quarta-feira, 24 de novembro de 2010

O terror e a Lei :: Merval Pereira

DEU EM O GLOBO

O governo do Rio está tomando providências em diversas frentes, invadindo várias favelas controladas pela facção criminosa que estaria promovendo esses arrastões, e ao mesmo tempo o governador Sérgio Cabral pediu que a Polícia Rodoviária Federal entrasse em alerta máximo, oficialmente para ajudar no controle das vias expressas como as Linhas Vermelha e Amarela, onde têm acontecido muitos ataques dos bandidos. Na realidade, as autoridades lidam também com uma denúncia de que um caminhão de explosivos estaria sendo desviado para o Rio para atentados, o que configura o caráter terrorista das ações dos últimos dias.

Este foi um primeiro pedido oficial do governo do Rio ao governo Federal, dando a dimensão da gravidade do caso, e o Ministro da Justiça ofereceu até mesmo a Força Nacional de Segurança.

Essa ação nos morros é uma reação para demonstrar à facção criminosa que não haverá recuo no combate ao crime organizado.

Além da ação terrorista coordenada para acuar as autoridades, há também a bandidagem que, expulsa dos morros, está no asfalto tentando reverter seus prejuízos.

Seria de se esperar que esse tipo de crime aumentasse nas ruas da cidade, e que muitos desses criminosos fossem para outras cidades do interior do estado, onde o índice de criminalidade tem crescido.

Inclusive porque a tática do governo é avisar com antecedência que vai invadir este ou aquele morro, dando tempo para os bandidos saírem sem resistir à chegada da polícia, para evitar um banho de sangue e colocar em risco os moradores.

Isso porque a ideia principal das Unidades de Polícia Pacificadora (UPP) não é acabar com o tráfico de drogas, mas sim acabar com o domínio dos bandidos sobre o território das favelas.

Interessa mais a essa política liberar as favelas para os cidadãos do que propriamente impedir o tráfico e prender os traficantes.

Mas a única coisa a fazer é continuar na estratégia de ir avançando no domínio do território ocupado pelos bandidos.

Sucessivos governos deixaram esses criminosos tomarem conta das favelas da cidade e agora para alcançar uma pacificação desses territórios é preciso devolver ao Estado o chamado "monopólio da força" onde os criminosos o exercem.

O Ministério da Justiça ofereceu também vagas em presídios federais para que sejam transferidos bandidos que continuam mandando ordens de dentro dos presídios estaduais, mas se as ameaças continuarem será preciso pedir a ajuda das Forças Armadas.

A tendência natural do governo, qualquer governo, é tentar reduzir o tamanho da ameaça, e é por isso que o secretário de Segurança José Beltrame, que está fazendo um excelente trabalho, diz que essas ações são feitas por uma facção criminosa pequena que não se conforma com a perda de espaço para suas ações nos morros da cidade.

Pode ser, mas o que estamos vendo são ações coordenadas, como se fossem treinadas com o objetivo único de causar impacto na população.

Os métodos são de ataques terroristas, com táticas de guerrilha. Tudo indica que são pessoas treinadas, muitos indícios de que há ex-soldados cooptados pelos traficantes.

Naquele episódio da tomada do Hotel InterContinental, em São Conrado, os filmes mostravam movimentos dos bandidos muito organizados, com claro preparo militar.

"Devido à existência do controle territorial armado por narcotraficantes e milícias, a retomada definitiva, com a retirada das armas, é uma questão estratégica e não tática", afirma um trabalho da Casa das Garças, um instituto de estudos do Rio, já abordado pela coluna, sobre as favelas do Rio.

O trabalho chegou à conclusão de que "o Estado e a sociedade civil estão presentes nas favelas. A ausência do Estado ocorre apenas em uma função: o policiamento ostensivo. Porém, este é o ponto primordial para que todos os demais direitos e equipamentos sejam acessados".

O estudo indica como ação prioritária após a "retomada definitiva e a pacificação", entre outras, a formalização dos negócios e a regularização da situação fundiária e do habite-se.

O mesmo grupo prepara-se agora para analisar as experiências de regularização de títulos em diversos países. No Rio, há uma ação bem-sucedida do Instituto Atlântico dando títulos de propriedade à comunidade do Cantagalo, um morro incrustado entre Copacabana e Ipanema.

O economista Sérgio Besserman, que já foi presidente do IBGE, também acha, como já registramos aqui na coluna, que o principal serviço público que o Estado está deixando de oferecer as populações dessas comunidades é a segurança, "não a segurança de não ter crime, de não ter tráfico, mas a segurança de a pessoa poder andar livremente".

Concordando com o objetivo básico das UPPs, Besserman acha que "se vai ter tráfico em Botafogo, em Copacabana, no Recreio, combatam o tráfico com inteligência. Mas a rua, a praça, o poder tem que ser do povo, através do Estado".

Se a situação chegar ao ponto de o governo estadual ter de pedir a intervenção das Forças Armadas, haverá uma nova situação, isso porque o Exército ganhou poder de polícia para ações urbanas em recente reforma do sistema de Defesa nacional, mas não está claro se ele pode exercê-lo nas cidades ou apenas nas fronteiras, no combate ao contrabando de armas e drogas.

A atuação das Forças Armadas nos conflitos urbanos sempre foi um tema polêmico, e embora seja cada vez maior a certeza de que as tropas brasileiras estão preparadas para agir em favelas do Rio de Janeiro, depois da experiência de campo nas favelas de Porto Príncipe, há ainda dúvidas sobre até que ponto elas poderiam atuar na repressão ao crime organizado.

Margem de segurança:: Dora Kramer

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Antes de sair, o presidente Luiz Inácio da Silva deixará duas questões resolvidas: a escolha do novo ministro do Supremo Tribunal Federal e o caso do italiano Cesare Battisti, preso e com extradição decretada pelo STF, no aguardo apenas da sua palavra final.

Pelo menos essa é a expectativa de quem compartilha conversas com o presidente sobre esses assuntos.

A escolha do STF não significa, entretanto, que haverá chance ainda antes do recesso de fim de ano e das férias de janeiro do Poder Judiciário, de a Corte voltar à composição de 11 integrantes.

Ao que tudo indica, Lula quer ter a primazia de indicar o 8.º ministro do Supremo (um para cada ano de mandato), marca, ao que se saiba inédita, mas deixará a nomeação para ser examinada pelo Senado renovado em dois terços com expressiva maioria governista.

A cada dia aparece um nome aqui e ali, mas os dois mais fortes são o advogado-geral da União, Luís Inácio Adams, e o ministro do Superior Tribunal de Justiça, Cesar Asfor Rocha.

Este último com padrinho forte, o ex-ministro da Justiça Marcio Thomaz Bastos, corria sozinho até que o próprio presidente começou a manifestar o desejo de nomear Adams para a vaga aberta com a aposentadoria de Eros Grau.

Pela lógica das cotações, Adams hoje está mais forte, mas o presidente ouviu ponderações de que não seria aconselhável indicá-lo porque seria o segundo advogado-geral da União (José Roberto Toffoli foi o primeiro) nomeado por ele, mas quem falou não obteve resposta positiva ou negativa.

Quanto a Cesare Battisti, ele fica no Brasil, mediante uma solução jurídica que não agrida a Justiça italiana e atenda ao governo Berlusconi. Vale dizer, que não questione a democracia nem o sistema jurídico da Itália. O encarregado de encontrá-la? Luís Inácio Adams.

Ideologia. Antes de sacramentar sua transferência do DEM para o PMDB o prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, tem detalhes a acertar como, por exemplo, evitar a contestação na Justiça pelo atual partido com base no princípio de que os mandatos pertencem aos partidos.

Pela norma, a desfiliação só se justifica em caso de expulsão ou de fusão de legendas. Por isso Kassab tentou antes que o DEM aceitasse se incorporar ao PMDB.

O problema dele nem é o próprio mandato, pois teria como postergar uma decisão definitiva até o fim de sua gestão. A questão complicada são os mandatos dos seis deputados federais que o prefeito levará consigo para um PMDB cuja bancada paulista limita-se a um parlamentar.

Em tese não haveria razão para o DEM "reclamar seus direitos" na Justiça: uma ala do partido quer vê-lo mesmo pelas costas e outra não tem interesse em lhe criar dificuldades.

Mas, pelo sim pelo não, como o patrimônio é significativo, Kassab pensa em alegar divergências ideológicas agora que o DEM resolve se assumir claramente como "de direita".

O prefeito não pretende alegar ser de esquerda, mas apenas que não concorda com o carimbo.

Cipó de aroeira. A condenação de Paulo Pereira da Silva - o "Paulinho", deputado do PDT e presidente da Força Sindical - por uso irregular dos recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador em 2001, resulta agora de uma investigação da Corregedoria Geral da União que, na época, levou o acusado a chamar a então corregedora, Anadyr de Mendonça, de "mal-amada".

Paulo Pereira era, então, candidato a vice-presidente da República na chapa de Ciro Gomes.

Síntese. No twitter, @saoblack dá palpite no debate de cardeais sobre refundação do PSDB: "Não tem que refundar nada, o PSDB precisa tomar vergonha na cara e resgatar o seu passado".

