domingo, 8 de maio de 2011

Reflexão do dia – Renato Lessa

O quadro, digamos, doutrinário do partido do dr. Kassab, como sabido, é indigente, mesmo para padrões nacionais. Trata-se de legenda que se apresenta como não sendo nem de esquerda, nem de direita, nem de centro. O corolário tático da estimulante renovação nos programas partidários é a disposição para apoiar o governo federal, os governos estaduais e, é claro, os governos municipais.

É uma tentação destacar o lado ubuesco da iniciativa, mas esse reembaralhamento oportunista não diz algo a respeito da vida partidária brasileira em geral?

Renato Lessa, professor titular de Teoria Política da UFF, investigador Associado do Instituto de Ciências Sociais, da Universidade de Lisboa e presidente do Instituto Ciência Hoje. “Oposição desfalcada”, Aliás/O estado de S. Paulo, 1/5/2011

Manchetes de alguns dos principais jornais do Brasil

O GLOBO

Obras do fim do governo Lula estão abandonadas

FOLHA DE S. PAULO

Demissão é maior nas companhias de origem chinesa

O ESTADO DE S. PAULO

'Bolsa-aluguel' eleva salário de promotores em 5 Estados

CORREIO BRAZILIENSE

Fundos põem R$ 17 bi nos bolsos dos aposentados

ESTADO DE MINAS

A intimidade de um terrorista

ZERO HORA (RS)

Avanço do jogo ilegal escraviza apostadores e destroça famílias

JORNAL DO COMMERCIO (PE)

Amor de mãe no calor do clássico

Obras do fim do governo Lula estão abandonadas

Promessas feitas para ajudar a eleger Dilma não foram cumpridas

Doze dias antes do primeiro turno das eleições passadas, o então presidente Lula visitava o trecho da Ferrovia Norte-Sul que ligaria Maranhão a Goiás e anunciava que tudo estaria pronto em dezembro. A obra não foi entregue no fim do ano, nem em 30 de abril, como foi estabelecido no balanço do PAC, e tampouco será concluída em julho, como se anunciou mais tarde. Também a reforma do aeroporto de Vitória, visitado por Lula no auge da campanha para eleger Dilma Rousseff, só deve começar no fim deste ano, segundo a Infraero. De norte a sul, obras usadas para alavancar a campanha do PT continuam paradas, atrasadas ou com problemas decorrentes da pressa eleitoral. Em setembro, quando chegaram ao conjunto habitacional Três Marias, no ASC, egressos de favelas viram Lula dizer que o pequeno apartamento seria um pedaço do céu na terra. Agora, continuam sem luz e água e acham que foram usados eleitoralmente.

Obras usadas por Lula estão empacadas

"Inaugurados" durante a campanha eleitoral, empreendimentos não foram concluídos

Roberto Maltchik

Ocenário não poderia ser mais emblemático: o então presidente da República, ao lado do então governador do estado, fixando sobre o solo um lance de trilhos de aço na divisa de Goiás e Tocantins. Era 21 de setembro de 2010. Faltavam apenas 12 dias para o acirrado primeiro turno das eleições presidenciais. Quem esteve por lá recebeu Luiz Inácio Lula da Silva como o portador da boa notícia: aquele trecho da Ferrovia Norte-Sul, ligando o Maranhão a Goiás, estaria pronto para ser entregue em dezembro.

"No dia 20 de dezembro preparem uma grande festa", afirmou Lula em Porangatu (GO).

Entre acenos e sorrisos, Lula foi embora e deixou para trás a realidade: a obra não foi inaugurada em dezembro. Nem em 30 de abril, como foi estabelecido no balanço de quatro anos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Nem mesmo será em julho, como se cogitou mais tarde. A Valec, empresa estatal ligada ao Ministério dos Transportes e responsável pelo empreendimento, hoje, limita-se a informar que os trens finalmente correrão sobre os trilhos em algum momento no "segundo semestre" deste ano.

O marco zero da Norte-Sul está em Anápolis, cidade goiana que já se prepara com o porto seco para se transformar em um entreposto da produção agrícola e de minério da região Centro-Oeste. O prefeito Antônio Gomide (PT) admite que o prazo ficou na promessa, por causa das contestações feitas à licitação de um túnel no último trecho da obra. Segundo o prefeito, a ferrovia só vai operar a partir do ano que vem.

- Queremos crer, com as garantias da presidente Dilma, que os recursos estão assegurados, que em janeiro de 2012, ano que não tem eleições presidenciais, essa obra esteja concluída - afirmou Gomide.

Como no caso da Norte-Sul, outras promessas foram feitas por Lula, cabo eleitoral número um de Dilma, ao longo do ano passado, principalmente no segundo semestre. Prazos foram dados e expectativas foram criadas. Porém, os canteiros de obras mostram, em muitos casos, uma história diferente daquela vendida no ano das eleições.

Quando esteve em Vitória, no Espírito Santo, em 15 de julho de 2010, Lula se valeu do prestigiado Batalhão de Engenharia do Exército, que põe a mão na massa quando emergem os desvios em contratos públicos, para criar expectativas sobre a reforma da pista do aeroporto da capital capixaba. Com o Exército, a obra da pista começaria imediatamente.

"Eu trabalho com a certeza que em agosto (de 2010), o Exército começa as obras na pista do Aeroporto de Vitória. É um atraso absurdo que aconteceu em Vitória, como também em Goiânia", disse Lula.

Na última sexta-feira, a Infraero apresentou o quadro atual: o projeto de engenharia deve ficar pronto em agosto, mas agora deste ano. A obra "pode" começar em outubro, frisou a estatal.

Rodovia no ES também atrasada

Ainda em Vitória, em entrevista ao jornal "A Gazeta", o então presidente afirmou que a obra de adequação do contorno rodoviário da capital capixaba, na BR-101, seria concluída em junho de 2011. Mas, segundo dados extraídos do Sistema Integrado de Informações Financeiras (Siafi), de R$30,6 milhões autorizados no Orçamento de 2011, nenhum centavo ainda foi pago. A conclusão dos trabalhos deve ocorrer apenas em 2012.

Em suas andanças em ano eleitoral, Lula se viu diante de um impasse quando foi a Santa Catarina inaugurar quatro trechos da duplicação da BR-101, entre Palhoça (SC) e a divisa com o Rio Grande do Sul. Em 13 de setembro de 2010, diante da complexidade da obra de 249 quilômetros - com túneis e pontes - Lula decidiu trocar a fixação de prazo por pesadas críticas à fiscalização e aos órgãos ambientais. Chegou a condenar o que chamou de "indústria da fiscalização".

"Nós criamos uma indústria de fiscalização e de proibição que é uma coisa maluca. (...) E eu, junto com vocês, ainda iremos ver essa estrada toda duplicada", frisou, ao explicar porque não poderia fazer a promessa: "Em campanha política as pessoas podem falar tudo. A única coisa que as pessoas não podem prescindir é de falar a verdade".

O balanço do PAC informa que o conjunto de obras da BR-101 (SC) será concluído em julho de 2012. Questionado, o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) informou que a obra termina no final de 2013. Entretanto, o secretário-executivo de Articulação Nacional do governo do estado, Acélio Casagrande, afirma que a duplicação deve terminar só em 2015. Além dos obstáculos ambientais, o Dnit teria identificado um grave problema nos contratos:

- As empreiteiras mergulharam os preços e, agora, não conseguem executar a obra. Entregamos documentos ao Dnit pedindo para agilizar as obras, mas está difícil. A perspectiva é finalizar a obra em 2015 - afirmou o representante do governo do estado.

Apesar do fosso que separa os prazos dos discursos e o ritmo das máquinas, o governo mantém o fluxo de investimentos em obras pelas quais Lula passou na reta final da disputa presidencial. No caso da BR-101 (SC), a União pagou, em 2010, 70% do valor autorizado no Orçamento. Este ano, executou 19,7% do total previsto até dezembro.

