domingo, 24 de outubro de 2010

Reflexão do dia – Aécio Neves

Vejo com muita tristeza a opção feita pelo presidente Lula, que abandonou seu papel institucional para virar um cabo eleitoral. Com essa postura, o presidente sai menor do que entrou nesta eleição.

A democracia é maior do que uma eleição e um conjunto de forças políticas. Por isso, não posso deixar de externar minha tristeza com o comportamento de uma pessoa a quem sempre julguei manter uma relação de amizade e de respeito
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(Aécio Neves, anteontem, em O Globo)

Mentira como método :: Merval Pereira

DEU EM O GLOBO

O PT estabeleceu um método de atuação política nos últimos anos que, por ter dado certo do ponto de vista de resultados, passou a ser um parâmetro a balizar os seus concorrentes, o que lhe dá vantagens claras.

O partido, apesar de todas as encrencas em que se meteu, é a legenda preferida de 25% dos eleitores, e o PMDB vem em segundo com menos de 10%.

É claro que a presença de Lula no governo dá ao partido essa preferência, que pode desaparecer com o fim do mandato do presidente mais popular da História recente do país. Mas é essa popularidade que dá também ao governo a possibilidade de nivelar por baixo a atividade política, utilizando a mentira como arma eleitoral.

Um exemplo típico é o debate sobre privatizações, que havia dado certo na eleição de 2006 e hoje continua dando resultados, embora mais modestos, já que o PSDB perdeu o medo de assumir as vantagens da privatização para o desenvolvimento do país, embora ainda timidamente.

Logo depois da eleição de 2006, o marqueteiro João Santana, o mesmo que comanda a campanha de Dilma hoje, deu uma entrevista a Fernando Rodrigues, da “Folha”, revelando que a discussão sobre as privatizações fora utilizada como uma maneira de reavivar “emoções políticas” no imaginário do brasileiro comum.

O erro de Alckmin, ensinava Santana na entrevista, foi “não ter defendido as privatizações como maneira de alcançar o desenvolvimento”.

Santana admitia na entrevista que a impressão generalizada de que “algo obscuro” aconteceu nas privatizações, explorada na campanha de Lula, deveu-se a um “erro de comunicação do governo FH, que poderia ter vendido o benefício das privatizações de maneira mais clara. No caso da telefonia, teve um sucesso fabuloso.

As pessoas estão aí usando os telefones”.

Perguntado se não seria uma estratégia desonesta explorar esses sentimentos populares que não exprimem necessariamente a verdade dos fatos, João Santana foi claro: “Trabalho com o imaginário da população. Numa campanha, trabalhamos com produções simbólicas.” O tema, como se vê, não era uma bandeira ideológica que Lula defendesse ardorosamente, assim como continua não sendo hoje, mesmo porque o governo Lula privatizou bancos e linhas de transmissão de energia, e até exploração de madeira na Floresta Amazônica, projeto, aliás, aprovado com o apoio de várias ONGs e do PSDB.

Na campanha atual, a candidata do PT continua demonizando as privatizações com frases que não combinam com a realidade de seu governo.

No recente encontro com intelectuais no Rio, ela disse em tom exaltado, provocando aplausos generalizados: “Fazer concessões no pré-sal é privatizar, é dar a empresas privadas um bilhete premiado.” Se, entre intelectuais, Dilma pode dizer semelhante absurdo e ainda ser aplaudida, o que dizer entre os eleitores mais desinformados sobre o assunto? Será que aquela plateia não sabia que o governo Lula já licitou, utilizando o sistema de concessão, vários blocos do pré-sal sem que houvesse necessidade de fazê-lo se realmente considera que estava privatizando o pré-sal? A acusação de que o candidato tucano, José Serra, privatizou a Companhia Siderúrgica Nacional, além de equivocada no tempo — o que valeu ao tucano um direito de resposta — está errada no conteúdo.

A privatização se deu no governo do hoje senador eleito Itamar Franco, que era contrário à ideia. Quem liderou a pressão para a venda foi a Força Sindical, central que hoje está integrada ao governo Lula.

Com relação à privatização da Vale, a história real é ainda mais estarrecedora.

O governo teve uma ocasião perfeita para reverter a privatização da Vale, se quisesse.

Foi em 2007, quando o deputado Ivan Valente, do PSOL, apresentou um projeto nesse sentido que foi analisado na Comissão de Desenvolvimento Econômico, Indústria e Comércio da Câmara.

O relator do projeto foi o deputado José Guimarães, do PT, aquele mesmo cujo assessor fora apanhado com dólares na cueca num aeropor to na época do mensalão.

Pois o relator petista votou pela rejeição ao projeto de lei, alegando em primeiro lugar que “não há como negar que a mudança das características societárias da Companhia Vale do Rio Doce foi passo fundamental para estabelecer uma estrutura de governança afinada com as exigências do mercado internacional, que possibilitou extraordinária expansão dos negócios e o acesso a meios gerenciais e mecanismos de financiamento que em muito contribuíram para este desempenho e o alcance dessa condição concorrencial privilegiada de hoje”.

Segundo o petista, “a privatização levou a Vale a efetuar investimentos numa escala nunca antes atingida pela empresa, (...) o que, naturalmente, se refletiu em elevação da competitividade da empresa no cenário internacional”. José Guimarães assinalou que com a privatização a Vale fez seu lucro anual subir de cerca de 500 milhões de dólares em 1996 para aproximadamente 12 bilhões de dólares em 2006.

E o número de empregos gerados pela companhia também aumentou desde a privatização — em 1996 eram 13 mil e em 2006 já superavam mais de 41 mil. Também a arrecadação tributária da empresa cresceu substancialmente: em 2005, a empresa pagou dois bilhões de reais de impostos no Brasil, cerca de 800 milhões de dólares ao câmbio da época, valor superior em dólares ao próprio lucro da empresa antes da privatização.