Pode não ser o jeito mais elegante de dizer a coisa, mas traduz perfeitamente o espírito da coisa.

Lógica da escolha :: Míriam Leitão

DEU EM O GLOBO

Alexandre Tombini tem várias qualidades, mas não está sendo escolhido por elas e sim pela suposição de que será dócil ao comando da Fazenda. Com Miriam Belchior no Planejamento e Guido Mantega na Fazenda, o PT fica forte no governo e, dentro do PT, o que está sendo fortalecido é a turma dos gastadores. O problema é que a inflação está subindo.

O importante não é o nome do presidente do Banco Central, mas sim o princípio da autonomia da instituição. E ela não está garantida, apesar das declarações da presidente eleita, Dilma Rousseff, feitas até agora. Tombini está sendo escolhido na expectativa de que com uma diretoria de funcionários públicos, sem economistas de fora, possa ser fácil executar a ideia de uma coordenação entre o Ministério da Fazenda e o Banco Central.

Tombini é elogiado por ex-dirigentes do Banco Central e por seus colegas: fez uma carreira brilhante e diversificada que foi da fiscalização ao departamento de pesquisas, e ao de normas. Passou três anos no FMI sob o comando de um dos melhores quadros da burocracia brasileira, Murilo Portugal. Mas o que pesou foi o pressuposto de que ele não exigirá respeito à autonomia. Com a inflação subindo e o cenário internacional se complicando, mais cedo do que se imagina o dilema vai se colocar para o governo Dilma.

Henrique Meirelles e, antes dele, Armínio Fraga, administraram com autonomia de fato a política monetária durante os três mandatos em que vigora o regime de metas de inflação. Não existe meia autonomia. Não existe coordenação possível entre Fazenda e Banco Central porque cada um tem que fazer o seu papel. O BC defende a moeda; a Fazenda defende o Tesouro da pressão dos ministérios gastadores - às vezes em aliança com o Planejamento -; e os ministérios setoriais pressionam por mais gastos. Cada um segundo a sua natureza.

Guido Mantega nos últimos dois anos inverteu a natureza da Fazenda e foi o que mais incentivou o aumento de gastos. A racionalidade fiscal tinha algum apoio no ministro Paulo Bernardo. O Banco Central decide por um colegiado do qual há muito tempo Tombini participa, mas tinha a liderança de Henrique Meirelles. Com isso, enfrentou e venceu várias brigas na hora de aplicar o amargo remédio da elevação dos juros diante dos riscos inflacionários.

Guido Mantega não só permaneceu, mas sua equipe está sendo fortalecida. Pelo menos, um dos seus subordinados, Nelson Barbosa, pode ser ministro também. O secretário do Tesouro, Arno Augustin, responsável direto pelas manobras contábeis que tornaram pouco confiáveis os indicadores de superávit primário, foi convidado por Mantega a permanecer. Miriam Belchior é o PAC no Planejamento, com todo o expansionismo fiscal que o plano significou até hoje, incluindo-se alguns projetos de alto risco de estouro das previsões de custo como trem-bala e Belo Monte. O risco fiscal subiu muito com as nomeações feitas até agora para o novo governo.

Apesar dos desmentidos, muito convenientes para a equipe de formação do novo governo, Meirelles foi convidado inicialmente a ficar e a conversa ficou inconclusa. Até que houve a reação furiosa de Dilma Rousseff ao pressuposto da autonomia do BC. O relevante é que se a autonomia estivesse implícita nem Meirelles a reclamaria, nem essa conversa provocaria fúria na presidente eleita, Dilma Rousseff.

Mesmo que venha a dizer que manterá a autonomia e o status ministerial do BC, o que a presidente gostaria era de mudar a forma de operação da equipe. Mas não será possível ao novo governo submeter o BC à Fazenda por um motivo com a qual não se negocia: a realidade. A inflação está subindo forte. O IPCA-15 de ontem foi mais alto do que a mais alta expectativa: 0,86%. A inflação de serviços está em 7,4%. Nos IGPs, a inflação saiu de -2% para quase 10% em doze meses. Há uma conjugação de fatores: preços de alimentos, pressão de cotações de commodities, contratos reajustados pelos IGPs e demanda aquecida. Num relatório da MB Associados analisando cada produto, a maioria tem pressão de alta. Sobram arroz e leite com tendência de queda. Com a demanda aquecida, inflação alta, gastos em expansão e crise externa, qualquer erro cobrará um preço alto do novo governo.

Fruto da tortura deve ser repudiado:: Mauro Malin

DEU NO OBSERVATÓRIO DA IMPRESNSA

Estão cobertos de razão, no caso dos documentos da ditadura sobre a atuação política de Dilma Rousseff, os que impugnam liminarmente tudo que foi obtido sob tortura. Ora, como podem os jornalistas construir reportagens com base no que ficou registrado judicialmente após a militante presa ter sido submetida a torturas? O Estado de S.Paulo, na edição de sábado (20/11), abordou o assunto com propriedade. Tanto na reportagem de Tatiana Fávaro como no comentário de Marcelo Godoy, o contexto em que foi produzida a papelada é colocado em relevo. A Folha de S.Paulo e o Globo, entretanto, tomaram ao pé da letra o legado dos esbirros.

Os três jornais, infelizmente, valorizam o fato de que a torturada tenha revelado isso ou aquilo. Cobrar de um torturado que se mantenha em silêncio (isso era chamado "ter bom comportamento") foi expediente stalinista inaugurado no Brasil pelo PCB.

Muito anos atrás, fiz na França um trabalho universitário sobre a política do Partido Comunista Italiano. Não encontrei, na considerável literatura compulsada, nenhuma "cobrança" em relação a "comportamento" de torturados. Nem na Itália, nem na França, nem em qualquer outro lugar onde agiram a Gestapo e outros organismos de repressão política. Lembro-me de ter comentado várias vezes o assunto com meu amigo Armenio Guedes, veterano dirigente comunista, e ter obtido sempre a mesma resposta: "Depois da guerra, ninguém na Europa se mostrou interessado em discutir quem falou ou não falou sob tortura. Isso não faz sentido."

Lição para as atuais e futuras gerações

A tortura, escreveu um sobrevivente da Gestapo e de Auschwitz, Jean Améry, "é o mais horrível evento que um ser humano pode reter na memória". Quando, portanto, jornais transcrevem "revelações" escritas por algozes, descem aos porões enlameados que eram o universo de eleição dos torturadores.

Em relação ao que Dilma Rousseff possa ter feito ou deixado de fazer ao longo de sua militância, remeto a tópico que escrevi em agosto sobre reportagem da revista Época. Chama-se "Revista ignora a anistia".

O melhor aproveitamento que pode ser dado à documentação sobre Dilma Rousseff é usá-la para denunciar a tortura ‒ ainda em pleno uso contra "presos comuns" ‒ e a repressão política. Essa é a lição que precisa ficar para as atuais e futuras gerações de brasileiros.

A brigada do mensalão atira a esmo:: Elio Gaspari

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

A reforma política pode virar um álibi para requalificar as malfeitorias da quadrilha junto ao STF
O principal objetivo político do comissariado petista para o próximo ano é obter no Supremo Tribunal Federal a absolvição dos companheiros da quadrilha do mensalão.

Se for preciso aprovar uma reforma política que institua o financiamento público das campanhas e amaldiçoe o atual sistema eleitoral, isso será feito. Afinal, obtendo-se a reforma de uma estrutura que se denunciou como podre, pode-se argumentar que as podridões eram inevitáveis.

Segundo as repórteres Vera Rosa e Eugenia Lopes, o comissário José Dirceu disse, ao sair de um café da manhã com Nosso Guia, que, deixando o governo, Lula se dedicará, entre outras coisas a desmontar "a farsa do mensalão". Como fará isso junto ao plenário do Supremo, não se sabe.

É direito dos réus lutar pelas suas absolvições, mas o comissariado do governo parece estar perdendo a sensibilidade política. Há uma semana, o líder do PDT na Câmara, deputado Paulo Pereira da Silva, o Paulinho da Força, propôs numa reunião do Conselho Político que se aprove a legalização dos bingos. Passam-se uns dias e o Ministério Público de São Paulo revela que o deputado, bem como a poderosa central sindical que presidiu, foi condenado em primeira instância a devolver ao erário R$ 235 mil malversados, pagando também uma multa de R$ 471 mil. O litígio não está encerrado e caberá ao Tribunal Regional Federal julgar um recurso do parlamentar.

O comissariado do Planalto estava farto de saber da existência desse processo. Onipotente, achou perfeitamente natural que o incentivo à tavolagem entrasse na discussão no primeiro encontro do Conselho Político. Início de governo estimula a onipotência, mas exageraram.

Durante a campanha de 2002 e nos primeiros dias inebriantes de 2003, um tipo de megalomania primitiva e desonesta criou o mensalão: "Nós devemos a você, você cobra do Marcos Valério, ele toma dinheiro emprestado, nós vamos para o Planalto, um companheiro vai ao Banco Central, levanta a intervenção em dois bancos e o ervanário aparece". (Esqueceram-se de combinar com o russo Henrique Meirelles.)

