quarta-feira, 27 de abril de 2011

Reflexão do dia – FHC: É preciso refazer caminhos.

Antes de especificar estes argumentos, esclareço que a maior complexidade para as oposições se firmarem no quadro atual – comparando com o que ocorreu no regime autoritário, e mesmo com o petismo durante meu governo, pois o PT mantinha uma retórica semianticapitalista – não diminui a importância de fincar a oposição no terreno político e dos valores, para que não se perca no oportunismo nem perca eficácia e sentido, aumentando o desânimo que leva à inação. É preciso, portanto, refazer caminhos, a começar pelo reconhecimento da derrota: uma oposição que perde três disputas presidenciais não pode se acomodar com a falta de autocrítica e insistir em escusas que jogam a responsabilidade pelos fracassos no terreno “do outro”. Não estou, portanto, utilizando o que disse acima para justificar certa perplexidade das oposições, mas para situar melhor o campo no qual se devem mover.

Se as forças governistas foram capazes de mudar camaleonicamente a ponto de reivindicarem o terem construído a estabilidade financeira e a abertura da economia, formando os “cam¬peões nacionais” – as empresas que se globalizam – isso se deu porque as oposições minimizaram a capacidade de contorcionismo do PT, que começou com a Carta aos Brasileiros de junho de 1994 e se desnudou quando Lula foi simultaneamente ao Fórum Social de Porto Alegre e a Davos. Era o sinal de “adeus às armas”: socialismo só para enganar trouxas, nacional-desenvolvimentismo só como “etapa”. Uma tendência, contudo, não mudou, a do hegemonismo, ainda assim, aceitando aliados de cabresto.


HENRIQUE CARSOSO, Fernando. O Papel da oposição. Revista Interesse Nacional, nº 13 – Abril a Junho de 2011

Dilma abandona dogma do PT e privatiza aeroportos

Obras no Galeão e outros 4 grandes terminais serão tocadas por setor privado

Parado há oito anos no Palácio do Planalto, onde sofria restrições do então presidente Lula e da chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, o projeto de concessão dos aeroportos à iniciativa privada foi anunciado ontem pelo governo como solução para o gargalo aéreo brasileiro. A proposta constava do programa de governo do candidato do PSDB à Presidência, José Serra, e foi atacada pelo PT durante as três últimas campanhas presidenciais. Segundo o ministro-chefe da Casa Civil, Antonio Palocci, obras e construção de novos terminais em Viracopos (Campinas), Guarulhos (São Paulo) e Brasília serão tocadas pelo setor privado, e o governo federal ainda estuda o modelo de concessão para os aeroportos de Confins (Belo Horizonte) e Galeão (Rio de Janeiro).

Aeroportos em mãos privadas

De olho na Copa, governo vai conceder a empresas administração e construção de terminais

Chico de Gois, Geralda Doca e Martha Beck

Ogoverno bateu o martelo pela concessão parcial à iniciativa privada dos cinco principais aeroportos de conexão e internacionais do país, informou ontem o ministro-chefe da Casa Civil, Antônio Palocci. Segundo ele, em reunião na segunda-feira com o ministro da Secretaria de Aviação Civil (SAC) da Presidência, Wagner Bittencourt, a presidente Dilma Rousseff definiu os modelos para Cumbica (Guarulhos) e Viracopos (Campinas), em São Paulo, e Brasília. Continuam em estudo, que será concluído em pouco tempo, frisou Palocci, as opções para Confins (Belo Horizonte) e Antonio Carlos Jobim (Galeão, no Rio de Janeiro).

Com a decisão, caberá ao PT - tradicionalmente refratário às privatizações realizadas em governos anteriores, como a das telecomunicações - abrir às empresas privadas a exploração do setor aeroportuário, única área da infraestrutura nacional que continua sob comando exclusivo do Estado. Os 67 principais terminais do país são administrados pela Infraero.

Segundo Palocci, a ideia é dividir a administração dos grandes terminais entre a estatal e o setor privado, para captar mais recursos, acelerar as obras e introduzir a competição no sistema. A concessão deverá ser feita por licitação, mediante pagamento ao governo (outorga). Os primeiros editais podem ser concluídos em maio:

- A presidente já definiu o critério de concessão dos serviços para os terminais de Guarulhos, Viracopos e Brasília. Num curto espaço de tempo, vamos ter obras no regime de concessão nos três principais aeroportos que necessitam de investimento.

"Ideologia ficou de lado", diz especialista

A concessão de aeroportos foi sistematicamente postergada no governo Lula. Nas últimas campanhas presidenciais, as privatizações foram duramente criticadas pelo PT. Mas, segundo participantes do encontro ministerial de anteontem, Dilma foi enfática ao reconhecer que será impossível ampliar a capacidade de transporte de passageiros sem recursos privados. O governo corre contra o tempo para dar conta da maior demanda interna e da proximidade de Copa de 2014 e Olimpíadas de 2016.

- Dilma acredita que a concessão para o setor privado é a única forma de enfrentar a deficiência da infraestrutura aeroportuária brasileira - afirmou um ministro ao GLOBO.

Para o coordenador do núcleo de logística e infraestrutura da Fundação Dom Cabral, Paulo Resende, a decisão de conceder à iniciativa privada alguns dos principais aeroportos do país mostra que a face gestora de Dilma de sobrepôs à face política, diante das necessidades do setor e os possíveis constrangimentos durante a Copa:

- A voz da gestora falou mais alto. Enquanto em outras áreas da economia se percebe uma tendência à centralização nas mãos do Estado, na aviação a ideologia ficou de lado.

Segundo Palocci, os estudos do melhor modelo de concessão continuam para Confins e Galeão.

- A presidente também pediu para que a Secretaria avance os estudos sobre Confins e Galeão, que são também aeroportos prioritários. Portanto, cinco grandes aeroportos terão iniciativas de curto espaço de tempo em regime de concessão - disse.

Segundo um interlocutor, Dilma descartou a construção do terceiro aeroporto de São Paulo, em Caieiras. Além de problemas topográficos, Caieiras poderia competir com Viracopos e prejudicar os planos da presidente, que pretende transformá-lo em "um aeroporto do futuro, com espaço para ampliação", segundo uma fonte. Por isso, explicou essa fonte, Dilma defende que Viracopos seja controlado majoritariamente pelo governo.

Concessões terão prazo de até 25 anos

Para Guarulhos - a atual jóia da coroa, com metade das receitas com aluguel de áreas comerciais arrecadadas pela Infraero e 35% das taxas de embarque -, os planos de concessão estão restritos à construção e exploração de novas áreas, como o terceiro terminal de passageiros. Dois terminais remotos (que servem apenas para embarque e desembarque, sem área de check-in e recolhimento de bagagens) também podem entrar no lance.

Galeão será concedido mais por pressão política do governador do Rio, Sérgio Cabral, pois suas obras já estão em andamento. Uma nova reunião na sexta-feira vai decidir os rumos do aeroporto do Rio e também de Confins. A perspectiva é que os editais de Guarulhos e Brasília saiam em maio. Entre junho e julho, seriam conhecidas as regras de Viracopos e, depois, de Confins e Galeão. A concessão deverá ter prazo entre 20 e 25 anos.

Técnicos envolvidos nos trabalhos afirmam que o governo não quer acabar com a Infraero e vai adotar um modelo híbrido de administração aeroportuária, estatal e privada. A ideia é que a Infraero mantenha alguns terminais (alguns lucrativos, regionais e de fronteira), ficando com um total de 34. Os demais entrarão em regime de concessão parcial ou serão transferidos a governos e municípios que poderão fazer o mesmo.

- É importante manter a Infraero, que será profissionalizada para um processo de abertura de capital no futuro - explicou um técnico.

Porém, a presidente não tem escondido a insatisfação com a estatal. Ela acha que a Infraero só tem futuro num ambiente de competitividade. Em outra frente, o governo negocia com a oposição incluir numa medida provisória um sistema diferenciado para a Infraero, que dispensa licitações, nos mesmos moldes da Petrobras.

Colaborou Danielle Nogueira

FONTE: O GLOBO

Promessas de campanha :: Merval Pereira

A tentativa de transformar a gestão pública em algo mais transparente e acessível ao escrutínio do cidadão comum está no cerne de várias propostas em discussão hoje no país, desde a nova lei de acesso a documentos públicos - que deve ser sancionada pela presidente Dilma Rousseff no próximo dia 3 de maio, Dia internacional da liberdade de imprensa - até a criação do Conselho de Gestão e Competitividade, ligado diretamente à Presidência da República, coordenado pelo empresário Jorge Gerdau.

A eficiência de cada setor governamental será medida pelo estabelecimento de metas a serem cumpridas, como se cada ministério assinasse com a Presidência da República um "contrato de gestão".

Segunda-feira estive na Escola de Políticas Públicas da UCAM falando sobre essas e outras iniciativas que estão sendo tomadas para superar as deficiências de nosso sistema de governança, numa palestra cujo tema era "Déficits da Democracia Brasileira: Transparência no Setor Público e Impunidade dos Crimes de Corrupção".