Em outras cinco obras - a ferrovia Norte-Sul, a adequação do contorno rodoviário de Vitória (ES), a expansão do Trensurb em Novo Hamburgo (RS), a recuperação do molhe do Porto de Itajaí e o rebaixamento da linha férrea de Maringá (PR) -, a execução ficou em 92,8% do previsto no ano passado.

Em 2011, a execução dos mesmos empreendimentos - excluindo o molhe do Porto de Itajaí - estava em 15,1% do montante autorizado para ser gasto até dezembro, segundo dados do Siafi atualizados no último dia 5 de maio.

FONTE: O GLOBO

A perspectiva social-democrata :: Luiz Sérgio Henriques

A vida é real e de viés, como lá diz o verso do Caetano, e essa pode ser uma sugestão para tentar decifrar o rumo enviesado que a política brasileira tomou pelo menos desde 1994, quando dois partidos social-democratas passaram a se enfrentar encarniçadamente nas disputas presidenciais, pelo controle do Parlamento e das instâncias locais. Um enfrentamento que, no quadro atual, vê, por um lado, o poderoso bloco de alianças em torno do partido social-democrata de origem sindical e, por outro, a minoritária aliança oposicionista, cujo eixo é o partido "irmão inimigo", de extração intelectual, imerso, ainda por cima, num conjunto de crises que parece abalar a sua expectativa de poder nas próximas rodadas eleitorais.

Com seu instinto político aguçado, sempre muito hábil em demarcar o espaço político entre amigos e inimigos até o ponto da exasperação, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva não teve meias palavras para definir o que espera do seu partido já para 2012: caberia ao PT agregar mais uma vez os "diferentes", a começar pelo PMDB, e lançar-se decididamente contra os "antagônicos". Pelo visto, se tudo for deixado mais uma vez à mercê do cálculo partidário imediato, preparemo-nos para mais rounds de maniqueísmo explícito, aos quais, à moda de uma certa cultura política argentina, se aplicaria o dito "al enemigo, ni justicia".

Veja-se, nesse sentido, a reação ao texto recente de outro ex-presidente, Fernando Henrique Cardoso, sobre o que julga dever ser daqui por diante o papel da oposição. O argumento de Fernando Henrique traz novidades interessantes sobre o processo de social-democratização da sociedade brasileira, entendido como exercício permanente de construção de direitos e em curso pelo menos desde a entrada em vigor da Constituição de 1988. Pois a reação inicial e mais exacerbada se deu porque o ex-presidente supostamente excluiria da estratégia oposicionista o "povão" e os movimentos sociais, aferrando-se, ao contrário, às novas classes médias como público preferencial, ainda quando esse público, por ora, esteja longe da política institucional dos políticos.

No fundo, quanto ao possível novo protagonismo dessas heterogêneas camadas emergentes, Fernando Henrique não disse nada muito diferente do que está no discurso de posse da presidente Dilma Rousseff perante o Congresso Nacional, há apenas alguns meses: um largo e generoso reconhecimento ao "país de classe média sólida e empreendedora", que este último período de intensa mobilidade descortinou - aliás, não apenas no Brasil, mas em muitos outros países em desenvolvimento, e num ritmo muitas vezes até mais pujante do que o nosso.

A crítica ao mecanismo de cooptação que programas como o Bolsa-Família podem significar deve sensibilizar todos aqueles que se preocupam com a vigência de um confronto político menos apaixonado e sectário, e não por isso indevidamente atenuado ou domesticado. Vale lembrar que, num passado recente, foram tomadas medidas de repercussão pelo menos comparável ao Bolsa-Família para a construção de uma rede de proteção social, sem que se deixasse de enfatizar o seu caráter de políticas de Estado, que não implicaram o erguimento de mitologias para maior glória do líder providencial. Refiro-me, por exemplo, à expansão da assistência social no governo Itamar Franco, protegendo idosos e portadores de deficiência física sem os recursos mínimos de sobrevivência digna.

O argumento de Fernando Henrique, ao que parece, torna-se particularmente cortante ao alertar para "o triunfo do capitalismo, em sua forma global", um triunfo ao qual teria aderido o lulopetismo, não obstante toda a profissão de fé em contrário. A adesão da social-democracia à moda petista teria agora o contorno de um capitalismo burocrático avesso aos requerimentos de uma moderna sociedade democrática. Da nossa parte, poderíamos lembrar que, nos anos 1990, ao contrário, o canto da sereia neoliberal andou encontrando ouvidos entre nós, ainda quando, da perspectiva de hoje, se possa ver nitidamente que tivemos, antes, reformas liberais num quadro de crise do velho nacional-desenvolvimentismo, e não a aplicação de um modelo liberal extremado, que, de resto, só teria sido possível com a supressão do regime de liberdades públicas.

Assim é que a intervenção de Fernando Henrique está em linha com a mais recente revalorização do papel do Estado na sua dimensão reguladora, indutora, e mesmo em áreas estratégicas da produção. Um Estado, contudo, que se requalifica como radicalmente comprometido com a estratégia democrática e faz dessa ação democratizadora o cerne da sua presença nos processos múltiplos e contraditórios de uma moderna sociedade de massas, comprometida com o progressivo acesso de todos aos bens essenciais, como saúde, educação e previdência, que devem ser subtraídos à lógica do individualismo selvagem.

A social-democracia europeia do pós-guerra, nos seus momentos mais altos e criativos, não esteve limitada à construção de uma rede de proteção social, por mais importante que seja. Implicou ainda a tentativa, mais ou menos bem-sucedida, de aumentar a incidência de trabalhadores e setores subalternos nos mecanismos da acumulação, orientando-os segundo as exigências de uma democracia econômica. Os excessos do capitalismo desregulado podem fazer com que esse tipo de preocupação pouco a pouco readquira força e vigor.

Entre nós, no entanto, esse horizonte criativo parece distante e, decididamente, não será possível sem que antes algum diálogo se restabeleça entre as almas partidas da social-democracia brasileira. Pelas artes enviesadas da política, em algum momento destes últimos 20 anos elas se desavieram, pondo em risco a relação virtuosa entre instituições políticas democráticas e avanço social.

Tradutor e ensaísta, é um dos organizadores das obras de Gramsci em português site: http://www.gramsci.org/

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Marcando posição:: Merval Pereira

A declaração meio extemporânea do presidente do PMDB, senador Waldir Raupp, de que o partido está preparando candidatos para disputar a sucessão da presidente Dilma Rousseff pode ser mais do que simplesmente uma ameaça para negociar cargos no governo.

Também é parte dessa estratégia, mas reflete uma preocupação maior, que não é só do PMDB, mas de todos os partidos aliados do governo que têm projetos políticos de mais longo prazo, como o PSB e até mesmo o futuro PSD, mal nascido e já inquieto com a disputa do poder político paulista.

A força política exagerada do governo, cooptando parte da oposição para o futuro partido do prefeito Gilberto Kassab e transformando a bancada oposicionista no Congresso na menor representação numérica de tempos recentes, certamente está provocando pensamentos estratégicos de longo prazo nas forças partidárias hoje na base aliada, que têm que buscar um futuro sem o PT.

A facilidade com que o PT está controlando o apetite do PMDB por cargos, e a voracidade que, sob nova direção, está anunciando em praça pública, mostram que será difícil a convivência nos próximos anos de governo, ainda mais se as turbulências econômicas que se anunciam começarem a colocar em risco a popularidade governista.

O movimento de formação do futuro PSD mostra como é difícil ao político brasileiro viver fora do círculo de poder central sem que haja uma expectativa de poder real pela frente.

O PT conseguiu ficar na oposição nos dois governos de Fernando Henrique, tendo se recusado a aderir à transição chefiada por Itamar Franco, justamente por que tinha uma expectativa de poder alimentada pela ida de Lula ao segundo turno da eleição presidencial de 1989 contra Collor.