Há uma forte carga de preconceito quando militantes do sindicalismo dos trabalhadores são nomeados para funções de relevo no governo. Busca-se transformar esse tipo de liderança em estigma. Se o indicado é um representante do sindicalismo patronal, tudo bem. Seu prestígio seria enobrecedor.

A ressurreição da quadrilha do mensalão depende apenas da Justiça e, até certo ponto, da opinião pública. Um governo que acredita na capacidade de mobilização dos sindicatos e entra em campo gritando "Bingo!" acha que pode tudo, em qualquer lugar, à hora que quiser. Engano. Olhado de dentro, o aparelho sindical pode ser lindo. Visto de fora, nem tanto.

Já se foi o tempo em que a morte de um sindicalista como Chico Mendes relacionava-se com uma causa. Nos últimos três anos foram assassinados pelo menos cinco dirigentes sindicais. Três eram tesoureiros de entidades. Em outubro mataram um diretor do sindicato dos motoristas de São Paulo, detentor de uma marca dramática: em 18 anos foram assassinados cinco diretores e sete funcionários do SindMotoristas.

Caso clássico de mais candidatos que vagas:: Rosângela Bittar

DEU NO VALOR ECONÔMICO

São poucos, mas alguns critérios vão se delineando, por adivinhação consensual de assessores da equipe de transição, na formação da equipe do governo Dilma Rousseff. Informa-se que a presidente eleita não gostaria de nomear para o primeiro escalão o político que pretende deixar o governo em 2012 para se candidatar a prefeito. Uma contradição, em termos, pois os políticos querem ir para o governo exatamente para nutrir sua rede eleitoral. Todo presidente pede este compromisso, e muitos políticos o firmam, mas saem quando chega a hora e, se perdem, querem para voltar.

Outro princípio é o de que haverá mais mulheres no governo federal. Na ordem de uns 30%. Como são 37 ministros, pode ser que sejam nomeadas 11 mulheres. Porque 11 e não 8, ou 3, ou 14, não se sabe, a presidente ainda não explicou. Dilma está deixando que o senso comum consolide ideias a respeito de seus planos, sem interferir para não tomar posições ainda.

Um importante princípio que cria expectativa de futuro para muitos é o de que os perdedores das eleições de 2010 não estarão necessariamente fora do poder.

Ainda que não seja de imediato, por absoluta falta de vagas em número proporcional aos candidatos, todos perdedores eméritos, mais dia menos dia haverá abrigo, por exemplo, para Aloizio Mercadante.

Seu mandato de senador está no fim, aceitou uma candidatura de sacrifício ao governo de São Paulo, correndo um risco alto de ficar sem nada. Mercadante já foi citado como Ministro do Desenvolvimento ou da Ciência e Tecnologia.

Outra que partiu para uma candidatura sem chances, com o único objetivo de dar palanque a Dilma, em Santa Catarina, foi Ideli Salvatti. Deve ser contemplada, até porque alia a essa condição a dimensão do gênero. Até Lula lhe é devedor, pois suportou sozinha o revide de um Estado a uma interferência indevida e agressiva do presidente contra adversários políticos.

Ana Júlia Carepa, do Pará, não deve ser deixada à margem, mas é uma dos perdedores do PT cujos casos são complexos. Como o de Minas Gerais. Não se pode dar ministério para um dos três políticos mais importantes do PT no Estado - Fernando Pimentel, Patrus Ananias e Luis Dulci - e deixar os demais ao relento. Uma equação difícil.

Mas se Dilma for dar espaço só aos perdedores do PT, terá problemas sérios na aliança. O PCdoB tem um perdedor insigne, o deputado maranhense Flávio Dino, que disputou o governo com chances de derrotar a oligarquia José Sarney. Foi traído pelo presidente Lula e pela direção do PT, que optaram por sua adversária local, Roseana Sarney (PMDB). O PT maranhense, seu aliado, promoveu até greve de fome no plenário da Câmara para sensibilizar o presidente, sem resultados. Lula e o PT nacional ficaram com os Sarney, e por milésimos Roseana venceu uma eleição que, se tivesse ido ao segundo turno, era de Flávio Dino.

Há o grande derrotado do PDT, Osmar Dias, que disputou o governo do Paraná para dar palanque a Dilma Rousseff e concordou em deixar a vaga do Senado para Gleisi Hoffmann (PT). O PDT quer, para Dias, a presidência de Itaipu Binacional. O PDT pretende, ainda, compensar Vilma Faria (RN), que também disputou em um Estado onde Lula investiu pessoalmente, com apelos à emoção, contra seus adversários do DEM. Não levou, mas deu força nova à resistência da oposição.

Mais uma dívida de campanha é Alfredo Nascimento (PR), que perdeu as eleições depois de ser o titular de uma confiança extraordinária do presidente e da então chefe da Casa Civil e coordenadora do PAC, como ministro dos Transportes.

Do PMDB, e de Minas, vem o perdedor Hélio Costa, que naufragou junto com o PT do Estado. Pode-se alegar que Lula perdeu tudo para Aécio Neves (PSDB), o governo e as duas vagas ao Senado. Mas devem os aliados contra argumentar que foi a luta da aliança PMDB-PT que manteve Dilma no topo, em Minas, não permitindo o avanço de Aécio também na presidencial.

Tem, ainda, no PMDB, Paulo Hartung, governador do Espírito Santo que viabilizou a vitória integral do governo no Estado, inclusive abdicando da própria candidatura. Iris Resende, de Goiás, renunciou à prefeitura para lutar por Lula contra os que o presidente apontou como inimigos, mais que adversários, do PSDB goiano. E o que dizer de José Maranhão (PB), Lula total, lulismo em pessoa? E Jorge Picciani (RJ), que conduziu uma campanha ao Senado, pelo Rio, em que, embora tenha perdido, logrou o terceiro lugar deixando para trás o ex-prefeito Cesar Maia, desafeto dos governos federal e estadual?

O esforço pré-eleitoral de Lula e Dilma conferiu êxito à candidata do PT. A expectativa dos aliados é que ambos façam, agora, um esforço pós-eleitoral, já que decidiram o mais difícil, não vetar perdedores.

Henrique Meirelles foi demitido do Banco Central, depois de bons serviços prestados ao governo, inclusive durante o período eleitoral, por recado de assessores à imprensa enquanto estava em viagem ao exterior, representando o Brasil em reuniões da área monetária. Modalidade de corte inaugurada pelo presidente Lula que, exatamente assim, no seu primeiro mandato, afastou o então ministro da Educação, o senador Cristovam Buarque, na época em viagem ao exterior para contatos com autoridades da área na Europa. O nome do método é fritura com humilhação.

A migração do prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, do DEM para o PMDB, em delicada fase de negociação, está deixando o PT paulista eufórico com a perspectiva de, finalmente, ter instrumentos para quebrar a longeva continuidade do sucesso eleitoral do PSDB no Estado. Como Kassab irá com todo o seu grupo de deputados federais e, sobretudo, estaduais, e sai exatamente para ter legenda a fim de enfrentar Geraldo Alckmin em 2014, o PT comemora antecipadamente a condição ideal, do ponto de vista numérico, de criar Comissões Parlamentares de Inquérito.

As CPIs, sempre barradas pela maioria governista em São Paulo, contariam, na matemática do PT, a partir da migração de Kassab, com a assinatura de 33 deputados.


Rosângela Bittar é chefe da Redação, em Brasília. Escreve às quartas-feiras

Unir o Brasil partido em bandas, desafio de Dilma :: José Nêumanne

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Em 2006, o fantasma da disputa do segundo turno contra Geraldo Alckmin, do PSDB, levou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva a "apelar". Tido como carta fora do baralho por culpa do "mensalão", mas depois favorito nas pesquisas, Sua Excelência contava com a vitória certa no primeiro turno e ela não veio. Foi aí que sacou do punho a carta decisiva para esmagar os adversários que nunca conseguiu desalojar do poder no Estado mais rico e mais populoso da Federação, São Paulo: o ressentimento do pobre contra o abonado, a inveja que o Zé Mané tem do seu sinhô dotô. Nunca antes na história deste país uma estratégia foi tão bem-sucedida. O mapa colorido do resultado das apurações publicado nos jornais não deixou dúvidas de que o Brasil que financia o Estado, pintado de azul, foi vencido pela banda vermelha, sustentada pela "viúva".

Institucionalmente, o mapa de duas cores nada representa. Lula teve mais votos do que Alckmin e se tornou presidente dos "dois Brasis". Fruto de sua argúcia e da enorme capacidade que tem de interpretar os anseios do povo, a estratégia deu resultado na contabilidade total dos votos. Mas produziu um efeito cascata difícil de explicar e, depois, quando necessário, de abortar. Não se trata de uma "secessão", como a que provocou a guerra civil nos Estados Unidos depois que Abraham Lincoln pôs termo à escravidão. Trata-se de algo mais profundo, mais longevo e muito mais perigoso. A semente da discórdia plantada pelo mais popular presidente da História de nossa nada exemplar República faz brotar erva daninha por todo o território nacional, sem que ele mesmo se tenha dado conta. Nem seus adversários.

