domingo, 10 de julho de 2011

Opinião – Fernando Gabeira: os partidos

O movimento que surge hoje é muito importante porque representa uma resposta a um problema fundamental dos últimos anos, que é o de aproximar a sociedade dos grandes temas, fazer com que exista a possibilidade de participação política para pessoas que querem atuar de uma forma digna e ética.

Vamos olhar os partidos com as suas limitações ou vamos tentar criar um novo partido. Acho uma questão fundamental para nós tentarmos definir lá na frente. É importante atuar nas instituições, resolver as questões no Parlamento. Acredito que os partidos já existentes podem fazer o caminho inverso e aderir aos preceitos do movimento que está sendo criado.
  
Fernando Gabeira, ex-deputado federal. O Globo 8/7/2011

Manchetes de alguns dos principais jornais do Brasil


O GLOBO
FOLHA DE S. PAULO
O ESTADO DE S. PAULO

ESTADO DE MINAS
CORREIO BRAZILIENSE

ZERO HORA (RS)
Corrupção muda táticas para escapar de controles
O pivô das denúncias

Verba de reconstrução é desviada para propina

Em depoimento ao Ministério Público Federal (MPF), o dono de uma construtora revelou que, na chuva que há seis meses matou mais de 900 pessoas na Região Serrana, um acerto entre empreiteiras e autoridades de Teresópolis subiu a taxa da propina de 10% para 50%, como revelam os repórteres Antonio Werneck e Waleska Borges. Em Friburgo, o município mais atingido pela enxurrada, uma empresa ganhou um contrato de mais de R$ 900 mil para prestação de serviços, apesar de estar proibida de participar de licitações. Até agora, o MPF da cidade já instaurou mais de dez inquéritos civis públicos para apurar denúncias de corrupção. "Ninguém da prefeitura apareceu por aqui para oferecer um saco de cimento", disse Josias Simões, morador de Teresópolis, que vive numa casa parcialmente soterrada

Depois da tempestade, vem a corrupção

Investigação do MPF revela que, na época das enxurradas, funcionários e empresas elevaram de 10% para 50% a propina para contratos sem licitação

Antônio Werneck

Em janeiro deste ano, as imagens do maior desastre natural já ocorrido no país comoveram os brasileiros, provocando uma onda de solidariedade em direção à Região Serrana do Rio. Passados seis meses das enxurradas, que mataram mais de 900 pessoas, uma investigação protegida por sigilo de Justiça, em curso no Ministério Público Federal, revela o pior do ser humano: enquanto equipes trabalhavam dia e noite nas buscas por sobreviventes, um grupo de funcionários públicos e empresários teria acertado o reajuste de propinas para aprovar contratos sem licitação, embolsando verba liberada para ajudar sobretudo os mais necessitados. A investigação mostra que o percentual da propina, que normalmente era de 10%, na tragédia quadruplicou, passando para 50%.

As investigações começaram com o relato de um empresário ao MPF de Teresópolis. Disposto a contar tudo o que sabia em troca de perdão judicial e proteção para sua família, ele recorreu à delação premiada (quando um criminoso faz acordo com a Justiça, ajudando nas investigações) para revelar um suposto esquema de corrupção que funcionava na prefeitura, envolvendo empresas que atuaram em pelo menos quatro municípios da Região Serrana na época da tragédia.

Segundo ele, na semana das enxurradas - ocorridas em 12 de janeiro -, empresários e secretários municipais se reuniram num gabinete da prefeitura, administrada pelo PT, para dividir os contratos sem licitação e os recursos federais. O dinheiro, um total R$100 milhões, foi enviado ao Estado do Rio pelo Ministério da Integração Nacional, por determinação da presidente Dilma Rousseff.

O empresário revelou ainda que secretários de Teresópolis na época - José Alexandre (Governo) e Paulo Marquesine (Obras) -, com o auxílio do então presidente da Comissão de Licitação do município, surpreenderam ao impor outro valor de propina. "Em 2010, eles exigiam de 5% a 10%, pediam presentes e adiantamentos para escolher as empresas que venceriam a concorrência. Na semana da tragédia, anunciaram um reajuste: o valor cobrado passaria para 50%", contou o empresário em depoimento ao MP. José Alexandre e Paulo Marquesine foram procurados pelo GLOBO, mas não foram encontrados.

Três empresas seriam as mais beneficiadas

Segundo o denunciante, três empresas (RW de Teresópolis Construtora e Consultoria Ltda; Vital Engenharia Ambiental S/A, do grupo Queiroz Galvão; e Terrapleno Terraplanagem e Construção Ltda) seriam as principais beneficiadas. Ainda de acordo com o seu relato, a RW e a Vital ficariam encarregadas da retirada de entulho e da desobstrução de ruas. Já a Terrapleno ficaria com a coleta de lixo, com auxílio da Vital, que cuidaria da instalação de um aterro. Uma quarta empresa, a Contern Construções e Comércio Ltda, de São Paulo, também teria recebido recursos do município, mas não é citada pelo empresário.

As denúncias foram feitas na sede da Procuradoria da República de Teresópolis, aumentando o número de informações de um inquérito civil público que já apurava o suposto desvio de dinheiro público e a não realização de obras contratadas na cidade. O procurador da República Paulo Cezar Calandrini, que cuida do caso, disse que não poderia falar do assunto porque o inquérito corria em segredo de Justiça.

Denúncias de irregularidades e suspeitas de corrupção também atingiram Nova Friburgo, o município que mais sofreu, em área urbana, com o temporal do início do ano, tendo recebido R$10 milhões - a maior fatia das verbas federais enviadas às cidades da região. Até agora, o MPF na cidade já instaurou mais de dez inquéritos civis públicos e promete outros, cobrando explicações da prefeitura. O caso mais grave aponta para funcionários da Fundação Municipal de Saúde (FMS), que autorizaram, no meio tragédia, o pagamento, sem licitação, de mais de R$900 mil a uma empresa do Rio, a Spectru Instrumental Científico Ltda. O contrato previa que a empresa faria a manutenção e a conservação de equipamentos da rede municipal de saúde atingidos pela enxurrada.

Os procuradores da República que atuam no município descobriram que a Spectru já tinha vencido, em 2010, uma concorrência para prestar basicamente os mesmos serviços (manutenção de equipamentos hospitalares) por um terço do valor total. O processo seletivo acabou anulado porque empresas participantes provaram na Justiça que a Spectru estava impedida de concorrer em qualquer licitação no estado - por não ter cumprido os termos do contrato de outra concorrência.

Em abril, o MPF de Friburgo já havia instaurado um inquérito civil público para apurar a lentidão da prefeitura para informar como estava usando verbas federais no município. No mês passado, em outra ação do MP, a Justiça determinou que a Fundação Municipal de Saúde suspendesse o pagamento de quase R$ 2,9 milhões a quatro empresas para obter material médico-hospitalar. Os procuradores da República também descobriram que as compras foram autorizadas sem um pedido prévio do chefe do almoxarifado central da FMS.

- A grosso modo, é o mesmo que você ir ao supermercado e encher um carrinho de compras sem antes saber o que realmente está faltando em sua casa - disse o procurador Marcelo Borges de Mattos Medina.

As suspeitas de fraudes com o dinheiro público recaem ainda sobre outros cinco municípios da região atingidos pelas enxurradas: Petrópolis, Sumidouro, Areal, Bom Jardim e São José do Vale do Rio Preto, que teriam recebido um total R$13 milhões do governo federal, mas até hoje não prestaram contas de como gastaram a verba. As investigações sobre possíveis irregularidades respingam ainda nas secretarias de Obras e de Assistência Social e Direitos Humanos do governo do estado. Os dois órgãos ficaram encarregados de aplicar nos municípios serranos recursos da ordem de R$70 milhões enviados pela União. Segundo procuradores do MPF que atuam da região, somente na última sexta-feira o governo estadual enviou informações sobre os serviços que contratou. Esses dados ainda serão analisados. Já os municípios não prestaram informações satisfatórias.