A derrocada do governo, comandada pela bancada petista no Congresso e pelos movimentos sociais nas ruas, deu a sensação ao PT de que chegara a sua hora.

A alternativa partidária derrotada nas urnas mostrava-se novamente à disposição dos eleitores em 1994, e poderia até mesmo ter sucesso se os planos não fossem atropelados pelo Plano Real.

Da mesma maneira, depois de perder duas vezes para o PT de Lula, o PSDB parecia ser a bola da vez em 2002, com dois candidatos aparentemente imbatíveis contra a falta de opção petista do outro lado.

Como não supunham que a popularidade de Lula, e mais seu menosprezo pelos limites legais, pudesse eleger a candidata tirada do fundo da cartola, os tucanos resistiram a todas as disputas internas, e chegaram à eleição com reais chances de vitória.

Hoje, a perspectiva é outra. A falta de expectativa de poder implodiu por dentro a oposição e resultou no PSD, um abrigo para todos que não querem ficar longe do poder que anuncia ter planos de permanecer muitos anos no controle da situação.

Raupp anunciou que o PMDB agora tem dois nomes sendo preparados para disputar a presidência: o vice-presidente Michel Temer e o governador do Rio Sérgio Cabral. A verdade é que o PMDB tem o mesmo dilema do antigo PFL.

O fato de os dois partidos terem se recusado a disputar as últimas eleições presidenciais explicaria por que não têm uma imagem política nacional, embora tenham dominado a política regional até pouco tem atrás, sendo que o PMDB mantém sua estrutura enraizada por todo o país.

O último candidato próprio do PFL foi Aureliano Chaves, em 1989. E o PMDB "cristianizou" primeiro Ulysses Guimarães, depois Orestes Quércia, e nenhum deles passou dos 10% dos votos.

O PMDB elegeu sucessivamente as maiores bancadas da Câmara e do Senado e tem o maior número de prefeitos. O PFL sofreu um baque nas urnas, tentou se reorganizar trocando de nome para Partido Democrata e radicalizando na oposição ao governo Lula e no programa liberal.

Não deu certo, e o DEM hoje se debate para manter o que resta da antiga estrutura de poder, mas sofreu mais do que esperava com a criação do PSD.

Deixando que questões locais se sobrepusessem às nacionais, os dois partidos demonstravam uma vocação política restrita, assumindo o papel de coadjuvantes.

PT e PSDB, por terem "vocação presidencial" desenvolvida em quatro disputas presidenciais, polarizam as disputas e têm uma rede de relacionamentos e interesses que proporcionou terreno fértil para que formulassem propostas para o país.

Essa polarização tem menos a ver com o que acontece nas eleições municipais, e mais com um padrão de comportamento que os partidos brasileiros desenvolveram nas eleições presidenciais.

À medida que a expectativa de poder vai se esvaindo, o DEM e mesmo o PSDB vão se perdendo em brigas internas que acabam limitando suas ambições a questões regionais, o que afasta ainda mais seus integrantes do poder central.

Essa necessidade de ter um futuro político pela frente tanto é responsável pela montagem do PSD quanto pelo incômodo de PMDB e PSB diante da possibilidade de perpetuação do PT no poder.

O PSD estaria, no sentido de relacionamento com o governo central, tentando mimetizar o sistema que produziu a força eleitoral do PMDB: uma ideologia flexível que permite ser aliado de qualquer governo, e um ajuntamento de líderes regionais que formam um partido forte, mas inorgânico.

Será na teoria um aliado político importante, mas forte o suficiente para tentar vôos solos assim que se considerar em condições. Como o PMDB ameaça fazer na sucessão de Dilma. E como o PSB se prepara para fazer também, em 2014 ou quatro anos depois.

FONTE: O GLOBO

2018:: Eliane Cantanhêde

O PSD de Gilberto Kassab arregimenta tropas no DEM, no PSDB e nos partidos governistas e vai disputar em São Paulo, em 2012, sem bater de frente com o governo Dilma. Sua guerra é 2018, não 2014, praticamente pré-definida pelo instituto da reeleição. Só errando muito Dilma vai perder, e ninguém aposta que ela vá errar tanto.

Kassab e seus mentores, como Jorge Bornhausen, fazem uma distinção: uma coisa é o governo de Dilma (que não tem alma nem tradição petista), outra é o projeto de 20 anos do PT no poder, já lançado por Lula. A ideia é conviver bem com Dilma, mas ir para o confronto com o PT em 2018.

Num movimento chamado de "transição geracional", Kassab se aproxima de Aécio Neves, do PSDB, e de Eduardo Campos, do PSB, que se uniu ao projeto Lula e agora ao de Lula-Dilma, mas não se rendeu à posição de satélite eterno do PT.

O prefeito tem pontes também com o PMDB, partido pendular que ficou com FHC, Lula e Dilma e poderá perfeitamente caminhar para qualquer um com real expectativa de poder. Uma aliança PSD, PMDB, PSB e a fusão PSDB-DEM-PPS em torno de Aécio, por que não?

São Paulo é o laboratório. Com a máquina da prefeitura e um partido novo em folha, Kassab entra no vácuo de Quércia, morto em 2010, e de Maluf, banido das campanhas majoritárias. Eis uma terceira via.

Uma boa aposta é que o candidato do PSD será Eduardo Jorge, um quadro político de primeira grandeza, com interlocução (e respeito) tanto no PT quanto no PSDB. Um trunfo sobretudo para embaralhar a polaridade PT-PSDB e definir o segundo turno.

Se der PSDB de Alckmin versus PSD com Eduardo Jorge, adivinha com quem o PT vai ficar? Se for PT versus PSD, com quem o PSDB fica? Mas, se der PT versus PSDB, o PSD tenderá para os tucanos, mas livre para ir com qualquer um dos dois.

O PSD parecia aventura, mas essa turma não brinca em serviço.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Ou vai ou racha:: Dora Kramer

Silentes em público para não agravar suas divergências, em privado os tucanos reconhecem que vivem um momento de decisão: ou abandonam o quanto antes a lógica do litígio entre os grupos de pretendentes à Presidência da República - em português claro, Aécio Neves e José Serra - ou caminharão inexoravelmente rumo à autodestruição.

Há no partido a plena consciência de que o PSDB desperdiça seu patrimônio eleitoral de 44 milhões de votos recebidos na eleição presidencial e 10 milhões amealhados nas eleições parlamentares, na repetição do mesmo equívoco cometido por três períodos eleitorais consecutivos.

Esse erro é a atuação partidária sempre referida nos projetos desta ou daquela liderança. Até 2010, o PSDB girou em torno de Serra e agora passou a girar em torno de Aécio e do esforço de levar o paulista a concluir que sua chance passou.

Tal dinâmica - admite a direção nacional - impede a construção de um discurso para a sociedade e transforma o partido numa confederação de litigantes prisioneiros das escaramuças internas. Enquanto isso, o eleitorado desaponta-se, se dispersa, encanta-se com o estilo sóbrio da nova presidente e, com isso, o PT se põe a campo sem competidor à altura.

Esse diagnóstico tem sido compartilhado pelas lideranças regionais que participam das conversas preparatórias à convenção do próximo dia 28, que elegerá o novo Diretório e a nova Executiva Nacional do PSDB.

Todos no partido se dizem fartos dessa agenda improdutiva e a maioria diz apoiar a composição de uma direção que não obedeça ao critério de representação por grupos. Uma divisão igualitária dos postos entre serristas e aecistas manteria a executiva na mesma condição de "colagem" do litígio.

A ideia, assim que for confirmada a recondução de Sérgio Guerra à presidência, é o partido se "abrir" à convocação de dirigentes sob critérios de representatividade política e social, constituindo um conselho consultivo encarregado das diretrizes gerais.

Um grupo enxuto, composto no máximo de seis pessoas, entre as quais Fernando Henrique, Serra, Aécio, Tasso Jereissati e um ou outro governador, para zelar pelo rumo e pela unidade do partido. Atributos sem os quais o PSDB já se rendeu à evidência de que não tem futuro.

