quarta-feira, 9 de março de 2011

Reflexão do dia – Roberto Freire

Trágico atestado da incúria do governo Lula/Dilma. Com mais 37 vítimas, mortes em estradas federais chegam a 166. [...] além das causas humanas, temos estradas federais em péssimas condições de manutenção e falta crônica de investimentos. Em 8 anos não fizeram nada com as estradas e os pedágios foram reajustados bem acima da inflação.

Roberto Freire, Twitter, 8 de março de 2011.

Fim do carnaval:: Míriam Leitão

Aumentou muito o risco econômico nas últimas semanas. A eclosão dos conflitos nos países do Norte da África e do Golfo elevaram o preço do petróleo e o risco do imprevisto. Na Europa, há o perigo de que comece uma onda de reestruturação das dívidas dos governos. No Brasil, os analistas estão revendo para baixo a previsão de crescimento e para cima, a de inflação.

Sei que isso não é lá notícia para se dar numa quarta-feira de cinzas, quando os foliões começam a guardar as fantasias, e os que escolheram descansar no carnaval têm que fazer um certo esforço para voltar ao cotidiano de trabalho, mas o fato é este. Tudo ficou um pouco pior nas últimas semanas.

No Brasil, o cenário econômico continua sendo bom, mas não tão bom quanto parecia ser, quando se dizia que a queda da taxa de crescimento era apenas um efeito estatístico de base de comparação. Os dados são contraditórios, como se viu na semana passada, com a forte venda de carros de fevereiro, ao mesmo tempo em que outros setores da indústria já sentem a desaceleração.


A encrenca está de novo nos países produtores de petróleo. A situação piorou tanto com os eventos na Líbia, pela reação ensandecida de Muamar Kadafi, que, visto de hoje, Hosni Mubarak parece um estadista. A teimosia do ex-governante egípcio e até a sua insensata reação de mandar camelos e cavalos para a Praça Tahrir parecem suaves perto da decisão de Kadafi de precipitar a guerra civil e mandar bombardear a própria população.

Os movimentos de revolta se espalham por vários países produtores de petróleo e, se isso estimula a se sonhar com mais liberdade na África, mundo árabe e Irã, por outro lado, o fato imediato é que aumentou o risco da falta de suprimento e de alta dos combustíveis. Como se vê nos EUA, mesmo não sendo importante comprador de petróleo líbio, e mesmo a Líbia não sendo um importante produtor mundial, a gasolina já está subindo na bomba.

Aqui, o preço fica estável qualquer que seja a cotação internacional porque há uma empresa só fornecedora, produtora, importadora. A Petrobras não tem a menor transparência sobre seu sistema de formação de preços. Nos últimos anos, tem seguido orientações políticas de não mexer nos preços quando o petróleo cai no mercado internacional, e assim formar um colchão amortecedor para não subir quando a cotação sobe lá fora. Isso traz a vantagem extra para ela de eternizar a atual situação de monopólio, porque ninguém quer produzir ou importar petróleo em país dominado por grupo tão forte. No máximo, as empresas aceitam se associar à Petrobras.

Mas no longo prazo esse sistema é insustentável. As previsões feitas numa reunião de presidentes de grandes empresas da área do petróleo na semana passada em Houston, no Texas, são de que a demanda vai crescer mais de um milhão de barris/dia, por causa do crescimento dos países em desenvolvimento. Outro fato de aumento da demanda é o transporte. O mundo vai dobrar o número de carros de um bilhão para dois bilhões em 2050. A longo prazo, o aviso é para reduzir a dependência do petróleo; a curto prazo, o alerta é para o risco das consequências da desestabilização geopolítica em países produtores.

De imediato, o que se tem no painel é que a incerteza no mundo dos produtores de petróleo leve de volta à recessão as economias da Europa e dos EUA. O canal direto de contaminação é o aumento do preço dos combustíveis.

Na política, o risco é de que a primavera do Norte da África e do Golfo se perca pela violência dos governantes e ambiguidades dos países mais importantes do Ocidente. O Egito foi esquecido porque todos os olhos foram para a Líbia e porque se considerou que uma vez sem Mubarak o problema estava resolvido. O país ainda vive forte crise econômica, agravada pela paralisia durante o mês do protesto e as manifestações continuam pedindo mais e mais mudanças. Permanecem os protestos na Tunísia, Irã, Iêmen, Omã, Bahrein, Kuwait, Iraque. Por mais sólida que pareça a monarquia ditatorial da Arábia Saudita, até lá há protestos. Não são todos eventos políticos da mesma natureza, alguns movimentos são de extraordinária complexidade.

Não há saída boa para a Líbia. Uma intervenção internacional só acirrará ainda mais a divisão interna. O risco é de provocar uma onda nacionalista que se voltará contra os insurgentes, que seriam acusados de terem chamado intervenção estrangeira. A única esperança é a renúncia de Kadafi para começar a reconciliação do país. É torcer.

É neste mundo de riscos, mudança geopolítica, conflitos que o Brasil terá que reduzir o ritmo de crescimento, elevar os juros, conter gastos públicos e tomar medidas de prudência para conter a euforia de consumo que se formou no ano passado pelos excessos de gastos e a expansão descontrolada do crédito. Mas baixar a bola é o melhor a fazer agora até que se entenda melhor a evolução de todos esses acontecimentos que juntos tornaram o ano de 2011 mais complexo do que parecia à primeira vista.

O carnaval acabou. Nos últimos tempos o Brasil viu a folia extrapolar: ela começa bem antes do sábado e vai até bem depois da quarta-feira de cinzas. Na economia, não se pode ampliar o calendário da folia. Mesmo vivendo bom momento, e com um crescimento voltado para o mercado interno, a instabilidade internacional afeta o Brasil.

FONTE: O GLOBO

O voto distrital e o senador biônico:: Rosângela Bittar

Tal qual a reforma tributária, não há um só especialista em Congresso que aposte na reforma política para este ano, apesar do barulho com que foram formadas duas enormes comissões especiais para tratar do assunto no Senado e na Câmara. Não teria chance agora como não teve no passado e não terá no futuro. Os arranjos em vigor favorecem os encarregados de alterá-los.

O debate começa fazendo o arrastão, desde já, a título de modernização, de algumas anomalias novas, como a criação do "distritão" (os mais votados são eleitos, eliminando-se a distribuição das vagas pelo quociente eleitoral) proposto por ninguém menos que o vice-presidente da República e ex-presidente do PMDB e da Câmara, Michel Temer. Não por isso, certamente, o "distritão" só favorece o seu partido e está longe de resolver um dos principais problemas do sistema político, o da representatividade.

Os parlamentares ainda não se deram ao trabalho de dizer o que querem realmente da reforma. As teses vão sendo jogadas para o alto mas não se percebe onde e se querem chegar a algum lugar: modernizar a política? Aproximar representante e representado? Fortalecer as instituições ou abalá-las de vez?

Em matéria de questões básicas que devem merecer atenção nos debates o mais objetivo projeto é o do ex-presidente da República, o senador Itamar Franco. Ele, que vem apresentando um notável início de mandato, defende o fim da reeleição, a candidatura avulsa (um mecanismo que assenta-lhe, e também à ex-senadora Marina Silva, como uma luva), e o voto facultativo, para apontar apenas três de suas propostas mais afinadas com a opinião pública. "Quando está de terno, o sujeito é governante, se tira o paletó, é candidato, mas a caneta continua no bolso", tem dito o senador para condenar a reeleição. A reeleição, para ele, torna a disputa desequilibrada, injusta.

A possibilidade de haver candidatura avulsa, segundo Itamar, tem também a vantagem de superar injustiças: os partidos, no Brasil, na sua opinião, são dominados por grupos, que vetam nomes "por simples antipatia". Itamar, nas duas vezes em que saiu do PMDB (foi para o PL e depois PPS) a razão foi por lhe negado a legenda para disputar. Esta é uma das principais razões da migração partidária. Além disso, diz, a candidatura avulsa favorece o surgimento de novos nomes que não se sujeitam à ditadura partidária, resultando em uma boa renovação na política. Os partidos, no Brasil, são, na opinião do senador, estruturas viciadas, em que três ou quatro dirigentes mandam. "Se eles não vão com a sua cara"... Quanto ao voto obrigatório, acredita o senador que a sociedade está bastante madura para decidir.