FONTE: O GLOBO

Estatal das ferrovias acumula denúncias

Controlada desde 2003 pelo PR, partido que foi pivô da última crise do governo Dilma, a Valec – estatal responsável pelas ferrovias – acumula denúncias de irregularidades. Um exemplo é a Ferrovia Norte-Sul. A obra do PAC tocada pela Valec recebeu nos últimos quatro anos R$ 4,7 bilhões, mas, no trecho entre Aguiarnópolis (MA) e Anápolis (GO), cada quilômetro custou quase 17% acima do valor de mercado. Em 2010, o TCU analisou 11 contratos da ferrovia – todos com sinais de sobrepreço. Os problemas cresceram na gestão de José Francisco das Neves, demitido junto com a cúpula dos Transportes

Estatal de ferrovias opera nos trilhos das irregularidades

Problemas se multiplicaram na gestão de Juquinha, demitido no escândalo dos Transportes

Regina Alvarez e Roberto Maltchik

A Valec, empresa responsável pelas ferrovias no governo federal, é uma fábrica de irregularidades e exemplo de má gestão. Os problemas são antigos, mas se agravaram na vigência do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), quando a empresa teve seu orçamento multiplicado por quatro. A Ferrovia Norte-Sul, obra mais robusta tocada pela Valec, recebeu nos últimos quatro anos R$4,7 bilhões dos cofres públicos, aplicados na construção de um trecho de 1.358 quilômetros, entre Aguiarnópolis (MA) e Anápolis (GO). Cada quilômetro custou R$3,5 milhões, em média, quase 17% acima do valor médio estimado pelo mercado - R$3 milhões.

Um exame em auditorias feitas pela Controladoria Geral da União (CGU) nas contas da empresa e em acórdãos do Tribunal de Contas da União (TCU) evidencia que as falhas na administração e as irregularidades nas obras da Valec se multiplicaram na gestão de José Francisco das Neves, o Juquinha, que assumiu a presidência da empresa em abril de 2003. Mas ele se manteve no cargo até estourar o escândalo que derrubou toda a cúpula do Ministério dos Transportes, na semana passada.

Juquinha tinha como padrinho o deputado Valdemar Costa Neto (SP), cacique do PR, e contava também com o apoio do ex-ministro dos Transportes Alfredo Nascimento, para quem eram encaminhados relatórios dos órgãos de controle interno e externo apontando as irregularidades e desmandos administrativos na Valec.

No comando da empresa, Juquinha se empenhou para acelerar o ritmo das obras da Norte-Sul em Goiás, seu estado natal, onde consolidou forte atuação política enquanto presidia a Valec. Quando a ferrovia chegou a Goiás, aprovou a nota técnica 03/2009, que permitiu à Valec firmar termo aditivo ao contrato 14/2006, garantindo acréscimo superior a 25% (limite permitido na lei das licitações) no valor para um trecho de só 12 quilômetros, que passou a custar R$84,9 milhões.

Esse acréscimo chamou a atenção do TCU, e a auditoria identificou graves irregularidades no contrato, com indícios de superfaturamento e sobrepreço. A obra foi paralisada. Hoje, esse trecho inconcluso impede que o trecho norte da estrada de ferro entre em operação. Na auditoria, os técnicos do TCU analisaram sete outros contratos, todos com indícios de sobrepreço.

As irregularidades nos contratos - sobrepreço, superfaturamento e pagamentos indevidos às empreiteiras - estão presentes em praticamente todos os trechos da Ferrovia Norte-Sul construídos na vigência do PAC.

Em 2010, em um único acórdão, o TCU analisou 11 contratos relativos ao trecho de 504 quilômetros, entre Aguiarnópolis e Palmas, em Tocantins. Em todos encontrou indícios de sobrepreço. Em seis, o tribunal recomendou a abertura de Tomada de Contas Especial, a partir de suspeitas de superfaturamento e de pagamentos indevidos às empreiteiras.

Em um dos contratos, firmado com a Odebrecht, os auditores encontraram fortes indícios de sobrepreço no montante de R$36,5 milhões para a manutenção de canteiros de obras no lote nove da ferrovia. Apesar das contestações da empreiteira, que nega as irregularidades, as suspeitas obrigaram a Valec a rescindir o contrato, reter novos pagamentos e entregar o serviço para outra construtora.

Em auditoria aprovada em setembro passado, o TCU identificou irregularidades com dano potencial ao erário de R$69,7 milhões em sete contratos com cinco empreiteiras diferentes, no trecho de 280 quilômetros entre Anápolis (GO) e Uruaçu (GO). Por isso, determinou a retenção cautelar de novos recursos às construtoras.
Essa é apenas uma amostra da quantidade de indícios de irregularidades apontadas no histórico da bilionária obra, alvo da cobiça de políticos e empreiteiros. Nos últimos dois anos, o TCU aprovou pelo menos 15 acórdãos nos quais expõe uma lista de trechos superfaturados ou com contratos inflados, que determinaram atrasos, processos administrativos e investigações criminais.

Em cada trecho, uma suspeita

Em cada trecho surge uma suspeita diferente. Entre Santa Isabel e Uruaçu, a Polícia Federal investiga indícios de superfaturamento de R$71,1 milhões. As principais irregularidades teriam ocorrido nos serviços de terraplanagem, apontados pelos técnicos do tribunal como os mais difíceis de detectar desvios. O próprio TCU já recomendou à Valec a adoção de novos mecanismos de qualificação do terreno, antes do início dos trabalhos.

As auditorias da CGU nas contas da Valec mostram falhas na gestão da obra anteriores ao PAC. Em 2005, dois aditivos foram aprovados em um contrato de 2002 com a empresa SPA Engenharia, sem autorização do Conselho de Administração da Valec.

Os aditivos irregulares, que só foram submetidos ao Conselho oito meses depois de aprovados, ampliaram em R$21,5 milhões o valor original, de R$119,4 milhões. A SPA é a empreiteira que mais recebeu recursos da Valec na vigência do PAC. De 2007 até junho deste ano, abocanhou R$1,2 bilhão em contratos da Norte-Sul.

Algumas conclusões da auditoria que analisou as contas de 2009 da Valec dão o tom do descontrole e da incapacidade para gerir obras sob sua responsabilidade: "A precariedade no gerenciamento, supervisão e fiscalização dos contratos de supervisão na Ferrovia Norte-Sul está relacionada, mais uma vez, com a deficiência de gerenciamento de atuação da Superintendência de Construção e, na parte que lhes competem, das superintendências de Goiás e Tocantins frente aos problemas evidenciados nas medições dos serviços de supervisão", escreveram os auditores.

"(...) Vale ressaltar, neste contexto deficiente de atuação gerencial da Diretoria de Engenharia, que uma das principais falhas caracteriza-se pela aprovação de documentos, base para o pagamento de serviços executados, sem os elementos suficientes e sem que os fiscais responsáveis exerçam efetivamente a atribuição de atestar os valores medidos, expondo a entidade a situações de vulnerabilidade, com riscos de danos ao erário". "Verifica-se ainda a carência de providências para apuração de responsabilidade (...)", destacam os auditores.

FONTE: O GLOBO

Dez grupos já dominam 70% do consumo

Com a concentração nos setores de alimentos, bebidas, higiene e limpeza, dez grandes empresas já detêm 70% das compras de supermercado dos brasileiros. Os demais 30% ficam com 500 firmas menores, diz a consultoria Azo. O secretário de Direito Econômico, Vinícius Carvalho, diz que quem julga fusões é "acusado de comunista"

O domínio silencioso das marcas

Dez empresas concentram 70% das compras dos carrinhos dos consumidores nos supermercados

Fabiana Ribeiro e Henrique Gomes Batista

A concorrência entre diversos produtos que pesam diretamente no orçamento familiar, como alimentos, bebidas, higiene e limpeza, em muitos casos, é mero jogo de faz de conta no país. Dez grandes empresas - multinacionais, na maioria - abocanham de 60% a 70% das compras de supermercado de uma família típica brasileira e tornam o Brasil um dos países com maior nível de concentração no mundo, apontam especialistas em varejo. Muitas vezes, um fabricante chega a ser dono de diversas marcas de um mesmo produto, fazendo com que elas "disputem" entre si fatias do mercado. Uma tática da indústria que acaba por limitar o poder de escolha do consumidor, que, constantemente, nem desconfia de quem está por trás de sua marca preferida. A estratégia também trava a expansão de marcas menores. A situação pode até se intensificar caso a polêmica fusão entre Pão de Açúcar e Carrefour saia, de fato, do papel, concentrando mais ainda o setor supermercadista.