Cooptação. A prestação de contas dos partidos à Justiça Eleitoral mostra que os "grandes" asseguraram apoio de legendas satélites mediante repasses financeiros, a título de doação de campanha.

O PT financiou R$ 11 milhões ao PSC, ao PDT, PTN, PTC, PRB e PR. O PSDB, mais modesto, transferiu R$ 2 milhões ao PTB, DEM e PMN.

Isso é compra de apoio. Uma modalidade, digamos, contabilizada, da prática conhecida como "mensalão".

Roteiro original. As especulações oriundas do PT sobre nomes de possíveis candidatos à Prefeitura de São Paulo - incluindo os ministros Fernando Haddad (Educação) e Guido Mantega (Fazenda) - repetem movimentos anteriores.

Em 2010, lançaram-se vários balões de ensaio, Ciro Gomes foi levado a mudar seu domicílio eleitoral e, no fim, prevaleceu o tradicional, com Aloizio Mercadante candidato ao Palácio dos Bandeirantes.

Por isso mesmo, gente experimentada em matéria de PT aposta que Marta Suplicy acaba sendo a candidata em 2012. Consta que Lula não aprecia a solução, mas ocorre que não costuma insistir quando o partido resiste.

Venceu no caso de Ciro. Mas o exemplo não vale porque, como se viu, não era para valer.

Unhas e dentes. PT e PSDB têm a mesma prioridade na eleição de 2012: São Paulo e Belo Horizonte.

O clima é de beligerância: o PT a querer avançar nas searas tradicionais do adversário e o PSDB a se armar para defender seus territórios a qualquer custo.

Nem em Minas se fala mais na aliança tucanopetista, com a qual Aécio Neves sonhava construir o "pós-Lula".

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

E o lobo virou cordeiro:: Ferreira Gullar

Se Lula aderiu às ideias do adversário, foi porque estas correspondiam às necessidades do país

O leitor sabe muito bem que não sou nem pretendo ser cientista político, mas apenas alguém que, como qualquer cidadão, acompanha com atenção o que ocorre em nossa vida política e procura, tanto quanto possível, compreendê-la. Mas não o esgoto, dou palpites. Não obstante, pelos muitos anos que tenho de observar, ler e refletir sobre os fatos políticos, creio às vezes perceber algo que ainda não foi formulado claramente pelos analistas profissionais.

Mas, também, pode ocorrer que me engane, claro. Ainda assim, me atrevo a dizê-lo, correndo o risco de não ir além do óbvio. É o que farei agora. Mas, antes, advirto os petistas de que, se lerem esta crônica até o fim, podem até concordar comigo.

Começo pelo que todo mundo sabe e que Lula e sua turma tudo fazem para ocultar: sem o Plano Real e a Lei de Responsabilidade Fiscal, o Proer e outras medidas tomadas por Itamar e Fernando Henrique, o êxito do governo Lula teria sido simplesmente impossível.

Não se trata, aqui, de uma simples opinião, mas de um fato incontestável de que nenhum economista ou cientista político que veja os fatos com isenção discordará. Todos sabemos, o Plano Real foi o que pôs fim à inflação galopante que arrasava os salários e a economia brasileira como um todo.

A criação do Real e os procedimentos que possibilitaram uma atitude disciplinadora em face dos problemas estruturais de nossa economia assinalaram o início de uma nova fase em nossa história.

Em seguida, a Lei de Responsabilidade Fiscal liquidou com uma das principais fontes do processo inflacionário: os gastos sem controle promovidos sobretudo pelos governos estaduais.

Essa lei, que condiciona as despesas públicas à arrecadação efetivamente conseguida, só foi posta em prática porque Lula e o PT não lograram impedir sua aprovação pelo Congresso. Foram derrotados na Câmara, depois no Senado, mas não desistiram e entraram com uma ação no Supremo Tribunal Federal para sustá-la.

A campanha do PT contra o Plano Real foi igualmente feroz, chegando Lula a afirmar que se tratava de um lance eleitoral demagógico, feito para não durar mais que três meses. O Proer, que evitou uma crise bancária de consequências imprevisíveis, contou igualmente com a furiosa oposição dos petistas.

A conclusão inevitável é que, se dependesse deles, nenhuma dessas medidas teria sido adotada e a economia brasileira não teria alcançado o equilíbrio e a consistência que permitiram ao governo Lula realizar o que realizou.

Cabe agora perguntar: não foi bom para o país que o governo Lula tenha dado certo? Claro que foi. Então, não tem sentido criticá-lo por ter feito o que era certo fazer.

Ideologia é uma coisa, realidade é outra. Quando Lula se deu conta de que sua pregação radical não o levaria ao poder, mudou de tom e de mensagem, assumindo uma posição moderada que lhe possibilitou ganhar as eleições. À frente do governo, adotou tudo o que seu adversário implantara, desde os programas assistenciais até a política econômica "neoliberal", imprimindo àqueles um colorido populista e à política externa um cunho antiamericano para salvar a face.

Com esses toques, que chegavam aos ouvidos do povão ampliados pela retórica de Lula, construiu-se a imagem de um governo que contou com a simpatia popular e ganhou a confiança do empresariado.

Nada melhor para o capital do que um país sem greves nem crises econômicas.

Uma visão simplista atribuiria tudo isso ao carisma e à sagacidade política de Lula quando, na verdade, se trata de coisa bem mais complexa, conforme entendo. Se Lula mudou de retórica e de visão social, aderindo às ideias do adversário, foi porque a visão e os projetos deste é que correspondiam às necessidades reais do país.

As mudanças que ele introduziu, por serem necessárias, tornaram-se irreversíveis. E, assim, o PT virou PSDB, como um lobo que se metesse em pele de cordeiro. Com a diferença de que, se o lobo da fábula continuou lobo, o lobo Lula virou cordeiro mesmo. E Dilma, mais ainda, se não quiser fracassar.

Daí por que o PSDB tem dificuldade de fazer oposição, pois seria como opor-se a si mesmo.

E também por isso Serra defendeu um salário mínimo de R$ 600, como se fosse possível cordeiro virar lobo, de repente.

FONTE: ILUSTRADA/FOLHA DE S. PAULO

O que pensa a mídia

Editoriais dos principais jornais do Brasil
Clique o link abaixo

Inflação e miséria no governo Dilma :: Suely Caldas

Há dias, em Minas Gerais, a presidente Dilma Rousseff deixou no ar a dúvida, mas a ministra do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Tereza Campello, e a secretária de Erradicação da Pobreza, Ana Fonseca, não têm dúvida alguma: garantiram que a extrema pobreza será totalmente erradicada até o fim deste governo, em 2014.

O Censo Demográfico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) contou 16,2 milhões de pessoas (e não mais 10 milhões, da primeira estimativa) que vivem à margem da vida, com R$ 2,30 por dia, em habitações miseráveis, sem renda, sem emprego, sem acesso à saúde e educação, sem cidadania. Para elas o governo prepara o programa Brasil Sem Miséria, prometendo levar-lhes serviços públicos e "inclusão produtiva".

Tudo o que for possível fazer para aliviar o sofrimento cotidiano dessas pessoas será bem-vindo, desde que funcione com eficácia e sem desperdícios de dinheiro. Mas o que for feito, com certeza, será desfeito, eliminado, zerado, se os preços do pão, do feijão, do remédio subirem, se a inflação engolir os míseros R$ 2,30 que lhes restam.

A inflação é um imposto cruel que piora o sofrimento dos pobres e multiplica a renda dos ricos aplicadores do mercado financeiro.

