quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Europa vive impasse após rejeição a socorro do euro

O voto contra da Eslováquia, um pequeno país que já foi comunista, deixou em suspenso o socorro a países endividados da Europa, aumentando a tensão na zona do euro. Por problemas políticos internos, a Eslováquia impediu a ampliação para € 440 bilhões do Fundo Europeu de Estabilidade Financeira, aprovada pelos outros 16 países da região. "Há uma crise sistêmica na região que põe em risco a estabilidade econômica global", alertou o presidente do BC europeu, Jean-Claude Trichet. Para analistas, o impasse deve afetar os mercados e mostra os graves problemas de coordenação política na União Europeia. Os bancos espanhóis Santander e BBVA foram rebaixados pelas agências de risco

Pedra no caminho do euro

Em meio a racha político, Eslováquia rejeita aumento do fundo de resgate. Haverá nova votação

BRATISLAVA, ATENAS e FRANKFURT - O poder das grandes economias da zona do euro tropeçou ontem em um pequeno obstáculo: a Eslováquia. Motivado por disputas políticas internas, o antigo país comunista foi o único dos 17 membros da zona do euro a rejeitar a ampliação do Fundo Europeu de Estabilidade Financeira (Feef) para 440 bilhões. A medida precisava da aprovação de todos os membros. Apenas 55 parlamentares votaram a favor, enquanto nove foram contra e 60 se abstiveram. Eram necessários 76 votos. Isso também implodiu a coalizão governamental, pois a primeira-ministra, Iveta Radicova, havia vinculado a aprovação a um voto de confiança em seu governo. A oposição, no entanto, já se disse disposta a negociar depois da saída do governo, e há expectativas de uma nova votação nos próximos dias - um deputado chegou a mencionar que poderia ocorrer hoje mesmo.

- Acreditamos que, de uma maneira ou de outra, o Feef será aprovado até o fim desta semana - disse o ministro de Finanças, Ivan Miklos.

Foram mais de dez horas de debate no Parlamento, na capital Bratislava, durante as quais a primeira-ministra tentou convencer seus próprios aliados da necessidade do sim.

- É todo o sistema da zona do euro que está ameaçado no momento, não apenas alguns países pequenos - disse Radicova. - Nosso euro está ameaçado. A situação precisa de uma reação rápida.

Mas um dos partidos de sua coalizão, o liberal SAS, era contra a ampliação do Feef, que acarretaria uma contribuição maior do país. O líder do SAS, Richard Sulik, defende que a Eslováquia é pobre demais para ajudar outros países da zona do euro. Mas, depois da rejeição de ontem, o deputado do SAS Martin Poliacik disse ao jornal francês "Le Monde" que poderia haver uma nova votação "na tarde de quarta-feira" (hoje).

Analista vê problema grave de governança

O ministro de Relações Exteriores da Áustria, Michael Spindelegger, afirmou, em entrevista à televisão local, que lamentava o ocorrido na Eslováquia, mas disse acreditar que o governo eslovaco deve aprovar a ampliação do Feef até o próximo dia 23.

Robert Fico, líder do Smer, o maior partido de oposição da Eslováquia, afirmou que votará a favor da medida, desde que o governo convoque eleições antecipadas. Por enquanto, Radicova permanece no cargo.

Para Alexandre Schwartsman, ex-diretor do Banco Central do Brasil, a rejeição do Feef pela Eslováquia mostra os graves problemas de governança da zona do euro:

- Chegamos ao ponto de problemas de política interna de um país pequeno atrapalharem a decisão do bloco. Vimos problemas semelhantes na Finlândia e em Malta.

Mas Schwartsman vê a rejeição eslovaca mais como uma "solução do que uma derrota" para o bloco. Ele explica que, com a decisão, o partido de centro-esquerda do país vai assumir mais postos no governo e deverá apoiar a ampliação do Feef.

Álvaro Bandeira, da Ativa Corretora, acredita que o fato pode pesar sobre os mercados nos próximos dias, já que adia novamente uma solução para parte da crise da dívida nos países europeus:

- O que aconteceu era de certa forma esperado por causa do momento político do país. Pressão política existe no mundo inteiro, inclusive na Eslováquia. Isso pode pesar um pouco sobre o mercado nos próximos dias, que continua preocupado com uma crise sistêmica.

Crise sistêmica foi a expressão usada pelo presidente do Banco Central Europeu (BCE), Jean-Claude Trichet, para alertar sobre os efeitos da crise da dívida na zona do euro tornou-se sistêmica e ameaça a estabilidade econômica global, a menos que uma ação decisiva seja tomada com urgência.

- A crise é sistêmica e deve ser enfrentada com determinação - disse Trichet a um comitê do Parlamento Europeu em sua última aparição antes de se aposentar, no fim deste mês. - Nós estamos no epicentro de uma crise global.

Ressaltando a gravidade da situação, um estudo divulgado ontem pela Columbia Business School afirma que o BCE detém 1 trilhão em títulos da dívida da zona do euro de elevado risco. Segundo o autor do estudo, David Beim, uma moratória grega poderia dar início a uma série de calotes e reestruturações na região.

Beim disse ao "Wall Street Journal" que a solução seria a Grécia deixar a zona do euro e reduzir sua dívida em 50% - hoje, o percentual acordado com os credores é de 20%. Outra medida, afirmou o economista, seria o BCE emitir moeda e permitir o aumento da inflação. "Há muito mais em jogo" que a estabilidade dos preços, ressaltou Beim.

FMI e UE aprovam recursos para Grécia

A Grécia, por sua vez, respirou aliviada ontem ao receber da chamad troika - União Europeia (UE), Fundo Monetário Internacional (FMI) e BCE - o sinal verde para a liberação de uma parcela de 8 bilhões do empréstimo de 110 bilhões aprovado no ano passado. Agora falta apenas o aval dos ministros das Finanças da zona do euro e da diretoria executiva do FMI. Estima-se que os recursos estejam disponíveis no início de novembro.

Os inspetores da troika alertaram, porém, que a Grécia fez um progresso irregular no cumprimento dos termos da ajuda acertada em maio do ano passado. Eles afirmaram que são necessárias medidas adicionais para cumprir as metas de redução da dívida em 2013 e 2014.

Já a Espanha amargou o rebaixamento de vários de seus bancos ontem pelas agências de classificação Fitch e Standard & Poor"s. A Fitch cortou a nota de seis bancos, e a S&P, de dez - inclusive Santander e BBVA, ambos de "AA" para "AA-". Nesse quadro, as autoridades reguladoras da UE pediram que os bancos da região forneçam dados atualizados sobre capital e exposição à dívida soberana, a fim de reavaliar sua necessidade de recapitalização.

FONTE: O GLOBO

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