- Poucas indústrias, apenas dez, entram com força no carrinho de compras dos brasileiros. Esse grupo representa até 70% das compras. Os demais 30% são disputados por cerca de 500 empresas menores, regionais - disse Marco Quintarelli, diretor do Grupo Azo, consultoria especializada em varejo, referindo-se a AmBev, BRF-Brasil Foods, Coca-Cola, Hypermarcas, JBS, Kimberly-Clark, Nestlé, Procter&Gamble, Reckitt Benckiser e Unilever (ver infografia ao lado).

Segundo Quintarelli, a concentração brasileira na indústria de bens de consumo cresceu fortemente, nos últimos anos, com a maior presença no país de grandes produtores mundiais - interessados no potencial de consumo das classes emergentes. A gigante Unilever, por exemplo, se orgulha de entrar a cada mês em 86% das residências brasileiras através de algumas de suas marcas como Omo, Kibon, Seda, Lux, Hellmann"s, Arisco e Knorr. Entre as nacionais, a tese de Quintarelli fica clara com o alto nível de concentração atingido no segmento de lasanhas e comidas prontas: a BRF-Brasil Foods, criada em 2008 com polêmica fusão entre Sadia e Perdigão, ainda em análise pelos órgãos de defesa da concorrência, detêm 90% do segmento.

Empresas impõem preços ao varejo

As vozes críticas à crescente concentração se voltam também para o problema do controle de preços. Ao dominarem mercados, as indústrias tendem a impor preços ou dificultar negociações com o varejo, diz um varejista que preferiu não se indentificar. Outra imposição é empurrar produtos de menor qualidade - ou de menor saída - nas meganegociações com o varejo.

- Os consumidores não têm a menor noção de que, após uma fusão, as indústrias ficam mais fortes e, por isso, acabam tendo maior controle sobre os preços. A culpa recai, sem dúvida, sobre os varejistas - disse Armando Strozenberg, conselheiro da Associação Brasileira de Propaganda (ABP).

Segundo Genival de Souza, diretor do Prezunic, a concentração diminui o poder de negociação dos varejistas. Além disso, dificulta o fortalecimento de marcas menores e reduz as opções de compra dos consumidores.

- No setor de sabão em pó, por exemplo, Omo e Surf (da Unilever) representam mais de 70% das vendas da categoria. Como não ter Omo? Estamos falando de uma marca imbatível. Podemos dar mais opções, por exemplo, de leite condensado. Mas não tem como não ter Leite Moça. Esse poderio me impede de barganhar, independentemente do bom relacionamento da rede com a indústria - disse Souza.

Os tentáculos das indústrias podem não ser percebidos pelos consumidores até o momento em que, paradoxalmente, buscam um selo de qualidade para um suco ou uma margarina. Então, marcas como a Del Valle não deixam de colocar, ainda que discretamente, a sua fabricante, a Coca-Cola. Outras empresas, como a Reckitt Benckiser, sabem da importância de reforçar marcas como Vanish - líder com mais de 75% de mercado em mais de 50 países - e praticamente dobrou seu investimento em publicidade no último ano, pulando da 16ª para a oitava posição entre os maiores anunciantes do país.

Consumidor ignora efeitos de fusões

- O mais importante para as empresas hoje são as suas marcas. Daí o fato de o suco Del Valle não apresentar tão agressivamente a marca Coca-Cola no rótulo. Em vez disso, o "Coca-Cola" fica no cantinho das embalagens e funciona mais como um atestado de qualidade do produto e pode trazer nas entrelinhas atributos como higiene e qualidade - afirmou Strozenberg, acrescentando que, atualmente, não se vê mais anúncios que fazem menção a uma empresa e suas marcas. - Já não se vê mais propagandas que lembrem que um ou outro produto faz parte da família Unilever.

- A força de empresas como Unilever e Nestlé fica clara em suas campanhas publicitárias - pondera José Martins, diretor da Global Brands, referindo-se ao fato de que muitas delas não fazem mais propaganda individualmente de seus produtos, mas da marca corporativa. - Ainda assim, pouca gente sabe que a Jaguar e Land Rover são da Ford.

Para Paulo Vicente, professor da Fundação Dom Cabral, a eventual concentração do varejo com uma fusão entre Pão de Açúcar e Carrefour poderia piorar essa situação e ampliar a barreira para novos fabricantes de bens de consumo. Vicente acredita que o mercado de alimentos e higiene e limpeza é mais concentrado no Brasil que em outros países.

- O setor de supermercados no Brasil é menos concentrado que em outros países e há espaço para novos jogadores, é um setor sem muitas barreiras de entrada. Mas a fabricação de alimentos e produtos de higiene é muito mais difícil, pois necessita de alto capital, know-how, maquinaria, rede de distribuição e de marcas fortes. Como grandes grupos já concentram este mercado e investem muito em suas marcas, esta é uma das maiores barreiras - afirmou. - Não deixa de ser um paradoxo um país tão forte no agronegócio não ter criado grandes marcas, com diferenciais, e manter diversos segmentos nas mãos de cinco ou seis jogadores globais - afirmou.

O publicitário Eduardo Barros, sócio da iYo, tem o hábito de comprar o sabão em pó Omo, mas nem tinha noção de que o Surf sai da mesma fabricante, a Unilever. Nem imaginava que três adoçantes - Finn, Adocyl e Zero-Cal - que controlam mais da metade do setor são da Hypermarcas. E muito menos que Elegê é BRF-Brasil Foods. Preocupado com a qualidade dos alimentos que dá à sua filha, sempre buscava comprar congelados de Sadia e Perdigão, fugindo de "marcas menores" como Batavo. Ao saber que ela também faz parte do grupo, se surpreendeu:
- Descobrir que uma marca controla outras menores me faz sentir um pouco enrolado. Por que os preços tão diferentes? Será que no produto mais barato há menos qualidade? - indaga Barros, que não experimenta marcas desconhecidas na alimentação, reforçando a tese do peso da marca e da dificuldade de pequenas empresas crescerem, enquanto marcas globais ficam cada vez maiores.

Procuradas, as dez empresas que concentram a grande parte das compras dos brasileiros não indicaram porta-voz para comentar o assunto.

FONTE: O GLOBO

Documentos revelam fraude em licitação de R$ 300 mi da Petrobras

Empresa de senador do PMDB fez acordo com concorrentes para ganhar contrato

Documentos e imagens obtidos pelo Estado mostram que a Petrobrás e uma empresa do senador e tesoureiro do PMDB, Eunício Oliveira (CE), fraudaram este ano uma licitação de R$ 300 milhões na Bacia de Campos, região de exploração do pré-sal no Rio, informa o repórter Leandro Colon. A Manchester Serviços Ltda., cujo dono é Eunício, soube com antecedência, de dentro da Petrobrás, da relação de seus concorrentes na disputa por um contrato na área de consultorias e gestão empresarial. De posse das informações, a Manchester procurou as empresas e fez acordo para ganhar o contrato.

Empresa de senador do PMDB fraudou licitação de R$ 300 mi na Petrobrás

Manchester Serviços Ltda., da qual Eunício Oliveira é dono, soube com antecedência, de dentro da estatal, quais eram seus concorrentes e os procurou em busca de acordo para vencer disputa por um contrato de consultoria e gestão empresarial

Leandro Colon

Documentos e imagens obtidos pelo Estado revelam que a Petrobrás e uma empresa do senador e tesoureiro do PMDB, Eunício Oliveira (CE), fraudaram este ano uma licitação de R$ 300 milhões na bacia de Campos, região de exploração do pré-sal no Rio de Janeiro. A Manchester Serviços Ltda., da qual Eunício é dono, soube com antecedência, de dentro da Petrobrás, da relação de seus concorrentes na disputa por um contrato na área de consultorias e gestão empresarial. De posse dessas informações, procurou empresas para fazer acordo e ganhar o contrato.