Citei o livro "Corrupção e democracia no Brasil, a luta pela responsabilização", de Timothy J. Power, diretor do Centro Latino-Americano da Universidade de Oxford, na Inglaterra, e Matthew M. Taylor, professor da USP, lançado pela editora da Universidade Notre Dame dos Estados Unidos. Os autores afirmam que a corrupção no Brasil é sistêmica e alimentada pela impunidade, afetando a eficácia da gestão pública.

Mesmo que o brasileiro ainda considere a democracia como o melhor sistema político, como mostram diversas pesquisas, a confiança nas instituições está em declínio nas últimas décadas, pois elas não são capazes de identificar os culpados ou de puni-los.

Apesar de tudo, na avaliação dos autores, o país tem tido uma evolução nessa questão desde a redemocratização, com vários sistemas anticorrupção tendo sido criados, como a Controladoria-Geral da União (CGU) ou pela atuação da Polícia Federal e do Ministério Público, cujas funções foram ampliadas na Constituição de 1988. Ressaltei apenas que em muitas ocasiões esses órgãos politizaram suas ações, mas o saldo é claramente positivo.

Também a atuação da sociedade civil, através de várias ONGs, e as denúncias através da imprensa livre têm tornado o combate à corrupção mais visível para a sociedade.

A impunidade, no entanto, continua sendo tão danosa às instituições quanto a corrupção em si mesma, pois corrói a confiança na classe política e no sistema democrático.

Iniciativa para tentar superar essas deficiências está sendo apresentada esses dias em Brasília por Oded Grajew, ex-assessor especial do presidente Lula, um dos criadores do Fórum Social e coordenador da ONG Rede Nossa São Paulo.

A proposta prevê o estabelecimento de um Programa de Metas para todo o País, baseada na ideia de metas de gestão, tornando-a mais eficiente e responsável.

A legislação é inspirada na que foi adotado em Bogotá, na Colômbia, e foi muito importante para que a cidade saísse de uma situação precária em que se encontrava no auge do combate ao narcotráfico.

A proposta de emenda constitucional dá instrumentos para que o eleitor acompanhe de maneira mais objetiva a gestão, e obriga a que o mandatário defenda projetos mais realistas, tenha mais cuidado com a propaganda sem conteúdo.

Repete a experiência pioneira lançada na cidade de São Paulo, que Grajew considera um marco na história da democracia brasileira.

No momento, aliás, o prefeito Gilberto Kassab está às voltas com o não cumprimento de algumas metas apresentadas, muitas das quais, como zerar o déficit de creches, têm mais base no marketing da campanha eleitoral do que na capacidade real de serem realizadas.

De acordo com a proposta de Grajew, o presidente da República, governadores e prefeitos, eleitos ou reeleitos, apresentarão à sociedade civil e ao respectivo Poder Legislativo o Programa de Metas e Prioridades de sua gestão, até 90 dias após a posse, que discriminará expressamente: as ações estratégicas, os indicadores de desempenho e as metas quantitativas e qualitativas para cada um dos setores da administração pública direta e indireta por unidades regionais de planejamento e desenvolvimento, observando, no mínimo, os objetivos, diretrizes, ações, programas e intervenções estratégicas e outros conteúdos conexos, apresentados como propostas da campanha eleitoral devidamente registradas no órgão eleitoral competente.

É uma iniciativa semelhante a já adotadas, desde os anos 80 do século passado, por países pioneiros como a Austrália e a Nova Zelândia, mas sem dúvida é uma novidade entre nós, tanto do ponto de vista puramente administrativo quanto político.

O país ainda tem poucas experiências no sentido de tratar o dinheiro público com base em boa gestão, previsão orçamentária e acompanhamento de metas e desempenho, medidas adotadas na maior parte dos países chamados desenvolvidos para tornar o Estado mais eficiente.

Pesquisa do Banco Mundial em parceria com a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que reúne os países mais desenvolvidos, mostra que a maioria deles inclui dados de desempenho não financeiro em seus orçamentos, sendo que alguns possuem até mesmo mecanismos formais para premiar os funcionários públicos, com a combinação entre desempenho, metas atingidas e bônus salarial.

A proposta da Rede Nossa São Paulo, no entanto, peca pela tentativa de impor, dentro da emenda constitucional, as metas que considera importantes serem atingidas, assumindo um papel que não é o seu, ou seja, determinar um verdadeiro programa de governo.

Com o agravante de que, entre as propostas, estão algumas promessas que dificilmente poderão ser cumpridas, fugindo justamente ao que pretende combater.

Está na emenda constitucional a promessa de promover a "universalização do atendimento dos serviços públicos com observância das condições de regularidade; continuidade; eficiência, rapidez e cortesia no atendimento ao cidadão; segurança; atualidade com as melhores técnicas, métodos, processos e equipamentos; e modicidade das tarifas e preços públicos que considerem diferentemente as condições econômicas da população".

Um marqueteiro populista não encontraria melhor mote para uma campanha eleitoral.

FONTE: O GLOBO

Malha fina eleitoral:: Dora Kramer

O presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Ricardo Lewandowski, recebeu ontem e encaminha hoje à Procuradoria-Geral da República e aos tribunais regionais eleitorais informações da Receita Federal sobre as doações de pessoas jurídicas e físicas às campanhas eleitorais de 2010.

Os dados mais relevantes dizem respeito às doações de pessoas jurídicas: de um universo de 20 mil doadores, quatro mil ultrapassaram o limite permitido por lei que é o de 2% do faturamento bruto da empresa no ano anterior à doação. No caso de pessoas físicas, o limite é de 10% do rendimento bruto do contribuinte.

O TSE não revela ainda quais os candidatos beneficiados, mas sabe-se que na malha fina estão campanhas federais e estaduais - de presidente a governadores, senadores e deputados.

Tanto doadores quanto receptores ficam, a partir do momento em que as informações chegarem ao Ministério Público, passíveis de processos. As empresas podem ser multadas no valor equivalente ao mínimo de cinco e ao máximo de 10 vezes a quantia excedente ao permitido por lei.

Além disso, podem perder o direito de participar de licitações e de fazer contratos com o poder público pelo prazo de cinco anos.

Os candidatos beneficiados pelas doações ilegais podem responder a processos por abuso de poder econômico, cuja pena máxima é a cassação do registro da candidatura e consequente perda de mandato com suspensão do direito de se candidatar por três anos.

Nos próximos dias, quando as informações já estiverem em poder da Procuradoria-Geral e dos TREs, será possível conhecer os detalhes do material encaminhado pela Receita ao TSE.

Os processos judiciais demoram, mas não custa lembrar que recentemente houve punições por abuso de poder econômico com a cassação do mandato de prefeitos, vereadores e governadores.

O trabalho conjunto da Receita Federal com a Justiça Eleitoral pode não solucionar definitivamente o problema de ilegalidades nas doações de campanha, mas de todo modo ao menos cria um espaço crítico para a dissolução do nefasto dogma segundo o qual nesse setor a infração é a mãe da necessidade, todos fazem e, por isso, a prática deve ser aceita.

Fogo fátuo. Assunto encerrado: a ideia de se promover uma fusão entre PSDB e DEM está fora de cogitação pelo menos até a eleição de 2012.

Depois que o senador Aécio Neves, inicialmente um defensor da fusão, declarou nesta semana que o melhor é preservar a aliança, mas conservar a independência das legendas, o plano foi abandonado e as especulações devidamente desautorizadas.

A fusão vinha encontrando pesadas resistências no PSDB, notadamente entre os políticos ligados ao ex-governador José Serra devido à rejeição a uma convivência sob o mesmo teto com o ex-presidente do DEM, deputado Rodrigo Maia, visto como um fator permanente de desestabilização da candidatura Serra durante a campanha presidencial.

Havia também problemas regionais que impossibilitariam a parceria de grupos antagônicos, como os dos deputados ACM Neto (DEM) e Jutahy Magalhães (PSDB) na Bahia, do governador Marconi Perillo (PSDB) e do deputado Ronaldo Caiado (DEM) em Goiás e de Onyx Lorenzoni (DEM) e Yeda Crusius (PSDB) no Rio Grande do Sul. Nenhum deles entregaria nem se submeteria ao comando do adversário.

Isso, para citar só alguns casos, já levaria a nova formação a iniciar os trabalhos em ambiente de pesados atritos.

Nenhuma vantagem, portanto, principalmente para os tucanos cuja crise interna é grave, mas não tão periclitante quanto a situação do DEM.

Os democratas, por sua vez, perderiam o tempo de televisão a ser negociado das eleições e, mais importante, estariam abrindo mão do fundo partidário de R$ 12 milhões até 2010 e de R$ 20 milhões para este ano. Soma considerável para ser desprezada assim de uma hora para outra.

A desistência do projeto de fusão produz um momento de rara unidade no PSDB que enfrenta uma péssima fase em São Paulo fonte de sua principal força política há 16 anos.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

A volta de quem não foi:: Fernando Rodrigues

O possível retorno de Delúbio Soares ao PT marca o fim de um ciclo. Se ele voltar a se filiar à legenda, os petistas rasgam a fantasia. Dão por encerrado oficialmente o luto postiço iniciado em 2005, com o escândalo do mensalão. O teatro aproxima-se do final. Até porque o julgamento no STF tem data incerta e não sabida.