Se o candidato tucano, José Serra, simplesmente lesse o relatório do deputado petista em um debate, ou na propaganda eleitoral, estariam respondidas todas as acusações da campanha adversária.

O estilo desfaz o homem:: Dora Kramer

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Daqui a oito dias, no próximo domingo antes das 9h da noite, o presidente Luiz Inácio da Silva começará a vivenciar o passado, as urnas apontem a eleição de Dilma Rousseff ou de José Serra para lhe suceder na chefia da Nação.

É inexorável: eleito, as atenções se voltam para o novo, o próximo, aquele que de fato traduz mais que uma expectativa, representa o poder em si. Político baiano da velha guarda, Afrísio Vieira Lima tem a seguinte filosofia: "Ninguém atende ao telefone ou à porta perguntando quem foi, todo mundo quer saber quem é."

Pois é. Face à evidência de que a natureza humana não falha, o mundo político não foge à regra. No momento seguinte à proclamação do resultado, o País - quiçá o mundo - voltará toda a sua atenção para a fala, os planos, os gestos, as vontades, os pensamentos, a biografia, a família, os amigos e tudo o mais que diga respeito à pessoa que a partir do primeiro dia de 2011 dará expediente no principal gabinete do Palácio do Planalto.

Quando a gente vê um presidente tomar a iniciativa de se desmoralizar em público apenas porque não resiste ao impulso de insultar o adversário, a boa notícia é que falta pouco tempo para que esse estilo comece a fazer parte de referências pretéritas.

Abstraindo-se juízo de valor a respeito de Dilma e Serra, chegará ao fundo do poço que o presidente Lula se deu ao desfrute de frequentar na semana passada. Pela simples razão de que é impossível.

A novidade não esteve na distorção dos fatos - isso já faz parte da rotina. O ineditismo foi o desmantelo da farsa. Melhor dizer, das farsas, pois foram duas: uma engendrada com vagar, outra montada às pressas. Ambas malsucedidas, não duraram 24 horas.

No começo da semana, quando já se anunciara o adiamento do fim da sindicância da Casa Civil sobre Erenice Guerra para depois das eleições, eis que a Polícia Federal ressuscitou o caso da quebra do sigilo fiscal de parentes e correligionários do candidato Serra, anunciando a identificação do responsável: Amaury Ribeiro Jr., jornalista que à época do crime trabalhava no jornal Estado de Minas.

O PT tentou legitimar, assim, uma versão que fazia circular desde junho quando se descobriu que os dados fiscais do vice-presidente do PSDB, Eduardo Jorge, apareceram em um dossiê que chegou ao jornal Folha de S. Paulo como originário do PT.

A versão - não de todo inverossímil, diga-se - era a de que as informações haviam sido reunidas por Amaury a serviço do Estado de Minas para municiar Aécio Neves de dados contra José Serra, que, por sua vez, mandara investigá-lo.

Segundo um delegado e o superintendente da PF, Amaury dissera em seu depoimento que o trabalho visava a "proteger" Aécio. Antes da entrevista dos dois, o presidente da República anunciava que naquele dia a Polícia Federal teria novidades.

Pois no dia seguinte, sabe-se que nem Amaury estava a serviço do Estado de Minas na ocasião nem citara no depoimento o nome de Aécio Neves. Ou seja, o presidente Lula comandara uma falácia e a PF aceitara se prestar ao serviço, acrescentando que as investigações estavam encerradas.

Foi desmentida em seguida pelo Ministério Público, que avisou que a polícia não estava autorizada a determinar o rumo e os prazos das investigações.

Não satisfeito, depois da pancadaria promovida por petistas contra uma passeata do candidato tucano no Rio, o presidente resolveu acusar o adversário de ser um farsante. Precipitou-se, insultou o candidato em termos zombeteiros, desqualificou um médico de respeitável reputação, foi de uma falta de modos ainda pior que o habitual.

Isso tudo para quê? Para ser logo em seguida desmentido pelos fatos exibidos no noticiário de televisão com a maior audiência do País, o Jornal Nacional.

Tudo isso sem necessidade, pois pelas pesquisas sua candidata está com 12 milhões de intenções de voto de vantagem sobre o adversário.

Tudo isso pelo exercício de um estilo abusivo que não conhece limites, mas que daqui a oito dias começará a perceber que o poder passa e a ausência dele dói.

Mentiras, política, universidade :: Roberto Romano

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Na busca do verdadeiro reside a essência universitária. Norberto Bobbio dizia existir um anti-Estado quando setores políticos e sociais agem ao arrepio das leis e da transparência democrática. Também é possível afirmar que a ordem acadêmica que renega seu múnus - a pesquisa acima das assertivas ideológicas, religiosas ou políticas - gera uma antiuniversidade.

Cientista que aceita e patrocina a distorção de enunciados e de atos atraiçoa a sua missão: vencer o sofisma e o fanatismo que castigam indivíduos ou grupos. Tomás de Aquino, ao receber o aviso de certo frade sobre um boi voador, incontinenti se dirigiu à janela para verificar o fenômeno. Vieram as caçoadas do brincalhão. "Prefiro acreditar que um boi voa, pois não aceito que um religioso minta", observou Tomás de Aquino. Quem age de maneira decorosa sempre opta inicialmente por atribuir veracidade aos professores. Se eles mentem ou aceitam a mentira, deixam sua condição, passam ao estatuto de sofistas.

É certo que algumas "classes e profissões forçam os seus representantes a mentir, como, por exemplo, os teólogos, os políticos, as prostitutas, os diplomatas, os poetas, os jornalistas, os advogados, os artistas, os fabricantes de alimentos, os operadores da bolsa, (...) os falsificadores, os gigolôs, os generais, os cozinheiros, os traficantes de vinho" - cf. Victoria Camps, in Carlos Castilla del Pino (Org.): El Discurso de la Mentira, Madrid, Alianza, 1988.