Houve reuniões entre concorrentes durante o mês de março, inclusive no dia anterior à abertura das propostas. A reportagem teve acesso ao processo de licitação e a detalhes da manobra por parte da Manchester para sagrar-se vencedora no convite n.º 0903283118. Às 18h34 de 29 de abril, a Petrobrás divulgou internamente o relatório em que classifica a oferta da Manchester em primeiro lugar na concorrência com preço R$ 64 milhões maior que a proposta de outra empresa.

O contrato, ainda não assinado, será de dois anos, prorrogáveis por mais dois. Sete empresas convidadas pela Petrobrás participaram da disputa, a maioria sem estrutura para a empreitada. Os convites e o processo de licitação são eletrônicos e as empresas não deveriam saber com quem estavam disputando.

Foto. Em 30 de março, um dia antes da abertura das propostas, o diretor comercial da Manchester, José Wilson de Lima, reuniu-se duas vezes, por mais de três horas, em São Paulo com uma das empresas convidadas pela Petrobrás, a Seebla Engenharia, segundo registros de segurança do prédio onde funciona essa empresa. Uma foto dele ficou registrada nos arquivos do condomínio. O objetivo da visita era exigir da Seebla que aceitasse um acordo.

A Seebla confirmou o encontro e, questionada, disse que isso também ocorrera em dias anteriores. A empresa afirmou que não fez acerto. No dia seguinte à reunião, ofereceu na licitação o preço de R$ 235 milhões, bem abaixo dos R$ 299 milhões apresentados pela empresa do senador. Mesmo assim, foi desclassificada pela Petrobrás.

Um diretor de outra empresa envolvida, que pediu para não ser identificado por questão de segurança, contou que diretores da Manchester usaram o nome de Eunício para oferecer R$ 6 milhões em dinheiro vivo em troca de uma "cobertura" na licitação - ou seja apresentar proposta com valor que serve apenas para simular concorrência e ajudar uma parceira a ganhar a licitação.

"Tentaram nos comprar", disse ao Estado o diretor da empresa. Em troca, a Manchester faria o mesmo em outra licitação.

Esse novo contrato da empresa de Eunício seria uma forma de substituir os serviços fechados sem licitação com a própria Manchester e que já lhe renderam R$ 57 milhões desde fevereiro de 2010, conforme revelou o Estado domingo passado.

Ao chegar ao prédio da Seebla no dia 30 de março, José Wilson de Lima entregou seu documento, teve rosto fotografado e disse para onde iria: "Seebla". Passou pela catraca do subsolo às 11h29 e subiu ao 8.º andar, onde fica a empresa concorrente. Saiu de lá às 12h35 e retornou às 15h07. Permaneceu até as 18h33, após reunir-se com o então diretor comercial da Seebla, Jorge Luiz Scurato. No dia seguinte, 31 março, ocorreria a licitação.

Na ocasião, Lima deixou seu cartão de visita da Manchester. O Estado localizou o diretor trabalhando, na quarta-feira passada, na sede da Manchester no Rio e o indagou sobre os motivos do encontro em São Paulo. "Não interessa a você", respondeu.

Já Scurato negou, num primeiro momento, qualquer reunião com Lima. Depois, apresentou a seguinte defesa: "O Wilson tinha me pedido para arrumar um emprego para o irmão dele. Foi entregar um currículo para mim."

A reportagem procurou a Seebla. A empresa disse que o diretor envolvido pediu afastamento dias após o episódio. "Houve um constrangimento pelo recebimento de um concorrente em nossa sede", afirmou a direção.

Já superfaturado. Segundo relato de empresários, a Manchester teria pedido para oferecerem valores acima de R$ 390 milhões à Petrobrás. Com isso, poderia vencer com R$ 380 milhões. O preço já estaria superfaturado para que houvesse divisão do dinheiro extra para as demais concorrentes. Só que a Seebla decidiu disputar para valer e fez uma proposta de R$ 235 milhões.

Avisada pela Seebla de que não haveria acerto, a Manchester apresentou proposta, em valor exato, de R$ 299.841.390,90. As demais concorrentes ofereceram valores superiores, como esperava a empresa de Eunício. No dia 29 de abril, uma sexta-feira, saiu o resultado da comissão de licitação. A Petrobrás desclassificou a proposta da Seebla por considerá-la "inexequível", ou seja, o valor seria muito baixo e a empresa não conseguiria cumprir o contrato. A Manchester, então em segundo lugar, foi declarada vencedora por ter feito a proposta "mais vantajosa". A Seebla recorreu e o processo de licitação ainda não foi concluído.

PARA LEMBRAR

O Estado revelou no domingo passado que a Manchester, empresa do senador e ex-ministro Eunício Oliveira (PMDB-CE), assinou sem licitação contratos que somam R$ 57 milhões com a Petrobrás para atuar na Bacia de Campos. Documentos da estatal mostram que foram feitos, entre fevereiro de 2010 e junho de 2011, oito contratos consecutivos, sempre com prazos curtos, o que permite "dispensa de licitação". A Manchester doou R$ 400 mil para a campanha de Eunício.
FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Processo pervertido:: Merval Pereira

As recorrentes crises políticas que temos vivido, com escândalos e denúncias de corrupção em vários escalões do governo, antes de ser uma condenação definitiva do sistema de coalizão partidária que adotamos, é a demonstração de que houve uma "depravação do processo", na análise do cientista político Sérgio Abranches. Em um estudo de 1988, ele cunhou a definição de "presidencialismo de coalizão" para nosso sistema de governo.
Um país heterogêneo como o nosso vai ser sempre multipartidário, tornando inevitáveis os governos de coalizão.

Mesmo que se mude a regra eleitoral, forçando um sistema bipartidário, a realidade não muda, destaca Abranches, lembrando que "os dois partidões serão um aglomerado de facções, e vai ter que haver coalizão dentro do partido que estiver no governo".

Ele destaca que a fragmentação partidária reflete a federação, da mesma maneira que o Partido Republicano do Texas tem pouco a ver com o Partido Republicano de Nova York.

Quando há uma estrutura multipartidária formal, como no Brasil, a coalizão tem que incluir os partidos, e é natural que eles queiram seu pedaço de poder. O processo de formação da coalizão é que tem diferenças essenciais, e nesse caso no Brasil ele tem se corrompido com o passar do tempo.

Em primeiro lugar, lembra Abranches, normalmente a coalizão eleitoral é a coalizão governamental, e raramente acontece uma coalizão depois das eleições, como recentemente na Inglaterra.

"Normalmente faz-se um acordo programático e na campanha eleitoral coloca-se para o eleitor esse programa", destaca Sérgio Abranches.

Para formar um governo de coalizão na Inglaterra, depois de mais de 60 anos, e garantir a primeira vitória dos conservadores em 13 anos, conservadores e liberais tiveram que abrir mão de certos pontos programáticos, e apoiar outros.

Nick Clegg, do Partido Liberal, ficou como um vice-primeiro-ministro responsável por determinadas articulações.

"O que é fundamental é que os partidos façam um acordo de políticas públicas e cada um assuma aquele setor em que seu partido é mais forte", diz Abranches, para lamentar que aqui tenhamos transformado a coalizão em "política de cargos e obras".

Ele lembra que o interesse do clientelismo pelo Ministério da Educação diminuiu por que não se constroem mais escolas, e o processo de seleção de diretores passou a ser mais democrático, normalmente são eleitos pelos professores ou indicados em lista tríplice.

À medida que a universalização do acesso à escola foi conseguida, acabou a influência política, por que há vagas para todos. "Quando as vagas eram poucas, era um instrumento político nomear o diretor de uma escola, porque a matrícula se conseguia através de pistolão".