Delúbio era o tesoureiro do PT durante a eleição de Lula a presidente em 2002. A partir de 2003, mesmo sem cargo no governo, despachava de dentro do Palácio do Planalto. Era (e é) um arquivo vivo de todos os acertos financeiros ligados à cúpula petista. Foi escolhido para ser a Geni do mensalão. Aguentou o martírio em silêncio obsequioso por meia década.

Um "apparatchik" clássico, Delúbio tinha potencial e conhecimento para enterrar uma penca de deputados em 2005. Nunca comprometeu seus aliados na Justiça.

Passou uma vergonha final em 2009. Já reabilitado e em ação nos bastidores, quis voltar a ser filiado ao partido. Seu desejo foi negado. Ficou no degredo político para não chacoalhar a poeira do mensalão em 2010, quando Lula tentaria manter o PT no Planalto.

Agora é a hora ideal. Neste ano não há eleição. Lula já elegeu Dilma Rousseff. A presidente está com popularidade em alta. O PT tomará algumas bordoadas no noticiário durante um período pela falta de sem-cerimônia. Mas passa.

A decisão sobre a refiliação de Delúbio Soares deve sair no sábado. Melhor dia impossível, pois a repercussão será durante a safra de partidas finais dos campeonatos regionais de futebol pelo país.

O ex-tesoureiro será premiado pelo seu silêncio. A "omertà" triunfou. Como Delúbio sempre operou nas sombras, será o retorno de quem nunca havia partido. Para o PT, é a hora da estrela. Emblemática. Quando o assunto é ética e moral, a sigla terá dado todos os passos necessários para se igualar aos partidos que um dia tanto execrou.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Diferentes papéis para velhos atores:: Raquel Ulhôa

Dilma Rousseff estava na China quando Luiz Inácio Lula da Silva e Fernando Henrique Cardoso, no Brasil, trocavam farpas pela imprensa. Eles voltaram a ocupar lugar central no debate político recentemente, à frente das discussões sobre as estratégias eleitorais de seus respectivos partidos, PT e PSDB.

Lula assumiu o comando das discussões sobre alianças do PT para 2012 pouco mais de três meses após deixar a Presidência da República. FHC, reabilitado por um PSDB em crise, escreveu artigo no qual recomendou à oposição priorizar a nova classe média em vez de disputar os mais pobres com o PT. Lula criticou, FHC reagiu e até levantou a hipótese de uma terceira disputa eleitoral entre eles.

A intensa atividade partidária dos ex-presidentes é criticada por analistas políticos. O Brasil vive situação inédita. Assim como FHC e Lula, os outros três ex-presidentes vivos - José Sarney (PMDB), Itamar Franco (PPS) e Fernando Collor (PTB) -, estão atuantes e ocupam papéis destacados no Senado, com ou sem influência política.

"Um ex-presidente deveria se recolher e criar o seu memorial. É o ponto máximo da carreira política, não deveria ser banalizado", afirma o historiador Marco Antonio Villa, da Universidade Federal de São Carlos. Para ele, o que explica a ação tão efetiva dos ex-presidentes é a falta de novas lideranças e ideias originais no país.

Dilma tem que dividir holofotes com antecessores

Presidente da República de 1985 a 90, Sarney preside o Senado pela terceira vez. Após desgaste sofrido na gestão passada no comando da Casa, neste mandato ele tenta patrocinar uma reforma política e mudar a tramitação de medidas provisórias. Mais recentemente, defendeu novo referendo sobre a comercialização de armas.

Collor, que assumiu a presidência em 1990 e renunciou em 92, após abertura de processo de impeachment, foi eleito senador em 2006, após derrota em 2002 na eleição para governador de Alagoas. No Senado, preside a prestigiada Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional (CRE) e usa o cargo para se posicionar sobre fatos como a crise no Egito e na Líbia e a nota da OEA pela suspensão das obras da hidrelétrica de Belo Monte.

Sucessor de Collor no Palácio do Planalto, Itamar Franco, após deixar a Presidência da República em 94, foi eleito governador de Minas Gerais em 1998. Ficou sem mandato eletivo até conquistar o Senado em 2010. Único senador do PPS, Itamar tem sido atuante na oposição, além de contestar a falta de espaço dos partidos pequenos.

"É a fase áurea, mais retumbante dos ex-presidentes que vi até hoje. Faço análise política há 30 anos e nunca vi um ciclo tão intensamente participativo. Estamos vivendo uma fase de ressurreição de ex-presidentes", diz o jornalista e consultor político Gaudêncio Torquato. Para ele, os ex-presidentes deveriam ter comportamento "menos ostensivo".

Luciano Dias e Marco Villa não defendem que os ex-presidentes vistam o pijama. Mas acham que, após chegar ao ápice da carreira política, deveriam se preservar, para desempenhar funções de "natureza mais elevada, humanitária ou de coordenação política". Para Dias, a sucessão de eleições realizadas no Brasil - o que ele chama de sistema político hipereleitoral - leva ex-presidentes a se envolverem em diferentes disputas, e, por falta de tempo, dificulta a formação de novas lideranças.

"Faltam espírito republicano, de pensar com o cérebro e não com o fígado ou o bolso. Infelizmente, a democracia brasileira ainda não chegou ao estágio de termos ex-presidentes como uma espécie de reserva moral", afirma Villa.

O fato de ex-ocupantes do Planalto atuarem na política "sem travas ou freios" pode não ser a melhor postura ética, mas faz parte da cultura política brasileira, segundo Otaciano Nogueira, professor aposentado de ciência política na Universidade de Brasília (UNB). Para ele, um ex-presidente tem direito de dar opinião como qualquer cidadão, mas espera-se dele "um pouco mais de serenidade, que não fale bobagem e não se intrometa muito no governo".

A forte presença dos ex-presidentes no cenário político revela falta de novas lideranças e ideias originais no país. Lula e FHC são os maiores ícones do PT e do PSDB. Com o vazio das cúpulas partidárias, os ex-presidentes assumem o centro da discussão política.

A desigualdade social no Brasil e a pouca tradição democrática do país são destacadas por Marcos Nobre, professor de filosofia da Unicamp, como explicação para que a produção de quadros políticos de alto nível esteja ainda "engatinhando". Por isso, diz ele, acadêmicos e líderes sindicais viram presidentes e continuam a ser importantes após deixarem o cargo.

"Não é fácil encontrar quadros capazes de fazer análise política, dar direção ideológica, comunicar com o conjunto da população. Se o país melhorar (em todos os sentidos, inclusive na sua cultura política democrática), ex-presidentes poderão talvez ser apenas ex-presidentes", afirma Nobre.

Dilma tem apoio de três dos cinco ex-presidentes. Mesmo assim, dividir os holofotes pode incomodar, como observa o cientista político Luciano Dias, da CAC Consultoria. Para ele, a "sagacidade" e a "sobrevivência" do presidencialismo americano podem ser atribuídos ao fato de o presidente ser o "centro incontestável" da vida política.

"O efeito [da exposição dos ex-presidentes no centro do debate político] é a banalização do cargo, porque o presidente de plantão começa a ter concorrentes que também foram presidentes. Diminui a visibilidade, porque ele não é mais o centro do sistema político. Dilma já tem o problema de ser cria do Lula. E, além de ser cria do Lula, ela ainda tem que lidar com o fato de que Lula segue ativo na vida partidária."

FONTE: VALOR ECONÔMICO

A Miséria da “Oposição” no Brasil Da Falta de um Projeto de Poder à Irrelevância Política?:: Paulo Roberto de Almeida

O cenário político brasileiro: A deterioração democrática

Um observador medianamente informado sobre a cena política brasileira da última década seria capaz de reconhecer a conjuntura histórica de transformação que ocorre nas forças dominantes no sistema político. Trata-se de uma evolução gradual, que um analista que trabalhe com as categorias “gramscianas” provavelmente consideraria tratar-se da emergência de um novo “bloco dominante”, tendente à hegemonia política e social. Essas novas forças estão identificadas com o PT e os partidos e movimentos a ele associados, que passaram de uma longa trajetória (1980–2002) de oposição ao sistema de poder anteriormente dominante, e que mantém, desde 2003, sua bem-sucedida consolidação majoritária. Os recursos – políticos, financeiros, humanos – para essa ascensão vieram em primeiro lugar dos sindicatos e dos movimentos sociais vinculados ao partido hegemônico nesse bloco e, depois de 2003, do próprio Estado e de uma miríade de entidades dominadas ou influenciadas por ele (empresas estatais, fundos de pensão, empresários “amigos” e os próprios militantes encastelados numa infinidade de cargos públicos).

O mesmo observador tampouco deixaria de reconhecer a oposição atual como uma oposição “miserável”, ou seja, incapaz de assumir as responsabilidades de sua condição. Com efeito, ele não teria dificuldades em constatar a gradual diluição da “oposição”, das mesmas forças que ocuparam o poder entre meados dos anos 1990 e início da década seguinte, mas que foram batidas três vezes desde então (2002, 2006 e 2010) e que arriscam serem vencidas novamente em 2014. O que surpreende no processo político brasileiro não é tanto a capacidade do governo de alinhar em torno de suas posições as forças políticas dos mais variados horizontes, sobretudo no Congresso; a surpresa é constituída, antes, pela debilidade da “oposição”, derrotada, mas ainda não destruída, e sua incapacidade de reorganizar suas tropas, de redefinir suas bandeiras de luta e de exercer sua função institucional de oferecer uma alternativa às políticas do bloco no poder.