Um dos políticos mais dedicados ao tema da reforma política, hoje, está sem mandato. É o ex-deputado Arnaldo Madeira (PSDB-SP) que, fora do Parlamento desde fevereiro deste ano, dedica-se a fazer uma mobilização em torno do voto distrital (cada distrito em que se divide o país elege um representante). Pessoalmente, Madeira defende o voto distrital puro, mas concorda que o distrital misto (que combina o distrital e o atual modelo), tem mais apoio no Parlamento.

Madeira não vê obstáculo, por exemplo, para as propostas de candidatura avulsa e voto facultativo. "O voto obrigatório, na América Latina, é exceção no mundo, voto é direito e não dever". A candidatura avulsa, também, não teria problema em apoiar. O ex-deputado diverge radicalmente, porém, da proposta do fim da reeleição.

É um retrocesso acabar com a reeleição, assinala. "Estamos apenas na quarta ou quinta reeleição, os resultados são bons, há pesquisas mostrando que os prefeitos são muito mais responsáveis no primeiro mandato para não criar uma bomba para eles próprios". Na argumentação de Madeira, a reeleição é quase automática. "O sujeito é eleito, na verdade, para 8 anos, com um referendo no meio para saber se deve continuar ou não. Isso dá estabilidade à administração".

Madeira desmonta o argumento de que o uso da máquina anula os benefícios da reeleição: "Dizer isso é ignorar o que Lula fez na última campanha. Ele não usou tanto a máquina para ele, na reeleição, quanto usou para Dilma. O sujeito tem mais cara de pau e segurança em cometer abusos para eleger seu preferido do que para si próprio. É um argumento de quem ignora também como Orestes Quércia elegeu Fleury e como Paulo Maluf elegeu o Pita.

Ampliando sua análise para além dos pontos destacados na proposta Itamar Franco, Madeira avalia que os debates carecem de um foco, não atingem o problema central do sistema político brasileiro hoje: "Temos eleição para deputado estadual, federal e vereador, mas não temos representação. A população não se sente representada, e só o distrito resolve".

Arnaldo Madeira está na liderança de um movimento a favor do voto distrital. Tem feito reuniões, recebido adesões. De início, havia pensado em uma Ong, mas desistiu de formalizar juridicamente a iniciativa, talvez, mais à frente, faça algo mais articulado pela Internet. "Temos eleição direta para tudo, tempo de televisão, financiamento público, privado, são questões mais ou menos equacionadas. O problema que não está resolvido é como aproximar o representante do representado".

Há, ainda, para Madeira, uma segunda questão inaceitável no sistema atual: o senador biônico, "mais biônico hoje do que na época do autoritarismo, quando se examinava o currículo do indicado na Assembleia". O ex-deputado está falando do suplente de senador - o financiador da campanha, a mulher, o filho, o irmão do eleito - que assume o mandato e fica anos na função sem ter recebido um voto.

O cargo de senador é o mais importante do sistema, na opinião de Madeira. "Se quer ser ministro, secretário de Estado, renuncie ao mandato, como Hillary Clinton fez nos Estados Unidos. Aqui, o suplente assume, um senador biônico que, como esse de Brasília, o Gim Argelo, suplente de Joaquim Roriz, ganhou sete anos e meio de mandato sem ter recebido um voto.

Se não der foco à reforma política, o Parlamento estará trabalhando para deixar tudo como está, diz Madeira. À semelhança das mudanças feitas, pelo casuísmo ou pela Justiça, todos os últimos anos.

Rosângela Bittar é chefe da Redação, em Brasília.

FONTE: VALOR ECONÔMICO

A banalização do mal:: Fernando Rodrigues

O governador do Rio Grande do Sul e um dos principais formuladores do PT, Tarso Genro, reclamou ontem dos mensageiros. Num artigo na Folha, refletiu sobre o pouco prestígio dos políticos:

"É visível que existe, em grande parte da mídia, também uma campanha contra a política e os políticos, o que, no fundo, é, independentemente do objetivo de alguns jornalistas, também uma campanha contra a democracia".

Tarso escolheu um momento ruim para redigir seu texto. No fim de semana, tornou-se público um vídeo no qual a deputada federal Jaqueline Roriz (PMN-DF) aparece recebendo um maço de dinheiro das mãos do delator do mensalão do DEM, Durval Barbosa. A cena não é inédita na política, embora continue a ser chocante.

É fascinante que esse vídeo tenha nascido no mesmo covil de outros conhecidos há mais de um ano. Mas só surgiu agora, quando Jaqueline Roriz já está eleita.

Deputados mudaram as regras de decoro não faz muito tempo. Ninguém pode ser cassado por crimes cometidos antes da eleição. Eis aí a sutileza: matou alguém, assaltou ou recebeu dinheiro sujo antes da eleição? Sem problemas.

Por fim, o corregedor da Câmara, Eduardo da Fonte (PP-PE), está em viagem de férias no exterior. Volta dia 13. A prática de "emendar um feriado" é levada ao paroxismo no Congresso. Até lá, Fonte acompanhará o episódio. Nada mais.

Nesses escândalos políticos em Brasília, o roteiro é sempre igual. A pressa é inimiga da prescrição. Tudo é acomodado para que o tempo passe, nada seja apurado de fato e ninguém acabe punido. Quando se trata de um político do baixo clero, como é o caso de Jaqueline Roriz, a operação é facilitada.

Diferentemente do que afirma Tarso Genro, quem faz "campanha contra a democracia" não é a mídia, mas os políticos, protagonistas desse enredo cujo objetivo tem sido apenas a banalização do mal.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

60 dias duros:: Celso Ming

Completados os primeiros 60 dias, o governo Dilma enfrenta uma confluência de problemas na economia com que não contava e que complicam a administração.

O mais grave deles é a inflação acentuada agora pela alta dos preços do petróleo e das commodities agrícolas. O governo Lula havia corrido o risco calculado de enfrentar uma elevação generalizada de preços ao permitir o excessivo aquecimento da economia. A ideia era expandir o emprego e a renda de maneira a lubrificar os trâmites eleitorais da candidata oficial. O diagnóstico do Banco Central era o de que a indústria já vinha operando a fogo baixo desde abril de 2010 e que, por isso, os juros básicos (Selic) podiam continuar estancados por mais tempo nos 10,75% ao ano. E o próprio governo entendeu que podia expandir impunemente as despesas públicas porque o baixo desempenho da indústria compensaria eventuais excessos fiscais.

Um pouco tarde, tanto o Banco Central como o próprio governo entenderam que o aquecimento foi longe demais. E foi o que puxou a inflação para acima dos 6% ao ano, como se viu em fevereiro.

Agora, apesar da torcida em contrário, para segurar os preços - prioridade do governo Dilma como tantas vezes repetido -, tanto os cortes orçamentários parecem insuficientes como os juros básicos têm de subir bem mais do que o inicialmente planejado.

Os demais controles da economia trabalham insatisfatoriamente também porque é preciso amansar a inflação. O câmbio preocupa. As reservas estão a US$ 310 bilhões e, no atual ritmo de compras do Banco Central, saltarão em alguns meses para US$ 350 bilhões, sem que se reverta a tendência à valorização do real. A todo momento, o Ministério da Fazenda despacha avisos de que mobilizará seu arsenal contra o enorme afluxo de moeda estrangeira. No entanto, não pretende reduzir ainda mais as despesas públicas para abrir espaço para a queda dos juros e, assim, evitar que mais recursos entrem para tirar proveito dos juros bem mais generosos pagos pelo Tesouro do Brasil.

E não é só isso. Eventual desvalorização do real (alta da cotação do dólar), que o governo pudesse comandar, não ajudaria a conter a inflação porque encareceria o produto importado. Portanto, se algum sucesso puder obter no câmbio, será apenas o de estabilizar as cotações, e não de desvalorizar o real.

O combate à inflação paralisa o governo também na administração das demais contas externas. O ministro do Desenvolvimento, Fernando Pimentel, não para de reclamar da excessiva entrada de produtos estrangeiros, especialmente da China, que fazem concorrência desleal à indústria brasileira. Mas também aí o governo não consegue avançar porque, no momento, o contra-ataque à inflação precisa da forte concorrência do produto importado de maneira a desestimular reajustes mais agressivos de preços por parte dos produtores locais.