Também o contingenciamento das verbas transforma o Orçamento em uma ação política, e não técnica, e a liberação de verbas virou instrumento de ação do Executivo para conseguir o apoio de setores partidários.

"Mudar o sistema eleitoral não resolve a questão, não muda a realidade. Tínhamos que fazer pequenas coisas", diz Abranches, uma das quais seria terminar com a coligação proporcional, "que mais perverte o sistema eleitoral", na sua opinião.

Mesmo nesse caso, Sérgio Abranches lembra que o fato de o deputado Valdemar Costa Neto só ter sido eleito por que colocou na chapa do PR paulista o palhaço Tiririca "é um sinal de mudança. O eleitor prefere eleger um palhaço a um corrupto".

Já o advogado João Geraldo Piquet Carneiro, que foi presidente da Comissão de Ética Pública da Presidência da República, em artigo publicado na revista "Interesse Nacional" de junho, procura demonstrar que, se a partilha de cargos é inevitável no nosso presidencialismo de coalização, pelo menos se deveria dar tratamento diferenciado aos órgãos partilhados, "de modo a assegurar um mínimo de controle sobre o uso de verbas e o desempenho ético".

Isso significaria, defende, "abandonar as formas padronizadas de controle e adotar-se a geometria variável: cada órgão seria fiscalizado de acordo com suas características".

Ele propõe, por exemplo, que se listem os órgãos partilhados segundo sua suscetibilidade à corrupção, levando em conta três fatores:
a) o poder de compra, ou seja, o volume de recursos geridos pelo órgão;
b) o poder de regulação do órgão sobre determinado setor de atividade;
c) a existência de instrumentos de detecção e correção de desvios de conduta.

Piquet Carneiro lembra que em 2003 a Comissão de Ética Pública da Presidência da República fez um estudo desses e colocou a Empresa de Correios e Telégrafos (ECT) como o órgão nº 1 em matéria de risco de corrupção.

Não foi por acaso, portanto, que em 2005 o escândalo do mensalão estourou justamente devido a uma disputa entre grupos políticos do PT e do PTB em torno do controle dos Correios.

"Certamente, hoje, o Ministério dos Transportes ficaria no topo da lista", comenta Piquet Carneiro, para quem, entre as providências de efeito instantâneo, "uma simples seria mudar o critério de composição das comissões de licitações para que passem a ser integradas por funcionários que não pertençam aos quadros do próprio ministério".

Outra providência mais abrangente seria a instituição de pré-requisitos para a nomeação para certos cargos. "Minas Gerais já adotou critério semelhante ao preparar um cadastro de pessoas que poderão ser nomeadas para cargos de confiança. A formação técnica específica e o estágio de adaptação na Universidade de Minas Gerais (UFMG) são requisitos essenciais".

FONTE: O GLOBO

Algo se move:: Dora Kramer

Eles são todos do PMDB, na maioria ex-governadores e recém-eleitos para o Senado.
Se de longe já olhavam com preocupação a respeitabilidade da Casa se esvair em crises e desmandos, de perto viram que o cenário era ainda pior: uma estrutura corporativista voltada para assegurar benfeitorias de funcionários e senadores, cujo desmonte só se fará ao custo da ruptura do pacto não escrito que a sustenta.

A partir dessa constatação, um grupo de oito senadores pemedebistas começou a se organizar numa espécie de rebelião pacífica com o objetivo de disputar a próxima eleição para presidente e impedir que José Sarney tenha êxito no plano de fazer de Renan Calheiros seu sucessor.

Os "novatos" Eduardo Braga (AM), Luiz Henrique (SC), Casildo Maldaner (SC), Roberto Requião (PR), Ricardo Ferraço (ES) e Waldemir Moka (MS) juntaram-se a Pedro Simon (RS) e Jarbas Vasconcelos (PE), que até então combatiam sozinhos e eram marginalizados no partido, para primeiro reorganizar o equilíbrio de forças dentro do PMDB.

Eles conseguiram reintegrar os colegas à bancada, começando por recuperar a vaga de Pedro Simon, que havia sido afastado da Comissão de Constituição e Justiça, e obtiveram algumas vitórias.
Foi por pressão deles que Renan Calheiros e Romero Jucá foram à tribuna defender que a presidente Dilma Rousseff vetasse duas emendas em medidas provisórias apresentadas por parlamentares do próprio partido e consideradas "indecentes".

Uma dava anistia a dívidas de banqueiros falidos e outra prorrogava, sem licitação, os contratos de lojas e serviços comerciais nos aeroportos.

E por que Renan e Jucá atenderam às exigências, quando normalmente não dariam bola para reclamações? Porque o grupo dos oito recebeu a adesão de outros três e, com isso, formaram maioria de 11 numa bancada à época de 19 (hoje são 20) senadores. Se não aceitassem, poderiam ter dificuldades: por exemplo, perder apoio para se manterem respectivamente como líderes do partido e do governo no Senado.

Já houve também ampliação da interlocução com o governo, até então uma exclusividade da trinca Sarney, Renan e Jucá. A ideia desses senadores é estabelecer um ambiente mais qualificado na bancada do PMDB, a maior do Senado, e depois estender o movimento para outros partidos onde há parlamentares igualmente desconfortáveis com a degradação da Casa.

Não se espere, porém, uma evolução muito rápida nessa movimentação. Experientes, os senadores sabem do poder do "pacto da mediocridade" sustentado por funcionários-chave encastelados em postos estratégicos com respaldo de senadores.

Qualquer tentativa de confronto, como aprovação de uma reforma administrativa agora a ferro e fogo, poderia pôr tudo a perder. O trabalho é lento, requer paciência e capacidade de convencimento para conseguir a adesão da maioria e alterar a correlação de forças hoje francamente favorável ao "esquema".
Nascimento e morte. Um, Alfredo Nascimento, se licencia do Senado para não enfrentar processo - se demissão por suspeita de corrupção não for quebra de decoro na vida de um parlamentar "emprestado" ao Executivo, difícil saber o que seria -, e outro, Blairo Maggi, não aceita ser ministro porque tem telhado de vidro, morre de medo de virar alvo e ir ao chão.

Ao mesmo tempo o secretário-geral, controlador do partido em foco (PR) e réu do mensalão, Valdemar da Costa Neto, submerge para não chamar atenção enquanto espera passar o vendaval.

Ou seja, está tudo errado nessa insistência da Presidência da República de preservar as credenciais do PR como aliado com direito ao manejo de um naco da administração federal.

Isso não é sinal de habilidade para contornar dificuldades políticas. Denota hesitação e abre espaço a um erro de cálculo, pois ao deixar o PR fritar-se a presidente Dilma Rousseff corre risco de se queimar junto à sociedade e ao Congresso por falta de regras claras quanto ao que é aceitável ou inaceitável na rotina de seu governo de coalizão.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Fogo pesado::Eliane Cantanhêde

Depois da queda de Antonio Palocci da Casa Civil e de Alfredo Nascimento dos Transportes, a presidente Dilma Roussef já se prepara para uma nova batalha: a do PR contra o ministro das Comunicações, Paulo Bernardo.

Seria uma forma de atingir dois coelhos com uma rajada só e ricochetear no Planalto, já que Bernardo é marido e parceiro político de Gleisi Hoffmann, da Casa Civil.

O homem bomba dessa vez é Luiz Antonio Pagot, que dirigia o Dnit, departamento que cuida de obras e define de onde vem e para onde vai a dinheirama dos Transportes. Ele despencou com a cúpula do ministério, suspeita de propinas, superfaturamento e desvios para empresas, inclusive a do filho-prodígio do próprio ministro.

Pagot tem subido de tom a cada dia e a cada nova entrevista. Sua melhor chance de trincar cristais será na próxima terça, quando depõe no Congresso. Ao que tudo indica, vai tentar tirar a responsabilidade do próprio ombro para jogar no de Bernardo. Na versão de Pagot, era ele, Bernardo, quem comandava reuniões com empreiteiras para discutir obras, verbas...