O termo “oposição” figura, na maior parte deste ensaio, entre aspas, pois o que se apresenta hoje, fora do arco governamental, não merece, legitimamente, essa designação, seja por deficiências intrínsecas, seja por fatores objetivos vinculados ao quadro político-eleitoral do Brasil. As aspas, justamente, não se devem às derrotas, esperadas ou previsíveis, da “oposição”, mas à sua incapacidade de ser aquilo a que o processo político a relegou temporariamente: uma oposição, na plena acepção da palavra. Se, e quando, ela assumir seu papel, será eximida da presença das aspas.

Se o mesmo observador, especulando por antecipação, fosse convidado a traçar um prognóstico sobre o futuro do sistema político brasileiro e se, no mesmo movimento, ele se dedicasse a divagar sobre a trajetória provável da “oposição” nos anos à frente, talvez não hesitasse muito em prever um destino melancólico, quando não trágico, para as forças que passam por oposição ao governo do PT. Estaria ela, de fato, condenada a desaparecer do cenário político, como força alternativa viável ao atual bloco hegemônico? Teriam os supremos estrategistas petistas – muitos mais por instinto do que por estratégias bem calculadas – conseguido realizar aquilo que Gramsci pregou no cárcere mussoliniano, sem que ele ou o partido que recuperou sua herança intelectual jamais tivesse conseguido materializar na prática? Estaríamos em face de um “bloco histórico” destinado a manter hegemonia sobre o sistema político pelo futuro previsível? Se isso ocorrer, seria o mais próximo que o Brasil já chegou daquilo que muitos representantes desse bloco chamam de “pensamento único”, embora eles mesmos apliquem o termo a uma inexistente ou rarefeita tribo de “neoliberais”.

Este texto não aspira responder a todas as questões relevantes para o futuro da democracia no Brasil. Não é nosso objetivo analisar todos os componentes de um sistema político relativamente complexo em suas diferentes vertentes organizacionais e forças atuantes, mas relativamente simples quanto às linhas principais de seu ordenamento. De um lado, temos o poder econômico incontrastável de quem detém o poder – e pode, assim, “comprar”, literalmente, os apoios de que necessita para se perpetuar no poder; de outro, forças dispersas e desorganizadas que sequer se entendem sobre um diagnóstico da situação, para planejar um contra-ataque que estaria na lógica de todos os sistemas políticos democráticos: a alternância no comando do Estado. Uma constatação de ordem geral não pode, contudo, deixar de ser feita inicialmente: o sistema democrático brasileiro, que já era de baixa qualidade antes de 2003, tornou-se ainda mais deplorável no plano de seu funcionamento e no de sua responsabilidade para com os eleitores, uma vez que o bloco petista se encarregou de deteriorar ainda mais a qualidade da democracia brasileira, realizando um amálgama de todas as forças políticas oportunistas, fisiológicas e rentistas que sempre se aproximaram do centro do poder, qualquer poder.

Mas o presente texto não pretende analisar o cenário político brasileiro como um todo; trata apenas da trajetória recente da atual¬ “oposição” ao governo do PT, supostamente empenhada, desde 2003, em criar as condições para reconquistar seu eleitorado e se configurar como alternativa viável de governo, no seguimento de uma hipotética vitória eleitoral em 2014. Estabelece primeiro um diagnóstico da situação política na presente conjuntura, para examinar em seguida as tarefas da oposição num sistema político democrático. Passa, então, a analisar as principais deficiências da “oposição” brasileira, para depois formular uma série de considerações sobre uma possível estratégia de reconquista do poder pela “oposição”, visando convertê-la em oposição, simplesmente, credível e com chances de chegar ao poder. O texto conclui afirmando que o eventual sucesso de qualquer estratégia de ação da atual “oposição” depende, em grande medida, de lideranças esclarecidas, o que não parece ser o caso, atualmente, com o simulacro de oposição existente.

Outra constatação inicial, que o mesmo observador político referido ao início deste ensaio poderia fazer é que essa “oposição” presumida deixou ao relento, de fato órfão, metade do eleitorado brasileiro, a julgar pelas evidências da mais recente campanha presidencial, ao faltar com suas responsabilidades de verdadeira oposição e ao não oferecer respostas compatíveis com as demandas desses eleitores. Mas essa constatação é um desdobramento lógico da análise que agora passa ser feita.

O diagnóstico da situação política

É evidente que o atual bloco no poder – dominado majoritariamente pelo PT – conquistou legitimamente sua hegemonia política ao longo dos três últimos embates eleitorais. Ele o fez com base em hábil propaganda política, com extenso recurso à manipulação das comunicações, mas também com o apoio de uma boa organização partidária (e corporativa), ainda que recorrendo diligentemente à propaganda enganosa, eventualmente a fraudes processuais (quando não a crimes eleitorais, apenas parcialmente sancionados pela justiça do mesmo nome). Essencialmente, porém, a razão maior do sucesso foi, de forma muito explícita, o carisma político-eleitoral de sua principal liderança e figura de grande relevo no cenário político. É também evidente que essa mesma personalidade e o seu partido domesticado – mesmo se fracionado internamente – pretendem preservar a atual hegemonia pelo futuro previsível, com base nos mesmos elementos políticos, aplicando de maneira diligente as mesmas receitas que os habilitaram a dirigir o país nos últimos oito anos.

Ainda mais evidente, e visível, nesse perío¬do, foi o desaparecimento gradual e a vir¬tual inoperância daquilo que se poderia chamar, com extrema generosidade, de “oposição”; na verdade, um conglomerado de tênues lideranças políticas, fragmentado em projetos pessoais ou regionais, e totalmente incapaz de oferecer alternativas credíveis ao eleitorado que não comunga das mesmas concepções de política, de economia e de sociedade do bloco no poder. Nunca se percebeu, desde 2003, um discurso coerente da “oposição”, alternativo e em oposição ao do bloco no poder. Este tampouco tinha um discurso coerente, mas soube implementar medidas de clara receptividade popular, sobretudo nas áreas sociais, com um enorme reforço de propaganda nas supostas virtudes do governo e apoiado no evidente carisma do seu líder político. Com base em virtudes próprias e nesse grande empenho publicitário, o líder em questão praticamente deixou a condição de carisma para firmar-se como novo mito do cenário político brasileiro, provando, mais uma vez, que mentiras bem articuladas podem, sim, criar fatos políticos dotados de boa impregnação popular.

Caso a evolução dos próximos anos confirme esse mesmo cenário, pode-se ter o afastamento da “oposição” – ou o que passa por ela – do governo durante mais de duas décadas, frustrando possivelmente metade do eleitorado brasileiro – das regiões mais desenvolvidas e majoritariamente de estratos mais esclarecidos – que não se reconhece no, e até recusa o, projeto de poder do bloco petista atualmente hegemônico. A percepção que emerge da atual situação brasileira é a de que a maior parte da população – embora não suas correntes mais esclarecidas – partilha das concepções econômicas, políticas e culturais do atual bloco no poder, que demonstrou ter praticado um “gramscismo” adaptado às condições de educação política do Brasil, configurando um cenário político que apresenta desafios para a consolidação de um sistema democrático no país, na medida em que as práticas políticas mobilizadas por esse bloco representam de fato um atraso relativo do ponto de vista da ética cidadã.

Não é surpreendente que o governo mantenha a capacidade de iniciativa e a ofensiva política – por todos os meios ao seu alcance – ou que até procure dominar – igualmente por todos os meios disponíveis, inclusive alguns pouco recomendáveis – o poder legislativo, colocado como nunca antes – salvo nos períodos ditatoriais – em situação de subordinação e de dependência em relação às verbas e diretivas do Executivo. Não se pode, tampouco, esquecer os movimentos ditos “sociais” (a maioria na folha de pagamentos do Executivo) e suas correias de transmissão nos mais diversos setores, com destaque para o sindical (não só de trabalhadores, mas igualmente patronais), que desempenham um papel importante na estratégia “gramsciana” de ocupação de espaços. A rigor, trata-se de uma “ditadura do Executivo”, no sentido de que este passa a determinar o voto dos parlamentares e as ações do que passa por uma “sociedade civil organizada” – manipulada, seria o termo mais exato – na direção que mais interessa ao primeiro, embora à custa de nacos do orçamento e de farta distribuição de cargos e comissões nas mais diversas prebendas estatais (na verdade, em todos os entes dominados ou influenciados pela vontade daquele poder).

O que é surpreendente é a “oposição” colocar-se totalmente a reboque da agenda governamental, deixar-se pautar pela propaganda oficial e descurar completamente da construção de uma pauta própria de críticas e reivindicações independentes, em nome da sociedade e dos eleitores de oposição que ela deveria supostamente representar. O que surpreende, de fato, é essa renúncia a ser oposição, ou a forma confusa, errática e até patética com que a “oposição” se desempenhou nesses anos de “travessia do deserto”. O parlamento é, evidentemente, o ponto fulcral das articulações políticas. Mas se a oposição revelou-se totalmente ineficiente, e até irrelevante, na suposta “casa das leis”, ela era inexistente, literalmente, na esfera da própria sociedade, cujos espaços de manifestações e de expressão de opiniões – inclusive nos meios acadêmicos e da imprensa – estavam totalmente ocupados por adesistas, por militantes da causa ou por serviçais do bloco no poder.