Sobra a vaga aposta em que, lá por julho ou agosto, a inflação estará controlada, que os juros não terão mais de subir, que as despesas públicas não terão mais de cair, que a indústria terá recuperado seu ritmo de produção, que alguma coisa mais consistente se poderá fazer para estabilizar (ou, quem sabe, reverter) a atual trajetória do câmbio, e que a política econômica poderá voltar a ser ativa. Mas, por enquanto, tudo isso não é muito mais do que uma aposta.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Mais um voo de galinha:: Carlos Lessa

Qualquer criança do interior sabe o que é voo de galinha. Curto, barulhento ao voltar para o chão. Vendo o gráfico de evolução do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro de 1980 a 2010, não consigo afastar a imagem do voo de galinha. Em 30 anos, a maior taxa de crescimento do PIB foi no primeiro ano do general Figueiredo (9,2%), colhendo iniciativas da era militar. Figueiredo encolheria a economia à mediocridade absoluta, sendo que a galinha dá um pulo nos seus anos finais, crescendo 5,4% em 1984 e 7,8% em 1985. Qualquer um desses é maior que o Pibão, como foi denominado o crescimento de 7,5% no ano de 2010.

O governo Sarney, apesar do brilho do Plano Cruzado, assistiu a uma despencada para um PIB negativo em 1988. Após a Constituição, um pequeno voo de galinha e a economia do país se contrai com a posse de Fernando Collor. Vai lá pra baixo. O período é de mediocridade absoluta, salvo em práticas de apropriação de bens públicos.

No intervalo Itamar, FHC se credenciava e, em 1994, eleito presidente, praticaria por dois mandatos um crescimento médio do PIB (2,3% ao ano), superior apenas ao do Haiti. O crescimento rastejante acompanhou-se de dois pequenos pulos da galinha. O governo Lula, cuja média foi um pouco menos medíocre - 4% ao ano -, termina com o Pibão de 7,5% de 2010... Precedido pelo mergulho de - 0,6% no ano anterior. Tudo leva a crer que assistiremos a mais um voo de galinha, pois não será sustentado o aumento do gasto público e a reposição da ideia de desenvolvimento permanece encabulada.

Quero cotejar esses 30 anos de esvoaçar cacarejante, no nível de chão de galinheiro, com médias históricas anteriores. Média de 1951/1960: 4,3% ao ano. Média do regime militar: 6% ao ano. Em termos de participação no PIB mundial, a economia brasileira caiu de 3,91% em 1980, para 2,92% em 2010 (estimativa do professor Reinaldo Gonçalves). Com seu esvoaçar precário, o Brasil somente poderá ganhar posições se alguns países europeus quebrarem.

O melhor dado de 2010 foi a pequena elevação da taxa de investimento de capital fixo. Foi uma taxa robusta de crescimento em relação a 2009, quando houve uma contração de 10,3% do investimento. Entretanto, o Brasil continua um pigmeu em relação a uma China, que pratica uma taxa de investimento de 40% do PIB, ou de uma Índia, acima de 30%. O Brasil tem uma taxa de 18,4% do PIB em 2010.

Com a inflação seguindo indexada a itens como a eletricidade, o povão é punido pelos altos preços do que o Brasil exporta, e que se refletem internamente nos alimentos e pela dificuldade de geração de novos empregos e elevações salariais. O investimento privado fica inseguro ante o anúncio de cortes de gasto público e persistência dos problemas de infraestrutura. A componente inquietante é reforçada quando se tem presente o crescimento do crédito em relação ao PIB e à visível curva ascendente da inadimplência de 2009: 5,9% para 8% em 2011.

É evidente que uma política de redução dos investimentos públicos e de elevação da taxa de juros alimentarão a taxa de inadimplência. Para as famílias endividadas, o importante é a multiplicação de empregos e uma tendência altista de salários - o oposto do que Dilma persegue. O diretor-gerente do Fundo Monetário Internacional (FMI), Dominique Strauss-Kahn advertiu que o risco da economia brasileira é o superaquecimento. Em 4 de março, a presidente Dilma disse que está muito consciente dessa questão. Suas declarações preconizando cortes de gasto público e rápida elevação da taxa Selic surgem como variação bastante conhecida de que, crescendo mais de 4%, a tendência do Brasil é inflação. Com juros hiperelevados, a tendência da empresa brasileira é ao rentismo, ou seja: ampliar aplicações financeiras e não realizar investimentos produtivos.

Enquanto o FMI aplaude a política econômica da presidente Dilma, parece haver um coro trágico limitando o crescimento brasileiro a 4% ao ano. As sugestões se acumulam. Afirmam ser o problema brasileiro a qualidade da mão de obra, ao invés do comportamento da elite dirigente globalizada, ou seja, o problema educacional restringe o desenvolvimento brasileiro. Sou professor e conheço de perto as brutais deficiências do sistema educacional brasileiro. Gosto de pensar que a tarefa da educação é a reposição de uma nova geração melhor qualificada que a geração que a formou. O bom mestre quer que o discípulo o supere. A nação exige que cada geração esteja melhor preparada para a futura civilização nacional. O investimento produtivo gera os empregos e a educação faz avançar o processo civilizatório.

O Brasil instalou em tempos de Juscelino o complexo metal mecânico e o eletroeletrônico sem qualquer estrutura de ensino profissional. O operariado brasileiro se qualifica trabalhando. É tão ávido em manter o bom emprego e nele prosperar que se autoqualifica. A qualidade do povo brasileiro é fantástica, pois sobrevive numa das economias com pior distribuição de renda do mundo e péssimo sistema educacional. Pratica, em escala espetacular, a geriatria que mantém funcionando máquinas, veículos, tratores muitos anos após as matrizes terem retirado de linha as peças de substituição.

Tratores com 30 anos de serviço e caminhões estradeiros com 17 anos em média fazem prova das dezenas de milhares de oficinas artesanais. A criatividade brasileira, principalmente nas seções de manutenção, é reconhecida pelos empresários industriais. O jovem necessita emprego e oportunidade de trabalho e isto não lhe é fornecido pela política econômica. Se o Brasil tiver cursos de alta qualificação sem gerar os empregos correspondentes, será introduzida uma nova commodity nas exportações nacionais - o próprio brasileiro.

Carlos Francisco Theodoro Machado Ribeiro de Lessa professor emérito de economia brasileira e ex-reitor da UFRJ, foi presidente do BNDES.

FONTE: VALOR ECONÔMICO

Evolução da renda no Governo Lula: Conclusões definitivas:: Reinaldo Gonçalves *

A divulgação dos dados de evolução da renda do Brasil pelo IBGE, bem como a base de dados do FMI, já permitem algumas conclusões definitivas a respeito do desempenho da economia brasileira (renda) durante o governo Lula (2003-10).

Primeira conclusão: fraco desempenho pelos padrões históricos do país

O crescimento médio anual do PIB real é de 4,5% no governo Lula. Mais especificamente, 3,5% em 2003-06 e 4,5% em 2007-10. Mesmo no segundo mandato, a taxa alcançada não supera a média secular do país (1890-2010, período republicano) (4,5%). Portanto, o desempenho do governo Lula é fraco pelos padrões históricos brasileiros. (ver Tabela 1)

Segunda conclusão: muito fraco desempenho quando comparado com outros presidentes

Desde a proclamação da república o país teve 29 presidentes (Vargas teve dois mandatos separados temporalmente). Neste conjunto, Lula ocupa a 19ª posição quanto ao crescimento da renda, ou seja, 18 outros presidentes tiveram melhor desempenho. Quando este conjunto é dividido em quatro grupos, Lula está no terceiro grupo. De outra forma, pode-se afirmar que Lula teve o 11º pior desempenho no conjunto dos mandatos presidenciais. (ver Tabela 2)

Terceira conclusão: retrocesso relativo

No período 2003-10 três indicadores merecem destaque.