Mentiras profissionais são partilhadas. Nelas a vítima assume a aparência, não exige a plena verdade. Temos aí algo lícito ou ilícito, segundo o caso. Torquato Acetto escreveu, em 1641, um livro cujo título já elucida o ponto: Sobre a Dissimulação Honesta. Pior é a mentira como ato de violência e poder. É o que pregou, na mesma ocasião, Gabriel Naudé, com o pior maquiavelismo, nas Considerações Políticas sobre os Golpes de Estado.

As falsidades mencionadas são convencionais. A mentira real identifica-se com a injustiça do poder, uma violência só justificada pela submissão do violentado. Nela as duas partes - falsário e vítima - sabem que estão mentindo um para o outro, mas ao dominado só resta aderir. Existe mentira jurídica e política se a competência linguística é assimétrica: mente-se à criança, ao doente, ao fraco, ao vulnerável, ao que depende de tutores. A mentira é possibilitada pela dominação religiosa ou ideológica. Na democracia, a competência linguística é simétrica e compartilhada.

Montaigne define a mentira como "valentia diante de Deus e covardia diante dos homens". Sendo assim, impera a assimetria discursiva entre cidadania e governos. E temos o poder de quem decide sobre o que pode ser ouvido e compreendido pelos governados. Mentira é não dizer a verdade a quem tem direito a ela. Assim, a censura à imprensa, sobretudo quando emana de juízes, mostra que uma sociedade não é democrática, pois nela se recusa aos governados o direito à verdade. O censor imagina-se acima do corpo cidadão. Tirania, eis o nome de tal prática na ética ocidental. No Brasil existem juízes censores, o que basta para mostrar o quanto nossa democracia é frágil.

Voltemos aos universitários e professores. Eles não devem nem podem tolerar, na própria vida e na coletiva, atos deliberadamente cometidos no campo da mentira, mesmo que tudo seja feito para maior glória do povo, do partido ou mesmo da divindade. "Deus não precisa de nossa mentira", dizia Santo Agostinho contra quem ousava inventar desculpas para o Ser que é a própria Verdade. Grandes causas, cultura, valores, quando defendidos com dolo, transformam-se imediatamente no contrário.

Agora, a realidade acadêmica de hoje, em clima eleitoral. Alguns professores universitários se reuniram na Sala dos Estudantes (Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo) para apoiar uma candidatura à Presidência da República. O ato, que ocorreu no dia 8 de outubro de 2010, é ilegal, pois é vetado o uso de próprios públicos para fins político-partidários (artigo 73 da Lei n.º 9.504/97). A ilegalidade foi cometida até mesmo por ilustres juristas. O pior é a desculpa usada para obter a referida sala: os estudantes afiançaram que nela fariam um regular "estudo de grupo".

Os intelectuais que endossaram o ato não desconhecem a lei. Eles também não podem ignorar a mendacidade praticada pelos estudantes, pois juntos organizaram a manifestação. Seria desgraça em demasia se professores do Direito desprezassem a norma legal. Pior é a atitude de professores de Ética e Política que, em plena consciência, aplaudem um truque onde reluz a mentira. Tudo vale em nome da causa?

Muito regrediu o Estado brasileiro em nossos tempos, rumo às trevas. Renasce entre nós todo o ódio trazido pelas religiosidades autoritárias, as quais retomam a face obscurantista. O avanço de bispos católicos e pastores na seara política se faz em prejuízo da ordem estatal, da sociedade e das próprias igrejas ou seitas.

No Estado, a plena soberania sai arranhada. Na sociedade, a intolerância gera frutos malditos. Nas próprias igrejas, a hegemonia dos retrógrados afasta os que respeitam crenças alheias. A divisão nas hostes da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) indica algo inédito na história daquele plenário. E Igreja Católica sem união conduz ao desarrazoado das massas. "Não se deve usar Deus como punhal", disse certa feita Denis Diderot.

Um nume reduzido a instrumento de luta política é pura mentira.

Uma universidade que permite no seu interior truques ignóbeis é pura mentira.

Saibamos evitar, com prudência máxima, tais ameaças à nossa frágil democracia.


Filósofo, professor de Ética e Filosofia na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), é autor, entre outros livros, de ""O caldeirão de medeia"" (Perspectiva)

Meditação à beira das urnas :: Wilson Figueiredo

DEU NO JORNAL DO BRASIL (online)

Por não ser decidida no primeiro turno, a sucessão presidencial não teve como livrar-se do foco que situa Minas Gerais e São Paulo como o centro de gravidade da própria democracia no segundo turno. Não por acaso, Minas e São Paulo são dois estados que se identificaram, no processo democrático, com o que se entende, por bom senso, como social-democracia na concepção ampla e já distante da sua origem histórica. A corrente de ideias organizadas segundo a visão social- democrática, desde o fim do século 19 se afastou da vertente marxista e se desenvolveu em direção a um revisionismo que a deixou fora de circulação na primeira metade do século 20.

De algum modo, com o fim do autoritarismo militar e sem se ater à ideia ortodoxa, no Brasil a social-democracia se deu particularmente bem, à moda brasileira, com destaque em dois estados São Paulo e Minas Gerais graças a franquias de origem liberal, acrescidas do toque reformista de natureza social mas sem o peso da suspeita que ainda embota, entre nós brasileiros, o conceito de esquerda e dificulta operacionalmente a redução de desigualdades sociais. A maldição da social-democracia prevaleceu, porém, sobre a reflexão reformista que a preservou em vão do marxismo, pois até hoje não encontrou expressão própria.