As tarefas da oposição num sistema político democrático

Em situações democráticas “normais” – isto é, com possibilidades reais de alternância no poder entre duas, ou mais, correntes majoritárias – o grupo que perdeu as eleições em um dado país se recompõe politicamente – eventualmente mudando seus líderes – e se dedica a uma séria preparação para os novos embates eleitorais mais à frente. Nas democracias modernas, o poder costuma ser alternativamente investido por três grandes grupos políticos – geralmente um de tendência social-democrata, ou socialista, outro bloco centrista ou reformista moderado, e, não raro, também, um setor conservador – que vão sendo guindados ao comando do Estado ou dele afastados em função da conjuntura econômica e dos benefícios sociais que eles possam trazer à maioria da população: desemprego, inflação, segurança (imigração, por exemplo), ou até questões morais (corrupção, mentiras e fraudes políticas, etc.).

A primeira tarefa, quando um grupo ou partido é “empurrado” para a oposição, é a de elaborar um diagnóstico – se possível consensual – sobre as razões da derrota: os líderes se dedicam, então, a analisar os fatores principais do insucesso para daí retirar as lições que se impõem, no que pode ser um simples episódio eleitoral momentâneo. Se a derrota é, porém, recorrente, ao longo de dois ou mais embates eleitorais, ou mesmo “estrondosa”, o diagnóstico teria de ser amplo, alcançando inclusive as bases programáticas do partido (sua “carta” aos eleitores). Nos casos menos graves se deveria atuar sobre os fatores de oportunidade, de mensagem política e de apresentação de propostas ao público eleitor. Feito o diagnóstico, retiradas as lições, deve-se preparar o terreno para as novas etapas que se apresentarão inevitavelmente à oposição. Nos regimes presidencialistas, as eleições sempre têm datas marcadas; nos parlamentaristas, elas podem se apresentar a intervalos variados.

Normalmente, uma oposição organizada tem, entre seus membros mais relevantes e também no staff partidário, especialistas nas diversas políticas macroeconômicas e setoriais que devem compor a mensagem do partido para o seu eleitorado, tradicional e flutuante (pois a intenção é sempre a de conquistar maior apoio entre os eleitores). Esses especialistas devem fazer o seguimento das políticas correspondentes do bloco no poder, discutir suas implicações para o país e tentar oferecer suas propostas alternativas de políticas, que contemplem as expectativas de seu eleitorado e de franjas mais amplas da população.

Normalmente, esse trabalho é conduzido no parlamento, mas o partido também pode ter apoios extensivos na sociedade, como são aqueles vinculados a movimentos sindicais e de interesses setoriais. Na tradição inglesa, tem-se a prática do shadow cabinet, ou seja, um “ministério” alternativo que faz o acompanhamento das políticas em curso, elabora a crítica das medidas implementadas e faz um oferecimento público de suas próprias alternativas de política. Não é preciso ser britânico, contudo, para exercer o saudável hábito do gabinete-espelho, ou melhor, de um governo paralelo; basta organizar seus especialistas e colaboradores voluntários para lançar o debate com a sociedade. Mais até do que oferecer soluções prontas e completas, a oposição tem de saber questionar os fundamentos de cada medida governamental, refazendo os cálculos de custo-benefício, alertando para os trade-offs e os side-effects – eles sempre existem – e antecipando consequências indesejadas e o custo-oportunidade da “receita” oficial. Este é, aliás, o principal dever da oposição: ela deve estar sempre pronta a oferecer soluções alternativas, ainda que parciais, ao quinto ou mesmo ao terço da população eleitoral não suficientemente identificada a uma das forças políticas nacionais dominantes (eventualmente no poder). É essa fração do eleitorado inconstante em suas escolhas – e volúvel, portanto – que pode fazer pender a balança para um lado ou para o outro, em função de considerações de curto prazo ou ligadas à conjuntura econômica do momento.

Na prática, as coisas são mais complicadas, pois, mesmo nos partidos mais modernos e institucionalizados, muito depende dos líderes do momento, do carisma e da atração que estes possam exercer sobre o eleitorado, e também das disputas entre as lideranças desse partido; estas últimas sempre podem eventualmente descambar para o regionalismo ou o caciquismo, em ambos os casos com consequências nefastas para a imagem da oposição. Mais grave ainda é quando essa oposição perde o contato com a realidade e com as expectativas de seu próprio eleitorado, para não dizer da maioria da nação. Surgem, nesse caso, dissidências que vão para outros partidos ou constituem os seus próprios. A experiência brasileira é extremamente pródiga nesses tipos de evento, sendo conhecida pela anarquia partidária, pela dança de partidos por parte de políticos profissionais e pela criação de partidos de aluguel ou de fachada.

Em qualquer hipótese, qualquer governo – de esquerda, de direita ou de centro – suporta o inevitável desgaste da governança, já que políticas “antipopulares” sempre precisam ser implementadas em algum momento, seja para corrigir exageros de tipo social-democrático (distributivismo fiscalmente irresponsável, déficits orçamentários, desalinhamentos cambiais, etc.), seja na vertente oposta (percepções de que os centristas ou conservadores se ocupam mais dos ricos do que dos pobres), ou por razões diversas (problemas de segurança, desemprego, etc.). A própria dinâmica econômica e conjunturas ¬adversas impõem limites a quem exerce o poder.

Assim, quando o eleitorado decidir tentar outros caminhos, outras soluções, a oposição, qualquer que seja ela, precisa estar pronta para oferecer suas receitas e propor seus remédios. A oposição precisa ter um programa de governo. Para isso ela precisa ter um projeto de poder, ou seja, ter consciência do que, exatamente, precisa ser feito, dizer como pretende fazer, e demonstrar credibilidade no empreendimento. O eleitorado brasileiro, pelo menos parte dele, tentou encontrar outra via, pelo menos em duas oportunidades: a “oposição” o abandonou miseravelmente. Ela não tinha soluções e sequer um discurso a apresentar. É o que discutiremos agora.

A “oposição” brasileira e suas principais deficiências

Não é preciso ser um analista político de qualquer envergadura para constatar que a “oposição” brasileira – que, apenas para relembrar, vinha de oito anos, ou mais, de exercício do poder – falhou miseravelmente em sua missão oposicionista. Dizer que ela foi inepta, ineficiente, incompetente, patética, seria até ser generoso com as principais forças que foram agrupadas nessa classificação de “oposição”. Basta dizer que, simplesmente, não existiu uma oposição de verdade durante todo o governo Lula: as forças que deveriam, até precisavam, ser oposição, simplesmente se autoanularam para um exercício que é uma das tarefas mais legítimas em todos os regimes democráticos.

Em sua defesa, pode-se dizer que os petistas, seu líder em especial, foram extremamente competentes – descontando-se, claro, as mistificações criadas para tal efeito – na construção de uma versão peculiar do processo político, da própria história recente do Brasil, o que deixou as forças potencialmente oposicionistas num estado psicologicamente defensivo, até de “vergonha assumida”, por supostos erros e injustiças cometidas ao longo do chamado neoliberalismo do “tucanato”. As campanhas eleitorais de 2002, de 2006 e de 2010 foram construídas com base em deformações grosseiras das políticas conduzidas sob os governos anteriores, desde as simplificações enganosas sobre as privatizações, até as patriotadas sobre a soberania retórica e a submissão ao FMI, passando pelo monopólio da “bondade social”, como se tudo tivesse tido início em 2003. Poucas vezes, no cenário político brasileiro, a versão deformada da história, em vários aspectos até mentirosa, conseguiu tal impregnação no imaginário popular, a ponto de anular discursos e ações daquelas mesmas forças que deram início à estabilização econômica e criaram as condições para a fase de crescimento com distribuição e prosperidade.

Muito se deve, obviamente, às qualidades de “ilusionista” político do presidente popular, suas mistificações propagandistas, mas também às boas condições da economia internacional, durante a maior parte de seus dois mandatos, e a uma gestão razoavelmente responsável na frente econômica. Mas deve-se reconhecer, também, que a “oposição” se autoanulou durante todo esse tempo, jamais tendo conseguido articular um discurso coerente, sequer esclarecedor, sobre o cenário de mentiras criado pelo bloco no poder. Quais as razões desse suicídio político?

Todo e qualquer ato político é encarnado por personagens políticos, príncipes e conselheiros do príncipe, que se conjugam na missão de conduzir homens e partidos ao pináculo do poder, ao comando do Estado. Devemos então concluir que à “oposição” brasileira faltaram as virtudes e as qualidades que, segundo Maquiavel, devem estar presentes nas pessoas que pretendem deter esse comando. Não que o presidente do bloco no poder fosse um estadista, mas certamente se tratava de um “animal político” extremamente competente. Pode-se dizer, nesse sentido, que à “oposição” – ou o que passa por ela – faltaram “animais políticos” de verdade, pessoas que tivessem as virtudes ou a fortuna – para permanecer nos termos do florentino – para representar uma pequena chance de alternância na disputa de poder.