O primeiro é a participação do Brasil no PIB mundial. Usando os dados de paridade de poder de compra, verifica-se que não houve alteração, A participação média do Brasil em 2001-02 manteve-se a mesma em 2009-10 (2,90%). (ver Tabela 3)

O segundo indicador é a posição relativa do Brasil no ranking da economia mundial quando se considera a taxa de variação real do PIB no período 2003-10. O Brasil ocupa a 96ª posição no painel de 181 países. Ou seja, dividindo este conjunto em quatro grupos, o Brasil está no terceiro grupo. O crescimento médio anual do PIB do país (4,0%) está abaixo da média (4,4%) e da mediana (4,2%) do painel mundial. (ver Tabela 4)

O terceiro indicador é o PIB (PPP) per capita. Este indicador de renda para o Brasil aumentou de US$ 7.457 em 2001-02 para US$ 10.894 em 2009-10. Entretanto, a posição do país no ranking mundial piorou. O país passou da 66ª posição para a 71ª posição. Ou seja, houve retrocesso relativo. (ver Tabela 5)

Quarta conclusão: país fortemente atingido pela crise global em 2009

A crise econômica de 2009 teve alcance global. O Brasil é um país marcado por forte vulnerabilidade externa estrutural. O passivo externo bruto ultrapassou US$ 1.292 bilhões em no final de 2010.No período 2003-10 houve reprimarização da economia brasileira, inclusive com significativo aumento do peso relativo das commodities nas exportações brasileiras. A maior participação do capital estrangeiro no aparelho produtivo também ocorreu no período em questão. A crescente liberalização financeira e o regime de câmbio flexível implicam maior instabilidade. O resultado é que a crise internacional atingiu fortemente o país em 2009. A queda do PIB real foi de 0,6%. No painel mundial o Brasil ocupa a 85ª posição. Dividindo este painel em quatro grupos, verifica-se que o país está no segundo grupo dos mais atingidos. Ademais, a frágil posição brasileira é evidente quando se leva em conta que a taxa média (simples) e a mediana de variação do PIB do painel é de 0,1% e 0,2% respectivamente. (ver Tabela 6)

Em síntese, durante o governo Lula a evolução da renda do Brasil caracterizou-se por:

1) fraco desempenho pelos padrões históricos do país

2) muito fraco desempenho quando comparado com outros presidentes

3) retrocesso relativo

4) país fortemente atingido pela crise global em 2009

* Reinaldo Gonçalves é economista e professor titular do Instituto de Economia da UFRJ. Artigo escrito no dia 3 março 2011. E-mail: reinaldogoncalves1@gmail.com

Confira a íntegra do artigo com as tabelas

http://www2.pps.org.br/temp/governo_lula_2003_2010_evolucao_da_renda_03_marco_2011.pdf

Petróleo, choques e faíscas:: Vinicius Torres Freire

A notícia econômica mais preocupante, talvez assustadora, no cardápio das possibilidades imediatas ainda é a de um tumulto longo na política da Arábia Saudita. Mas, enquanto se espera que a novidade catastrófica de choque do petróleo (não) venha, é conveniente lembrar de algumas histórias mais amanhecidas e menos incertas sobre o curso do crescimento mundial.

Sobre o petróleo, observe-se ainda e de vez que uma Líbia sozinha não faz um verão de gasolina cara nos EUA, cara a ponto de derrubar o consumo pessoal e as margens de empresas de modo significativo, pelo menos dizem os economistas norte-americanos mais entendidos.

A situação decerto ainda é bem séria, mas o anúncio do Kuait, de que vai colocar mais óleo nos canos, e a sugestão de um encontro dos países petroleiros (Opep) deu um tombo nos preços do barril. No mais, a revolta dos povos árabes parece, no momento, arrefecer.
Enquanto a gente torcia pelas revoluções, os problemas mais tediosos do resto do mundo continuavam seu curso. Ninguém mais lembra da crise da dívida europeia ou menos ainda acredita na seriedade dos seus efeitos, embora o tumulto de Grécia, Irlanda e companhia tenha provocado uma desaceleração na economia mundial nos dois trimestres do meio do ano passado.

Pois então, a Grécia está de novo no bico do corvo. A taxa de juros para financiar o governo grego voltou ao nível recorde, sinal objetivo de que a praça do mercado voltou a acreditar em "reestruturação" da dívida grega -isto é, em um calote organizado. Isso depois de a União Europeia ter arrumado mundos e fundos para tapar buracos nos países endividados, além de induzir seu Banco Central a sustentar ou financiar, indiretamente, a dívida grega.

Ainda na Europa, o Banco Central Europeu (BCE) avisa que os juros irão subir, talvez já em abril. Não se trata de um terremoto. O efeito disso no crescimento mundial não será, a princípio e de imediato, tão grande -a eurolândia já cresce pouco. Mas entra alguma areia na produção mundial, até porque a Europa é o grande mercado chinês.

Na China, não passa quinzena sem haver medida de controle da inflação, uma daquelas medidas confusas e "heterodoxas" que a ditadura chinesa usa para controlar crédito e preços. Mas controlar inflação implica sempre crescer menos. Na China, isso talvez signifique passar de 10% de avanço anual para 8,5%. Não é pouco, pois o grande diferencial de crescimento do mundo vem da China, da Índia e até do Brasil.

Os americanos são mais pragmáticos do que os fanáticos do BCE. Ben Bernanke, presidente do Fed, o BC americano, diz e repete que a recuperação da economia americana ainda não é forte o suficiente. Logo, nada de mexer em juros tão cedo. Mas o Partido Republicano quer dar um nó no assustado democrata Barack Obama e cortar gastos a fundo, o que pode limitar o crescimento e a ainda fraca, embora surpreendente, recuperação dos Estados Unidos.

Há inflação pelo mundo inteiro, embora quase todo mundo relute em elevar juros, em especial para evitar apreciação da moeda e fluxos de dinheirama especulativa. Mas, ainda assim, se recorre a medidas "macroprudenciais" ou heterodoxas mesmo para controlar preços.

"Hetero" ou "ortodoxas", trata-se de arrefecer as economias.

FONTE:FOLHA DE S. PAULO

Agorafobia Política :: Rudá Ricci

Acabo de ler dois livros que motivaram este artigo. O primeiro foi “O fantasma da revolução brasileira”, de Marcelo Ridenti. Gosto dos livros de Ridenti porque são honestos, objetivos, sem firulas. Lembro de um livro que li, tempos atrás, onde descrevia os autores clássicos da sociologia, relacionando-os com as práticas políticas. Um trabalho típico de educador, honesto e solidário. Neste livro que acabo de ler, Ridenti retoma, ao final, uma expressão de Giannotti para descrever a esquerda brasileira que entrou na luta armada: “permanência representativa”. Seria algo como a ilusão da perenidade da representação dos partidos e organizações de esquerda em relação aos desejos das classes trabalhadoras.

O autor vai mais além e retoma o impacto psicológico da clandestinidade, que impele à uma profunda solidão e à ida sem volta, já que a clandestinidade transforma o militante em profissional: está totalmente submetido à organização, que o sustenta, inclusive materialmente. Imagine o impacto psicológico desta prisão que aparta o militante do corpo social, da dinâmica tortuosa da vida política pública. O militante clandestino visualiza uma trajetória retilínea e o mundo lá fora dando voltas e trançando movimentos erráticos. O pior dos mundos para quem quer ser a expressão dos que estão lá fora.

O outro livro foi “O Poder do Povo”, de Yves Sintomer. O autor trabalha sobre uma tese das mais polêmicas: o sorteio como prática democrática. Retoma Aristóteles para quem as funções públicas que não requeriam experiência específica deveriam ser sorteadas, como ocorre na montagem do corpo de jurados num julgamento público. O autor descreve a experiência ateniense, de Veneza e Florença. A descrição da experiência do Grande Conselho de Veneza chega a causar vertigem no leitor: o conselheiro mais jovem saía à rua e retornava com a primeira criança que encontrasse, que retirava, por sua vez, bolas de madeira (denominadas “balote”) de uma urna. Daí eram sorteados 30 eleitos que se reduziam a nove após novo sorteio.
Esses nove eleitos elegiam, então, 40 conselheiros por maioria qualificada, que eram reduzidos a 12, por sorteio. Esta rotina se repetia por nove turnos, até a escolha final do “doge” (o comandante, o magistrado supremo de Veneza). A candidata socialista da França em 2007, Ségolène Royal, sugeriu recentemente que se criasse um júri de cidadãos sorteados para avaliarem os governos. Em 2006, Marousi (cidade próxima de Atenas) evocou a experiência do sorteio para que 131 cidadãos definissem o candidato socialista à prefeitura.