Pois bem. Se for mesmo obsessão de seu governo erradicar a pobreza, a presidente Dilma não pode vacilar em concentrar seu arsenal no alvo da inflação, não permitir em nenhuma hipótese a sua volta, eliminar o mal pela raiz. Se a inflação ganhar fôlego, Dilma pode dar adeus ao programa Brasil Sem Miséria. Sua equipe que comanda a economia já errou muito neste campo, mostrou insegurança, vacilação, leniência, permitiu abrir espaço para a inflação se instalar e, pior, alargando o campo para a indexação de preços, que dá fôlego, multiplica e espalha reajustes pela economia.

Na semana passada a presidente reuniu sua equipe, deu bronca por causa das divergências públicas e elegeu o ataque à inflação o alvo prioritário de seu governo. Tudo bem, agora vai, com firmeza, determinação, sem vacilações, obsessão de verdade. Nada disso. Há uma condicionante: desde que não prejudique o crescimento de 4% projetado para este ano. E quem não quer crescimento econômico? Só alucinados. "Profetas do caos" só existem no fantasioso imaginário de Lula, ao atacar a oposição, com rótulos e sem substância.

Mas, ao definir prioridades, o governante não pode ignorar e simplesmente desprezar dificuldades que se opõem em seu caminho. Ele precisa analisar fatores, avaliar e fazer escolhas. E este é o momento de fazê-lo - aliás, já está atrasado.

Há anos a China vive com inflação baixa e cresce continuamente a 9% ao ano. Mas investe pesadamente em infraestrutura, o custo de produção e de transporte é muito baixo, a taxa de poupança equivale a 45% do Produto Interno Bruto (PIB) e a taxa de investimento se aproxima de 50% do PIB. São condicionantes para um crescimento sem riscos.

No Brasil é o inverso. Nossa taxa de poupança é de 15% do PIB, há variados gargalos na infraestrutura, que encarecem o custo de produção e transporte, e a taxa de investimento patina em 19% do PIB.

Essas condições precárias para o País crescer sem riscos têm de ser levadas em conta pela presidente Dilma ao definir sua estratégia de ataque à inflação. Afinal, garantir crescimento contínuo, sem cair em reajustes de preços, implica expandir a produção e dispor de rodovias, ferrovias, portos e aeroportos em abundância para garantir o transporte dessa expansão.

E o Brasil tem isso? É claro que não. Só a urgência da Copa do Mundo de 2014 e da Olimpíada de 2016 fez o governo se mexer e decidir privatizar aeroportos (não estaria no sufoco, se decidisse há tempos).

Por aqui, quando a produção cresce, esbarra nos gargalos dos transportes, a oferta estanca, a procura segue crescendo, os preços sobem e a inflação volta. Essa trajetória vem ocorrendo desde o ano passado e foi agravada no governo Dilma, porque alguns preços - gasolina, por exemplo - foram represados por Lula.

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, vive repetindo que crescimento ameaçar a inflação é coisa do passado. Não é. É justamente o que o Brasil vive atualmente.

É esse tipo de resposta vazia, esse desejo de derrotar a alta de preços no gogó, que leva a estratégia do governo ao descrédito. Dos últimos oito anos, só em três a inflação fechou dentro da meta; em cinco, foi ultrapassada; e no mês passado ela estourou o teto na medição dos últimos 12 meses.

Não se trata de fazer recuar a demanda até a recessão. O País pode e precisa continuar crescendo em 2011. Mas com calibragem, moderação e equilíbrio, até afastar o inimigo mais perigoso. E, para ser vitorioso nesta guerra, o governo precisa agir rápido para frear o impulso da indexação de preços, que se tem espalhado e alargado espaço. É verdade que o Banco Central detectou esse risco e seus diretores têm alertado para a necessidade de desindexar a economia. Mas não será com troca de índices de inflação, como sugeriu, na quinta-feira, o secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Márcio Holland.

Aliás, impressiona e não para de surpreender o potencial criativo da equipe da Fazenda em inventar e reinventar soluções amadoras, inócuas. Substituir o IGP pelo IPC não é desindexar a economia, é perpetuar a indexação com outro índice de preços.

Se o governo quer desindexar, dê o exemplo, elimine índices de reajustes ao negociar seus contratos. Assim, vai abrir caminho para o setor privado fazer o mesmo. Mas, se ficar na substituição de índices, quando chegar setembro os petroleiros, bancários e metalúrgicos também vão querer aumentar salários com base na inflação passada. Daí industriais e banqueiros irão repassar o custo para os preços de uma infinidade de produtos, que irão realimentar outros - a ciranda segue girando e a inflação vence a batalha. Vamos fazer figa para que não aconteça.

Ao contrário do que diz o eufórico ministro Guido Mantega, a inflação continua exibindo suas garras. Não chegaria ao ponto que chegou, se tantos erros não fossem cometidos. Corrigi-los agora exige um sacrifício maior na conta de juros, em frear a demanda e crescer com limites.

Há dúvidas sobre se este governo está disposto a seguir esse caminho. Mas resta confiar. Afinal, a presidente Dilma já disse que tem duas obsessões em seu governo: acabar com a miséria e controlar a inflação. E uma depende da outra.

Jornalista, é professora de comunicação da PUC-Rio

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Olho no futuro:: Míriam Leitão

Esta semana o Brasil pode tomar uma decisão que vai afetar as futuras gerações. O país tem diante de si muitas dúvidas, mas já tem uma certeza: até agora, errou muito. O Código Florestal não é sobre o conflito entre produtores rurais e ambientalistas, é sobre os erros do passado, as chances e riscos do futuro. O debate tem sido medíocre.

O fotógrafo brasileiro e global Sebastião Salgado passou os últimos anos olhando o presente do futuro num projeto chamado Gênesis, que lembra o passado mais inicial. Fotografa o que resta de protegido na natureza. Essa ideia surgiu quando voltou para a fazenda em que cresceu no interior de Minas, Aimorés. Tudo árido, desmatado, morros pelados, erosões. Nada lembrava a vida cheia de verde que ele tinha visto na infância. Ele começou a replantar. Mil, duas mil, um milhão de mudas de espécies nativas. A água, que havia secado, brotou de novo; as árvores cresceram, voltaram animais, pássaros. A mulher do fotógrafo e autora do projeto, Lélia Salgado, quando me contou o momento da descoberta da água retornada, se emocionou.

Os produtores pensam estar protegendo seus interesses quando defendem anistias e leis que aceitam mais desmatamento. Podem estar secando seus rios, revoltando os leitos que vão mostrar suas fúrias nas tempestades, minando o solo, que vai secar, desabar ou se partir nas crateras da erosão. Podem estar contratando o acirramento de fenômenos climáticos extremos que destruirão suas terras, plantações e a economia do país.

O dilema que está diante de nós é maior do que temos visto. O Brasil é ao mesmo tempo um dos maiores produtores de alimentos do mundo, o país com a maior diversidade biológica do planeta, um dos grandes reservatórios de água. Como é possível conciliar a abundância das chances que temos? Há países que administram a escassez. Temos sorte.

Os ruralistas disseram que querem mais terra para plantar. Com a produção deles, o Brasil garante a balança comercial, aproveita a alta das commodities, acumula reservas cambiais, entra em todos os mercados como o primeiro do mundo em muitos produtos. Os produtores são parte do nosso sucesso como país. Os ambientalistas dizem que o país já destruiu demais. Foram 333 mil km na Amazônia nos últimos 20 anos: 11 Bélgicas, quase uma vez e meia o território do Reino Unido. Além disso, reduziu a quase nada a Mata Atlântica, é insensível ao Cerrado, ameaça o Pantanal, despreza a Caatinga. Os ambientalistas são parte do nosso melhor projeto. Os cientistas fizeram um grupo de trabalho, reuniram mentes brilhantes, estudaram profundamente e fizeram um relatório que alerta para os riscos de o país escolher mais desmatamento. Foram ignorados e disso deram ciência ao país. A Agência Nacional de Águas (ANA) ouviu os técnicos e avisou: sem a cobertura vegetal, vamos perder água; o elemento da vida que está ficando cada vez mais escasso. A agência foi ignorada como se chovesse no molhado.