Embora todas as eleições, sobretudo as presidenciais, se pareçam em linhas gerais, com prejuízo para o que realmente são, cada uma tem, por trás da retórica, mesmo nas diferenças, a marca da época e das condições reais. Aí terminam as diferenças que ainda contam no Brasil. No primeiro turno desta sucessão presidencial, Minas liquidou uma conta suspeita, onde se embutiu a pretensão de Lula em resolver a parada no primeiro turno. O presidente acabou arcando com o desgaste da estabanada intromissão federal para garantir em Minas a vitória da candidata oficial e da coligação PT-PMDB & Cia na sucessão mineira.

Nem mesmo o segundo turno sobrou para salvar, na candidata Dilma Rousseff, a máscara de Luiz Inácio numa derrota que descadeirou o presidente por mais de uma semana.

São Paulo repetiu o sucesso de Minas ao varrer as pretensões eleitorais de petistas e associados.

Há muito mais do que coincidência a ser trazido à luz do dia.

Por trás da frustração oficial de submeter-se a um segundo turno, que hospeda o perigo para quem queria adiantar-se aos fatos, coube ao presidente Lula sinalizar com ressentimento em carne viva o esboço de um final sem a ênfase com que contava. O resultado das urnas atingiu em cheio o modo destemperado do presidente Lula, ao demonstrar com veemente oratória seu inconformismo com o insucesso.

Lula ficou desacostumado de derrotas que são o sal da democracia, pois com vitórias nada se aprende de útil. A eleição e a reeleição deixam claro que o presidente perdeu a noção da distância entre o possível e o impossível, com a qual aprendeu o suficiente.

No segundo turno, Lula dissipou a confiança acumulada e recaiu na explosão de ressentimento.

Não tem sido capaz de avaliar sequer o prejuízo que lhe será debitado no futuro, de muito maior duração do que o presente.

A vitória em Minas coube ao governador Aécio Neves, cujo candidato ao Palácio da Liberdade, em desvantagem nas pesquisas até duas semanas antes da eleição, impôs ao PMDB e ao padrinho Lula derrota histórica. O presidente ficou mais longe da apoteose com que contava sair do governo para voltar em 2014 num andor sindical. Ainda não percebeu que, em quatro anos, os brasileiros certamente terão melhores condições de avaliar o peso que a história lhe conferir, sem nada a acrescentar por fora.

Já era tempo de que o partido da social-democracia, pelo seu lado, entendesse que a idéia da reforma social, por meios democráticos, é mais do que proposta de circunstância.

Lula :: Eliane Cantanhêde

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Lula continua batendo recordes de popularidade, sua candidata é franca favorita no próximo domingo, PT e PMDB têm a perspectiva de controlar o país por 20 anos.

Mas, paradoxalmente, Lula sai da eleição menor do que entrou.

Surpreendem o ego, a falta de limites, o personalismo. Quanto mais esperava-se o estadista, mais cedeu ao populismo oportunista. Quanto mais o momento exigia grandeza, mais apequenou-se.

Bastou a eleição de Dilma ser dada como certa no primeiro turno, e lá foi Lula, vermelho, com ar de ódio, xingar a imprensa e conclamar o extermínio de adversários. Bastaram as pesquisas prevendo a vitória no segundo turno, e lá foi Lula, vermelho, com ar de ódio, acusar Serra de encenar "uma farsa", uma "mentira descarada". Duplo erro: tentou transformar a vítima em réu e estimulou a militância petista a cair de pau.

Lula deveria ler as pesquisas e aprender com elas que Dilma e o lulismo vencem graças à votação maciça nas regiões e áreas mais manipuláveis, onde a Arena, o PDS e o PMDB já foram reis. Enquanto isso, crescem entre os mais escolarizados a desilusão e a condenação ao estilo raivoso, à cultura da vitimização, às práticas de dossiês e falsificações da verdade, à ocupação do governo e das estatais como se fossem donos do país. É esse tipo de reinado que Lula almeja?

Com o governo bem-sucedido e 80% de apoio, cabia a Lula investir em princípios, na melhor prática eleitoral e na educação política dos brasileiros, não sucumbir à esperteza com Collors e Sarneys; confraternizar com as ditaduras de Cuba e Irã; cooptar as centrais sindicais e os movimentos sociais; jogar o governo, as estatais e a figura do presidente sem pudor na campanha.

Na reta final do primeiro e do segundo turno, Lula, com seus excessos, mais prejudicou do que ajudou Dilma. Quanto mais atua assim pela sua candidata, mais trabalha contra a própria imagem. Governos e eleições passam, a história fica.

O pai da oposição :: Alberto Dines

DEU NO JORNAL DO COMMERCIO (PE)

O presidente Lula sabe que está indo longe demais ao transformar-se em candidato virtual à própria sucessão. Enredou-se de tal forma à campanha, atropelou tão ostensivamente os rituais e códigos que já não é apenas marqueteiro sênior, cabo-eleitoral-mor ou alter ego da sua preferida.

Mergulhou de cabeça na disputa confiando na boa estrela, na sua infinita capacidade de desarmar armadilhas e restaurar a imagem. Sabe que aos vencedores tudo se perdoa e já está pronto a exibir uma humildadezinha aqui, um rasgo de generosidade acolá, certo de que logo o país estará novamente galvanizado em torno da sua popularidade.

Acontece que mesmo os otimistas estão pessimistas. O estresse é visível, o país está sendo submetido a uma inaudita tensão que contraria a sua natureza e anestesia os seus atributos. E mesmo que o presidente Lula saia moralmente vitorioso da disputa, a eventual sucessora não tem o fôlego, o carisma, a experiência, a paciência e até a vocação para desarmar os espíritos e suturar as rupturas que se produziram no último semestre.

Lula vai palpitar caso Dilma seja a vencedora, já avisou. Mas o Brasil não é a Rússia, impensável a hipótese de se reproduzir aqui, ainda que disfarçadamente, o esquema Putin-Medvedev.

