sábado, 26 de novembro de 2011

Dois pontos:: Míriam Leitão

O Copom apostou num cenário em que a situação internacional se agravaria a ponto de derrubar a inflação no Brasil. Olhando a crise lá fora e os números internos, chega-se à conclusão de que o BC acertou apenas em uma parte. De fato, o quadro internacional piorou, até além da imaginação, mas a inflação permanece pressionada.

Já era prevista a queda neste final de ano do IPCA acumulado em 12 meses, mas olhando-se dentro dos números - que estão disponíveis no próprio site do Banco Central - encontram-se índices muito acima do razoável. A inflação do grupo vestuário foi de 9,57% nos últimos 12 meses até outubro; alimentos e bebidas subiram 8,5%; a educação ficou 8,1% mais cara e os serviços tiveram alta de 8,94%.

O núcleo da inflação, que exclui da conta preços voláteis como combustíveis e alguns alimentos, está ainda acima do teto da meta: 6,61%, em 12 meses. O que mais impressiona é o que está acontecendo no mercado imobiliário. O preço do metro quadrado dos imóveis no país, medido pelo índice Fipe Zap, aumentou 28% de outubro de 2010 a outubro de 2011. No Rio de Janeiro, a alta foi de 39%. Os aluguéis no Rio ficaram 24% mais caros em um ano. Em São Paulo, a alta foi de 15,6%. Os custos da construção civil subiram 7,72%. A mão de obra para as construtoras ficou 11,3% mais cara.

Essa montanha de números mostra que o movimento no mercado imobiliário - tanto em locação, quanto em compra e venda de imóveis - está perigosamente aquecido.

A cesta básica está mais alta que a média da inflação no Brasil inteiro, mas em algumas cidades o custo pesa mais. Somente este ano, de janeiro a outubro, a cesta básica aumentou no país 9,11%. Na cidade de Fortaleza, a alta foi de 16%. Em Florianópolis, a cesta subiu 12,48%. No Rio, 11,37%. Em Belo Horizonte, 10,86%, em Vitória, 10,51%.

A previsão do BC era que a deterioração do quadro externo seria tão forte que diminuiria fortemente o preço das commodities. Isso derrubaria o preço dos alimentos no Brasil e tiraria pressão sobre a inflação. O cálculo é que esse efeito seria grande o suficiente para neutralizar o impacto de uma alta do dólar decorrente exatamente do agravamento da crise.

O dólar subiu, sim, a situação ficou pior, de fato, mas o índice IC-Br, do Banco Central, que mede os preços das commodities em reais, subiu 15,49% de outubro a outubro. A maior parte da alta é velha, aconteceu no final de 2010, mas em agosto, setembro e outubro os preços aumentaram 4,11%, mesmo com o agravamento da crise. O que mais pesou foi a desvalorização do real no período. Os produtos agropecuários aumentaram 7,11% nesses três meses. Os produtos ligados à energia (petróleo, carvão e gás natural) também subiram no trimestre, 4,14%.

O mercado de trabalho no Brasil continua forte e o crédito segue com taxas altas de elevação em relação ao ano passado, o que tem mantido o crescimento. O país cresce bem menos do que 2010, menos do que se previa, mas ainda está no terreno positivo. O rendimento do trabalhador caiu 0,3% em outubro, em comparação com o aquecido outubro do ano passado, mas foi a primeira queda desde janeiro de 2010. O total de rendimentos das pessoas com trabalho subiu 22% de janeiro a agosto. O rendimento médio aumentou 21,53%. O crédito destinado a pessoas físicas subiu 12,4% de janeiro a outubro. Para as empresas, a alta foi de 12,8%. O crédito para habitação deu um salto de 34%.

O governo em dez meses quase cumpriu a meta de superávit primário, mas não porque reduziu despesas, mas sim porque elevou a arrecadação. Mais uma vez, como tem sido sempre nos últimos anos, o Tesouro cumpre as metas fiscais por receber mais receitas do contribuinte, e não por redimensionar suas despesas. Essa elevação constante do gasto público é uma parte da lenha na fogueira da inflação.

A arrecadação do governo com Impostos sobre Produtos Industrializados (IPI) aumentou 14% de outubro a outubro. Com o setor automobilístico, a alta foi de 28%. Do setor de bebidas, mais 11,3%. Quando os dados forem calculados, eles mostrarão que em 2011 houve nova alta da carga tributária. O economista Rogério Werneck escreveu no seu artigo publicado ontem no GLOBO que pode ser de 1,5 ponto percentual de alta este ano.

Os juros vão cair na semana que vem, novamente, e o que se discute no mercado é se será um corte de 0,5% ou 0,75%. O cenário Tombini está se confirmando em parte: o mundo está pior a cada semana. Há um volume enorme de incertezas aumentando a possibilidade de novos agravamentos.

A economia brasileira sente isso de diversas formas: o dólar sobe, o ritmo de crescimento diminui, a bolsa cai ou anda de lado, mas a inflação continua pressionada. O próximo ano começará com a alta de 14% no salário mínimo, o que representará um impacto forte nos custos da Previdência e na inflação de serviços.

Pelo cenário do Banco Central, tudo isso será absorvido e eliminado durante o ano de 2012 que terminará com a taxa em 4,5%, no centro da meta. É torcer para que isso ocorra.

FONTE: O GLOBO

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