quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

Militares aderem à oposição; Kadafi apela a mercenários

O regime sustentado pelo coronel Muamar Kadafi ao longo dos últimos 42 anos na Líbia está desmoronando. Ontem, parte das Forças Armadas se juntou aos insurgentes em grandes cidades do leste do país. Militares e mercenários estariam concentrados em um raio de 40 km de Trípoli, onde tentam garantir a sobrevida da ditadura. Entidades de direitos humanos dizem que os mortos já chegaram a 640. A ferocidade da reação de Kadafi aos opositores fez a comunidade internacional se mobilizar para isolar a Líbia. Ontem, a Europa estabeleceu sanções econômicas, e os EUA caminhavam para fazer o mesmo. A Liga Árabe afastou Kadafi de suas reuniões.

Tropas leais a Kadafi e mercenários cercam Trípoli para defender regime

Agentes das forças de segurança da Líbia teriam aderido aos insurgentes que já controlam o leste do país; testemunhas informam que ditador ordenou que seus partidários abram fogo de maneira indiscriminada contra qualquer foco de oposição perto da capital

Andrei Netto

Os sinais de que o regime do coronel Muamar Kadafi está desmoronando na Líbia são cada vez mais claros. Ontem, parte das Forças Armadas juntou-se aos insurgentes em grandes cidades do leste do país, como Benghazi, Tobruk e Ajdabiya, na província de Cyrenaique, que já passou às mãos dos revoltosos. Militares e mercenários estariam concentrados em um raio de 40 quilômetros de Trípoli, onde tentam garantir a sobrevida da autocracia.

Segundo organizações não governamentais, pelo menos 640 pessoas já morreram na mais violenta das rebeliões populares que estão transformando o mundo árabe. Mas testemunhas estimam esse número na casa dos milhares em todo o país.

No leste, próximo à fronteira com o Egito, o controle de imigração foi aberto e a segurança em rodovias e cidades passou a ser feita por manifestantes armados com fuzis AK-47 roubados dos arsenais ou de paus e pedras. Segundo as agências AFP e Reuters, que já ingressaram no país, soldados aliaram-se ao movimento popular em Ajdabiya, a 847 quilômetros da capital, Tobruk e Benghazi, ambas mil quilômetros a leste de Trípoli. Nessa região, vídeos registrados por insurgentes mostram prédios públicos e veículos incendiados, cartazes de Kadafi sendo destruídos e milicianos cercados por militantes.

Já em Trípoli, conforme testemunhos obtidos pelo Estado, a situação é diferente. Em torno da metrópole de 2 milhões de habitantes um anel foi formado pelos setores das Forças Armadas leais a Kadafi para garantir a segurança do regime. Ontem pela manhã, a situação era mais calma e não havia registros de manifestações nas ruas. A calmaria permitiu aos moradores ir às ruas buscar suprimentos. Tiros eventuais eram ouvidos, mas nenhum bombardeio teria sido realizado.

"Há tiros a toda hora e a polícia atira nos manifestantes a mando do governo. Mas não é verdade que a população tenha sido bombardeada na capital", disse o petroleiro tunisiano Mohamed Trizou, que deixou Trípoli e retornou à Tunísia com a mulher e um filho. Em Sabratha, a 70 quilômetros a oeste da capital, as Forças Armadas também teriam enviado tropas para tentar dispersar os manifestantes, que já teriam tomado sedes governamentais e prédios da polícia. Nas rodovias próximas, que cortam o deserto e conduzem a Trípoli, as barreiras policiais se multiplicaram. Nos 207 quilômetros que separam a capital e a passagem fronteiriça de Ras Jdir, na Tunísia, a principal porta de entrada terrestre do país, mais de 20 postos de controle foram montados pelas forças de ordem para controlar a saída e entrada de estrangeiros.

O resultado do conflito armado na Líbia já é o mais sangrento das revoltas árabes que se espalham pelo Norte da África e pelo Oriente Médio. Segundo a Federação Internacional das Ligas de Direitos Humanos (FIDH), de Paris, mais de uma centena de militares teriam sido executados por insubordinação.

Para Abdel Moneim al-Honi, representante da Líbia na Liga Árabe que renunciou ao posto, os dias de Kadafi no poder estão contados, mas o custo humano da revolta vai crescer à medida que o poder se sinta cercado. "Eu creio que seja uma questão de dias, não mais", estimou ao jornal Al-Hayat, da Arábia Saudita. "Ao mesmo tempo, penso que o levante custará caro à Líbia e aos líbios, porque Kadafi é capaz de tudo. Creio que massacres horríveis vão ocorrer."

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

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