Sim: José Serra, o candidato tucano que enfrentou o "poste" petista de Lula em 2010, pode até ter ouvido o galo cantar, mas nunca teve a mínima noção do lugar onde ele bateu as asas. O líder máximo, que despiu a faixa presidencial para se tornar cabo eleitoral do próprio capricho, nunca teve exata noção dos efeitos maléficos de seu investimento no difuso ressentimento social e regional do brasileiro. Da mesma forma, o ex-governador de São Paulo permitiu que sua campanha abrigasse uma reação com idêntico potencial de ódio. Para eleger a favorita o ex-líder sindical investiu contra a zelite, neologismo rastaquera que tem seu valor de face: zero. Para se contrapor ao apelo popular da inveja odienta do sucesso do outro, o ex-dirigente estudantil da esquerda se omitiu, deixando prosperar à sombra de sua candidatura a mesma sementeira de ignorância e truculência.

É isso aí. Engana-se quem pensa que preconceito é uma pretensa manifestação de superioridade. Nada disso. Muito antes pelo contrário, é o atestado cabal da ignorância de quem se considera (ou até se sabe) inferior ao alvo de seu ódio sem explicação racional cabível. O demagogo austríaco Adolf Hitler usou de sua astúcia e de sua falta de escrúpulos para explorar o que havia de mais podre e rasteiro nos porões da civilização alemã, cuja cultura produziu Goethe e Marx, Kant e Bach, Beethoven e Schiller. O holocausto dos judeus pelo regime nazista foi a mobilização do ódio provocado nas massas famintas alemãs pela capacidade de sobreviver e prosperar nas piores circunstâncias exibida pelos filhos de Israel. Os turcos são discriminados na Alemanha de hoje, 70 anos após a eclosão do grande conflito mundial, pela ameaça que sua presença significa para os nativos empobrecidos na ocupação de empregos num mercado cada vez mais competitivo.

Mayara Petruso, a universitária de classe média residente no Sudeste que sugeriu a leitores de seu twitter que afoguem nordestinos para vingar a derrota imposta pela mineira ao paulistano nas urnas eletrônicas dos grotões sertanejos, não pretendeu eliminar seres inferiores. Os vários manifestos de orgulho pau de arara que tentaram na internet responder à ofensa choveram no molhado, apesar de chuva e solo úmido serem raros no Semiárido. É inócuo rebater os argumentos dela com exemplos de gênios da estirpe de Euclides da Cunha, Gilberto Freire, Augusto dos Anjos e Jorge de Lima, entre outros, por duas razões. É difícil imaginar que uma estudante do ensino superior se proponha a um genocídio, ainda que virtual, se houver na vida lido uma linha de algum tipo aproveitável de literatura. Mas, ainda assim, algo que pode ser atribuído à intuição feminina deve repetir no fundo de sua crassa ignorância a superioridade intelectual e moral destes titãs sobre os ídolos que encantam a própria mediocridade.

A srta. Petruso e os energúmenos que ecoaram propostas de teor semelhante, acobertados pelo silêncio cúmplice da oposição, esmagada eleitoralmente pelo iniciador desse movimento de segregação, que contrariou sua missão constitucional de garantir a unidade nacional, são sintomas de um mal maior. E esse mal parece recrudescer em episódios isolados, mas similares, como a agressão de um grupo de jovens por homófobos, de madrugada, na Avenida Paulista, e um tiro num manifestante da Parada Gay no Rio de Janeiro. Como os preconceitos de origem regional, racial ou de opção religiosa, a homofobia é uma manifestação de ignorância das evidências científicas da tediosa similitude entre seres humanos, animais espantosamente repetitivos em relação aos outros. E expressa ainda um temor que a psicanálise explica: no fundo, o homófobo teme a tentação da opção sexual que rejeita a pauladas.

O arrazoado acima foi exposto para preceder um apelo à presidente eleita, Dilma Rousseff. Ao agradecer à militância do Partido dos Trabalhadores (PT) pelo duro trabalho de elegê-la, ela disse que será presidente de todos os brasileiros, e não apenas dos que nela votaram. Tal verdade contém profunda sabedoria. Oxalá prenuncie que, não conseguindo patrocinar a união, ela contribua para restaurar a unidade nacional, que seu patrono debilitou para obter os triunfos dele e dela nos idos de outubros.


Jornalista e escritor, é editorialista do "Jornal da Tarde"

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Jarbas promete oposição a Dilma

DEU NO VALOR ECONÔMICO

Raquel Ulhôa De Brasília

No primeiro discurso no Senado após ser derrotado nas eleições para o governo de Pernambuco, o senador Jarbas Vasconcellos (PMDB-PE), dissidente do seu partido e aliado do candidato derrotado a presidente, José Serra (PSDB), prometeu ontem fazer oposição ao governo de Dilma Rousseff (PT) na mesma postura adotada pelo pemedebista na gestão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Com duros ataques ao petista, Jarbas sugeriu que a sucessora, Dilma, mantenha "uma relação de respeito com a oposição, que busque uma convivência republicana, sem tentativas de cooptação ou de acordos de gabinete, que não pregue o extermínio daqueles que pensam de forma diferente, pois, sem oposição, não há democracia". Jarbas também anunciou que não vai se "intimidar" com a maioria governista na Casa a partir de fevereiro.

O senador disse que Lula não realizou as reformas institucionais que considera prioritárias, especialmente a política e a tributária. Criticou os "abusos" cometidos por Lula na campanha, que, segundo ele, atuou como "chefe de uma facção e não como o presidente de todos os brasileiros".

"O presidente da República usou e abusou da popularidade para eleger Dilma. Lula montou um palanque móvel antes do prazo legal e com ele percorreu todo o Brasil. O presidente desrespeitou a legislação eleitoral para viabilizar a vitória da candidata do PT. Fez uso exagerado da máquina do governo, atacando a oposição e pregando o extermínio dos seus adversários."

Jarbas disse que o país "andou para trás" nas questões políticas, eleitorais e partidárias. O senador defendeu a gestão de Fernando Henrique Cardoso e Itamar Franco, dizendo que o PT encontrou uma economia estabilizada pelo Plano Real, com a dívida dos Estados renegociada, a implantação da Lei de Responsabilidade Fiscal e o saneamento do sistema bancário promovido pelo Proer.

"O que existe em comum nessas medidas, além de terem sido implantadas nos governos Itamar e FHC? O Partido dos Trabalhadores votou contra todas elas. A oposição parlamentar mais radical que existiu na história recente do Brasil foi exercida pelo PT."

Jarbas avaliou que a próxima legislatura terá a maior fragmentação partidária da história da República, com 22 partidos com representantes na Câmara dos Deputados. Esse cenário, segundo ele, impede a realização de uma reforma política - tema pelo qual afirmou que lutará nos próximos quatro anos, quando permanecerá no Senado.

Difícil, mesmo, é frear o apetite do PMDB

DEU NO CORREIO BRAZILIENSE

Antes de ser anunciada a equipe econômica, partido do vice-presidente testa a influência do "blocão" em outras áreas. Intenção é demover Dilma da ideia de entregar os ministérios da Saúde e das Comunicações a petistas

Denise Rothenburg e Leandro Kleber

Os obstáculos que a presidente eleita, Dilma Rousseff, enfrentou para escolher os responsáveis mais diretos pela política econômica do governo (leia mais na página 3) são pequenos perto do que está por vir. Na fase em curso, a de escolha dos ministros dos partidos combinada com aqueles cargos em que ela deseja nomear pessoas de sua estrita confiança, Dilma começa enfrentando resistência do PMDB, que não aceita ceder os ministérios das Comunicações e o da Saúde. Isso mesmo que os titulares cotados para as pastas sejam nomes ligados diretamente à presidente Dilma, como o chefe da transição, Antonio Palocci, e o atual ministro de Relações Institucionais, Alexandre Padilha. Mas Dilma, por enquanto, não se mostra disposta a ceder. Ontem, por exemplo, ela se reuniu com o presidente do PSB, Eduardo Campos, considerado na transição como alguém que pode auxiliá-la na operação de enquadramento do PMDB.

Depois que Palocci apareceu cotado para ocupar as Comunicações e Padilha, a pasta da Saúde, os peemedebistas deflagraram a reação. O primeiro movimento visível saiu ontem, da reunião dos governadores (leia mais na página 7) na casa do presidente da Câmara, Michel Temer, vice-presidente eleito. Quando lhe foi dada a palavra para falar em nome do PMDB, o deputado Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) anunciou que representava naquele momento o bloco PMDB, PP, PR, PTB e PSC. “Recebemos muitos ‘elogios’ no fim de semana, mas queria comunicar que estamos aqui, num bloco, de forma amadurecida e responsável, para ajudar”, afirmou, referindo-se às críticas que Lula fez ao bloco na semana passada e à afirmação feita pelo presidente do PT, José Eduardo Dutra, na entrevista ao Correio, de que a operação havia sido “atabalhoada”.