O presidente Lula é um genial improvisador, toca de ouvido admiravelmente, mas existem situações, sobretudo as situações-limite, em que partituras são indispensáveis. Bússolas também. A pretendida polarização plebiscitária escolhida como núcleo da sua estratégia saiu pela culatra. O presidente foi avisado, preferiu não ouvir as vozes da prudência.

Ganhou em 2002 quando acenou com a soma e a união. Agora, acelerado, escolheu como símbolo e ícone o rolo compressor, Queria esmagar a oposição quanto mais rápido melhor não se contentava em desmoralizá-la ou vencê-la. Foi o seu erro, não contava com as leis da dinâmica e da dialética.

O presidente Lula forjou uma oposição com a mesma onipotência que pretendia arrasá-la. Vitoriosa ou não nas urnas está liberada das táticas e promessas eleitorais de curto prazo. Não estará ocupada em distribuir o butim, contentar os incontentáveis e saciar os insaciáveis. Terá tempo para agrupar-se em torno de plataformas mínimas, aparar divergências, descartar excrescências e servir-se das drásticas mudanças na conjuntura internacional para cobrar mais eficácia.

Terá uma invejável coleção de nomes e uma sólida base na porção mais desenvolvida do território nacional. E, além disso, está fadada a herdar do atual governo uma bandeira que ele não quer ou não tem condições de empunhar: moralidade administrativa. A nova classe média criada pela prosperidade da Era Lula será a primeira e a mais exigente cobradora de novos costumes na vida pública. Isto compreende o fim da impunidade. Complicações à vista.

O presidente Lula esperneou, mas teve que engolir o segundo turno. Na pior das hipóteses terá que resignar-se a entrar para a história como o pai de uma oposição ferida e briosa.


» Alberto Dines é jornalista

As rosas não falam - Luciana Mello

Chefe de Gabinete vira réu por propina

DEU EM O GLOBO

Processo trata de esquema de corrupção na gestão de Celso Daniel em Santo André, na qual Carvalho era secretário

BRASÍLIA. O chefe de Gabinete da Presidência, Gilberto Carvalho, e o PT foram enquadrados como réus em processo da Justiça de São Paulo que trata de esquema de propina envolvendo a prefeitura de Santo André, na gestão petista de Celso Daniel, e empresas de transporte. Carvalho e o partido, segundo reportagem de ontem de “O Estado de S. Paulo”, são acusados de participar de uma quadrilha que comandava o esquema e teria desviado R$ 5,3 milhões dos cofres públicos. As denúncias são antigas e “atormentam” o PT desde a campanha de 2002, do então candidato Luiz Inácio Lula da Silva.

Celso Daniel foi sequestrado e morto em janeiro de 2002.

Recentemente, o presidente Lula desistiu de nomear Miriam Belchior, que foi casada com Celso Daniel, como nova ministra da Casa Civil, justamente por temer a volta do caso Celso Daniel na eleição e atingir Carvalho, que foi secretário de governo do prefeito.

Na última segunda-feira, a Justiça decidiu pela abertura definitiva do caso. A juíza Ana Lúcia Xavier Goldman negou recursos apresentados para protelar o andamento do processo e confirmou o despacho que aceita a denúncia. Além de Carvalho e o PT, são citadas outras cinco pessoas e uma empresa.

“Há indícios bastantes que autorizam a apuração da verdade dos fatos por meio da ação de improbidade administrativa”, disse a juíza, segundo “O Estado de S. Paulo”. Segundo a ação, o assessor de Lula transportava propina para o comando do PT.

“Ele concorreu de qualquer maneira para a prática de atos de improbidade administrativa”, diz a denúncia aceita.

Por meio da assessoria do Palácio do Planalto, Carvalho informou que já prestou depoimento em duas CPIs e no Ministério Público sobre as denúncias e que “está com a consciência tranquila”. O chefe de Gabinete de Lula, que também é seu principal homem de confiança, segundo assessores, vai se defender das acusações. Ele depôs na CPI dos Bingos, em 2005, e depois teve de dar explicações em 2008 quando seu nome apareceu num grampo na Operação Satiagraha. Na atual campanha da candidata Dilma Rousseff, Carvalho tem sido integrante da coordenação, atuando, sobretudo, junto à Igreja Católica.

Casa de viúva de Chico Mendes é invadida no Acre

DEU EM O GLOBO

Ilzamar, que declarou apoio a Serra, crê em tentativa de intimidá-la

Evandro Éboli

BRASÍLIA. A residência de Ilzamar Mendes, viúva do líder seringueiro Chico Mendes, foi invadida na noite da última sexta-feira, em Rio Branco (AC), por três homens, que chegaram a derrubar um portão de três metros de altura. Eles permaneceram por cerca de cinco minutos na área, mas não chegaram a entrar na casa nem levaram qualquer objeto.

Ilzamar evitou associar o episódio ao seu apoio público ao candidato do PSDB à Presidência, José Serra, mas o tratou como uma tentativa de intimidá-la.

Policiais não conseguiram localizar o grupo Ilzamar gritou por socorro e chamou a polícia, que só chegou 20 minutos após seu telefonema. Os policiais deram uma volta no bairro, acompanhados de Ilzamar, mas não localizaram o grupo.

Os três homens estavam vestido de roupa preta; não foi possível identificar se estavam armados.

— O muro da casa é pequeno.

Se a intenção fosse assaltar, teriam pulado sem problema.

Não precisavam derrubar um portão enorme e fazer todo aquele barulho.

Acho que foi uma tentativa de me intimidar. Mas quero ressaltar que os índices de violência no Acre são altíssimos.

A segurança pública vai muito mal — afirmou Ilzamar Mendes. — Nós da família Mendes já sofremos na pele a ação de bandidos e de muita violência. Sempre convivemos com ameaças.

No momento em que os três homens entraram na área da residência, Ilzamar estava com a neta. Os policiais permaneceram na casa até as 4h de ontem.

