terça-feira, 7 de junho de 2011

A crise está no governo:: Raymundo Costa

É pouco provável que a demissão do ministro Antonio Palocci e sua substituição por outro petista encerre a crise política pela qual passa o governo. Isso exige a mudança de postura da presidente da República em relação ao Congresso, o que ela mesma já reconheceu, mas também a conciliação de interesses do PT e da imensa e heterogênea base de sustentação parlamentar do governo, especialmente do PMDB, o maior partido da base, a cada dia menos cúmplice da presidente que ajudou a eleger.

Para os pemedebistas é irrelevante se Palocci sai ou fica, se não houver uma efetiva divisão de poder, o que era o pressuposto da aliança eleitoral de 2010.

Do ponto de vista pemedebista, longe de ser um "problema pessoal" de Palocci, como caracteriza o chefe da Casa Civil, a crise está no governo e somente se resolve com a efetivação no poder do partido do vice-presidente da República, Michel Temer. O PMDB se ressente do alijamento de Temer nas decisões de governo. Insatisfação antiga, forjada na constituição do ministério.

Dilma, que teve um pemedebista como candidato a vice, reduziu o papel do PMDB em relação ao que o partido tinha no governo anterior do presidente Lula, ao qual aderiu tardiamente.

A crise com o PMDB estava em gestação, portanto, é certo que houve muito cálculo político quando Michel Temer reagiu ao célebre telefonema de Palocci cobrando a fidelidade do partido na votação do Código Florestal. Foi a "deixa" aguardada para o vice expressar o descontentamento partidário.

Poucos foram os partidos, nesses 25 anos ininterruptos de democracia, que souberam tirar proveito das crises tão bem quanto o PMDB. Talvez o antigo PFL com a sua política de morde (Antonio Carlos Magalhães) e assopra (Marco Maciel). E o PMDB está apresentando a fatura a presidente Dilma.

Partido que carrega a tatuagem do fisiologismo, o PMDB agora toma o cuidado de dizer que não é movido pelo desejo de cargos, mas de formulação e participação efetiva no exercício de poder. A rigor a cúpula partidária estaria 99,9% atendida no que se refere às nomeações, apesar de ainda ter correligionários de peso na chuva, casos de José Maranhão (PB), Hélio Costa (MG) e Orlando Pessuti (PR).

O exemplo que os pemedebistas gostam de apresentar é a completa ausência dos ministérios do partido na execução daquele que é anunciado pela própria presidente da República como sendo o principal programa de seu governo, o Brasil Sem Miséria. Os pemedebistas não foram envolvidos nem na elaboração nem na execução de um programa que tem tudo para render bons dividendos eleitorais, se for bem sucedido.

O Ministério de Minas e Energia e o de Agricultura poderiam ser facilmente engajados no esforço para a erradicação da pobreza no país, mas o Brasil Sem Miséria ficou caracterizadamente petista, apesar da escalação do Ministério da Integração Nacional, comandado pelo PSB do governador de Pernambuco, Eduardo Campos.

A avaliação crua do PMDB é que o mais importante programa de Dilma foi definido sem a participação de seu sócio-proprietário e que Michel Temer é um vice-presidente sem qualquer influência no governo, quando não deveria ser considerado um vice comum, igual a seus antecessores na função.

O atual senador Itamar Franco, vice de Fernando Collor, não tinha partido (filiara-se ao minúsculo PRN por uma conveniência eleitoral). O ex-senador Marco Maciel não foi a primeira opção do tucano Fernando Henrique Cardoso e foi escolhido por causa de uma denúncia contra um assessor de Guilherme Palmeira, o nome preferido do PSDB. O último vice, José Alencar, era um empresário bem sucedido que entrou na chapa de Lula da Silva para sinalizar a inflexão programática do PT.

A cúpula do PMDB alega que Temer tem um trânsito institucional diferente dos demais: foi três vezes presidente da Câmara e está no efetivo comando do PMDB, partido majoritário no Senado e a segunda maior bancada da Câmara. Basta observar a unidade demonstrada pela sigla em votações importantes para o governo - os pemedebistas não consideram que houve traição na votação do Código Florestal. A dissidência se estendeu por toda a base de apoio ao governo.

A fatura pemedebista tem créditos da campanha eleitoral. Um exemplo é o empenho da cúpula pemedebista para resolver problemas espinhosos, como a retirada da candidatura à reeleição do governador Orlando Pessuti, no Paraná, importante, à época, para o esquema eleitoral da candidata Dilma no Estado.

No entanto, dirigentes pemedebistas consideram que o vice-presidente, a principal referência da aliança do partido com o PT, está restrito à articulação parlamentar na Câmara dos Deputados. Temer nem mesmo é chamado para solenidades político-administrativas que lhe permitiriam aparecer bem na foto, ao lado de Dilma Rousseff.

Na ótica do PMDB, a ausência do partido do núcleo de poder é que deixou a presidente Dilma vulnerável ao "fogo amigo" petista. A avaliação corrente é que a hegemonia atiçou a cobiça dos vários grupos e correntes que disputam o controle do PT.

Dizem os pemedebistas que não se trata de fazer ameaça, mal querência ou má vontade, mas se a presidente não resolver a situação do PMDB, será irrelevante manter ou afastar Palocci da Casa Civil. A crise política continuará rondando o Palácio do Planalto, até porque, além deles, há insatisfação nos outros partidos da base com a hegemonia petista.

FONTE: VALOR ECONÔMICO

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