A retomada do bloco pegou os petistas de surpresa. Para assessores próximos, foi a forma que Alves encontrou de levar a presidente eleita a pensar duas vezes antes de decidir reduzir o espaço do PMDB no que se refere à Esplanada dos Ministérios. Por enquanto, o partido de Temer só não encrencou com os cargos da área econômica e, ainda, com aqueles exclusivos do Palácio do Planalto — para onde vai o atual ministro do Planejamento, Paulo Bernardo.

Barganha

Para ceder Comunicações ou Saúde, o PMDB deseja uma compensação à altura. Serviria, por exemplo, a Previdência Social, hoje nas mãos do PT. O problema é que a presidente eleita não deseja lotear a Previdência, para onde o secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Nelson Barbosa, que terminou fora do Banco Central, também aparece cotado. O vice-presidente eleito, Michel Temer, que tem participado das conversas de escolha de ministros, tem procurado se manter como um conciliador da briga a tentado assumir o papel institucional que lhe cabe no futuro governo. Ainda assim, não deixa de levar à equipe de transição as preocupações de sua legenda. Ontem, por exemplo, se reuniu com Dilma para tratar dessa segunda fase da montagem da equipe.

A conversa entre Temer e Dilma foi antes do encontro da presidente eleita com o presidente do PSB, Eduardo Campos. Na saída, Campos foi evasivo ao falar do espaço de seu partido no governo. “Queremos ajudá-la a montar a melhor equipe, que funcione e dê condições para fazer uma grande gestão. Esse é o comportamento que o PSB deve ter”, comentou. O PSB, entretanto, já avisou que gostaria de ocupar a Integração Nacional, outro espaço que hoje está nas mãos do PMDB.

Enquanto Dilma ouve os presidentes dos partidos e conversa com os ministros escolhidos, seus escudeiros consultam os políticos para saber se alguns ministros atuais representam efetivamente os partidos em que estão inscritos. Ontem, por exemplo, houve contatos com integrantes do PV para saber se o ministro Juca Ferreira, da Cultura, representa o interesse da bancada. “A Cultura não é do PV, nunca foi. A maioria dos deputados nem conhece o ministro. Quem tem cargo no governo hoje é pessoal”, comentou o deputado Fábio Ramalho (PV-MG).

STJ absolve Palocci

Os ministros da 1ª turma do Superior Tribunal de Justiça decidiram, ontem, rejeitar um recurso do Ministério Público de São Paulo contra o ex-prefeito de Ribeirão Preto (SP) Antonio Palocci. O relator, ministro Teori Zavascki, entendeu que não havia elementos suficientes para dar consistência ao argumento do MP. Palocci já tinha sido absolvido na primeira e na segunda instâncias.

O MP sustentava que o ex-ministro de Lula, nome forte da transição de governo de Dilma Rousseff , teria autorizado a contratação de serviços de informática sem licitação durante sua gestão em Ribeirão Preto.

Política industrial do governo Lula fecha o ano sem cumprir as principais metas

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Em meio à ameaça de desindustrialização, governo faz um balanço dos erros e acertos e discute novo plano para Dilma Rousseff

Alexandre Rodrigues / RIO

Criada em 2008 para coordenar as ações do governo de incentivo à indústria, a Política de Desenvolvimento Produtivo (PDP) deve terminar 2010 sem cumprir as quatro principais metas para este ano. Em meio à ameaça de desindustrialização identificada pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, o governo faz um balanço dos erros e acertos da política industrial da era Lula e discute novo plano para Dilma Rousseff.

Em vez dos 21% do Produto Interno Bruto (PIB) estabelecidos pela principal meta da PDP, a taxa de investimento fixo na economia deverá fechar 2010 perto de 19% do PIB. A elevação do gasto privado com pesquisa em desenvolvimento, que a segunda meta fixava em 0,65% do PIB, deve se manter em 0,5%.

Outro objetivo, o aumento de 10% no número de micro e pequenas empresas exportadoras, foi prejudicado pelo câmbio desfavorável. Em 2009, houve queda de 4%.

A quarta meta, a de elevar a participação das exportações brasileiras a 1,25% do total mundial, pode até ser alcançada, especula Reginaldo Braga Arcuri, presidente da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI).

A fatia do Brasil nas exportações mundiais pode chegar a 1,35%, mas puxada por produtos primários, que tomaram a liderança dos manufaturados na pauta. Mesmo com a previsão de crescimento de 27% das exportações este ano, a conta deve fechar abaixo do nível de US$ 208 bilhões projetados pela PDP em 2008.

"As metas não servem apenas se foram cumpridas. Servem mais para definir de onde se parte e onde se quer chegar, além de aprender com o que acontece no caminho. Guiam as ações, criam parâmetros de avaliação e dão ao setor privado uma visão clara de para onde o governo quer direcionar o País", diz Arcuri, que participa da secretaria executiva da PDP com representantes de outros órgãos, como o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e o Ministério da Ciência e Tecnologia sob a coordenação do Ministério do Desenvolvimento.

Para o governo, as metas foram frustradas pela crise mundial, desencadeada pouco depois do lançamento da atual política industrial.

Escalada. Foi essa a explicação que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ouviu do BNDES, principal instrumento do plano. A recuperação da taxa de investimento, a principal meta da PDP, foi o motivador da recente escalada de desembolsos do BNDES.

Turbinadas por empréstimos do Tesouro, as liberações do banco saltaram de R$ 92,2 bilhões em 2008 para R$ 137 bilhões em 2009 e devem ultrapassar R$ 146 bilhões este ano, com ênfase no financiamento de bens de capital. Mesmo assim, só foi possível até agora recompor o nível de 2008 do investimento. Segundo projeções do banco, a meta de 21% do PIB só será superada entre 2012 e 2013.

"A crise internacional não é nenhuma desculpa, é um fato concreto. Na formulação da PDP, todas as curvas estavam com vetores para cima e eles caíram perpendicularmente", diz o presidente da ABDI. "A recuperação em V mostra que os fundamentos da economia estão sólidos. Houve a retomada da trajetória anterior, mesmo que não tenhamos a recuperação em números absolutos."

O governo ainda não fechou um balanço das metas da política industrial, cujos resultados só devem ser medidos no início de 2011. No entanto, técnicos dos órgãos envolvidos nas ações da PDP trabalham num relatório de avaliação do que foi conseguido até agora. O documento deve ser entregue pelo ministro do Desenvolvimento, Miguel Jorge, à presidente eleita, Dilma Rousseff, com sugestões para a formulação de uma política industrial para o novo governo.

Além de reformular as metas, a ideia é intensificar a interação com o empresariado e agregar categorias como a cadeia produtiva do trigo, a indústria de brinquedos e a de eletrônicos de consumo (como televisores, celulares e aparelhos de som) aos setores econômicos definidos como prioritários pela PDP.

Nos últimos dois anos, setores como os de carnes, software, petroquímica e fármacos receberam incentivos do governo para financiar investimentos, internacionalização e operações de consolidação.

PARA ENTENDER
Segundo plano industrial falha, mas continua

A PDP foi o segundo plano industrial do governo Lula. Deu lugar à Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior (PITCE), de 2004, ao estabelecer um sistema de metas que guiou a articulação entre órgãos de governo e o meio empresarial em favor da competitividade da indústria. A avaliação no governo é de que, mesmo sem atingir as metas, a PDP foi um instrumento acertado, que deve ser reproduzido na gestão Dilma. A determinação para que a proposta de um novo plano fosse deixada para a próxima gestão veio da própria presidente eleita, ainda como ministra da Casa Civil. O pedido foi reiterado pelo presidente Lula ao BNDES, numa reunião na sede do banco em abril.

Unica pede a Lula pressão por Código Florestal

DEU NO VALOR ECONÔMICO

Ana Paula Grabois De Ribeirão Preto (SP)

Com receio de perder o apoio do governo na gestão Dilma Rousseff, os usineiros pediram ajuda do presidente Luiz Inácio Lula da Silva para aprovar no Congresso ainda em 2010 o novo Código Florestal. Ontem, em assinatura de contrato para a construção de rede de dutos de etanol pela Petrobras e o setor privado, Marcos Jank , presidente da maior entidade do setor, a União da Indústria da Cana (Unica), pediu interferência de Lula para que as alterações no Código Florestal passem ainda em 2010. Para Jank, é preciso "urgentemente" de solução definitiva para o tema da reserva legal, que "ameaça milhares de hectares de cana".

Jank defende a votação do relatório do deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP) ainda neste ano, antes da mudança de cadeiras no Congresso. Para o presidente da entidade, o tema já foi muito debatido. "Os conflitos decorrentes da aplicação do código geram insegurança e mudanças devem ser feitas à Câmara e ao Senado. Não podemos voltar à estaca zero. Temos a posse da nova presidente. Obrigado, presidente, se o senhor puder nos ajudar", disse Jank, durante a cerimônia de assinatura de contrato de construção de uma rede de dutos de etanol pela Petrobras - da qual também participou o presidente da empresa, José Sergio Gabrielli -, em conjunto com empresas privadas.

O relatório do deputado Aldo Rebelo fixa mudanças em linha com as demandas do setor, como a redução de áreas de reserva legal e anistia às multas impostas a desmatadores e a flexibilização da produção agropecuária em áreas de proteção permanente.