Viúva apareceu no programa de Serra semana passada Na semana passada, Ilzamar apareceu no programa de TV de José Serra, onde declarou que o candidato tucano tem propostas ambientais alinhadas com os sonhos de Chico Mendes. Ilzamar mora no bairro Vila Acre, a nove quilômetros do centro de Rio Branco.

Sobre sua adesão à campanha do presidenciável do PSDB, Ilzamar afirmou que ficou admirada com o apoio que obteve do Brasil inteiro e disse que não recebeu provocações por apoiar Serra: — Sou uma pessoa pública e tenho recebido muitas mensagens e telefonemas pela minha decisão. Vivemos numa democracia e não há espaço para perseguições pelas escolhas que fazemos.

O assédio petista à mídia:: Editorial - O Estado de S. Paulo

As tentativas de controlar os meios de comunicação no Brasil podem ser abertas ou camufladas. Nos últimos dias, surgiram exemplos das duas modalidades. No primeiro caso, amplamente noticiado, a Assembleia Legislativa do Ceará aprovou, por unanimidade, o projeto de uma deputada petista que institui no Estado um Conselho de Comunicação Social - na linha prevista pela aparelhada Conferência Nacional de Comunicação (Confecom), realizada em dezembro de 2009, sob os auspícios do Planalto. As suas diretrizes frequentaram brevemente o programa da candidata Dilma Rousseff, antes de serem expurgadas por evidente inconveniência eleitoral.

A segunda manobra, que tenta encobrir a sua verdadeira natureza, foi uma ação direta de inconstitucionalidade "por omissão", impetrada no Supremo Tribunal Federal (STF) pela Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), a mesma que no começo do atual governo quis emplacar o policialesco Conselho Nacional de Jornalismo, e a Federação Interestadual dos Trabalhadores em Empresas de Radiodifusão e Televisão (Fitert). As entidades assinalam que a revogação da Lei de Imprensa pelo próprio STF deixou sem regulamentação o direito de resposta na mídia e pedem que o vazio seja preenchido. À primeira vista, pode parecer uma demanda de todo procedente. Mas não é, como se verá adiante.

Já o pretendido conselho cearense, que depende da sanção do governador Cid Gomes, do PSB, quer fiscalizar os meios de comunicação do Estado, criar condições para a "democratização" da informação e orientar a distribuição das verbas publicitárias estaduais considerando a "qualidade e pluralismo" da programação dos órgãos da mídia eletrônica. Os controladores, reguladores e, em última análise, vigias do sistema serão 25 conselheiros, dos quais 18 da sociedade civil, incluindo representantes dos meios de comunicação, sindicatos e consumidores. Eles julgarão o desempenho e a conduta ética da mídia local com base na Constituição, Declaração dos Direitos Humanos "e outros tratados internacionais".

O presidente do Sindicato dos Jornalistas do Ceará (Sindjorce), Claylson Martins, nega que o órgão tenha pretensões censórias, já que as eventuais sanções a que estiverem expostas dependerão do Judiciário - como se pudesse ser de outra forma no Estado Democrático de Direito. Mas o palavreado apaziguador não engana. Para o diretor executivo da Associação Nacional de Jornais (ANJ), Ricardo Pedreira, a proposta é "obscurantista, autoritária e inconstitucional". "Quem deve controlar os veículos de comunicação deve ser a sua audiência", argumenta. "Não cabe a nenhum órgão do Estado exercer esse papel."

Enquanto a intenção de assediar a imprensa é manifesta na iniciativa do PT do Ceará, os petistas da Fenaj escolheram um caminho mais sinuoso para o mesmo objetivo. Isso porque a ação por eles impetrada no Supremo Tribunal vai além da correção da lacuna legal sobre o direito de resposta, com o fim da Lei de Imprensa. Quando cobram a regulamentação da matéria, dão ao termo "direito de resposta" um sentido ameaçador, que extrapola o artigo 5.º da Constituição, que o consagrou. A ação cita dois outros artigos que tratam da mídia eletrônica e que não guardam relação com a faculdade de as pessoas publicarem na imprensa as suas versões dos fatos ou situações em conexão com os quais se viram citadas.

Um artigo é o 221, segundo o qual a programação das emissoras deve dar preferência a finalidades educativas, artísticas e informativas, respeitados os valores éticos e sociais da pessoa e da família. O outro artigo é o que o precede, que determina que lei federal deve garantir ao público a possibilidade de se defender de programações que contrariem o disposto no texto anterior. Assim, na interpretação da Fenaj, a lei deveria dar a cada espectador ou ouvinte o direito à divulgação de suas opiniões, nos próprios canais e estações, sobre os respectivos programas. Não é preciso nenhum voo de imaginação para imaginar a avalanche de pressões orquestradas contra a mídia eletrônica se o Congresso aprovar a legislação reivindicada - o que pedem que o STF induza, em regime de urgência.

Intrigas de estado

DEU NA REVISTA VEJA

Diálogos entre autoridades revelam que o Ministério da Justiça, o mais antigo e tradicional da República, recebeu e rechaçou pedidos de produção de dossiês contra adversários

Gustavo Ribeiro


RELAÇÕES PERIGOSAS: As conversas às quais VEJA teve acesso mostram que o braço direito do presidente Lula, Gilberto Carvalho, e a candidata à Presidência Dilma Rousseff tentaram usar o Ministério da Justiça para executar tarefas absurdas

Estamos a menos de uma semana das eleições e, como escreveu o correspondente Stuart Grudgings, da agência noticiosa Reuters, políticos e jornalistas correrão às bancas mais próximas para ver se será esta a edição de VEJA que vai abalar a liderança de Dilma Rousseff nas pesquisas eleitorais. Embora a análise do funcionário da Reuters demonstre um total desconhecimento do que seja jornalismo, atividade em que os fatos fazem as notícias e não o contrário, ele acertou em seu diagnóstico a respeito da ansiedade que as capas de VEJA provocam no meio político. A reportagem que se vai ler a seguir não foge à regra. Ela revela, talvez da maneira mais clara até hoje, o tipo de governo produzido pela mentalidade petista de se apossar do estado, aparelhá-lo e usá-lo em seu benefício partidário. VEJA já havia demonstrado nas reportagens O polvo no poder e A alegria do polvo como a Casa Civil fora transformada em um balcão de negócios, em que maços de dinheiro vivo apareciam nas gavetas de escritórios a poucos metros da sala do presidente da República. A presente reportagem relata as tentativas ousadas de petistas de alto coturno de conspurcar um dos mais antigos e venerandos ministérios da República, o da Justiça.