Mas, o que teria a leitura dos dois livros em comum? A noção que a democracia vai muito além da democracia partidária, onde os eleitos possuem uma grande autonomia para decidir em nome do voto. A democracia partidária parece se transformar num simulacro de espaço público (ou representação do espaço público). Trata-se mais de um arranjo privado, entre lideranças – quase sempre notáveis – de agrupamentos infrapartidários. Se representação é equivalência, onde estaria o par do líder partidário, que afinal define os candidatos que supostamente
representarão os cidadãos. Onde nos perdemos para chegar a tal vertigem democrática?

Talvez, no momento em que a sociedade se fragmentou e acelerou os processos de mudança cultural, de comunicação, fragmentou os padrões de consumo e escolha ou construiu a “sociedade reflexiva”, as estruturas formais de representação política caducaram e se aproximaram da profissionalização política não-representativa do período de clandestinidade dos anos de chumbo.
Duas situações alertam para tal descompasso. O primeiro, o fenômeno de agorafobia que acomete a Presidente Dilma Rousseff. A agorafobia é o medo do medo ou uma antecipação do possível medo de situações não controladas. Dilma parece fazer uma ponte com seu passado de clandestinidade ao se abdicar do papel de liderança midiática. Dilma não é mais uma persona, mas uma instituição, o cargo mais alto da República Presidencialista de nosso país. Como ápice de todo um sistema político, é expressão pública da moral desta estrutura política. A Presidência da República é uma investidura. revestida de uma aura cerimonial, uma distinção, uma honra que envolve o cargo oficial a partir do qual se estabelece a lógica política republicana.

Mas o que parece suceder à Dilma Rousseff é a dificuldade de se relacionar com este espaço público formal, cuja realidade não se confunde com as suas escolhas privadas, com a lógica de um escritório empresarial. Ser Presidente da República não é, necessariamente, ser como se é de fato, mas se submeter à uma lógica específica, nacional e coletiva, forjada na ética da responsabilidade política.

Dilma não parece muito à vontade em não ser o que é. Pior: não parece à vontade em assumir a investidura que o voto lhe conferiu.

Mas o pior é que o outro lado da moeda, a oposição, também parece acometida do mesmo problema psicológico. A oposição ao governo federal se enredou na “Síndrome da Tribuna Parlamentar”. Acredita piamente que o parlamento representa, de fato, a diversidade nacional.
Mas todos brasileiros, como demonstram tantas pesquisas, acreditam que o parlamento representa a si. Aliás, algo que ex-governadores, hoje parlamentares, afirmam e reafirmam. Blairo Maggi (PR-MT), Jorge Viana (PT-AC), Eduardo Braga (PMDB-AM) e tantos outros ex-governadores, hoje senadores, estranham a lentidão e a falta de “senso de praticidade” do parlamento (cf. Folha de S.Paulo, 8 de março de 2011, p. A5).

A oposição perdeu, enfim, sua capacidade de se comunicar e, enfim, se fazer representante dos cidadãos.

O que faz de nossa democracia formal um diálogo entre iguais, uma espécie de oligarquia formalizada pelo ato simbólico (ou simulacro) do voto.

A não-representação do sistema político formal brasileiro gera algo próximo da vertigem da clandestinidade. Sendo que naquele momento, a vertigem se fazia sentir porque havia a ânsia de representação dos que se encontravam marginalizados ou submetidos ao regime militar. Nos dias atuais, o ritual das eleições impede qualquer sentimento de angústia. Talvez, apenas nos meses que antecedem às eleições, mas não no ato da representação efetiva.

Se a análise está correta, Sintomer e Ségolène podem ter dado a pista, sem o saber, para nossa reforma política. Contudo, para que desse certo, o fórum de formuladores da proposta de reforma política deveria ser sorteado entre cidadãos. Afinal, haveria um vício de origem se os atuais parlamentares decidissem sobre a sua real representatividade.

Sociólogo, Doutor em Ciências Sociais, Diretor Geral do Instituto Cultiva (www.tvcultiva.com.br) e membro do Fórum Brasil do Orçamento.Autor de “Lulismo: da Era dos Movimentos Sociais á Ascensão da Nova Classe Média Brasileira” (Editora Contraponto). Blog: rudaricci.blogspot.com. E-mail: ruda@inet.com.br .

Comissão da Verdade é alvo de militares

Em documento enviado ao ministro da Defesa, Nelson Jobim, as Forças Armadas criticam a Comissão da Verdade, que pretende esclarecer crimes da ditadura militar. Produzido pelo Exército, mas com adesão de Marinha e Aeronáutica, o texto diz que a comissão vai “abrir feridas”.

Forças Armadas resistem à Comissão da Verdade

Em documento enviado a Jobim, Exército diz que projeto reabre feridas

Evandro Éboli

Apesar da decisão da presidente Dilma Rousseff de bancar como prioridade a criação da Comissão Nacional da Verdade, as Forças Armadas resistem ao projeto e elaboraram um documento com pesadas críticas à proposta. No texto, enviado mês passado ao ministro da Defesa, Nelson Jobim, os militares afirmam que a instalação da comissão "provocará tensões e sérias desavenças ao trazer fatos superados à nova discussão". Para eles, vai se abrir uma "ferida na amálgama nacional" e o que se está querendo é "promover retaliações políticas".

Elaborado pelo Comando do Exército, o documento tem a adesão da Aeronáutica e da Marinha. No texto, os militares apontam sete razões para se opor à Comissão da Verdade, prevista para ser criada num projeto de lei enviado pelo Executivo ao Congresso Nacional em 2010. Os militares contrários à comissão argumentam que o Brasil vive hoje outro momento histórico e que comissões como essas costumam ser criadas em um contexto de transição política, que não seria o caso. "O argumento da reconstrução da História parece tão somente pretender abrir ferida na amálgama nacional, o que não trará benefício, ou, pelo contrário, poderá provocar tensões e sérias desavenças ao trazer fatos superados à nova discussão".

As Forças Armadas defendem que não há mais como apurar fatos ocorridos no período da ditadura militar e que todos os envolvidos já estariam mortos. "Passaram-se quase 30 anos do fim do governo chamado militar e muitas pessoas que viveram aquele período já faleceram: testemunhas, documentos e provas praticamente perderam-se no tempo. É improvável chegar-se realmente à verdade dos fatos".

O objetivo da Comissão da Verdade é esclarecer as graves violações de direitos humanos praticadas durante o regime militar, como torturas, mortes e desaparecimentos. E ainda tentar identificar os responsáveis por esses crimes, mas sem buscar a punição deles, por causa da Lei da Anistia. Desde sua criação, a comissão tem sido alvo de polêmicas. Por causa de pressões dos militares, o governo já modificou o texto original para assegurar que a Lei da Anistia seja respeitada e atos cometidos no regime militar não deem origem a processos penais.

Mas o documento enviado a Jobim mostra que as Forças Armadas continuam refratárias até à possibilidade de identificar responsáveis por atos da ditadura. No documento, os militares reconhecem ser legítimo o direito das famílias de buscar desaparecidos, mas falam em revanchismo: "O que não cabe é valer-se de causa nobre para promover retaliações políticas".

Tema "não contribui para a paz"

Para as Forças Armadas, a criação da Comissão da Verdade não faz mais sentido, por se tratar de uma etapa da História superada, segundo os militares, principalmente se comparado a outros países do continente, "que até hoje vivem consequências negativas de períodos históricos similares". Trata-se de uma referência a Argentina, Chile e Uruguai, países que fizeram a revisão de suas ditaduras, e julgam e punem os responsáveis.

"Trata-se de assunto delicado ressuscitar discussão sobre os atos do governo militar. Não contribui para a paz nacional, considerando que o governo não foi derrubado pelas forças políticas, mas sim ensejou processo lento e gradual de transição e devolução do poder aos civis, promovendo verdadeira reconciliação nacional".

Os militares recorrem também à decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) do ano passado, que, segundo o documento enviado a Jobim, "extinguiu as pretensões de grupos desejosos de buscar punição a qualquer custo aos agentes do Estado". O STF entendeu que a Lei da Anistia encerrou com possibilidade de julgamentos de possíveis culpados.