Incapacidade de se organizar

Por certo que se trata de uma incapacidade de se organizar, com bases reais na sociedade, para, a partir daí, conceber e exibir um discurso coerente, compatível com as aspirações de largos estratos sociais, sobretudo nas classes médias. Mais grave ainda: pode-se dizer que à “oposição” brasileira faltaram, sobretudo, ideias claras sobre como apresentar e “vender” seu programa, se é presumível que, de fato, ela pudesse ter algo assimilável a um programa para oferecer à metade da população – na verdade estratos cambiantes – que não aceita e nunca aceitou a propaganda política que lhe foi servida sob disfarce de “política nacional” pelo bloco no poder. Sem conseguir ver claro no cenário político, dividida pelo caciquismo de seus líderes regionais, a “oposição” não soube sequer explorar as inconsistências e mazelas do bloco no poder, tão evidentes aos olhos de estratos médios de eleitores basicamente comprometidos com a ética e a moralidade no trato da coisa pública.

Pode-se aventar a hipótese de que a qualidade dos homens públicos que se colocam numa oposição de princípio ao bloco no poder – não por razões puramente instrumentais, de conquista do poder pelo poder, mas quer se acreditar que por razões de filosofia política – precisaria melhorar dramaticamente para que eles possam integrar algo suscetível de ser chamado de oposição. Talvez sejam necessárias, inclusive, novas lideranças políticas, que obviamente tenham “princípios” compatíveis com uma oposição digna desse nome. Tal “reinvenção” depende de vários fatores dentre os quais podem ser citados: a reeducação dos próprios integrantes do que é hoje uma oposição de araque; a reorganização de suas bases partidárias; a revisão do seu modo de “funcionamento” no Congresso; mudanças nos parâmetros mentais que orientam o discurso político e que comandam suas ações no plano prático; transparência aos olhos dos eleitores e, sobretudo, distinção clara com “tudo isso que está aí”, atualmente, e que visivelmente não agrada ao eleitorado instruído. Tudo leva a crer que uma nova oposição precisa ser construída, ou que a atual “oposição” deva ser praticamente reinventada, para, finalmente, começar a existir. Vejamos como.

Da travessia do deserto a... mais deserto?

A oposição a ser construída – a verdadeira, não o simulacro que hoje existe – já parte de uma formidável base real e potencial. Os dados eleitorais estão disponíveis no site do TSE, mas se podem extrair algumas conclusões adicionais a partir deles. A base total do eleitorado brasileiro situava-se, em 2010, em quase 136 milhões de pessoas, provavelmente atingindo 145 milhões em 2014. A abstenção em 2010 foi excepcional, alcançando quase trinta milhões de eleitores, aos quais se juntaram 4,6 milhões que anularam seus votos e 2,5 milhões que se abstiveram de qualquer escolha. Os “excluídos” representaram, portanto, um quarto do eleitorado; pode-se, em toda a legitimidade, imaginar que eles possam ser reduzidos à metade, em condições normais de disputa política, o que, infelizmente, não ocorreu em 2010.

Imaginamos, também, que os votos dados à “oposição”, em torno de 43 milhões, sejam realmente de oposição ao presente estado de coisas, especificamente ao “Estado do PT”. Pode-se razoavelmente conceber que uma oposição – qualquer oposição – no Brasil possa reunir metade do eleitorado, admitindo-se, inclusive, que a educação política, de um lado, e o desgaste do poder petista, do outro, contribuam para uma pequena maioria potencial, numa situação em que o mito carismático ainda estará ativo e trabalhando para consolidar o poder petista.

Num regime parlamentarista, é possível compor um governo com apenas 40% de apoio popular. Regimes presidencialistas do tipo brasileiro, ou americano, contudo, convivem com maiorias diferenciadas para a representação parlamentar e para a chefia do executivo, cargo este que exige a maioria absoluta do eleitorado. Na prática, não existe, a rigor e numa abordagem prosaicamente matemática, nenhuma garantia antecipada de vitória, ou certeza de derrota, para qualquer um dos lados, na medida em que, à diferença dos sistemas parlamentaristas, contendas eleitorais em sistemas fortemente marcados por disputas pessoais apresentam-se quase como uma loteria. Um dos fatores é que os eleitores “flutuantes”, os “indiferentes” e os “desalentados” são em número suficiente para alterar a balança para qualquer um dos lados.

Porém, números são um componente talvez objetivo, mas insuficiente para determinar resultados eleitorais. Mais importante é a predisposição do eleitorado para “acolher” uma definição clara quanto aos problemas mais angustiantes da conjuntura. A situação econômica pode até ser decisiva numa escolha eleitoral; mas as percepções sobre quem conduz a política econômica e sobre como ela é conduzida pelos responsáveis também são relevantes. Questões como emprego, segurança pessoal, disponibilidade de serviços públicos – saneamento, saúde e educação, etc. – e temas pontuais, de interesse setorial ou regional podem fazer pender a balança eleitoral. Em outros termos, não existe uma determinação prévia quanto aos embates eleitorais no modelo brasileiro – como em qualquer outro, aliás – e isso significa que as chances estão abertas às forças políticas que pretendam se apresentar como oposição.

Não importam quais sejam as alternativas de políticas oferecidas ao público eleitor por uma oposição efetiva e confiável. É preciso que esta seja precisamente isso: confiável. Ora, não é surpresa para nenhum eleitor medianamente bem informado que a classe política, de maneira geral, fez tudo o que era possível para se desqualificar moralmente, para se rebaixar no plano da ética, para deteriorar completamente a instituição parlamentar e outro tanto no plano dos executivos locais, estaduais e até o federal. Qualquer que seja a qualidade da nova mensagem política de oposição, se ela um dia existir, sua credibilidade, intrínseca e extrínseca, depende essencialmente da regeneração moral de suas lideranças, que deveriam operar aquilo que os italianos – escaldados por anos e anos de corrupção política – chamam de rientro morale, ou seja, uma profunda recomposição da ética na vida política do país.

A julgar por exemplos recentes – os aumentos para os próprios parlamentares e a questão das aposentadorias escandalosas de ex-governadores são dois casos eloquentes do completo descompasso entre as expectativas da população e a atitude das “oposições” – o Brasil não está sequer próximo de uma recomposição da classe política para fora da atual degradação das instituições de representação; nisso, a suposta “oposição” não se diferencia em nada das perversões morais alimentadas pelo próprio bloco no poder. Aparentemente, a “oposição” atual ainda não está pronta a empreender essa passagem; ela não quer enfrentar sua própria regeneração moral (talvez não possa, ou não tem coragem, provavelmente não quer).

Uma vez aceita e internalizada essa decisão pela “moralização” da oposição – que se situa no centro de toda e qualquer regeneração oposicionista, cabe lembrar – começa, então, a tarefa de organizá-la em função do objetivo da reconquista do poder. Tal tarefa implica, em primeiro lugar, uma definição clara de um programa político de escopo nacional e setorial, ou seja, uma plataforma explícita que toque em todos e em cada um dos principais problemas nacionais, sobretudo na esfera institucional, no terreno econômico e nas diversas áreas de maior impacto no plano das políticas públicas (social, cultural, regional, etc.).

Não é simples montar um programa e uma plataforma de ação com tal amplitude, o que certamente exigirá seminários e grupos de trabalho em cada uma dessas vertentes abertas à ação partidária. Mas um partido, ou uma oposição, que pretenda aspirar a ser uma real alternativa de poder não pode ser econômico nem em definições programáticas, nem em propostas político-econômicas relativamente detalhadas. Basta arregaçar as mangas e colocar o cérebro para pensar.

O que fazer? Tudo depende de lideranças esclarecidas

Vendo o panorama da planície, isto é, do ponto de vista dos cidadãos eleitores, não parece haver dúvidas de que o Brasil não conta com uma classe política à altura de suas novas responsabilidades enquanto potência emergente, desejosa de assumir um papel relevante na cena internacional. O parlamento, em especial, mas também os partidos políticos e as forças que gravitam em torno deles parecem viver num mundo à parte, feito de partilha de despojos estatais, conquista de pedaços do orçamento e disputa por pequenas prebendas em todos os poros do imenso ogro estatal.

A discussão sobre temas internacionais no parlamento, e dentro dos partidos, é rara, superficial e geralmente equivocada. Quando ela ocorre, tende a focar falsos problemas que estariam, supostamente, na origem das dificuldades enfrentadas pelo Brasil: guerra cambial de alguns, concorrência desleal de outros, capitais especulativos de um lado, arrogância imperial do outro, ameaças imaginárias sobre a soberania brasileira, em alguma parte de seu imenso território, e sobre seus fabulosos recursos naturais. Poucos desses representantes políticos, contudo, comparam o Brasil a seus equivalentes em outras partes do mundo; poucos deles se dão conta de como o Brasil avança devagar, de como ele está de fato atrasado em relação às mudanças mais dinâmicas que estão ocorrendo um pouco em todas as partes.

De fato, nenhum dos problemas atuais enfrentados pelo Brasil tem a ver com impactos negativos do ambiente externo: o mundo tem sido muito “generoso” com o Brasil, oferecendo mercados e provendo investimentos de todos os tipos para sustentar seu crescimento do período recente. Todos os problemas brasileiros, sem exceção, são made in Brazil, têm raízes puramente internas e devem receber aqui sua solução; seu equacionamento passa por um conjunto de reformas que deveria estar no centro de qualquer programa credível de proposta política geral de um movimento oposicionista que aspire legitimamente conquistar o poder para implementar, a partir daí, essas reformas.