A pressão ambiental contra o Código é crescente. Estudo do Observatório do Clima, divulgado ontem, indicam que as alterações no Código Florestal, propostas pelo deputado Aldo Rebelo podem representar a emissão de até 26 bilhões de toneladas de gases de efeito estufa e comprometer a meta brasileira de reduzir entre 36,1% e 38,9% as emissões nacionais até 2020.

Às vésperas de uma nova rodada da negociação climática internacional, que começa na segunda-feira em Cancun, no México, o documento analisa os impactos de duas das principais propostas do novo código para os compromissos de redução de emissões assumidos internacionalmente pelo Brasil.

No evento em Ribeirão Preto, os discursos dos representantes do setor de açúcar e álcool foram recheados de elogios ao presidente Lula. Nos oito anos, a safra de cana dobrou, a produção de açúcar subiu 70% e a de etanol mais que dobrou, com ganhos de produtividade e elevação do volume de exportações. O presidente também foi lembrado pela promoção do etanol no exterior, especialmente nas tratativas do Brasil para evitar a renovação dos subsídios e da tarifa cobre o etanol importado pelos Estados Unidos. "Em 30 anos de história de renovações automáticas, nunca se esteve tão perto da possibilidade da quebra ou pelo menos da redução desse protecionismo", disse Jank.

Em seu discurso, Lula disse ter certeza que 99% dos usineiros não votaram nele quando foi eleito pela primeira vez, em 2002. Hoje, se diz o melhor presidente para o segmento, antes tratado pelos governantes "como uma doença". "Nunca perguntei, mas tenho certeza que quando fui candidato em 2002, 99% votaram contra mim, por medo de mim. Não sei quantos votaram em mim já em 2006, não sei quantos votaram na Dilma em 2010. Mas hoje eu posso chegar em qualquer lugar deste país, do Nordeste ao Sudeste ao Centro-Oeste, pode até ter usineiro que não gosta e que não vota, mas ele terá que olhar para mim e dizer: "Ô baixinho, tu foste o que melhor cuidou da gente e o que melhor respeitou a gente, que nos tratou como cidadãos"". Lula citou ainda sua política de valorização do segmento, como o aumento da oferta de crédito, o empenho em tornar o país líder na produção de etanol.

O presidente negou ainda que exerça algum tipo de interferência sobre a equipe da presidente eleita Dilma Rousseff. "Ela indica quem ela quiser e o cargo que ela bem entender", disse. O presidente afirmou que não deixa "herança maldita" para Dilma, termo usado por petistas para criticar o governo de seu antecessor, Fernando Henrique Cardoso. Segundo Lula, a única herança maldita está fora do país, em referência à crise econômica na União Europeia e nos Estados Unidos. "Tem uma herança delicada à medida que a União Europeia e os Estados Unidos não resolveram ainda seus problemas da crise. Não podemos aceitar o fato de os Estados Unidos quererem fazer seu ajuste interno com base na produção de dólares e mais dólares. Sabem que não vai resolver o problema deles, vai causar inflação e vai encher o mundo de dólares, o que vai causar problema em outros países" , disse o presidente.

Lula disse ainda que logo depois de encerrar os oito anos na Presidência, a primeira coisa que vai fazer será "desencarnar do cargo para voltar a agir dentro da normalidade". "Não tem nada pior do que um jogador de bola parar de jogar e pensa que ainda está jogando ou ainda de quem foi presidente ter papel de ex-presidente", disse em entrevista antes de deixar Ribeirão Preto. As obras do sistema de dutos só devem ficar prontas em 2014 e consumirão R$ 5 bilhões. Além da Petrobras, participam do projeto de dutos as empresas Cosan, Copersucar, Uniduto e Camargo Corrêa.

Estados tentam adiar para 2015 a desoneração

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Lu Aiko Ota

Os governadores decidiram fazer pressão sobre o Congresso, também, para conseguir ainda este ano a aprovação de um projeto de lei complementar que adia para 2015 a entrada em vigor da desoneração do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sobre a compra de bens de consumo, energia elétrica e telefonia por parte das empresas. Em tese, ela vigora já no dia 1º de janeiro.

"É para evitar que os Estados tenham perdas de R$ 19,5 bilhões", disse o recém-eleito governador paulista Geraldo Alckmin em reunião com a bancada paulista, em Brasília. "Isso deve ser discutido no bojo de uma reforma tributária mais ampla."

A Lei Kandir é mais conhecida por retirar a incidência do ICMS sobre a exportação de produtos básicos e semielaborados. Esse dispositivo já está em vigor e é a razão por que o governo federal repassa, todo ano, verbas aos Estados. Para 2011, o valor transferido deve ser de R$ 3,9 bilhões.

O que os governadores querem adiar é a possibilidade de as empresas transformarem em crédito a seu favor o ICMS pago nas contas de luz e telefone e na compra de material de uso e consumo. Só em São Paulo a perda do Estado chegaria aos R$ 700 milhões sobre as contas de telefone das empresas e R$ 600 milhões na eletricidade. Contando com os bens de consumo, a conta ultrapassa R$ 7 bilhões.

A movimentação dos governadores antecipa a dificuldade que a presidente eleita, Dilma Rousseff, terá em conduzir a prometida reforma tributária.

Lula agora inaugura até solda de tubulação

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Presença em canteiros de obras ainda não concluídas marca agenda de final de governo

Tânia Monteiro, Leonencio Nossa / BRASÍLIA

Depois de esgotar na campanha eleitoral as oportunidades de lançamento de pedra fundamental e início de terraplenagem de obras, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva iniciou ontem uma nova safra de viagens. Ele esteve no final da manhã em Ribeirão Preto (SP) para dar o "primeiro pingo de solda" na tubulação de escoamento de álcool de cidades da região e de Goiás para usinas de Paulínia e Taubaté.

Até o final do ano e do mandato, Lula terá uma agenda movimentada. Mesmo sem poder concluir obras, ele pretende participar do maior número possível de eventos em canteiros do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). A seus auxiliares, o presidente repete que não quer viver a sensação de final de festa.

A agenda inclui viagens especialmente para a Região Nordeste, onde ele não conseguirá entregar as mais importantes obras de infraestrutura de seu governo. Governadores e prefeitos aliados do presidente preparam uma série de homenagens. Não faltarão lágrimas, dizem os auxiliares do presidente.

Lula percorrerá pela última vez no cargo trechos dos canais de transposição das águas do Rio São Francisco, no sertão pernambucano. A água ainda não chegou às comunidades que enfrentam o problema da seca, mas o presidente quer mostrar ao menos seu esforço para concluir as obras.

Além das obras da transposição, o presidente deixa o governo frustrado por não entregar as ferrovias Transnordestina, que ligará os portos de Pecém (CE) e Suape (PE), e a Leste-Oeste, que começa em Figueirópolis, no Tocantins, e termina em Ilhéus (BA).

As viagens de Lula ao Nordeste na reta final de governo se justificam só pelo caráter "sentimental", dizem assessores.

Isso ficará ainda mais claro, segundo eles, numa viagem que Lula fará ao Recife, no dia 29 de dezembro. Ele participará da inauguração de um museu dedicado ao músico Luiz Gonzaga, o Rei do Baião. Lula ainda mantém a promessa de ir a Guaribas (PI), onde lançou o Fome Zero.

PARA LEMBRAR

Alcoolduto foi lançado em 2007

Em maio de 2007, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi a Uberaba, no Triângulo Mineiro, para assinar um "protocolo de intenções" para o início das obras do alcoolduto que passará por cidades de Goiás, São Paulo e Minas Gerais. Lá, ele surpreendeu empresários e prefeitos ao não assinar o protocolo. O Planalto não tinha preparado a proposta.


Três anos e meio depois, o projeto continua na lista de intenções. O que mudou foi o valor estimado para sua construção. Inicialmente, o governo previa gastar R$ 4,1 bilhões. Agora, o gasto estimado chega a R$ 5,7 bilhões.

Como o início da obra estava atrasado, os assessores do governo planejaram para ontem uma "solenidade da solda". Um deles explicou que não era possível realizar, neste caso, mais uma visita para lançar pedra fundamental ou assinar papéis. Aimagem das faíscas de solda dá ideia de obra em andamento, avaliou um auxiliar do presidente.

A obra do alcoolduto ainda vai começar. Na avaliação dos assessores o "ato do primeiro pingo" atende de forma "elegante" à demanda do presidente, que não quer dar mostras de fim de governo e pretende viajar até o último dia de mandato.

Pela tubulação será escoada a produção de etanol de Senador Canedo, em Goiás, até Paulínia, São Paulo. Estão previstos projetos de grupos do setor sucroalcooleiro para a área onde passará a tubulação. A licença ambiental foi emitida em outubro pelo Ibama. Estima-se que até o final de 2011 estará concluído um trecho de Paulínia a Ribeirão Preto. Não há previsão de conclusão total do projeto.