Mas, cientes da dificuldade de barrar a criação da Comissão da Verdade, os militares se preparam para o embate no Congresso e têm prontas cinco emendas para modificar o texto original do governo. Eles querem que testemunhas e militares sejam convidados, e não convocados, como prevê o projeto do governo; que se investiguem casos de terrorismo e justiçamento praticados pela esquerda; e o fim de anonimato para quem entregar documentos de forma voluntária.

Na emenda em que pedem apuração também de casos de terrorismo e justiçamento (militantes de esquerda que matavam traidores dentro de seu grupo), os militares afirmam que, assim como a tortura e o homicídio, são crimes equiparados a hediondos e que devem receber o mesmo tratamento pela Comissão da Verdade.

O projeto do governo assegura o anonimato a testemunhas que, voluntariamente, entregarem documentos ou prestarem depoimentos. As Forças Armadas querem a identificação de todas as pessoas. "É atender ao princípio do contraditório e da ampla defesa. Denúncias anônimas poderiam surgir sem fundamento", argumentam.

Outra mudança desejada é trocar a expressão "convocar" (militares e outras testemunhas) por "convidar" - que ninguém seja obrigado a comparecer à Comissão da Verdade. "É inconstitucional dar poderes de polícia à comissão", afirmam.

Outra alteração é impedir sessões fechadas, como prevê o texto do governo em casos de resguardar a intimidade e a vida privada das pessoas. "É para garantir transparência e espírito democrático às atividades da comissão, evitando que reuniões secretas tenham por fim direcionar os trabalhos. Não há motivos que justifiquem os trabalhos secretos da comissão", defendem os militares.

As Forças Armadas pretendem incluir no texto que a comissão deve se restringir à busca de fatos históricos e "não deve ter por objetivo perseguir ou tentar incriminar pessoas".

FONTE: O GLOBO

"Distritão" artificial

Congresso reabre discussão extemporânea sobre reforma eleitoral e se apequena mais uma vez perante os outros Poderes da República

Sempre que se inicia um mandato presidencial e toma posse uma nova legislatura, ressurgem alguns debates improdutivos, como a famigerada reforma política.
Em sua atual reencarnação, o espectro materializou-se sob a forma do "distritão", entre outras propostas brotadas no vácuo do verão parlamentar. A ideia, defendida por caciques do PMDB, alteraria o modo de eleger deputados federais, o que em tese favoreceria grandes partidos.

Pelo sistema atual, o número de vagas obtidas na Câmara por um partido ou uma coligação é proporcional ao total de votos obtidos pela legenda (com base no chamado "quociente eleitoral"). Candidatos célebres, que atraem grande número de votos, ajudam a eleger nomes obscuros, mesmo numa agremiação pequena.

A alternativa em consideração transformaria todo um Estado, ou regiões inteiras, num grande distrito eleitoral. O quociente deixaria de existir, e se elegeriam ali todos os deputados mais sufragados, pela ordem de votação individual. É o sistema majoritário vigente na eleição a senador quando há duas vagas em jogo.

Há quem defenda o "distritão" por razões doutrinárias, mas elas não se acham na primeira linha de motivações de quem o propõe. Simulações indicam que o PMDB veria sua bancada inchar de 78 para 88 deputados, caso a regra estivesse em vigor na última eleição.

Nas duas últimas décadas, nada menos que 300 iniciativas do gênero emergiram e submergiram no Congresso, um bom indicador da fatuidade dessa discussão. As modificações políticas mais fundamentais foram produzidas alhures, no Poder Judiciário (Tribunal Superior Eleitoral e Supremo Tribunal Federal, no caso).

Foi assim com a fidelidade partidária. E também com a Lei da Ficha Limpa, que, embora nascida de iniciativa popular e aprovada no Congresso Nacional, teve sua aplicação no pleito de 2010 determinada pelo TSE.

Ocorre que a Ficha Limpa ainda se encontra "sub judice". O STF, agora com time completo de 11 ministros, pode desempatar a votação sobre o tema e reverter a decisão do TSE, o que implicaria desempossar alguns parlamentares e empossar outros. Uma legislatura que não tem certeza nem de sua própria composição se entrega a um debate fútil sobre como se escolheria a próxima.
É a discussão errada na hora errada. Ela apenas abrirá novas frentes para o que se tem chamado de "judicialização da política", a qual pode ter rendido alguns efeitos positivos, mas que sem dúvida é mais uma expressão do apequenamento do Legislativo diante dos outros Poderes da República.

Há matérias mais importantes do que o "distritão" para o Congresso enfrentar e decidir. A mais urgente: como pretende retomar a iniciativa legislativa hoje usurpada pelo Executivo, que governa por medidas provisórias sem a urgência nem a relevância exigidas pelo artigo 62 da Constituição.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO / EDITORIAL

Novo partido não interrompe parceria de Campos com tucanos

Aécio Neves e presidente do PSB podem estar juntos no mesmo palanque ou até dividir chapa em 2014

Marcelo de Moraes

Tucanos e socialistas não pretendem romper a parceria política informal que costuraram ao longo dos últimos anos e rendeu vitórias importantes, como nas eleições para a Prefeitura de Belo Horizonte e a de Curitiba. Muito próximos, o senador Aécio Neves (MG) e o presidente do PSB e governador de Pernambuco, Eduardo Campos, sabem que podem estar juntos no mesmo palanque - ou até numa chapa - na campanha de 2014.

O primeiro sinal explícito da manutenção da parceria deverá ocorrer na campanha pela Prefeitura de Belo Horizonte, em 2012. Fruto de uma inusitada aliança que reuniu Aécio, o petista Fernando Pimentel e o PSB, o socialista Márcio Lacerda foi eleito em 2008, tendo como vice o petista Roberto Carvalho. Informalmente, Campos e Aécio já acertaram a manutenção do acordo para reeleger Lacerda. Mas o PT desembarcará da aliança, provavelmente para bancar a candidatura de Carvalho.

A busca pela consolidação de seu projeto nacional fez o PSB garantir planos mais ambiciosos. Com seis governos sob seu controle (Pernambuco, Ceará, Paraíba, Espírito Santo, Piauí e Amapá), o partido quer ser protagonista em 2014. Como parceiro do PT, os socialistas não conseguiram espaço nem sequer para indicar o vice na chapa encabeçada por Dilma Rousseff, primazia que foi repassada ao PMDB.

Por conta disso, embora se mantenham na base governista e controlem dois ministérios (Integração Nacional e Portos), os socialistas se relacionam não apenas com os tucanos, mas já se preparam para receber de braços abertos o PDB.

A relação com o PSDB não será afetada por conta disso. Os partidos manterão parcerias regionais onde for estratégico, como é o caso de Belo Horizonte e de Curitiba, onde os tucanos podem apoiar a reeleição do prefeito Luciano Ducci (PSB). Eleito vice-prefeito, Ducci assumiu a prefeitura depois que Beto Richa concorreu e ganhou a disputa pelo governo do Paraná.

Além disso, a própria aproximação de Kassab com o PSB pode afinar a sintonia do partido com outro importante líder tucano, o ex-governador de São Paulo José Serra.

Padrinho político de Kassab, Serra passará a ter um canal aberto com o comando do PSB através da parceria que os socialistas devem firmar com o PDB.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Cientista político Jairo Nicolau diz que o “distritão” não vai vingar

Lucas de Abreu Maia

O cientista político Jairo Nicolau (foto) se diz "cético" em relação à fundação de um novo partido pelo prefeito Gilberto Kassab (DEM), que em seguida seria fundido ao PSB. Para ele, o PSB, deve tomar cuidado para "não viver o drama do PMDB e virar uma confederação de líderes regionais".

O sr. vê nas articulações do prefeito Kassab potencial para alterar o quadro partidário?

Desde a nova Lei dos Partidos Políticos, de 1995, há uma certa estabilidade dos atores. De lá para cá, apenas dois partidos foram fundados: PSOL e PRB. Hoje, criar um partido dá muito trabalho. Mas é inconteste que o DEM vive uma crise que está associada ao péssimo desempenho eleitoral que o partido teve nas eleições do ano passado - um declínio que começou em meados da última década.

Para um partido tradicionalmente governista e com bases nos grotões do País, foi mais difícil ser oposição?