No meio dessa complexidade, o deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP) escolheu apequenar seu campo de visão e viu apenas um dos lados do polígono. Não entendeu que esses são conflitos não antagônicos, para usar uma linguagem que talvez ele ainda tenha de memória. É preciso ver toda essa diversidade. Escolhendo ouvir só os produtores de visão estreita, ele pode estar revogando os interesses mais permanentes dos próprios produtores. Sem proteção do meio ambiente não haverá água, sem água não haverá produção. Sem meio ambiente não há agronegócio. Os interesses são mais convergentes do que parecem.

Os produtores têm razão em reclamar que a lei mudou no meio do caminho em alguns pontos. Olhar esses pontos com sinceridade é necessário. A ANA lembrou as políticas de incentivo ao desmatamento e as alterações de tópicos da lei e separou o que o projeto misturou: "Quem agiu de boa fé" e "quem comprovadamente gerou passivo ambiental." O projeto mistura tudo quando anistia quem desmatou até 22 de julho de 2008. O texto como foi escrito estatiza os custos e privatiza o lucro.

Os cientistas alertam que uma pequena alteração feita no texto representa um risco imenso. Se a mata em torno dos rios tiver que ser calculada a partir da menor calha, e não das bordas maiores, os rios da Amazônia que enchem e encolhem ao longo do ano podem perder 60% da sua proteção.

A ANA, a Academia Brasileira de Ciências e a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) avisam que não se deve mudar o código. A tarefa é aprimorar a lei e melhorar a implementação. A ideia de que uma lei deve ser jogada fora porque muitos não a respeitaram é estranha. Ela não foi entendida nem pelo governo que a baixou em 1965, mas para nossa sorte ela ficou atual. Protege áreas frágeis da erosão e dos deslizamentos. Protege rios e mananciais de água. Cria a obrigação de cada proprietário reservar uma parte da sua terra para a vegetação natural. Está em sintonia com o tempo da mudança climática que já está entre nós.

A oposição desistiu do futuro; o governo decidiu escolher o menos pior. Erram os dois. O sensato é querer o melhor. Olhar para as exigências que o planeta nos faz para as próximas e decisivas décadas. Entender como aumentar a produção conservando os ativos. Fazer mais com cada hectare de terra da agricultura e da pecuária. Tirar mais informação da biodiversidade que recebemos por herança. Não se deve votar com olhos paroquiais. É pelo porvir que se vota, congressistas. Leis não são mudadas para apagar o crime do passado, mas para garantir o melhor futuro.

FONTE: O GLOBO

Charge de hoje

Avanço do PT em cargos e programas irrita aliados

Para siglas como PMDB e PCdoB, petistas estão crescendo em áreas com potencial de uso da máquina na eleição de 2012

Gerson Camarotti

BRASÍLIA. Partidos da base aliada não escondem mais a contrariedade com o avanço do PT em áreas do governo com grande potencial para eventual uso da máquina nas eleições de 2012. Nos bastidores, a estratégia da cúpula petista já foi traçada: dobrar as 480 prefeituras conquistadas em 2008 e, com isso, igualar o número de municípios governados com o PMDB, que elegeu no último pleito 1.118 prefeitos.

O PT quer reconquistar cidades estratégicas, como São Paulo, e ao mesmo tempo crescer nos grotões. A mais de um ano da eleição municipal, a constatação entre partidos como PMDB, PCdoB, PP e PR é que os petistas ocuparam estrategicamente o comando de cargos e programas com grande capilaridade nacional e ações municipais.

- O PT não pode ver o PMDB como alvo, como adversário. O PMDB tem de ser visto como parceiro, para que possamos caminhar juntos em 2014 - adverte o líder do PMDB, deputado Henrique Eduardo Alves (RN).

Os aliados citam que o PT está avançando em postos estratégicos de segundo e terceiro escalões, como Funasa e o controle do Bolsa Família, áreas consideradas de grande visibilidade.

- No governo Dilma, o PT decidiu tomar conta de todos os cargos federais nos estados e municípios. Os aliados já estão incomodados. A reclamação é geral, pois o PT comanda todos os programas. E, se Lula fizer mesmo uma caravana para os candidatos do PT, isso vai complicar ainda mais a disputa municipal. Se o PT mantiver esse ritmo de avanço, as alianças vão para o espaço - alerta, por sua vez, a deputada acreana Perpétua Almeida, do PCdoB.

Programas como o Territórios da Cidadania, com forte atuação nos grotões, também preocupam aliados. Eles acusam o Planalto de avisar com antecedência parlamentares petistas, para que capitalizem politicamente as ações.

Na pasta da Saúde, foi um duro golpe para o PMDB a transferência da Funasa para petistas. Principalmente por causa das inúmeras ações do órgão nos municípios: instalação de postos de saúde, Farmácia Popular, Centros de Especialidade Odontológica e as Unidades de Pronto Atendimento, estas últimas em municípios médios e grandes.

Até pastas que estão com os aliados, como Cidades, sob o comando do PP, perderam a influência em algumas ações. Isso acontece com o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), cuja coordenação agora é definida pelo Ministério do Planejamento, responsável por relacionar os municípios dos programas.

Aliados também estão incomodados com o novo presidente da Caixa, Jorge Hereda, identificado como petista atuante. O banco cuida da aprovação de projetos e liberação de recursos do Minha Casa, Minha Vida. Peemedebistas também não escondem o incômodo com a perda dos Correios para o PT.

O líder do governo, deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP), disse que não há motivo para rebelião de aliados:

- O governo está equilibrado entre PT, PMDB e todos os partidos da base aliada.

FONTE: O GLOBO

Em 12 Estados, comando do PSD é pró-governo

O PSD (Partido Social Democrático), definido pelo prefeito Gilberto Kassab como "nem de direita nem de esquerda nem de centro", nasce com viés pró-governo. Em 12 Estados, o comando está com aliados da presidente Dilma.

Partido de Kassab tem viés pró-Dilma em 12 Estados

No PSD, mesmo estrelas da oposição preferem o rótulo de "independentes"

Tendência governista se repete na bancada da nova legenda; entre os seus 42 deputados, terá até um sobrinho de ACM

Vera Magalhães e Natuza Nery

SÃO PAULO / BRASÍLIA - Definido pelo prefeito Gilberto Kassab como "nem de direita nem de esquerda nem de centro", o PSD (Partido Social Democrático) nasce com claro viés pró-governo. Das 23 unidades da federação onde está formado, em 12 o comando é de aliados da presidente Dilma Rousseff.

No mapa do DNA do novo partido, a Folha considerou "oposicionistas" as seções capitaneadas por notórios críticos do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

São seis: São Paulo (Kassab e o vice-governador Guilherme Afif Domingos), Rio de Janeiro (Indio da Costa, ex-vice de José Serra), Santa Catarina (o governador Raimundo Colombo), Paraná (o ruralista Eduardo Sciarra), Tocantins (a senadora Kátia Abreu, presidente da CNA) e Goiás (Vilmar Rocha, secretário de Marconi Perillo).

Mesmo nessas seções, os caciques preferem o rótulo de "independentes". "Eu sou identificado com a oposição, porque fui candidato a vice do Serra. Mas tudo o que eu defendi a Dilma está fazendo: privatização de aeroportos, defesa dos direitos humanos", diz Indio da Costa.

Ele segue: "O PSD é uma criança que ainda está na barriga da mãe. Não seremos do contra, como muita gente na oposição. O que for a favor do Brasil, apoiaremos."

Há cinco Estados considerados "neutros", seja porque o comando está com não políticos -como em Minas, onde será presidido por um empresário-, seja porque ainda não está claro como os caciques vão se comportar.

VOTO "SIM"

Há quatro unidades, entre elas o DF, onde o PSD ainda não tomou corpo.

Quando se analisa a bancada na Câmara -de 42 deputados, pela lista mais atualizada-, a orientação pró-Dilma é mais clara.