É conhecido o desprezo que o PT nutre pelas instituições republicanas, mas o que se tentou no Ministério da Justiça, criado em 1822 por dom Pedro I, ultrapassa todas as fronteiras da decência. Em quase 200 anos de história, o ministério foi chefiado por homens da estatura de Rui Barbosa, Tancredo Neves e quatro futuros presidentes da República. O PT viu na tradicional instituição apenas mais um aparelho a serviço de seu projeto de poder. Como ensina Franklin Martins, ministro da Supressão da Verdade, às favas com a ética quando ela interfere nos interesses políticos e partidários dos atuais donos do poder. VEJA teve acesso a conversas entre autoridades da pasta que revelam a dimensão do desprezo petista pelas instituições. Os diálogos mostram essas autoridades incomodadas com a natureza dos pedidos que vinham recebendo do Palácio do Planalto. Pelo que é falado, não se pode deduzir que o Ministério da Justiça, ao qual se subordina a Polícia Federal, cedeu integralmente às descabidas investidas palacianas. Não aguento mais receber pedidos da Dilma e do Gilberto Carvalho para fazer dossiês. (...) Eu quase fui preso como um dos aloprados, disse Pedro Abramovay, secretário nacional de Justiça, em conversa com seu antecessor, Romeu Tuma Júnior. Abramovay é considerado um servidor público exemplar, um diamante da República, como a ele se referiu um ex-ministro. Aos 30 anos, chegou ao Ministério da Justiça no início do governo Lula pelas mãos do ex-ministro Márcio Thomaz Bastos. A frase dele pode confirmar essa boa reputação, caso sua canseira tenha se limitado a receber pedidos e não a atender a eles. De toda forma, deveria ter denunciado as ordens impertinentes e nada republicanas de produzir dossiês.

Mesmo um alto funcionário com excelente imagem não pode ficar ao mesmo tempo com a esmola e o santo. Em algumas passagens da conversa, Abramovay se mostra assustado diante das pressões externas e diz que pensa em deixar o governo. Não deixou. Existem momentos em que é preciso escolher. Antes de chegar ao ministério, ele trabalhou no gabinete da ex-prefeita Marta Suplicy, na liderança do PT no Senado e com o senador Aloizio Mercadante. Vem dessa etapa da carreira a explicação para a parte da frase em que ele diz quase fui preso como um dos aloprados. A frase nos leva de volta à campanha eleitoral de 2006, quando petistas foram presos em um hotel ao tentar comprar um dossiê falso contra José Serra. A seu interlocutor, Abramovay sugere ter participado do episódio e se arrependido, a ponto de temer pedidos semelhantes vindos agora do Palácio do Planalto. Ele disse que quase foi preso na época do escândalo e que, por isso, teve de se esconder para evitar problemas. Deu bolo a história do dossiê, comenta. Em pelo menos três ocasiões, Abramovay afirma que não está disposto a novamente agir de forma oficiosa. E justificou: ...os caras são irresponsáveis.

Os diálogos aos quais a reportagem teve acesso foram gravados legalmente e periciados para afastar a hipótese de manipulação. As ordens emanam do coração do governo do chefe de gabinete da Presidência, Gilberto Carvalho, e da candidata a presidente, Dilma Rousseff. A conversa mais longa durou cinquenta minutos e aconteceu em janeiro deste ano, no gabinete do então secretário nacional de Justiça e antecessor de Abramovay no cargo, Romeu Tuma Júnior. Os interlocutores discutem a sucessão do ex-ministro Tarso Genro. Ao comentar sobre o próprio futuro, Abramovay revela o desejo de trabalhar na ONU. Em tom de desabafo, o advogado afirmava que já não conseguia conviver com a pressão. Segundo ele, a situação só ia piorar com a nomeação para o cargo de Luiz Paulo Barreto, então secretário executivo, pela falta de força política do novo ministro, funcionário de carreira da pasta, em que também angariou excelente reputação. Isso (o cargo de ministro) é maior que o Luiz Paulo. (...) Agora eles vão pedir... para mim... pedir para a Polícia (Federal), desabafou.

Procurado por VEJA, Abramovay disse: Nunca recebi pedido algum para fazer dossiês, nunca participei de nenhum suposto grupo de inteligência da campanha da candidata Dilma Rousseff e nunca tive de me esconder ao contrário, desde 2003 sempre exerci funções públicas. Romeu Tuma Júnior, seu interlocutor, porém, confirmou integralmente o teor das conversas: O Pedro reclamou várias vezes que estava preocupado com as missões que recebia do Planalto. Ele me disse que recebia pedidos de Dilma e do Gilberto para levantar coisas contra quem atravessava o caminho do governo. Acrescentou Tuma: Há um jogo pesado de interesses escusos. Para atingir determinados alvos, lança-se mão, inclusive, de métodos ilegais de investigação. Ou você faz o que lhe é pedido sem questionar, ou passa a ser perseguido. Foi o que aconteceu comigo, afirma o ex-secretário, que deixou a pasta em junho, depois que vieram a público denúncias de que teria relacionamento com a máfia chinesa. Tuma Júnior atribui a investigação contra si formalmente arquivada por falta de provas a uma tentativa de intimidação por parte de pessoas que tiveram seus interesses contrariados. Ele não quis revelar quais seriam esses interesses: Mas posso assegurar que está tudo devidamente documentado.