Não acho que o maior problema do DEM tenha sido virar oposição, mas a ausência de bases regionais. Um partido pode suportar ficar fora do governo federal, desde que mantenha alguns Estados importantes da federação para que seus quadros sejam acolhidos. O DEM já teve lideranças importantes em Pernambuco, na Bahia, em Minas. Hoje, o partido não controla nenhum Estado importante e está "costeando o alambrado", como diria o velho Leonel Brizola.

Quais seriam as consequências de Kassab levar, como promete, uma bancada de cerca de 20 deputados para a nova sigla?

Esse novo partido será como aquele último ônibus que passa pegando todo mundo e vai deixando cada um em um canto. Se ele se consolidar, vai ser uma surpresa para mim, porque este não tem sido o caminho nos últimos anos. Agora, é claro que o PSB, vitalizado com essas migrações, passa a ter uma bancada mais forte e quase começa a rivalizar com o PT. Mas o desafio do PSB é não viver o mesmo drama do PMDB e virar uma confederação de lideranças regionais. Sem um líder nacional que se coloque eleitoralmente e apresente um projeto para 2014, o PSB pode engordar demais. O que une Kassab e Eduardo Campos? Nada.

Uma crítica que se faz ao projeto do "distritão", que acabaria com as eleições proporcionais, é que ele enfraqueceria ainda mais as legendas. O sr. concorda?

Eu tenho certeza de que o "distritão" não vai vingar, porque é uma ideia absurda e estúpida. Se você pedisse o pior sistema eleitoral para as eleições legislativas seria este. Seria o fim dos partidos. Haveria 600 mil candidatos, um concorrendo diretamente contra o outro. O "distritão" é um sistema de representação do século 19, que foi abandonado quando a representação proporcional foi inventada. Hoje, ele pode ser usado para eleger síndico. Para a minha alegria, o PT já fechou questão em favor do voto em lista fechada (em que o eleitor escolhe o partido), e não existe a possibilidade de o "distritão" prosperar sem o apoio do partido que está no poder.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Presidente recebe as centrais no Planalto

João Villaverde

A presidente Dilma Rousseff convocou as seis maiores centrais sindicais do país para uma reunião na sexta-feira pela manhã, no Palácio do Planalto. A ideia do encontro, segundo apurou o Valor, é reduzir as áreas de atritos entre o governo e as entidades, que viram a relação de apoio mútuo construída nos último anos transformar-se em críticas mútuas desde o início do ano. Dilma não estabeleceu pautas para a reunião. Os sindicalistas, no entanto, definirão entre hoje e amanhã uma agenda consensual para ser levada à Brasília.

"Todos sabemos que Dilma não é que como Lula, que gostava de reuniões abertas ao diálogo. Dilma gosta de pautas, tudo tem de ser discutido com começo, meio e fim, então não vamos chegar nessa reunião sem nada a oferecer", diz uma fonte próxima ao movimento sindical. Segundo apurou a reportagem, os sindicalistas fecharão uma pauta conjunta em torno de quatro temas, que serão discutidos com a presidente: a desoneração da folha de pagamentos, a correção da tabela do Imposto de Renda (IR), as aposentadorias que não sofrem reajuste direto do salário mínimo, e o fator previdenciário.

As centrais devem negociar com Dilma uma correção superior aos 4,5% na tabela do IR - o reajuste que deve ser levado à reunião ficará entre 5,5% e 6%. Os sindicalistas avaliam que parte da derrota sobre o valor do salário mínimo de 2011 - fechado em R$ 545, enquanto as centrais defendiam R$ 560 - pode ser revertida com um reajuste mais elevado na tabela do IR.

Quanto à desoneração da folha, as centrais vão atingir um denominador comum ainda hoje, uma vez que cada entidade defende um modelo - desde a transferência de parte da contribuição previdenciária para uma alíquota sobre o faturamento até o aumento da participação estatal na conta. Os sindicalistas devem levar à Dilma a sugestão de uma frente de trabalho junto à entidades patronais para discutir a questão.

As centrais também sugerirão à presidente uma política de valorização das aposentadorias do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) cujos benefícios não são ligados ao salário mínimo. Cerca de dois terços dos aposentados recebem um salário mínimo por mês, mas aqueles que ganham mais não contam com reajustes além da inflação.

Ao todo, participarão da reunião 12 dirigentes sindicais. Dilma solicitou que cada central enviasse dois integrantes, assim, CUT, Força Sindical, UGT, CTB, NCST e CGTB serão representadas por seus respectivos presidentes e secretários-gerais. As trocas de acusações recentes entre Artur Henrique, presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), e Paulo Pereira da Silva, o Paulinho, presidente da Força Sindical, serão "provisoriamente esquecidas", nas palavras de uma fonte próxima aos dois. Paulinho, que é deputado federal pelo PDT, também deve ignorar a pauta partidária no encontro.

A reunião será a primeira entre Dilma e as centrais, que esperam, segundo o secretário-geral de uma delas, "recuperar o ânimo perdido" com o governo. "Fomos às ruas e ocupamos espaço na mídia defendendo a Dilma nas eleições do ano passado, que depois de eleita só nos ignorou", afirma.

FONTE: VALOR ECONÔMICO

Nas estradas, o carnaval mais violento em 6 anos

Número de mortes nas rodovias até segunda-feira é de 166; em 2010, em todo o feriadão, morreram 143 pessoas

Sérgio Roxo

SÃO PAULO. Balanço parcial da Polícia Rodoviária Federal mostra que o número de mortos nas estradas do país contabilizado até a segunda-feira de carnaval já supera o total de óbitos registrado em todo o feriado nos últimos seis anos. Entre a meia-noite de sexta-feira e a de segunda, 166 pessoas morreram em acidentes nas rodovias. Em 2010, em seis dias de feriado, foram 143 mortos. O aumento já é superior a 15%. Os números finais do carnaval deste ano só serão divulgados amanhã.

A quantidade de pessoas mortas em decorrência da violência nas estradas superou inclusive o do carnaval de 2007, quando ainda não estava em vigor a proibição da venda de bebidas alcoólicas nas rodovias federais. Na ocasião, 145 perderam a vida. No ano seguinte, em 2008, o número de mortos no carnaval caiu para 128. Em 2009, houve nova queda, para 127.

Acidente em SC teve o maior número de mortos

Neste ano, o acidente com maior número de mortos ocorreu na BR-282, em Santa Catarina, na madrugada de sábado. Um ônibus de turismo que levava passageiros do Rio Grande do Sul para uma confraternização de bolão, uma espécie de boliche, colidiu com um caminhão carregado de madeira, e 27 pessoas morreram. A maioria das vítimas era de Santo Cristo (RS).

Ontem de madrugada, uma pessoa morreu em um acidente entre dois caminhões na BR-101, em Igarassu, na Região Metropolitana de Recife, em Pernambuco. Anteontem, na BR-262, em Minas Gerais, Marcos Souza Ferreira, de 46 anos, morreu depois de o Uno que dirigia bater de frente com uma caminhonete. Ainda no estado, três pessoas de uma mesma família morreram em um acidente na BR-381, em Sabará. O motorista de um carro, que seguia sentido Belo Horizonte, perdeu o controle do veículo e bateu de frente com um caminhão que levava 15 mil litros de combustível. O casal e uma filha de 15 anos, que estavam no automóvel, morreram.


O total de acidentes nas estradas federais em 2011 ainda é inferior ao do ano passado, mas o número também deve ser superado. Até segunda-feira, foram 3.032 ocorrências, uma média de 758 por dia. Em todo o feriado do ano passado, ocorreram 3.233 acidentes, com média de 539.

- Não temos números fechados ainda, mas a tendência é aumentar o número de acidentes, porque temos cada vez mais veículos em circulação. Com mais veículos, é inevitável que aumente o número de acidentes - afirmou o inspetor Edson Varanda, chefe da comunicação da Polícia Rodoviária Federal em São Paulo.

Nos últimos seis anos, o crescimento dos acidentes no carnaval nas estradas federais foi contínuo, com exceção de 2008, quando houve uma pequena redução em relação a 2007, 2.396 contra 2.417. Em 2009, o número voltou a crescer, para 2.865.

A quantidade de feridos nas estradas também deve bater recorde neste carnaval. Até segunda-feira, o número estava em 1.783 e já superava os índices de 2006, 2007, 2008 e 2009. Ainda era inferior a 2010, quando os acidentes deixaram 1.912 feridos, mas a média é superior agora, com 446 ocorrências por dia contra 319 do ano passado.