Mesmo os dissidentes de partidos como DEM e PSDB aportam na sigla idealizada por Kassab com a disposição de votar a favor do governo.

Na Bahia, por exemplo, os seis deputados que aderiram devem seguir a orientação do vice-governador Otto Alencar, ex-PP e aliado do governador Jaques Wagner.

O rol de neogovernistas inclui até um sobrinho de Antonio Carlos Magalhães, Paulo Magalhães. O PT baiano sempre se opôs ao carlismo.

Na Paraíba, o líder do PSD será o vice-governador Rômulo Gouveia, que deixou o PSDB para ficar ao lado do governador Ricardo Coutinho (PSB) e de Dilma.

Em Mato Grosso, o vice-governador Chico Daltro, ex-PP, comandará uma das maiores bancadas: um senador de saída do DEM e três federais, todos dispostos a rezar pela cartilha dilmista.

Para Kassab, a diversidade ideológica é natural nessa fase inicial do partido, cuja composição é heterogênea.

"O ano de afirmação do PSD, de sua consolidação, será 2018, quando já teremos passado por duas eleições e será possível fechar uma posição única", diz o prefeito.

Para 2012 e 2014 vai vigorar a política de alianças, já que o partido não terá tempo de TV nem fundo partidário. A ordem na sucessão presidencial é clonar o PMDB: liberar as seções estaduais para apoiar a reeleição de Dilma ou o candidato do PSDB, sem fechar questão.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Alckmin liga PSD a ação para "dizimar oposição" no país

Em convenção, Serra diz que debandada de tucanos é "normal" e que nova sigla de Kassab não será "inimiga"

Dividido, PSDB encerra encontro estadual sem eleger novos dirigentes em SP; votação é adiada para a próxima quinta

Bernardo Mello Franco

SÃO PAULO - Num discurso com tom acima do usual, o governador Geraldo Alckmin (PSDB) ligou a criação do PSD, do prefeito paulistano Gilberto Kassab, a uma ação para "dizimar a oposição" no país.

Ele protestou contra o esvaziamento das siglas oposicionistas em convenção tucana ontem, em São Paulo.

Minutos antes, o ex-governador José Serra, aliado de Kassab, disse que a saída de tucanos para a nova legenda é "normal" e que o PSD não será "inimigo" do PSDB.

Sem citar a sigla de Kassab, Alckmin culpou sua criação pelo enfraquecimento de PSDB, DEM e PPS, partidos que mais têm sofrido com a debandada de filiados.

"Ainda querem nos responsabilizar pela crise na oposição. É inacreditável. [Há] uma ação para dizimar as oposições. Destruir o DEM, enfraquecer o PPS, enfraquecer o PSDB onde ele é mais forte, em São Paulo."

O governador atacou a suposta inconsistência ideológica do PSD -que Kassab já disse não ser de direita, de esquerda ou de centro.

"Partido é como religião. Não tem religião sem fé. Não tem partido sem idealismo."

Ele ainda ironizou a aproximação entre os ex-oposicionistas da nova sigla e o governo Dilma Rousseff.

"Não é fácil fazer oposição num país onde a política é governista e se faz embaixo, sob o aparelho de Estado, como carrapato grudado na máquina pública."

Em entrevista, Serra afirmou, pouco antes, que a saída de seis vereadores do PSDB ligados a Kassab foi um "episódio localizado".

"Isso é normal na vida partidária. Às vezes, há desentendimentos com desenlaces indesejáveis. Mas não afeta o partido como um todo."

Sobre a nova sigla, disse: "O PSD não é inimigo do PSDB. Saíram para fazer seu partido, mas isso não significa que sejam contra o PSDB."

Questionado se teria aconselhado algum dos dissidentes, não quis responder.

À plateia tucana Serra afirmou que o PSDB deve "honrar os votos" que ele recebeu na eleição presidencial e endurecer com Dilma.

"Muita gente [está] reclamando do partido no Brasil inteiro. Tem esse problema."

IMPASSE

A divisão do partido fez naufragar a convenção que elegeria ontem a nova cúpula tucana em São Paulo.

A votação foi adiada para quinta-feira por falta de acordo sobre o novo secretário-geral da sigla. Disputam o cargo o deputado federal Vaz de Lima, ligado a Serra, e César Gontijo, aliado do secretário José Aníbal (Energia).

Serra e Aníbal são cotados para disputar a prefeitura pelo PSDB em 2012.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Serra sob pressão do PSDB

Na mira de aliados, que o acusam de ter se omitido diante da criação do PSD, ex-governador está no centro de um impasse: a eleição do diretório paulista foi adiada para quinta-feira.

PSDB põe Serra contra a parede

Disputa interna pelo controle local da sigla empurra ex-governador para a disputa pela Prefeitura de São Paulo. Cessar-fogo aparente com Alckmin terminou em impasse na convenção

Ivan Iunes e Ulisses Campbell

O ex-governador de São Paulo José Serra bem que tentou passar a imagem de união com o atual governador, Geraldo Alckmin, ontem na eleição do diretório paulista do PSDB. Os dois até acertaram chegar juntos, no mesmo carro, com Serra ao volante e Alckmin no banco do passageiro. Mas a guerra interna deflagrada entre os tucanos paulistas adiou as definições do encontro para a quinta-feira. E mais, pode forçar o ex-governador a voltar à Prefeitura de São Paulo no ano que vem. Alvejado pelas críticas de aliados de que estaria se omitindo diante da criação do PSD e até incentivando a migração de políticos aliados para o novo partido, o cacique tucano aposta na possibilidade de atração da nova legenda para conseguir manter o controle dos rumos dos tucanos em 2012.

Depois de assistir à fuga de variados aliados para o PSD, incluindo a parcela do DEM liderada por Kassab e Jorge Bornhausen e seis vereadores tucanos de São Paulo, Serra se movimentou nos últimos dias com o intuito de negar influência sobre as decisões dos políticos próximos. Mesmo assim, mantém na nova legenda uma importante linha política auxiliar para 2014. A guerra interna deflagrada no DEM e no PSDB pelo controle das legendas, já com vistas às eleições de 2014, só deve ter um desfecho na convenção nacional tucana, marcada para o final do mês.

Até lá, Serra já confidenciou a aliados que não pretende manifestar-se oficialmente nem sobre a criação do PSD, nem sobre a sucessão do presidente tucano Sérgio Guerra — candidato à reeleição. Desde o início do ano, o ex-governador paulista procurou diversos aliados, queixando-se da movimentação de adversários internos e da subsequente perda de espaço. Ao governador de Goiás, Marconi Perillo, que é aliado do senador Aécio Neves (PSDB-MG) no ninho tucano, chegou a falar em deixar a legenda. Depois de perder o primeiro round da briga com Aécio nas eleições internas do DEM, o tucano preferiu deixar os holofotes e arregimentar forças nos bastidores.

Em sequência ao revés, a diáspora no DEM levou os tucanos a cobrarem de Serra uma ação no intuito de segurar os dissidentes na oposição — o neopartido de Kassab tem um pé na base governista. Acuado pelo rumo adotado por aliados serristas, que incluiu até a perda de nomes importantes como o seu vice-governador, Guilherme Afif Domingos, Alckmin decidiu partir para cima dos diretórios municipais e estaduais paulistas do partido. Esvaziado no ninho tucano, Serra reabriu o diálogo com o governador na semana passada. Negou ter incitado políticos tucanos a mudarem para o PSD e costurou a eleição do deputado estadual Pedro Tobias (PSDB-SP) como nome de consenso para direção do diretório paulista tucano.

Acuado

Para transmitir o recado de união, o ex-governador e Alckmin chegaram juntos à convenção, ao som da música de Roberto Carlos Eu quero apenas, que diz “eu quer ter um milhão de amigos e bem mais forte poder cantar”. O cessar-fogo durou poucas horas ou até a eleição do secretario-geral da legenda em São Paulo, que terminou em impasse. Serra quer o deputado federal Vaz de Lima na função, enquanto Alckmin apoia César Gontijo. E o cessar-fogo caiu por terra.