Inflação em alta agora e também em 2011

DEU EM O GLOBO

Pressionado por alimentos, IPCA-15 sobe 0,86% este mês e mercado vê preços em patamar elevado no ano que vem

Fabiana Ribeiro

Após um ano com preços em alta - até outubro, a inflação acumula alta de 4,38% e deve fechar 2010 em 5,60% -, 2011 não promete alívio ao orçamento dos brasileiros. A inflação deverá ficar em torno de 5,15%, segundo projeções do mercado, portanto inferior à de 2010, mas, ainda assim, acima do centro da meta estabelecida pelo governo, de 4,5%. Ontem, o IBGE informou que Índice de Preços ao Consumidor Amplo-15 (IPCA-15, similar ao IPCA, usado nas metas do governo, porém com período de coleta entre os dias 15 de cada mês) subiu 0,86% este mês, bem acima das expectativas dos analistas, que eram de 0,72%.

- Ainda que a inflação de 2010 seja maior, o ano que vem seguirá com uma inflação num patamar alto. As expectativas não seriam tão altas se o Banco Central (BC) já tivesse começado a subir a taxa de juros da economia - disse Luis Otávio Leal, economista-chefe do banco ABC Brasil.

Com o resultado divulgado ontem, o IPCA-15 acumulado em 12 meses está em 5,47%, quase um ponto percentual acima da meta de inflação.

Além de alimentos, vestuário e combustíveis pressionam

Mais uma vez, os alimentos puxaram o avanço dos preços frente a outubro (0,62%), mas não foram o único vilão. Combustíveis (2,22%) e vestuário (1,17%) também contribuíram para a formação do índice.

O consumidor passou a pagar 6,10% a mais pelo quilo de carne - item que ficou na dianteira dos principais impactos, com 0,14 ponto percentual do IPCA-15 de novembro. No ano, os preços das carnes já subiram 20,49%. No Rio, por exemplo, o quilo do filé mignon está saindo a R$44,90 no Zona Sul. Já o feijão carioca aumentou 10,83% no mês e mais do que dobrou de preços este ano (105,48%). No Rio, o preço médio do feijão está a R$2,74, bem acima dos R$2,26 de um ano atrás, segundo a Fecomércio-RJ.

Em novembro, altas expressivas foram registradas ainda no custo de açúcar cristal (14,05%), tomate (10,28%), batata-inglesa (9,96%), feijão preto (7,15%), farinha de trigo (5,76%) e açúcar refinado (4,50%).

- Quebra de safras, secas, problemas estruturais na pecuária brasileira ajudam a explicar a alta dos preços dos alimentos agora. Os preços, contudo, devem ceder nos próximos meses e no início de 2011 - acredita Fábio Romão, economista da LCA, acrescentando que as commodities em alta também refletem especulações do mercado financeiro.

Na casa de Adriana Martins, a carne é comprada apenas quando há promoções e, por isso, vem sendo substituída por cortes de frango.

- Não dá mesmo. Optamos por outros alimentos, como nugget e hambúrguer e até peixe. Proteína é importante, pois temos crianças em casa. Mas está tudo muito caro - comentou Bruno Martins, que acompanhou a mãe no supermercado ontem.

Nos cálculos de Romão, o IPCA de 2010 deve ficar em 5,80%, já os preços dos alimentos devem subir 10%. Em 2011, prevê, a inflação ficará em 4,80% e os alimentos subirão 5,70%.

- Também há a influência do mercado de trabalho. Os números do emprego começam a perder o fôlego. E o reajuste do salário mínimo pode ser em 2011 de 1,4%, abaixo da média de 6% em 2010 e 2009. Com menos renda, a pressão sobre os preços é menor - concluiu Romão, que acredita na necessidade de um ajuste na Selic em 2011, de 0,75% a dois pontos percentuais em relação ao nível atual (10,75% ao ano), caso não se verifiquem desacelerações nos gastos do governo e nos desembolsos do BNDES.

Economista sugere ajuste fiscal para segurar preços

O professor Antônio Correa de Lacerda, da PUC-SP, acredita que os preços dos alimentos vão se "acomodar" no ano que vem. Para ele, há uma bolha nas commodities, mas outros fatores influenciam na inflação brasileira:

- Ajustes na área fiscal ajudariam a combater a inflação - disse o Correa de Lacerda, para quem subir os juros pode apreciar o câmbio. - Isso traria mais problemas.

Leal, no entanto, diz que a alta nos juros seria um remédio necessário para conter a inflação. E lembra que, no ano que vem, o câmbio deve ser menos favorável à inflação do que o atual.

- O ideal seria subir os juros o quanto antes. Postergar essa decisão só aumenta o problema. É como se o BC fosse, mais tarde, tratar de uma pneumonia e não mais uma gripe.

O aumento do IPCA-15 puxou ontem os juros negociados na Bolsa de Mercadorias & Futuros (BM&F). Entre os contatos mais líquidos, os com vencimento em abril de 2013 subiram para 10,91%, ante 10,84% do fechamento de segunda-feira.

Colaborou Bruno Villas Bôas

Equipe econômica com a cara de Lula

DEU EM O GLOBO

A presidente eleita, Dilma Rousseff, anuncia hoje a equipe econômica. Mais próxima do presidente Lula do que de Dilma, terá Guido Mantega (Fazenda), A1exandre Tombini (Banco Central) e Miriam Belchior (Planejamento).

Equipe econômica com a mão de Lula

Futuros nomes da área, como Mantega, Miriam Belchior e Tombini, não estavam no desenho original de Dilma

Gerson Camarotti, Patricia Duarte e Eliane Oliveira

Os três principais nomes que serão anunciados hoje pela presidente eleita, Dilma Rousseff, para sua equipe econômica tiveram grande influência do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. São mais ligados a Lula do que a Dilma. Conforme antecipou ontem O GLOBO, a trinca será formada pela gerente do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), Miriam Belchior, que assumirá o Ministério do Planejamento; pelo diretor de Normas do Banco Central (BC), Alexandre Tombini, que irá para a presidência da instituição; e por Guido Mantega, que permanecerá no Ministério da Fazenda. Esse não era o desenho original pensado por Dilma.

Pesaram na decisão da presidente eleita a força do continuísmo e o esforço por um gesto de conciliação na transição. Segundo interlocutores, o nome preferido de Dilma para comandar a Fazenda era o do presidente do BNDES, Luciano Coutinho, que ficará no cargo e deve ser confirmado hoje. O secretário de Política Econômica, Nelson Barbosa, era pensado para o Planejamento. Os dois são os economistas mais consultados por Dilma.

Hoje, antes de participar de uma audiência pública no Senado, o presidente do BC, Henrique Meirelles, dará entrevista para falar do caso do banco PanAmericano, que quase quebrou devido a fraudes, e confirmará que deixará o cargo no último dia deste ano. Meirelles e Dilma teriam um encontro ainda ontem à noite. Também ontem à noite, Dilma voltou a se encontrar com Lula no Palácio da Alvorada.

Dilma não gostou do fato de Meirelles ter exigido manter a autonomia do BC para permanecer no cargo, como noticiado semana passada. Hoje, Meirelles dirá que considera concluído seu trabalho à frente do BC de manutenção da estabilidade econômica do país.

Dilma quer influir na Fazenda
A escolha de Tombini foi uma decisão pragmática de Dilma - para evitar solavancos na política econômica -, mas também teve grande influência de Lula. Ainda na semana passada, Lula comentou com parlamentares que Tombini seria o futuro presidente do BC, e que o nome era do agrado do próprio Meirelles.

Apesar das concessões a Lula, Dilma sinalizou que quer comandar pessoalmente o processo decisório da política econômica e influir na troca de cargos importantes da Fazenda, como a Receita. Ela já avisou que deseja uma equipe harmônica. Ou seja, não adotará o modelo de Lula de estimular divergências para construir o consenso.

O nome de Miriam Belchior não era a opção original para o Planejamento. Apesar de ser subordinada a Dilma na Casa Civil, Miriam sempre foi ligada a Lula e ao chefe de Gabinete, Gilberto Carvalho. Nos bastidores, Carvalho defendeu a indicação de Miriam. Quando Lula quis nomeá-la para chefiar a Casa Civil, em março, foi a própria Dilma quem pediu a Lula pela sua então secretária-executiva, Erenice Guerra.

Miriam integra o seleto grupo de auxiliares diretos de confiança máxima de Lula. Ela e Carvalho foram secretários em Santo André (SP), na gestão do então prefeito Celso Daniel, morto em 2002, com quem Miriam foi casada.

Quando Erenice foi demitida em setembro, após o escândalo de tráfico de influência, Miriam foi cotada para assumir a Casa Civil. Mas recusou a proposta para evitar se transformar em alvo na campanha eleitoral.

Para ocupar o lugar de Meirelles, Tombini precisará passar novamente por sabatina no Senado. Há tempo suficiente, pois o Congresso deve funcionar até por volta de 20 de dezembro.

A avaliação entre integrantes da área econômica do governo e da equipe de transição é a de que, ao escolher Tombini, Dilma deu sinais claros de que não mexerá no modelo em vigor, que vincula radicalmente a meta de inflação ao manejo da taxa básica de juros (Selic). A escolha de Tombini, disse um técnico da área econômica do governo, também mostra que Dilma não quer ser taxada de desenvolvimentista - característica que a marcou quando chefiou a Casa Civil.

