quarta-feira, 23 de novembro de 2011

As conseqüências:: Merval Pereira

O acidente na exploração do petróleo na costa do Estado do Rio provocado por uma das maiores companhias petrolíferas do mundo, a americana Chevron, reacende a discussão sobre a distribuição dos royalties e participações especiais da exploração do petróleo.

Oficialmente, a discussão do polêmico assunto ficou para o próximo ano, mas há uma desconfiança em setores políticos nos estados produtores de que, resolvida a questão crucial do governo com a aprovação da DRU - que aconteceu ontem -, o Palácio do Planalto faça vista grossa e permita uma votação do projeto que redistribui os royalties para os estados não produtores ainda este ano, ao apagar das luzes do Congresso, no que seria um golpe parlamentar de consequências políticas imprevisíveis.

O secretário estadual do Meio Ambiente, o petista Carlos Minc, chama a atenção para o fato de que nesse acidente, apenas por uma situação específica, os ventos e as marés levaram o óleo que vazou para longe das praias, mas esse mesmo acidente, com outras condições climáticas, iria poluir as praias de Macaé, Rio das Ostras, de Búzios, Arraial do Cabo, "e o óleo derramado não ia bater às portas do Piauí e muito menos em Rondônia ou Mato Grosso".

Além disso, uma parte substancial desse óleo não aflorou com o acidente, ficou no que se chama de "coluna d"água". Segundo técnicos do Ibama e do Inea, o óleo sofre um processo químico e vira aquelas pelotas que parecem piche. "Todo mundo um dia já pisou numa bola preta de piche em uma praia. Dependendo da corrente, podem ir para as praias do Rio, de Angra, de Ubatuba, do Espírito Santo, mas seguramente nesta região", adverte Minc.

O problema não é apenas o óleo chegar à praia, lembra o secretário: "Vamos pegar o caso do acidente da Baía de Guanabara em 2000 ou o caso de 1987 do terminal da Baía da Ilha Grande. Você tem afetados o turismo, a pesca, o transporte, o esporte náutico, uma série de atividades."

Esses transtornos podem ser minimizados, mas não evitados totalmente, lembra, destacando que "não existe risco zero, e o impacto obviamente é na localidade e afeta os empregos no turismo, na pesca, na navegação".

O acidente da Chevron aconteceu em uma área do pós-sal, isto é, a exploração ainda não é do pré-sal, as sondas da empresa petrolífera americana estavam a aproximadamente 1.500 metros abaixo do chão do mar, e o pré-sal, 6 a 7 mil metros.

"Esse acidente foi a 800 metros, onde tinha uma falha qualquer, que já existia, mas foi se aprofundando com a pressão do óleo. Imagina isso tudo em uma profundidade oito a dez vezes maior", argumenta Carlos Minc.

No pré-sal, tudo é mais complicado tecnologicamente. "Acontecendo um acidente, seguramente é mais complexo e mais custoso", completa Minc.

O Estado do Rio sempre apoiou sistemas de distribuição da renda dos impostos nacionais com base no critério inverso da renda per capita.

Por esses critérios, o retorno para o Estado do Rio dos impostos aqui arrecadados foi de apenas 2,4%, enquanto no conjunto dos estados do Norte, do Nordeste e do Centro-Oeste foi de 56%, e nos estados do Sul foi de 17%.

Na distribuição dos royalties ou das participações especiais, esse critério não pode ser adotado, pois quebraria financeiramente os estados produtores, além de desrespeitar o espírito da legislação, que trata os royalties como uma compensação aos estados produtores, não só pelos transtornos que têm na exploração do petróleo, mas também pelo fato de que o petróleo não tem ICMS cobrado na sua origem, e sim onde é consumido, prejudicando os estados produtores.

O fato é que, como comenta um estudo produzido pelo assessor econômico José Roberto Afonso, a pedido dos senadores Francisco Dornelles e Lindbergh Farias, as participações governamentais na extração de petróleo e gás natural, bem assim de recursos minerais e na geração de recursos hídricos, nunca geraram volumes importantes de receita e nem despertaram maiores atenções sobre sua divisão entre as três esferas de governo e entre as unidades de cada uma dessas esferas até há poucos anos.

A lei regulamentadora qualificou os royalties como compensação financeira, e a participação especial como a mesma compensação, mas extraordinária.

A descoberta de enormes reservas de petróleo e gás em mar, nas camadas do pré-sal, mudou radicalmente esse cenário.

Para a exploração, o governo federal propôs mudar o regime de concessão para partilha de produção, e o novo marco regulatório foi dado pela Lei nº 12.351 de 22/12/2010.

Já no campo da divisão federativa da receita, subitamente irrompeu e foi fomentado um enorme conflito federativo, porque aquela receita que era ignorada e, depois, pouco observada passou a ser vista como uma espécie de redenção para as finanças de todos os governos do país, sobretudo dos ditos não produtores.

A exploração do pré-sal em mar passou a ser vista como espécie de novo e futuro eldorado para as finanças públicas estaduais e municipais, capaz de gerar um enorme e inesgotável volume de receitas e, para tanto, disseminou-se a ideia de que as participações não devem caber originalmente aos estados e às prefeituras confrontantes dos campos em mar ou afetados pela citada produção, que será gerada fora do território em terra.

Neste contexto, o novo marco regulatório em si passou para o segundo plano no Congresso Nacional na apreciação final do projeto que o regulamentou. Tanto na Câmara quanto no Senado, foram apresentadas e aprovadas propostas com objetivo de redistribuir para todos os estados e para todos os municípios, segundo os mesmos critérios de rateio aplicados aos respectivos fundos de participação (FPE e FPM), as parcelas que cabem a essas duas esferas de governo.

Nas simulações mais conservadoras, entre 2012 e 2020, os governos do Rio de Janeiro podem vir a perder ao menos cerca de R$49 bilhões em royalties e participações especiais em petróleo e gás, caso o projeto aprovado em outubro pelo Senado venha a ser aplicado.

No mesmo período, o governo estadual deve deixar de arrecadar perto de R$64 bilhões em ICMS sobre o petróleo destinado a outros estados e a não receber outros R$13 bilhões do FPE se for mantido o coeficiente que foi imposto por uma tabela no lugar do critério de rateio do código tributário.

Agregados os três montantes, chega-se a um prejuízo de R$125 bilhões.

FONTE: O GLOBO

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