em 1,4 ano de estudo, e essa diferença só fez aumentar de lá para cá, estando atualmente em mais de seis anos.

FONTE: O GLOBO

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