Ontem, em Ribeirão Preto (SP), Lula disse que a única "herança maldita" que Dilma poderá receber será a da crise econômica mundial, principalmente de Europa e Estados Unidos. Discursando num evento do setor sucroalcooleiro, afirmou que o país cresceu em seu governo:

- Nada melhor para o país, depois dessa experiência bem-sucedida de um metalúrgico (na Presidência), que ter uma mulher, que não vai receber uma herança maldita. Se tiver que receber, será da crise econômica lá de fora, porque aqui dentro estamos crescendo - disse Lula, que voltou a afirmar que não defende a manutenção de ninguém no governo. - Dilma indica quem ela quiser. Não cabe a ex-presidente ficar defendendo quem fica. Ela vai escolher livremente quem quiser.

Colaborou Adauri Antunes Barbosa

Gaúcho, novo presidente do BC é um dos pais das metas de inflação

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Lisandra Paraguassú /BRASÍLIA

PERFIL
Alexandre Tombini
ECONOMISTA, ATUAL DIRETOR DE NORMAS DO BANCO CENTRAL

Escolhido pela presidente eleita Dilma Rousseff para presidir o Banco Central, o economista Alexandre Tombini é um nome que não cria nenhum tipo de abalo no mercado. Um dos formuladores da política de metas de inflação, criada em 1999, ainda no governo de Fernando Henrique Cardoso, o atual diretor de Normas do BC defendeu no Senado, em 2005, o mecanismo e a política de alta de juros para conter a inflação.

Gaúcho de Porto Alegre, casado e pai de dois filhos, a imagem que o economista de 46 anos passa é de alguém muito fechado e extremamente sério. Não costuma dar muitas entrevistas e já mostrou ter uma linha semelhante à de Henrique Meirelles - daí ser o nome mais cotado para a presidência do Banco, já que dificilmente causaria turbulências no mercado.

Formado pela Universidade de Brasília (UnB) em 1984, Tombini tem ainda PhD pela Universidade de Illinois (EUA). Antes de entrar para o BC, foi coordenador de análise internacional do Ministério da Fazenda e assessor especial da Casa Civil no governo de Fernando Henrique Cardoso.

Tombini entrou no BC em 1999 para chefiar o departamento de estudos e pesquisas da instituição, onde trabalhou na formulação do mecanismo de metas de inflação. De lá saiu para trabalhar na representação brasileira no Fundo Monetário Internacional (FMI), em Washington.
Voltou ao Brasil em 2005 e logo em seguida foi indicado para a diretoria do Banco Central.

Ligada a José Dirceu, Belchior chefia PAC

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Nova ministra do Planejamento era preferida de Lula para Casa Civil

Ela foi casada com Celso Daniel, prefeito morto de Santo André, e atuou em campanha para a reeleição do presidente

BRASÍLIA - Miriam Belchior, 52, tem posição estratégica na gestão Lula desde 2003 e, em abril deste ano, só não se tornou ministra da Casa Civil porque Dilma Rousseff, que deixou o governo para concorrer à Presidência, emplacou como sucessora Erenice Guerra.

Lula tinha preferência por Belchior, mas acabou cedendo ao apelo de Dilma. Meses depois, Erenice acabou se demitindo após denúncias de tráfico de influência de seus familiares no governo.

Ligada ao ex-ministro José Dirceu, Belchior é atualmente subchefe de Articulação e Monitoramento da Presidência e coordenadora do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento). Sua intimidade com o programa acabou a credenciando para o Ministério do Planejamento.

Ela ocupa o cargo atual desde 2004. Nos dois primeiros anos do primeiro mandato de Lula, era assessora especial do gabinete.

Em 2006, conciliou a função com a campanha de Lula à reeleição. Foi uma das coordenadoras do programa de governo.

Belchior é ex-mulher de Celso Daniel, prefeito assassinado de Santo André, mas já não eram casados quando ele foi morto, em 2002.

Durante as investigações, Belchior foi denunciada ao Ministério Público pelo irmão do ex-prefeito João Francisco Daniel, que disse ter ouvido dela e de Gilberto Carvalho, ex-secretário municipal e atual chefe de gabinete da Presidência, a ocorrência de um desvio de R$ 1,2 milhão da prefeitura em benefício do PT.

Carvalho e Belchior negaram as acusações.

Belchior é engenheira com mestrado em administração pública na FGV.

Beltrame: facções se uniram e reação da PM será em dobro

DEU EM O GLOBO

Após 16 anos de uma guerra que matou dezenas de inocentes, as duas maiores facções criminosas do Rio se uniram pela primeira vez para tentar desestabilizar o principal projeto de segurança pública do estado: o da implantação das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs). A informação desta união foi dada ontem pelo secretário de Segurança, José Mariano Beltrame, que, num discurso inflamado, anunciou que vai enfrentar os criminosos com efetivo dobrado das polícias Civil e Militar. A aliança dos bandidos já teria se concretizado também na Zona Sul, com a ida de traficantes do Complexo do Alemão para a Rocinha Em resposta aos ataques, que continuaram ontem, houve blitzes nas ruas e operações policiais em 22 favelas. A Polícia Rodoviária Federal triplicou seu contingente no estado. Oito presos serão transferidos para presídios federais.

A união do crime contra as UPPs

A GUERRA DO RIO

Grupos rivais de traficantes se aliam para ataques; Beltrame promete aumentar repressão

Vera Araújo

Pela primeira vez, depois de 16 anos, as duas maiores facções criminosas do Rio se uniram com o objetivo de desestabilizar o principal projeto de segurança pública do estado: o de implantação das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs). A informação foi dada ontem pelo secretário de Segurança, José Mariano Beltrame. Num discurso inflamado, ele anunciou que vai endurecer a repressão aos bandidos, por planejarem a onda de ataques no Rio:

- O serviço de análise da Subsecretaria de Inteligência detectou que está havendo esse tipo de união de duas facções. Isso não quer dizer que o crime seja organizado, pois facção criminosa não é organizada.

Beltrame atribuiu a onda de ataques ao incômodo que as UPPs provocaram ao tráfico:

- Quem perde reclama e aposta na desestabilização. É isso que os bandidos tentam fazer com os ataques. Nós dobramos a aposta. Se as ações continuarem, vamos usar as forças (PM e Polícia Civil) com efetivo dobrado. Em qualquer lugar do mundo, quando há mudanças de estratégia no combate ao crime, esse tipo de coisa acontece. O que eu digo é que quem atravessar o caminho das UPPs será atropelado.

Cem bandidos do Alemão estariam na Rocinha

A Subsecretaria de Inteligência da Secretaria de Segurança já investiga a denúncia de que bandidos da Rocinha e do Complexo do Alemão, na Penha, de facções rivais, uniram forças. As duas comunidades são as mais importantes na geografia do crime no Rio. Os investigadores analisam a informação de que cem homens do Alemão estão na Rocinha e planejam criar dificuldades no caso de uma ação do Bope, para a implantação de uma UPP. Na favela, estariam escondidos centenas de pneus para serem incendiados durante uma incursão da tropa de elite, a fim de atrapalhar a visibilidade dos PMs que desembarcam de helicóptero, dando início à ocupação. Um morador da Rocinha contou que, nos últimos dois meses, tem crescido o número de bandidos desconhecidos circulando na favela armados de fuzis e metralhadoras.

Sobre a insegurança que tomou conta dos moradores do Rio, Beltrame disse que, enquanto o programa de segurança não estiver totalmente em prática, a população terá que conviver com as ações terroristas:

- Sei que a população tem seus motivos de preocupação, mas temos que executar um plano concreto de segurança pública. Enquanto não chegarmos ao Rio que se pretende, vamos continuar a ver essas ações de bandidos. A transformação que se quer não vai acontecer de uma hora para a outra.

O apoio da Força Nacional de Segurança ou das Forças Armadas foi descartado por ele:

- O governo federal não enviou ajuda. O que a Polícia Rodoviária Federal vai fazer é a obrigação dela: cuidar das rodovias federais.

Vinícius de Moraes - Para viver um grande amor

Os ombros suportam o mundo :: Carlos Drummond de Andrade

Tempo de absoluta depuração.
Tempo em que não se diz mais: meu amor.
Porque o amor resultou inútil.
E os olhos não choram.
E as mãos tecem apenas o rude trabalho.
E o coração está seco.

Em vão mulheres batem à porta, não abrirás.
Ficaste sozinho, a luz apagou-se,
mas na sombra teus olhos resplandecem enormes.
És todo certeza, já não sabes sofrer.
E nada esperas de teus amigos.

Pouco importa venha a velhice, que é a velhice?
Teus ombros suportam o mundo
e ele não pesa mais que a mão de uma criança.
As guerras, as fomes, as discussões dentro dos edifícios
provam apenas que a vida prossegue
e nem todos se libertaram ainda.
Alguns, achando bárbaro o espetáculo
prefeririam (os delicados) morrer.
Chegou um tempo em que não adianta morrer.
Chegou um tempo que a vida é uma ordem.
A vida apenas, sem mistificação.