Já que o mensalão está de volta com o parecer do procurador geral da República, Roberto Gurgel, pedindo a condenação de 36 implicados, impõe-se uma comparação: Pagot está ensaiando para ser um novo Roberto Jefferson, que detonou o esquema, carimbando duas fases tanto do governo Lula quanto do PT: o antes e o depois do mensalão. Resta saber se ele tem bala na agulha, como Jefferson tinha.

Para quem alega que Pagot não tem credibilidade nenhuma, vale lembrar que se dizia o mesmo de Roberto Jefferson à época. E deu no que deu -e ainda está dando.

Há, porém, uma diferença importante. Enquanto Jefferson foi um franco atirador, Pagot parece ser a linha de frente de um exército -o PR. A artilharia pode ser pesada, e Dilma deve estar preparada e armada para o contra-ataque.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

A exaustão intelectual da nação petista:: Elio Gaspari

O comissariado perdeu a capacidade de discutir políticas públicas e um bom exemplo está na saúde

A nação petista e o governo da doutora Dilma padecem de exaustão intelectual. Não se trata apenas de desarticulação política, é sobretudo a incapacidade de justificar racionalmente suas posições. Juntam-se meia dúzia de pessoas no Planalto, trocam ideias (se é que são ideias) e tomam decisões desconexas, inexplicáveis. Aqui vai um exemplo.

No dia 27 de maio do ano passado, quando as pesquisas eleitorais informavam que Dilma Rousseff disputava a liderança na campanha presidencial, ela foi ao Congresso de Secretarias Municipais de Saúde, na cidade gaúcha de Gramado, e prometeu "tomar iniciativas logo no início do mandato para regulamentar a Emenda Constitucional 29". Tratava-se de dar vida a um dispositivo que fixa o piso dos gastos da União, Estados e municípios com a saúde pública. Faz 11 anos que a emenda foi aprovada, mas por falta de regulamentação gerou um carnaval.

As repórteres Daniela Lima e Mariana Schreiber mostraram que 12 Estados fingem que aplicam na saúde os 12% determinados pela lei. Entre 2004 e 2008 inflaram suas contas maquiando algo como R$ 11,6 bilhões, dinheiro suficiente para manter por um ano 13 ambulâncias do Samu em cada um dos 5,5 mil municípios do país. Em Minas Gerais carimbaram como investimento em saúde despesas com a construção de casas para funcionários da Assembleia Legislativa. No Rio Grande do Sul, a saúde custeou um programa de prevenção da violência.

Quando o presidente da Câmara, deputado Marco Maia, anunciou sua disposição de votar a regulamentação da emenda, pensou-se que isso poderia ocorrer ainda neste mês. Se alguém objetasse, seria razoável que pusesse a cara na vitrine, até porque o assunto está na gaveta desde o tempo de FHC, Bill Clinton e João Paulo 2º. Nada.

O ministro da Saúde, Alexandre Padilha, fez saber a um grupo de parlamentares com quem jantou que o governo teme que o Senado ressuscite o texto apresentado pelo companheiro Tião Viana (PT-AC). Ele propôs que o piso seja fixado em 10% da arrecadação federal, o que significaria R$ 120 bilhões. Atualmente a Viúva federal gasta R$ 70 bilhões, e o governo prefere fazer o cálculo sobre a receita líquida, o que levaria a conta para R$ 80 bilhões.

É possível que Tião Viana esteja errado, mas esse tipo de nó não se desata em jantares, até porque ao longo dos últimos 11 anos os ministros da Saúde jantaram 4.015 vezes.

É comum que os governos não façam o que devem. A exaustão intelectual petista diante da agenda de saúde pública é mais que isso. Trata-se de não fazer nada e de não discutir coisa alguma, nem para dizer que a proposta de Tião Viana era ótima, para o governo dos outros.

PRECAUÇÃO

Por mais astuciosa que tenha sido a iniciativa dos sábios do governo colaborando com a implosão dos cleptoaliados do Ministério dos Transportes, ela foi provocada por um receio de incêndio iminente.
Chegou ao conhecimento do alto comissariado que a Polícia Federal estava prestes a desencadear uma operação pública que incluiria a busca e apreensão de documentos nos gabinetes ou mesmo nas casas dos envolvidos. A investigação da PF prossegue.

OS NERVOS DE TEMER

Às 20h da sexta-feira, dia 1º, o vice-presidente Michel Temer (secretário de Segurança de São Paulo em duas ocasiões) ia no banco de trás de seu automóvel quando o trânsito parou e um segurança percebeu que um cidadão saltara do veículo ao lado, empunhando uma arma.

Ele conseguiu abrir a porta do motorista e ameaçou-o com o revólver. Estavam na avenida Cidade Jardim, em São Paulo.

Na cabeça de Temer, rodou a seguinte cena: o sujeito atira, os seguranças atiram nele. Policiais que estejam por perto atiram em todos. Ficou no susto. Os seguranças imobilizaram o assaltante e o revólver era de brinquedo.

Para quem lida com Temer: na semana seguinte ele narrou o caso a menos de dez pessoas, sem qualquer emoção ou adjetivo.

GATOS

Uma expressão do gosto do presidente Itamar Franco poderia ser ressuscitada pela doutora Dilma. Quando ele via alguma coisa esquisita num papel que lhe levavam, avisava que não o assinaria e explicava com apenas quatro palavras: "Tem gato na tuba."
Poupou a Viúva de muitos dissabores.

CONTÁTICA

Marina Silva fez muito bem ao fugir do PV e está inteiramente certa ao pedir que os partidos políticos mudem suas práticas, mas quando ela se filiou aos verdes (pouco a ver com a cor da ecologia) sabia em que cumbuca estava botando sua biografia.
Para que sua "sonhática" prospere, seria necessário associá-la à "contática", pela qual conta-se o que se vê.

BOA LEITURA

Os comissários de obras públicas e os grandes empreiteiros de Pindorama poderiam fazer circular nas suas diretorias um livro que acaba de sair nos Estados Unidos. Chama-se "Railroaded". Conta a história da construção de suas ferrovias transcontinentais, na segunda metade do século 19, e foi escrito por Richard White, professor de Stanford (universidade criada por um dos grandes larápios da festa ferroviária).

É uma crítica devastadora de uma iniciativa habitualmente apresentada como alavanca do progresso do país. Deixando-se de lado o estudo do uso do dinheiro público e as fraudes, "Railroaded" vale como lição, mostrando como quatro grandes empresários criaram um sistema corrupto que deu origem ao que hoje se chama de lobby e acabaram criando custos que inviabilizaram seus negócios, produzindo corporações ineficientes e disfuncionais. As ferrovias faliram e a festa contribuiu para levar a dívida pública americana de US$ 65 milhões para US$ 2,7 bilhões em apenas seis anos, jogando o país em três crises econômicas.
Um consolo para os donos das empreiteiras: nenhum morreu pobre, mas todos os governos que se meteram com eles acabaram tisnados. Até o de Abraham Lincoln.
O e-book de "Railroaded" está na rede por US$ 19,95.

O VÍRUS DO KREMLIN CONTAMINOU O PLANALTO

A postergação dos efeitos da Emenda 29 é apenas um indicador de que o governo perdeu a capacidade de discutir sua política de saúde. A exaustão intelectual vai além. Quando um governo sonda Blairo Maggi para o ministério ao mesmo tempo em que manifesta sua "confiança" em Alfredo Nascimento, o problema não está na bagunça, mas na incapacidade de explicar e discutir o que faz. Essa onipotência inócua, instalada no Kremlin, destruiu um dos grandes impérios do século passado. O PT quer fazer crer que seus cleptoconsórcios têm a ver com o sistema político nacional. Sistemas políticos não geram larápios. Eles são produto da tolerância e da impunidade. Pode-se dizer tudo da doutora Dilma Rousseff, menos que ela não sabe, há tempo, o que acontece com as obras do Dnit, dos estádios, das ferrovias e com as concessões de energia. Seria demais pedir aos companheiros que transformassem o país num grande inquérito policial. 

Pede-se apenas que parem de tratar a plateia como se ela fosse uma récova de asnos.