A oposição não conseguirá chegar a ocupar esse espaço alternativo de candidata ao poder se não trabalhar intensamente no diagnóstico dos problemas brasileiros, no oferecimento de respostas sólidas aos mesmos problemas, e na sua própria organização interna, colocando-se numa posição de governo “virtual”, ou potencial, com base em propostas aceitáveis para uma maioria de brasileiros, sem ceder a populismos ou à demagogia habitual nesses meios. Ou seja, a oposição precisa estar pronta para oferecer outro futuro a todos os brasileiros que não acham que a esperteza política aliada ao oportunismo propagandístico representa o horizonte real de possibilidades para o país. Existe um imenso contingente de brasileiros que não se reconhece no estado de coisas vendido atualmente como a condição normal e possível para o Brasil. Como diriam alguns sonhadores, “outro Brasil é possível”; mas para isso outra oposição é necessária, uma que se apresente como alternativa credível.

Uma das condições essenciais para que essa oposição seja construída parece ser a existência de lideranças dotadas de credibilidade intrínseca e de capacidade política para, em primeiro lugar, reformar profundamente a “oposição” atual; num segundo momento, presidir à elaboração temática e organizacional de um “governo” alternativo ao atual bloco no poder. Não existe nenhum obstáculo “técnico”, nenhuma força externa à própria “oposição”, nenhum impedimento estrutural, ou nacional, de caráter político, para que essas tarefas sejam empreendidas.

Tudo depende da disposição de figuras políticas que pretendam aspirar ao papel de alternativa ao poder atual: a “fortuna” do quadro político pode ser favorável a uma oposição renovada, como observado nas eleições de 2010. Mas o fator mais importante ainda é – ele sempre é – constituído pelas “virtudes” dos condutores de cidadãos.

• É diplomata de carreira e professor universitário, com diversos livros sobre a política externa e as relações internacionais do Brasil

FONTE: Revista Interesse Nacional Nº 13 – Abril a Junho de 2011

O que pensa a mídia

Editoriais dos principais jornais do Brasil
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Visão parcial :: Míriam Leitão

O governo tem um diagnóstico parcial da inflação e todos, inclusive o Banco Central, estão incentivando uma perigosa interpretação de que a inflação subiu no mundo inteiro e que o Brasil não está tão mal assim. Parecem não ter entendido que o país tem uma história diferente na relação com esse problema. Não demonstram perceber o risco da reindexação.

O presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, e o ministro Guido Mantega estavam completamente afinados, mas quem mudou o discurso foi o BC para afinar o coro com a Fazenda; quando o ideal é que houvesse sim um coro afinado, mas com a Fazenda entendendo mais decisivamente a parte que lhe cabe nesse combate, que só funciona em várias frentes.

Para o ministro da Fazenda, "o Brasil não está mal na foto" quando se trata de inflação. A taxa está no teto da meta e vai superá-la em breve, mas a "foto" que ele se refere é que relativamente a outros estamos bem. Tombini tombou na mesma direção e deu números em transparências que mostravam os outros: Reino Unido, 4%; Índia, 8,8%; China, 5,4%. Vários países com metas explícitas já ultrapassaram a meta. Outros, sem metas, estão com taxas altas.

- A inflação é tema de debate internacional. Nos nossos encontros de banqueiros centrais é assunto recorrente - disse Tombini.

Essa ideia de que se os outros podem, também podemos, elide o fato de o Brasil ter convivido por 30 anos com uma superinflação indexada, e o risco é fortalecer os mecanismos de indexação ainda presentes. Tombini apresentou um mapa-múndi com todos os números e cores para confirmar o diagnóstico de que é um fato mundial. Admitiu que há "outros componentes", como uma inflação de serviços, mas que também seriam "comuns a outros países emergentes", que retomaram o crescimento mais rapidamente e por isso têm uma inflação maior.

O diagnóstico não está errado, mas é parcial. Ao ser parcial, pode errar no remédio. Houve aumento forte nos preços das commodities após a crise de 2008, puxado principalmente pelo crescimento da China e afetado por problemas climáticos. Mas não é só isso que explica a alta de preços. No Brasil, ela foi alimentada com aumento forte do gasto público, incentivo ao crédito e ao consumo que não foram suspensos no momento certo, por motivos políticos. O país já havia saído da recessão, mas o governo por imprudência ou cálculo político manteve os gastos e os incentivos fiscais em 2010.

O ministro Guido Mantega disse que o governo fez "uma redução significativa" dos gatos públicos e deu os números: as despesas aumentaram 19,3% em 2010 e vão aumentar 7,1% este ano. Trocando em miúdos, o que o ministro está admitindo é que num ano em que o país crescia fortemente, ele estava fazendo uma política pró-cíclica, elevando as despesas em quase 20%. Aumentar gasto em ano de crise, faz sentido; mas quando a economia já está acelerada, é uma forma de contratar mais inflação. Em 2011, as despesas serão maiores do que as do ano passado em outros 7,1%. "Não devemos poupar armas, devemos usar todas as armas possíveis contra a inflação, sejam monetárias ou fiscais", disse Mantega. Palavras fortes, mas que não convencem quando se comparam com os dados que eles mesmos divulgam. O governo fará superávit primário porque está arrecadando mais e não por corte de gastos. Apenas o ritmo de crescimento das despesas é que foi reduzido.

A ideia de que o atual grupo no poder é inventor de uma nova fórmula econômica atravessou o governo Lula e continua sendo proclamado pela presidente Dilma.

- Nós todos aqui presentes sabemos que o Brasil passou e passa por um novo momento na sua história. Nós mudamos, de fato, os caminhos do desenvolvimento. Quando nós assumimos, de uma forma muito especial, a convicção de que não havia contradição entre desenvolvimento econômico, distribuição de renda e inclusão social, nós mudamos os caminhos que o país tinha traçado até então - disse a presidente.

Isso fica ótimo em campanha eleitoral, mas dado que ela já nos governa há quatro meses pode restabelecer a verdade histórica. Quem dizia que havia essa contradição - e que era preciso fazer o bolo crescer para depois dividir - era o então ministro, hoje aliado do governo, Delfim Netto, nos anos 70. Não foi o governo atual, nem o de Lula, que inventou a inclusão. Basta olhar as estatísticas de redução da pobreza pós-estabilização e qualquer economista constatará que o círculo virtuoso começou na estabilização. A inflação, como se sabe, tem o poder perverso de tirar renda exatamente de quem tem menos. Por isso, não se faz distribuição de renda em meio à inflação alta, o que a torna o grande inimigo de qualquer projeto de inclusão.

Para ficar claro que o governo atual tem a mesma visão partida da história recente do Brasil, o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, começou sua explicação com uma série de dados bons que chamou de "conquistas da sociedade brasileira nos últimos dez anos." Então fomos informados de que a virtude começou há dez anos. Pena que esse tempo não inclua um dos momentos importantes do processo que foi a introdução da política de metas de inflação em 1999, na qual Tombini teve participação.

FONTE: O GLOBO

A festa e a conta: Rolf Kuntz

A economia brasileira continua em festa, e a conta, naturalmente, vai subindo. A inflação passa de 6% e pode superar o limite da banda oficial, 6,5%. Nas contas externas, o déficit em transações correntes bate recordes - US$ 5,7 bilhões em março, US$ 14,6 bilhões no primeiro trimestre e US$ 50 bilhões em 12 meses. A atividade cresce, as empresas lucram, os juros permanecem altos e a inundação de capital estrangeiro continua. Entraram US$ 42,6 bilhões entre janeiro e março, em termos líquidos. Esse dinheiro bastaria para cobrir quase o triplo do déficit em conta corrente do período. O investimento direto estrangeiro, US$ 27,3 bilhões, foi o principal componente da enxurrada financeira. Compensaria quase o dobro do buraco nas transações correntes. Esse tipo de investimento, em geral considerado o mais benéfico para a economia, deve chegar a US$ 60 bilhões em 2011, segundo o governo. Pelos prognósticos oficiais, o setor externo continuará seguro, o ajuste interno será conduzido gradualmente e no fim do próximo ano a inflação estará no centro da meta, 4,5%. Tudo se arranjará maciamente e sem dor.

Seria bom viver nesse mundo imaginado pelo ministro da Fazenda e por seus colegas de governo. Mas o gradualismo, até agora, produziu pouco ou nenhum resultado no combate à inflação. Ao contrário: os indicadores só pioraram desde o trimestre final do ano passado. A inflação tem um importante componente externo - as cotações das matérias-primas, afetadas pela quebra de safras, pela forte procura dos emergentes e pela crise no Oriente Médio. Mas quase dois terços dos preços têm subido, no mercado brasileiro, e esse dado só é explicável se for levada em conta a demanda interna muito forte. Essa mesma demanda se reflete na expansão das importações. A valorização do real sempre afetaria as contas externas, barateando os produtos estrangeiros e encarecendo os nacionais. Mas não há como atribuir o desequilíbrio na conta corrente só ao desajuste cambial, quando todos os dados apontam para um mercado interno ainda muito aquecido.