Quem for pegar a estrada hoje deve redobrar os cuidados para evitar que os índices de ocorrências subam mais.

- Mais de 30% dos acidentes são causados pela falta de atenção do motorista. Se o tempo estiver chuvoso, a orientação é para reduzir a velocidade e aumentar a distância do carro da frente. Também é necessário ter paciência. Quem viaja nesta época do ano sabe que vai encontrar o trânsito mais moroso - orientou o inspetor Varanda.

Para tentar coibir as ocorrências, a Polícia Rodoviária Federal informa ter intensificado a fiscalização. Nos quatro dias do feriado até agora, foram realizados 22.290 testes de bafômetro, e 347 motoristas foram presos em flagrante por embriaguez ao volante.

FONTE: O GLOBO

Prof. Paulo Fleury (UFRJ) : 'Mortes são 36 mil por ano'

Professor titular do Coppead/UFRJ e especialista em logística e transportes, Paulo Fleury critica a falta de uma entidade que coordene ações na área e a fiscalização do transporte de carga no país.

Alessandra Duarte

Este carnaval foi mais violento nas estradas que o de 2010. O que motivou isto?

PAULO FLEURY: É bom lembrar que os dados da Polícia Rodoviária Federal dizem respeito só às rodovias federais, apenas 25% das rodovias pavimentadas do país. Se considerarmos todas as rodovias, o número médio de mortes é de cerca de cem por dia, ou 36 mil mortes por ano. Corresponde em média a dois acidentes fatais de avião a cada três dias. É inaceitável para um país com o grau de desenvolvimento do Brasil. Entre os principais motivos para isso, está a falta de regulação minimamente adequada sobre o transporte rodoviário de carga. Por exemplo, não há limites de horas de direção para os transportadores autônomos; não é incomum um motorista dirigir 40 horas seguidas sem descansar. Quando há a legislação, não é cumprida por falta de fiscalização. Um exemplo é o peso máximo permitido numa carreta, que não pode ser fiscalizado pois cerca de 90% das balanças não estão funcionando. O excesso de peso desequilibra o veículo, aumentando a chance de um tombamento.

A sinalização tem melhorado? E a Lei Seca? Funciona nas rodovias como tem funcionado em áreas urbanas?

FLEURY: A falta de sinalização continua sendo um dos principais problemas, principalmente combinado com altas velocidades em estradas com retas seguidas de curvas. A Lei Seca nas estradas não tem funcionado pela falta de fiscalização; nas vias urbanas é bem mais fácil fazer inspeção.

Como avalia a atuação do governo Lula e desse início de governo Dilma na prevenção e redução de acidentes nas estradas?

FLEURY: Infelizmente nenhum governo deu ou tem dado a devida atenção ao problema. Mesmo tendo conhecimento dos números alarmantes. Acho que o Congresso deveria votar uma lei de responsabilidade dos dirigentes que mantêm estradas em condições de risco como se encontram as nossas. As iniciativas dos governos federal e estaduais são absolutamente insuficientes para interromper esta tragédia nacional.

Quais são os estados em melhor e pior situação?

FLEURY: O estado com o maior número de acidentes e mortes é Minas: há manutenção precária para uma rede extensa, sobretudo de estradas estaduais com traçado antigo. São Paulo, com o maior percentual de rodovias privatizadas, é o que tem avançado mais no combate aos acidentes, pelo monitoramento das concessionárias, por exemplo.

Quais órgãos federais têm mais responsabilidade nesse quadro?

FLEURY: Um dos principais problemas que levam à falta de ações efetivas é a inexistência de uma entidade que coordene esta política. Hoje, as principais entidades são a PRF, o Dnit, os DERs estaduais e o Conit (Conselho Nacional de Integração de Políticas de Transporte), de âmbito multiministerial, mas que não tem se reunido com uma frequência mínima.

FONTE: O GLOBO

Gaddafi encurrala rebeldes e civis fogem

Ditador líbio faz 4 ataques aéreos a Ras Lanuf, de onde os insurgentes não conseguem avançar desde sábado

Zawiyah, tomada pela oposição, também sofre bombardeio; rebelados se contradizem sobre negociação com regime

Marcelo Ninio

Em meio a informações desencontradas sobre uma negociação entre Muammar Gaddafi e a oposição, forças leais ao ditador líbio intensificaram ontem a pressão militar contra os rebeldes no oeste e no leste do país.

A cidade portuária de Ras Lanuf, um estratégico polo petrolífero de onde os insurgentes não conseguem avançar desde sábado, sofreu quatro ataques aéreos, engrossando o êxodo de civis.

Uma das bombas atingiu o duto de abastecimento de água da cidade, com prováveis consequências para a logística rebelde. Outras acertaram estradas e uma casa desocupada em Ras Lanuf.

Mesmo sem vítimas, os bombardeios fizeram boa parte dos moradores da cidade deixar tudo para trás e partir em disparada rumo ao leste. "Metade da cidade está vazia, e a outra metade está pensando em sair", disse à Folha Mohamed Omran, 30.

Famílias inteiras também deixavam ontem em caravana a cidade de Bin Jawad, 50 km a oeste de Ras Lanuf, que foi fortificada pelo governo e tornou-se um obstáculo duro de transpor pelos rebeldes.

Os reveses dos últimos dias, quando as forças pró-Gaddafi fizeram uso sistemático de artilharia pesada e ataques aéreos, dissiparam o entusiasmo dos rebeldes e interromperam seu avanço.

Com isso, frustraram o plano de conquistar a cidade natal do ditador, Sirte, passo fundamental na caminhada rumo à capital, Trípoli.

Sem liderança nem estratégia militar, os rebeldes continuaram a se lançar em ataques desordenados a Bin Jawad, apesar da vasta superioridade em poder de fogo das forças de Gaddafi.

Em muitos casos, em missões quase suicidas, como admitiu à Folha Omran, técnico em computação transformado em guerrilheiro.

"Depois dos bombardeios aéreos, decidimos ir a Bin Jawad em três camionetes, mas fomos recebidos com fogo pesado a 10 km da cidade. Sete companheiros morreram e tivemos que recuar."

A adesão dos moradores de Bin Jawad às forças pró-Gaddafi é motivo de controvérsia entre os insurgentes. Muitos dizem que eles foram comprados pelo ditador; outros, que estão sendo usados como escudos humanos.

O rebelde Suleiman Mahda Suleiman, 28, jura ter visto uma fileira de mulheres na entrada de Bin Jawad. "Eram mulheres de todas as idades, que os cães de Gaddafi colocaram para sua proteção."

Ontem, Gaddafi também se valeu de tanques e aviões para atacar Zawiyah, cidade no oeste que é a mais próxima de Trípoli ainda sob controle de rebeldes. Relatos afirmam que muitos prédios, incluindo mesquitas, foram destruídos nos ataques.

Segundo habitantes, porém, até ontem à noite os insurgentes ainda controlavam a praça central de Zawiyah.

DESENTENDIMENTO

Em entrevista à rede Al Jazeera, o ex-ministro da Justiça de Gaddafi Mustafá Abdel Jalil, líder do conselho dos rebeldes, disse que havia proposto a "negociadores indiretos" do ditador não processá-lo por seus crimes se ele saísse da Líbia e cessasse os bombardeios em 72 horas.

O porta-voz do mesmo conselho, Abdel Hafiz Ghoga, porém, negou qualquer tratativa. "Nossas demandas são tão claras quanto a revolução. Não estamos negociando nada", afirmou ele.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO. Com agências de notícias

Ivana Domenico - Marcha da Quarta-Feira de Cinzas/Carlos Lyra e Vinicius de Moraes

Poema de uma quarta feira de cinzas:: Manuel Bandeira

Entre a turba grosseira e fútil
Um pierrot doloroso passa.
Veste-o uma túnica inconsútil
feita de sonho e de desgraça…

o seu delírio manso agrupa
atrás dele os maus e os basbaques.
Este o indigita, este outro apupa…
indiferente a tais ataques,

Nublaba a vista em pranto inútil,
Dolorosamente ele passa.
veste-o uma túnica inconsútil,
Feita de sonho e de desgraça…