domingo, 17 de julho de 2011

Dilma roda o mesmo filme de Lula:: Elio Gaspari

O primeiro grande escândalo do governo Lula estourou em fevereiro de 2004, 13 meses depois de sua posse. Custou o cargo a Waldomiro Diniz, subchefe da Casa Civil de José Dirceu. Ele fora filmado num achaque ao tempo em que dirigia as loterias do Rio de Janeiro. Até o dia em que deixou o Planalto, em janeiro passado, Nosso Guia foi perseguido por escândalos que se sucederam em intervalos regulares.

O governo Dilma Rousseff foi mais veloz. Seu primeiro escândalo estourou cinco meses depois da posse e custou o cargo ao chefe da Casa Civil, Antonio Palocci. Um mês depois, Dilma perdeu o ministro dos Transportes e o diretor do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes, o Dnit. (Em julho de 2003, quanto Lula tinha sete meses de Palácio, o mesmo Dnit deu-lhe uma pequena crise, com o ex-diretor financeiro acusando o ministro Anderson Adauto de favorecer a empreiteira Queiroz Galvão e sendo acusado de embolsar propinas.)

Deixando-se de lado o varejão da roubalheira, onde ficam contratos de serviços, de publicidade, ou despesas com cartões de crédito, mordomias e viagens, a crônica de nove anos incompletos de governo petista revelam que há nele uma engrenagem blindada, metódica e articulada de corrupção. Não há novos escândalos, há apenas novas erupções, beneficiadas por uma rotina em que uma crise só se exaure quando é substituída por outra, na qual estão personagens que passaram despercebidos na anterior.

O centro dessa rede fica no Palácio do Planalto, ora na Casa Civil, ora na coordenação política e sempre na coleta e repasse de doações. Quando Waldomiro Diniz foi apanhado, pouca gente sabia quem era Delúbio Soares. (Em janeiro de 2003, o tesoureiro do PT organizou uma festa numa fazenda de Buriti Alegre. Entre os convidados estava o deputado Valdemar Costa Neto, do PR, atual marquês do Ministério dos Transportes.)

Desde fevereiro de 2004 sabia-se que Delúbio pagava mesadas a deputados do PTB. Entre a crise de Waldomiro Diniz e a seguinte, com o vídeo de um pagamento de propina a um diretor dos Correios, passaram-se 15 meses. Bastaram mais quatro meses para que daí surgisse a palavra que mudaria a história do PT e do comissário José Dirceu: "mensalão".

O novo escândalo expôs o loteamento, pelo Planalto, de cargos nos Correios, Banco do Brasil, Instituto de Resseguros do Brasil, Furnas, bem como a manipulação, pela Casa Civil, dos fundos de pensão de estatais. Nos governos anteriores aconteceram episódios semelhantes, mas não tiveram a articulação e a blindagem conquistada pelo comissariado. Trinta e dois parlamentares acusados de ter participado do "mensalão" e de roubalheiras nas verbas da saúde tiveram um crescimento patrimonial de 32% entre 2002 e 2006.

O "mensalão" ainda não saíra no noticiário quando puxaram-se as pontas da administração do ministro da Fazenda, Antonio Palocci, na Prefeitura de Ribeirão Preto. Era mais do mesmo. Negociando contratos de loterias na Caixa Econômica, Waldomiro Diniz propusera a empresários o serviço da consultoria de Rogério Buratti, ex-secretário de governo de Ribeirão, ex-sócio do chefe de gabinete do ministro da Fazenda. Incriminado por Buratti, Palocci agonizou durante um ano. Trazido de volta ao Planalto por Dilma, aguentou 23 dias de crise e saiu de cena sem contar quem eram os clientes que o tornaram milionário.