FONTE: O GLOBO

Varejo no atacado :: Carlos Lessa

Nas últimas semanas, a fusão do grupo Pão de Açúcar com o grupo Carrefour para a criação do Novo Pão de Açúcar abriu um debate que percorreu a dimensão ética, jurídica, de interesse privado e dos interesses nacionais. Praticamente todos os articulistas da mídia impressa, televisiva e radiofônica colocaram em pauta a questão (corretamente, pois o BNDES, banco histórico do desenvolvimento industrial brasileiro, estava se propondo a aplicar mais de US$ 2 bilhões em uma operação global de quase US$ 3 bilhões!).

Pelo lado ético, foram feitos reparos a diversos protagonistas públicos e privados envolvidos na operação. Pelo ângulo jurídico, a redução do peso do grupo francês Casino em um Novo Pão de Açúcar tem as características de um divórcio parcial do empresário brasileiro e sua nova parceria com outro grupo francês, o Carrefour. Tem ou não um valor impeditivo para a operação pretendida (a existência de um acordo de acionistas entre o Pão de Açúcar e o Casino)? Neste momento, tudo leva a crer que a operação é juridicamente contestável e, levada aos tribunais, seria extremamente nociva para os parceiros atuais e os novos (Carrefour e BNDES). Isso, aparentemente, não foi levado em conta pelo BNDES, que não apenas avançou num comprometimento prévio com Abilio Diniz como lhe pôs nas mãos o poderoso argumento de R$ 3,7 bilhões.

Hoje, 7 de junho, li em jornal de grande circulação que o dr. Abilio declarou: "Fiz um trabalho extenuante". Costurar esse trabalho que foi feito não é fácil e entendo por quê; afinal, não é todos os dias que um empresário pode dizer a outros: tenho a chave para um suprimento financeiro superior a US$ 2 bilhões.

Luciano Coutinho, atual presidente do BNDES, declarou antes da controvérsia que o BNDES somente faria a operação se houvesse acordo do grupo Casino. O negócio não foi desmanchado, por isso o dr. Abilio, com a chave do BNDES, desafia o grupo Casino a demonstrar que a fusão não é uma boa ideia.

Obviamente, a fusão é magnífica para o interesse privado do dr. Abilio, que, em entrevista, declara que quer "continuar levando a companhia que tem o DNA dele". Porém, isso não o impediu de, há alguns anos, assinar com o grupo Casino o direito de, em 2012, trocar, por R$ 1, a possibilidade de o grupo Casino consolidar os resultados do grupo Pão de Açúcar, diluindo o seu DNA. Quando assinou o acordo, era pré-datada a diluição do DNA brasileiro. É transparente a vantagem da operação pretendida para dr. Abilio. É inteiramente obscuro o interesse da sociedade brasileira nessa fusão que daria origem a um trio (dois franceses e um brasileiro).

É importante advertir a ministra-chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, que o BNDESPar é o braço do BNDES em operações no mercado de capitais e que é uma subsidiária 100% de propriedade do banco oficial. Este, como a ministra deve saber, é 100% do Tesouro. Assim sendo, são recursos públicos que, pela missão do BNDES, devem ser aplicados em projetos que gerem emprego e renda para os brasileiros.

Fusões podem ser meritórias, porém essa operação do Pão de Açúcar não nacionaliza o grupo de varejo, apenas aumenta o poder de arbítrio do dr. Abilio, restaurando seu DNA. Não é uma operação geradora de crescimento da economia. E, ao contrário do que declarou o ministro do Desenvolvimento, da Indústria e do Comércio, Fernando Pimentel, não gerará saldo comercial positivo. O ministro declarou que o grupo Carrefour iria, associado ao Pão de Açúcar, "ampliar exportações brasileiras" (?!). O atual Pão de Açúcar é uma rede varejista que importa muito mais do que exporta, gerando um saldo comercial negativo. O grupo Carrefour já participa da rede brasileira de varejo e não é exportador líquido para o varejo mundial; a entrada do Carrefour não ampliará a rede de varejo. O que amplia o varejo é a multiplicação de emprego e renda no interior da economia brasileira.

Alguém afirmou que a aplicação do BNDESPar em papéis do Pão de Açúcar é um ótimo negócio para o BNDES. A elevação de valor patrimonial passa por um aumento futuro de lucratividade do cogitado NPA - Novo Pão de Açúcar. Isso pode ser obtido por redução dos custos operacionais (inclusive massa de salários) ou pelo aumento da margem comercial na compra e venda das mercadorias que distribui como rede varejista. Cabe ao Cade julgar se essa concentração do varejo vai baratear o custo de vida ou a lucratividade maior será um jogo perverso em relação às famílias brasileiras. De qualquer forma, o BNDES não é vocacionado a maximizar seu lucro (não é um banco de investimento); é um banco de desenvolvimento cuja primeira função é ampliar o emprego e a renda dos brasileiros. Tenho a preocupação de que se produza um desgaste na imagem do BNDES, o que seria um subproduto perverso da cogitada operação.

O dr. Abilio diz que foram encomendados "estudos" a três consultorias para avaliar a operação. É óbvia a vantagem patrimonial privada de dispor de mais de US$ 2 bilhões de recursos públicos. As três consultorias devem estar construindo "argumentos" para seduzir o grupo Casino; outras deveriam mostrar "vantagens" para a sociedade brasileira.

Carlos Lessa é economista. foi presidente do BNDES e é professor emérito da UFRJ

FONTE: ALIÁS/O ESTADO DE S. PAULO

Sinfonia inacabada:: Rubens Ricupero

 O panorama do mundo lembra uma orquestra que, quando parece chegar ao clímax, recomeça do zero

O panorama mundial lembra o que diziam de Mahler as línguas ferinas de Viena: que ele não sabia como terminar uma sinfonia. Toda a vez que a orquestra dava a impressão de atingir o clímax, a música recomeçava do zero.

Se olharmos para o mundo ao redor é um pouco isso o que vemos. Nos EUA a crise brinca de criar falsas esperanças: a recuperação do emprego e o aumento de produção de um mês são desmentidos no seguinte.

Na Europa, a alternância de quebra-não quebra refaz, o tempo todo, o percurso circular Irlanda-Grécia-Portugal, com a Espanha esperando o turno.

Na diplomacia de Obama, dois problemas foram no início separados do resto para serem confiados a mediadores experientes e consagrados: o de Israel e os palestinos a George Mitchell, e o Paquistão-Afeganistão a Richard Holbrooke.

Dois anos e meio depois, Mitchell renunciou, Holbrooke morreu e ambos os problemas estão piores do que antes.

As duas guerras herdadas de Bush não tiveram melhor sorte. A retirada no Iraque e no Afeganistão não deve enganar ninguém. No fundo, corresponde ao conselho que o jornalista francês Bernard Fall deu aos americanos no Vietnã: "Declarem vitória e caiam fora".

A Primavera Árabe é a mesma coisa: não consegue desabrochar em verão. No Egito, ninguém sabe se os militares deixarão o poder; no Bahrein e no Golfo, a democratização foi firmemente contida.

No Iêmen, na Síria, na Líbia, os governos resistem com graus distintos de êxito. Nem a operação militar da Otan contra Gaddafi logrou superar a indecisão.

O que está acontecendo com o mundo? Uma espécie de reprise do "Anjo Exterminador", de Buñuel, na qual invisível maldição impede os convivas de deixarem a casa? Uma "paz dos cemitérios" como o aparente triunfo da reação sobre as revoluções de 1848, que apenas escondia o lento apodrecimento dos antigos regimes?

As razões são provavelmente tão diversas e complexas como os próprios problemas. Contudo não é arriscado afirmar que a mediocridade das lideranças mundiais e as profundas divisões dentro dos países explicam muito da paralisia atual. Não se diga que a culpa é da crise financeira. A década de 1930 foi muito pior, o que não anulou lideranças fortes e resolutas para o bem e para o mal.