O grande influxo de capital externo produz efeitos com sinais opostos. Permite cobrir o buraco das transações correntes. Assim se acomoda parte do excesso da demanda interna. Sem esse fator a inflação seria maior. Mas essa mesma enxurrada financeira mantém o real valorizado e mina o poder de competição dos produtores nacionais, pondo em xeque a sobrevivência não só de uma ou de outra empresa, mas de segmentos industriais.

Apesar do amortecedor propiciado pelas importações e pelo influxo de capitais, a inflação permanece elevada e tende a crescer. O gradualismo adotado pelo Banco Central (BC) desde o fim do ano passado pode ser insuficiente para a contenção da alta de preços. Aumentos maiores de juros poderão, no entanto, atrair volumes maiores de dólares.

Os controles de capitais produziram efeito pouco sensível até o mês passado. Neste mês, segundo o presidente do BC, Alexandre Tombini, entradas e saídas estão empatadas - um sinal, segundo ele, da eficácia das novas barreiras adotadas pelo governo. Pode ser, mas será necessário algum tempo mais para se confirmar essa avaliação. Além disso, controles de capitais nunca produzem mais do que efeitos temporários. Essa tem sido a lição mais comum da experiência internacional.

Fatores externos, como o baixo nível de atividade no mundo rico e o excesso de dinheiro nos mercados podem explicar em parte o problema cambial do Brasil. Fatores de atração, como o crescimento econômico, a lucratividade empresarial e os juros altos também entram na conta. Mas o dado politicamente mais importante é outro: o Brasil entrou na armadilha cambial bem antes da crise, por causa da teimosia de um governo disposto a gastar demais e acostumado a deixar ao BC o custo do combate à inflação. O real já estava supervalorizado antes do agravamento da crise em setembro de 2008. Só se depreciou por um período muito curto. A deterioração da conta corrente havia começado em 2007, foi contida por pouco tempo e acelerou-se quando a demanda interna voltou a se expandir velozmente. Os números são claros.

Para tirar o País da armadilha, o governo terá de aceitar um ajuste fiscal de verdade, muito mais sério que esse alardeado pelos ministros da Fazenda e do Planejamento. Mas ninguém pode acreditar numa séria intenção de austeridade quando lê, por exemplo, o projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias. Quanto ao resultado obtido pelo governo central em março, é insuficiente para confirmar a adoção de uma nova política. Além de uma boa dose de seriedade fiscal, o governo precisará cuidar para valer das condições de competitividade, passando da conversa às ações concretas. O resto é espetáculo.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

A nova classe de partidos médios :: Vinícius Torres Freire

Agora é moda se ocupar da "crise da oposição". Mas ora se trata mais de derrocada do que de crise.

O desmanche ficou apenas evidente devido a acontecimentos como o partido de Gilberto Kassab (PSD), os estertores do DEM-PFL, a afundação da refundação do PSDB, o estupor causado pelo artigo de FHC sobre a desorientação tucana e, enfim, a turumbamba municipal do PSDB paulistano. A crise mesmo começara em 2002, 2003.

Já no primeiro mandato do governo Lula, o PFL (hoje DEM) começou a se desmanchar. Entre um terço e um quarto dos seus parlamentares aderiram aos partidos governistas. O PSDB sangrou menos, mas sangrou. A debandada parecia, ou talvez fosse mesmo, a debandada típica dos períodos de troca de governo.

Poderia ter sido esse o caso se a oposição tivesse algum projeto para 2006. No caso, o projeto poderia ser apenas do PSDB, pois o DEM-PFL jamais conseguiu nem ao menos passar-se uma maquiagem de "direita orgânica".

Mas o PSDB não tinha projeto. Esperava que o governo caísse de podre, mas não teve coragem de dar um piparote na podridão quando a oportunidade apareceu, na crise mensaleira, na segunda metade de Lula 1 (2005-2006). Tucanos e a elite que jamais tolerou Lula não tiveram coragem de enfrentar o lulismo-petismo. Ficaram com medo das ruas.

A oposição não teve o que dizer mesmo em 2006, quando o crescimento econômico era pequeno e o governo estava na lama. Renegou o governo FHC. Não tinha discurso, programa, base social. Não inventou quadros ou lideranças novos. Seus líderes mais jovens e potenciais candidatos a presidente são vácuos em termos intelectuais e políticos.

A oposição teve ainda menos o que dizer depois do "milagre do crescimento", dos anos de PIB melhorzinho (mas inédito), da inflação baixa e da "pax luliana", os variados acordos de Lula, pactos que ofereciam de benefícios sociais vários a grandes subsídios a empresas, passando pela trégua com a finança e pela reorganização da propriedade da grande empresa.

Essa foi a crise. Mas a crise acabou. O que se chamava de oposição praticamente desapareceu. O PSDB e seu possível enxerto marginal, o DEM, correm o risco de se tornarem apêndices da "oposição intestina". Isto é, o grupamento de partidos que cava favores em governos: PMDB, PSB, PDT, PSD, PTB etc.

Apesar do esvaziamento ideológico e político do PSDB, trata-se do único partido relevante que ainda tem trejeitos de oposição: não está no governo e, em tese, ao que parece, não concorda com o modo petista de governar e pensar. Mas, de tão vazio de ideias e conexões sociais e políticas, por ora resta-lhe apenas a esperança de que o governo Dilma dê com os burros n"água. Que perca o controle da inflação e/ou tenha de recorrer a um arrocho forte a fim de evitar tal descontrole. Isso ou uma crise internacional horrível.

A isso chegamos.

Curioso é que o PT também corre riscos nesse processo de cristalização de agências de fisiologia que são os partidos da "base governista". Sob Lula 1 e agora, o PT evitou receber adesistas. Terceirizou o inchaço do governismo por meio de partidos de aluguel. Agora, pode ficar muito menor que o conjunto das suas criaturas, a "nova classe de partidos médios", e que o PMDB.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Rio, mais cooptação: Maria Silvia é autoridade do Rio para 2016

A convite do prefeito Eduardo Paes, a economista Maria Silvia Bastos Marques assume no segundo semestre a direção da Autoridade Olímpica Municipal, na qual atuará como uma espécie de prefeita dos Jogos Olímpicos de 2016.

Ex-supersecretária será a "prefeita" da Rio 2016

Maria Sílvia Bastos Marques é convidada por Eduardo Paes para comandar a Autoridade Olímpica Municipal

Luiz Ernesto Magalhães e Cláudio Motta

A economista Maria Silvia Bastos Marques, que vai dirigir a Autoridade Olímpica Municipal - conforme antecipou Ancelmo Gois, em seu blog no site do GLOBO -, será uma espécie de prefeita dos Jogos Olímpicos de 2016. A definição das atribuições é do prefeito Eduardo Paes, que a convidou para o cargo. Caberá a Maria Silvia, que assumirá o posto no segundo semestre, o papel de gerenciar o andamento dos projetos da prefeitura para o evento. Ela será também a interlocutora da prefeitura junto à Autoridade Pública Olímpica (APO), que será dirigida pelo ex-presidente do Banco Central Henrique Meirellles.

- Nós estamos trazendo um grande quadro de volta à prefeitura. O prefeito tem que cuidar do dia a dia da cidade e delegar atribuições para cuidar dos Jogos - disse Paes.

Formada em Administração Pública, mestre e doutora em economia pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), Maria Silvia foi secretária de Fazenda do prefeito Cesar Maia entre janeiro de 1993 e maio de 1996. Na época, ela encontrou o Rio em dificuldades financeiras e se dedicou a recuperar a capacidade de investimento do município. O poder valeu-lhe o apelido de "supersecretária".

Logo em seguida, ela assumiu o comando da Companhia Siderúrgica Nacional, uma das maiores empresas do Brasil. Presidiu também o Instituto Brasileiro de Siderurgia. Chegou a ser incluída pela revista americana "Fortune" na lista das mulheres mais poderosas do mundo. Foi ainda diretora financeira e de Planejamento do BNDES e está, há cinco anos, à frente da Icatu Seguros, cuja presidência deixará no fim do semestre.

Economista se diz emocionada com convite

Em nota, a futura prefeita dos Jogos lembrou seu "profundo envolvimento" com a cidade. "Recebi do prefeito Eduardo Paes um convite para dirigir a Autoridade Olímpica Municipal, empresa que será a responsável pela coordenação dos diferentes aspectos relativos à realização das Olimpíadas em nossa cidade. Este é um desafio que muito me motiva, pois entendo que estamos vivendo um momento especial e temos a chance concreta de mudarmos o destino do Rio. Por isso, decidi aceitar este convite e somar meu trabalho e entusiasmo ao das equipes da prefeitura, do estado e do governo federal, que estarão empenhadas em fazer destas Olimpíadas um grande sucesso", disse a ex-secretária de Fazenda.

No texto, Maria Silvia explica ainda que será substituída por Kati Almeida Braga, presidente do Conselho de Administração da Icatu Seguros. Mesmo fora da presidência, a economista não deixará a empresa, pois foi convidada para integrar o Conselho de Administração.

FONTE: O GLOBO

Frase de Gabeira


"O problema aqui no Rio é o Eduardo Paes. Ele está querendo sair candidato à reeleição sem oposição. Está tentando cooptar todo mundo. Não é só o PV ou o PPS, também está atrás do Índio da Costa, do PSD. O Paes quer tudo"