Burattis, Waldomiros, Delúbios, Erenices e até mesmo Pagots foram peças acessórias de uma máquina. Isso pode ser entendido quando se vê como saíram de cena. Delúbio, reintegrado recentemente à família petista, ensinou: "Faz parte da minha integridade não delatar ninguém". Na semana passada, o doutor Luiz Antonio Pagot fechou suas oito horas de silencioso depoimento com uma frase: "Sou um leal companheiro".

O escandaloso enriquecimento de Palocci foi substituído pelas propinas do Ministério dos Transportes. Como acontece desde o caso de Waldomiro Diniz, será esquecido, diante do próximo.

Come-se e bebe-se

Há breves episódios que contam tudo. Faz pouco tempo, o deputado Eduardo Cunha (PMDB -RJ) casou a filha com uma festa para mil convidados nos salões do Copacabana Palace. Na terça-feira a base aliada do governo organizou dois eventos.

Num, as lideranças do PMDB e do PT comeram um bolo (horrível) de nozes simbolizando o amor que os une. Noutro, o PR manifestou seu desconforto com a faxina na área dos transportes recusando-se a comparecer a um almoço de próceres governistas. No dia seguinte foram todos ao Alvorada, para um coquetel com a doutora Dilma.

Manuel Bandeira sabia de tudo:

"Os cavalinhos correndo,

E nós, cavalões, comendo."

A conta da base

De uma víbora:

"O Planalto pode resolver todos os problemas de contabilidade de sua base, mas não vai fazê-lo.

Para resolver, basta dizer ao sujeito que está pedindo cem que se contente com dez. Ele dirá que não aceita e ameaçará romper com o governo. Uma semana depois estará de volta, aceitando os dez. Se o governo oferecer cinco ele fecha negócio. Para que esse mecanismo funcione, o cidadão jamais poderá argumentar que a banda petista recebeu os cem que pedia em outro balcão. Como esse argumento continuará de pé, o Planalto irá de crise em crise. Não se esqueça que ninguém do PR ou do PMDB defendeu a entrada do BNDES no negócio do Pão de Açúcar/Carrefour."

Avatar

Pelo andar da carruagem, o Palácio do Planalto começou a ficar pequeno para Dilma Rousseff e o secretário-geral da Presidência, Gilberto Carvalho. Se o problema fosse só esse, a solução seria simples, mas Carvalho é um avatar, de Lula.

Partir para cima

O repórter Ilimar Franco narrou uma cena ocorrida na sala da Câmara em que depunha Luiz Antonio Pagot, ex-diretor do Dnit, depositário de esperanças e segredos de petistas e empreiteiros. O líder do PT, Paulo Teixeira, aproximou-se do deputado Anthony Garotinho (PR-RJ) e disse-lhe: "Vê lá o que você vai falar aí. Não vai vir com essa história de mensalão de novo, se não a gente vai partir pra cima de você".

Madame Natasha

Natasha tem carinho pelo uso do idioma a serviço das boas maneiras. A senhora incomoda-se quando vê mensagens eletrônicas de pessoas que não conhece, encerrando o texto com um seco "aguardo retorno", ou numa versão mais radical, "aguardo pronto retorno". Ela acredita que o "aguardo" pode ser usado em relações hierárquicas e funcionais. Fora daí, conviria usar o velho e bom "agradeço o retorno".

Os papéis de 1961

A morte do almirante Faria Lima, que passou pelo governo do Rio e pela presidência da Petrobras como exemplo de honorabilidade, poderá liberar um tesouro.

Em 1961, quando o país esteve à beira da guerra civil, durante a crise resultante da renúncia do presidente Jânio Quadros, Faria Lima era subchefe do Gabinete Militar. Na ocasião, o vice-presidente João Goulart estava no exterior e os ministros militares não queriam empossá-lo.

Foi montada uma operação que grampeou os telefonemas dados a Jango por aliados como Juscelino Kubitschek e Tancredo Neves. As degravações dessas conversas foram conservadas pelo almirante. Em 1986 ele contou que ainda as guardava consigo, mas não os mostrava: "É coisa para meus netos".

FONTE: O GLOBO

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