O embate deflagrado com Alckmin, adversário de Kassab pelo Palácio dos Bandeirantes em 2014, mostra que uma possível composição de PSD e PSDB em São Paulo passaria pelo nome de Serra, necessariamente. De um lado, Kassab já declarou apoiar o ex-governador em qualquer eleição. Aliado do cacique tucano, o senador Aloysio Nunes (PSDB-SP) retribuiu o cortejo. “Eu não considero o PSD nosso adversário. O fundamento é do nosso campo”, afirmou o senador, durante a eleição de ontem do diretório paulista. Nos bastidores do encontro tucano, entretanto, voltou a ganhar força a possibilidade de Serra costurar a ida para o recém-criado PSD — publicamente o tucano nega. Ex-vice de Serrra, Alberto Goldman (PSDB) deu a tônica do encontro: a crise está longe do fim. “Em toda história de partido há grupos insatisfeitos”, justifica.

Hora da decisão

A convenção nacional do PSDB colocará de volta à mesa de negociações no final do mês dois grupos em conflito no PSDB. De um lado estarão novas lideranças como o senador Aécio Neves (PSDB-MG) e o governador paulista Geraldo Alckmin (PSDB-SP). Do outro, nomes históricos tucanos, como José Serra. A tendência é de que os tucanos reconduzam Sérgio Guerra (PSDB-PE), aliado de Aécio e Alckmin, ao comando da legenda. A possibilidade de acordo estudada para tentar por paz ao partido entregaria a Serra a oportunidade de indicar um aliado para secretário-geral ou vice-presidente do partido. Os escolhidos seriam o senador Aloysio Nunes (PSDB-SP) ou o ex-governador paulista Alberto Goldman. Mas tudo depende de como a fissura no diretório paulista será emendada.

FONTE: CORREIO BRAZILIENSE

BCs querem guerra à ''complacência com a inflação''

Presidentes de bancos centrais iniciam reunião hoje na Suíça para discutir estratégias de contenção dos preços

Jamil Chade

Os maiores bancos centrais do mundo querem um compromisso dos emergentes na luta contra a inflação. Os xerifes do sistema financeiro internacional se reúnem a partir de hoje na Basileia, na Suíça, com praticamente uma só tema na agenda: como dar uma resposta à alta nos preços no mercado global.

Segundo fontes que participam do encontro, a mensagem que os BCs querem passar na segunda-feira ao mercado, quando a reunião terminar, é a de que há um compromisso internacional para enfrentar a pressão inflacionária e chegou a hora de acabar com a complacência em torno da inflação, principalmente nos mercados emergentes.

A reunião ocorre no momento em que Brasil, China e Índia se deparam com a constatação de que a alta nos preços tem escapado a seu controle. No caso do Brasil, dados do governo mostraram que os preços superaram a meta de inflação estipulada pelas autoridades.

"A inflação nos países emergentes é uma preocupação não apenas para essas economias, mas também para Europa e Estados Unidos, que dependem hoje do bom desempenho dos emergentes para continuar exportando e compensar a falta de crescimento de seus mercados internos", explicou ao Estado o presidente de um BC no Oriente Médio, que pediu para não ser identificado diante do compromisso de sigilo em torno do que se debate na reunião.

Nos últimos dias, diversos governos de países em desenvolvimento foram obrigados a anunciar uma elevação nas taxas de juros. Além do caso brasileiro, uma das principais preocupações é com a inflação na Ásia.

Filipinas, Índia, Vietnã e Malásia elevaram suas taxas de juros nos últimos cinco dias. Um estudo da ONU confirma que a Ásia será o motor do crescimento da economia mundial em 2011 e 2012, mas indica que a tendência será acompanhada por uma pressão nos preços.

Desde outubro de 2010, a China já elevou quatro vezes a sua taxa de juros. Na Índia, o governo já aumentou a taxa em nove ocasiões em 12 meses. O governo da Índia anunciou o combate à inflação como uma prioridade.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Bin Laden e o fanatismo :: Alberto Dines

O tabuleiro de xadrez do Oriente foi desarrumado com a eliminação do chefe da Al-Qaeda. Osama bin Laden era o comandante dos mujahedines, guerreiros religiosos, portanto líder militar e religioso. Sua eliminação pelos EUA não altera apenas o quadro da luta contra o terrorismo, mas tem implicações no universo político-religioso islâmico onde o wahabismo de Bin Laden disputa com os salafitas a hegemonia da ortodoxia sunita que, por sua vez, se opõe ao radicalismo xiita.

Apesar da fragmentação, as facções islâmicas majoritárias estão impregnadas pela devoção teocrática, antisseculares e antidemocráticas. A morte do mais audacioso dos fanáticos islâmicos não altera o quadro conflituoso, mas reforça a necessidade de fortalecer o laicismo onde quer que esteja ameaçado.

A recente decisão do STF em favor da união civil de cidadãos do mesmo sexo representa um avanço em nosso País, mas as discussões sobre a execução de bin Laden não estão contemplando o fato de que foi o mandante assumido de um massacre religioso que produziu 2.982 vítimas inocentes em 11 de setembro de 2001.

Graças à explosão dos fanatismos estamos sendo expelidos de um século que parecia dedicado à razão, à tolerância e remetidos ao passado remoto dominado pelo obscurantismo e intolerância. Nosso empenho em humanizar o outro, desarmar conflitos e construir alianças humanitárias é permanentemente confrontado pelos demônios da exclusão. Na véspera do 63º aniversário da criação do Estado de Israel a questão do fundamentalismo torna-se crucial, magnificada por vetores opostos. De um lado, facções político-militares como a Al-Qaeda, Hamas e Hezbollah dedicadas a varrer o país do mapa e, do outro, a coligação político-religiosa que domina a nação e a empurra para um perigosos isolamento.

A criação do Estado de Israel em 1948 tornou-se possível graças à ONU do ano anterior que optou pela partilha da Palestina em dois Estados. Não importa que a criação do estado árabe tenha sido impedida pelas monarquias do Egito, Transjordânia (hoje Jordânia), Iraque e pela Síria e pelo Líbano que não admitiam a existência de um Estado não islâmico naquele território sagrado. O que preocupa é que Israel não aceite a existência de um Estado previsto na mesma ocasião e pelas mesmas circunstâncias: o Estado da Palestina. Israel não tem o direito de negar aos palestinos os benefícios de uma decisão que permitiu a sua existência.

Aqui entra a inflamação teocrática: no passado a direita israelense também não admitia a partilha da Israel bíblica. A direita israelense hoje engrossada pelo fanatismo religioso não consegue pensar política ou estrategicamente como aconteceu em 1979 quando Menachem Beguin aceitou devolver a península do Sinai ao Egito de Sadat reduzindo as tensões regionais. O premiê Benjamin Netanyahu tornou-se refém de um delírio religioso que não prega a guerra santa, mas compartilha do mesmo irracionalismo dos fanáticos adversários.

Bin Laden foi o símbolo da exaltação religiosa. Melhor seria julgá-lo. Não deu: foi derrubado pela onda de ressentimentos que ele próprio gerou. Hora de repensar as religiões. Ou apenas em Deus.

Alberto Dines é jornalista

FONTE: JORNAL DO COMMERCIO (PE)

Gal Costa - Aquarela do Brasil

A cadência fagueira dos meninos:: Graziela Melo

Existem homens
Com a alma


Pelo ódio


Corroída
Destruída


E tão


Inteiramente
Carregada


Que,
Cegos,


Não
Enxergam


A doçura
A cadência


Fagueira


Dos meninos


Brincando
Na calçada


In “Crônicas, contos e poemas”, pág. 100. Abaré Editorial/Fundação Astrojildo Pereira, Brasília, 2008