Uma dessas lideranças decisivas era a do ex-diretor do FMI Strauss-Kahn. Os que o viram atuar descrevem como se substituía aos líderes nacionais a fim de coordenar não só a sempre dividida União Europeia, mas até o governo alemão!

Sem lideranças convictas, não saem do lugar negociações vitais das quais depende o futuro do mundo: mudança climática, a Rodada Doha de comércio, a guerra das moedas. Quem acredita ainda na expectativa despertada pelo G20?

Inaugurado em meio a entusiasmo mágico, o destino de Obama é fiel espelho da situação geral. Tendo perdido a iniciativa estratégica, o governo contrasta com implacável oposição de demagogos e lunáticos de direita. Nunca foi tão verdadeira a descrição do poema de Yeats: os melhores carecem de qualquer convicção ao passo que os piores estão cheios de passional intensidade. Não é, convenhamos, receita adequada para permitir revigorar uma posição de liderança.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Para aliados, presidente age por impulso

"Ela não tem o controle do PT nem dos demais partidos"

BRASÍLIA. No Ministério de Minas e Energia, apesar do comando do peemedebista Edison Lobão, Dilma tem o controle das principais estatais. A presidente, segundo seus auxiliares, tem outras preocupações na Esplanada. No Ministério das Cidades, nas mãos do PP baiano de Mário Negromonte, Dilma já esvaziou as atribuições do PAC na pasta, subordinando obras ao Ministério do Planejamento. Esse é o mesmo modelo que a presidente pretende implantar nos Transportes.

Dilma queria manter no Ministério das Cidades o ex-ministro Márcio Fortes, que foi vetado pelo PP. Por isso, para tratar das Olimpíadas, ela indicou Márcio Fortes para assumir a Autoridade Pública Olímpica (APO). Apesar de ele ser filiado ao PP, o partido não considerou o novo cargo como da cota política da legenda.

Mas essa intervenção brusca no feudo do Ministério dos Transportes está deixando os aliados e ministros de Dilma apreensivos. Nos bastidores, a presidente chega a ser chamada de forma pejorativa de "biruta de aeroporto", que age por impulso, cria uma crise e depois não sabe o que fazer e tem que ceder.

- A Dilma está virando uma biruta de aeroporto. Não há um encontro de partido aliado em que não seja pontuado por lamúrias. Nunca vi um governo onde tanta gente do governo trama contra a presidente. E o pior é que, em seis meses, não há nada de novo para apresentar à sociedade, só confusão - disse um peemedebista com cargo no governo.

Ministro da Defesa chama Dilma de "lobisomem"

Nessas reuniões do PMDB, por exemplo, o ministro Nelson Jobim (Defesa), segundo o relato de um correligionário, chama Dilma de "lobisomem":

- É uma mulher que exerce um cargo político mas não gosta de fazer politica. Dilma se comporta como lobisomem: aparece para quem quer, quando quer e como quer - contou um dos peemedebistas que presenciaram a descrição.

Segundo esses aliados, quando Dilma vê o custo de suas reações por impulso, tem que pagar caro. Até mesmo os petistas já demonstram contrariedade com o estilo de Dilma de comandar todos os ministérios e principais órgãos.

- Ela não tem o controle do PT nem dos demais partidos aliados - disse essa fonte.

O senador e ex-governador Eduardo Braga (PMDB-AM), entretanto, diz que é bom os aliados se acostumarem porque esse estilo veio para ficar e ela pode intervir a qualquer momento em qualquer lugar onde achar que precise.

- Quem não conhecia a Dilma antes? Esse é o estilo dela, não entendo a surpresa! Mas ao contrário, em vez de isso ser um defeito, pode ser uma qualidade - disse o senador peemedebista.

FONTE: O GLOBO

Cresce a 'bancada' de desiludidos com a política

Bresser, Fábio Feldmann e Vladimir Palmeira abandonam vida partidária alegando decepção com o cenário

Silvia Amorim
SÃO PAULO. Decepção com o rumo dos partidos levou veteranos na política a abandonarem nos últimos meses a vida partidária. Desde março, foram três anúncios de afastamento, carregados de críticas ao comportamento das legendas no país. Em meio aos sucessivos escândalos de corrupção como o do Ministério dos Transportes, envolvendo o PR, essas deserções, embora isoladas, expõem a gravidade da crise que atinge as instituições políticas brasileiras - partidos, Congresso e governo.

A fila foi puxada pelo ex-ministro e fundador do PSDB Luiz Carlos Bresser Pereira. Em março, ele tornou pública a decisão de deixar a sigla tucana e a política partidária, após mais de duas décadas de filiação. No mês passado, o ex-deputado Fábio Feldmann divulgou o desligamento do seu último reduto partidário, o PV, após ter passado por PSDB e PMDB. Há duas semanas, foi a vez do ex-deputado Vladimir Palmeira anunciar, com um discurso de cobrança por ética, a saída dele do PT, que ajudou a fundar.

Bresser-Pereira e Feldmann garantem que se despediram da vida partidária. Já Palmeira não descarta, no futuro, uma nova filiação.

- Os partidos estão mais eleitorais que políticos, propõem pouco debate de conteúdo e não estão preocupados em investir em quadros de qualidade, mas em pessoas que possam levar a mais espaço em governos. Não vejo, para um perfil como o meu, estímulo para continuar. Me sinto um peixe fora d"água - revela Feldmann, que foi deputado federal por 12 anos e está sem mandato há 13 anos.

O ex-verde já esteve em grandes legendas, como o PMDB e o PSDB, e há seis anos militava no PV. Em 2010, foi candidato ao governo de São Paulo para ajudar Marina Silva, então candidata à Presidência da República.

- Não estou desqualificando a democracia representativa, mas, fora de partido, tenho mais liberdade para exercer pressão para que melhore - completou.

'Isso reflete a deterioração da política'

Analista faz alerta sobre o desinteresse da juventude

SÃO PAULO. Contemporâneo de Fábio Feldmann no Congresso, Vladimir Palmeira explica que o que o levou a deixar o PT foi não pactuar com incoerência política. Ele não concordou com o retorno ao partido do ex-tesoureiro Delúbio Soares, um dos pivôs do escândalo do mensalão.

- Em 2006 eu aceitei ser candidato porque o partido decidiu punir as pessoas envolvidas naquele escândalo. Acabando com a punição, o que parece é que você pactua com a corrupção. Assim, um partido perde sua coerência política e credibilidade - disse o ex-petista, que descarta, por enquanto, outra filiação:
- Não pretendo me filiar a curto prazo. Vou aproveitar esse tempo para defender mais minhas ideias. Mas continuo achando que partido é um caminho por excelência para mudar a sociedade.

Ministro por três vezes, Bresser Pereira, em viagem ao exterior, não falou com O GLOBO. Em entrevista na época, ele disse que tomara a decisão por questões ideológicas e acusou o partido, que nasceu social-democrata, de passar a ser de direita e dos ricos.

Para o cientista político da Universidade de Maringá e autor do artigo "Investigando os determinantes individuais da confiança política entre os brasileiros", Ednaldo Aparecido Ribeiro, iniciativas como essas tendem a reforçar a desconfiança da sociedade em relação aos políticos.

- Quando você vê políticos profissionais se desligando e com discursos como esses é grave porque fica a sensação de que mesmo aqueles que tinham vocação para o exercício da política estão se desencantando. 

Isso tende a agravar o fenômeno de apatia do cidadão médio com as instituições - defende Ribeiro.

O coordenador do Núcleo de Pesquisa em Políticas Públicas (NUPPs) da USP, José Alvaro Moisés, chamou a atenção para o que considera um outro problema.

- Não acho que essas iniciativas vão impactar de alguma forma a população por serem bastante isoladas, mas elas refletem uma deterioração das atividades políticas, o que é muito grave - afirmou.

Outro alerta que Moisés faz é sobre o distanciamento dos jovens da política. Segundo ele, isso compromete, a médio e longo prazos, uma renovação de quadros nos partidos:
- Os jovens não querem ir para o parlamento, não querem contato com partidos, preferem militar de outras formas, como nas redes sociais.

FONTE: O GLOBO