Para o ministro da Justiça, Luiz Paulo Barreto, o diretor da PF, Luiz Fernando Corrêa, se valeu do aparato policial para monitorar autoridades. O ministro suspeitou que ele próprio houvesse sido vítima de grampos ilegais e que até o presidente Lula tivesse sido constrangido por Corrêa

O clima de desconfiança no Ministério da Justiça contaminou até o mais alto escalão. A certa altura das conversas, o chefe da pasta, Luiz Paulo Barreto, manifesta suspeita de que seu subordinado Luiz Fernando Corrêa, diretor-geral da Polícia Federal, o espione. Em inúmeras ocasiões, Barreto revelou a seus assessores não ter ascendência sobre Corrêa. O ministro chega a expressar em voz alta sua desconfiança de que o diretor da PF tem tanto poder que se dá ao luxo de decidir sobre inquéritos envolvendo pessoas da antessala do presidente da República. Um desses casos é relatado por Barreto em conversa no seu próprio gabinete, ocorrida em meados de maio. À sua chefe de gabinete, Gláucia de Paula, Barreto fala sobre o possível indiciamento de Gilberto Carvalho, braço direito do presidente Lula. Em 2008, a PF interceptou telefonemas em que o chefe de gabinete da Presidência conversava com o advogado Luiz Eduardo Greenhalgh, um dos investigados na Operação Satiagraha, que prendeu o banqueiro Daniel Dantas.

Em um dos diálogos, o ministro da Justiça, Luiz Paulo Barreto, sua chefe de gabinete, Gláucia de Paula, e o então secretário nacional de Justiça Romeu Tuma Júnior conversam sobre a origem do poder do diretor da Polícia Federal, Luiz Fernando Corrêa que teria conseguido, entre outras coisas, evitar o indiciamento de Gilberto Carvalho, chefe de gabinete do presidente Lula.

Gláucia de Paula

O Gilberto (Carvalho, chefe de gabinete da Presidência) foi indiciado?

Ministro Luiz Paulo Barreto

O processo foi travado. Deu m... (...) O negócio do grampo. O Luiz Fernando falou pra não se preocupar.

Gláucia de Paula

Tem certeza disso?

Ministro Luiz Paulo Barreto

O ministro Márcio (Thomaz Bastos) que me contou isso. O Gilberto (Carvalho) me contou isso.

Tuma

Esse cara tem alguma coisa, não é possível (...).

O ministro, que diz ter tido conhecimento do indiciamento pelo próprio Gilberto Carvalho, revela que o diretor da PF promoveu uma encenação para iludi-lo, numa manobra para mostrar que seu poder emanava de fora da hierarquia do Ministério da Justiça. A conversa toma um rumo inesperado. Um dos interlocutores fica curioso para saber a fonte real de poder de Luiz Fernando, que lhe dá cobertura até para desafiar seu próprio chefe sem temor de represálias. Ele deve ter alguma coisa..., afirma. Procurado, Luiz Paulo Barreto informou que não comentaria nada antes de ter acesso ao áudio da conversa. Gilberto Carvalho negou que já tenha feito algum pedido a Pedro Abramovay, a mesma resposta de Dilma Rousseff. As conversas e sua vinda a público funcionam como o poder de limpeza da luz do sol sobre os porões. Elas são reveladoras da triste realidade vivida por instituições respeitadas quando passam a ser aparelhadas por integrantes de um projeto de poder.

O quartel-general da pré-campanha de Dilma Rousseff foi usado para espionar adversários. A mando de Luiz Lanzetta, o ex-jornalista Amaury Ribeiro Jr. comprou a quebra do sigilo fiscal do vice-presidente do PSDB, Eduardo Jorge, e de aliados de José Serra

Outra demonstração disso surgiu na semana passada, quando a Polícia Federal forneceu a mais recente prova de quanto pode ser perniciosa a simbiose entre partido e governo. Na quarta-feira, depois de revelado que o ex-jornalista Amaury Ribeiro Jr., integrante do grupo de inteligência da campanha de Dilma, foi o responsável pela violação do sigilo fiscal de Eduardo Jorge e de outros integrantes do PSDB, o militante petista Lula, atualmente ocupando a Presidência da República, anunciou ao país que a PF faria revelações sobre o caso antegozando o fato de que um delegado, devidamente brifado sobre o que deveria dizer, jogaria suspeitas das patifarias de Amaury Ribeiro sobre os ombros do PSDB. Mais uma vez, a feitiçaria dos petistas resultou em um tiro no próprio pé. Nunca aprendem que, uma vez aberta a caixa de Pandora, os fantasmas escapam e voam sem controle.

Em junho passado, VEJA revelou que o comitê de campanha de Dilma Rousseff arregimentou um grupo de arapongas para espionar o candidato José Serra, seus familiares e amigos. A tropa começou os trabalhos com o que considerava um grande trunfo, um dossiê intitulado Operação Caribe, produzido por Amaury e que narrava supostas transações financeiras de pessoas ligadas ao PSDB. As únicas peças do dossiê fajuto que não podiam ser lidas no Google haviam sido obtidas de forma preguiçosa e venal, compradas de bandidos com acesso a funcionários da Receita Federal e pagas com dinheiro vivo. Os dados fiscais violados serviram de subsídio para o tal relatório que circulou no comitê de campanha. Como previu o militante petista que ora ocupa a Presidência da República, horas depois de sua entrevista apareceram as tais novidades. Um delegado anunciou que, com a identificação de Amaury, o caso estava encerrado, já que o ex-jornalista, ao violar o sigilo, ainda era funcionário do jornal O Estado de Minas, portanto não haveria nenhuma ligação com a campanha do PT. O delegado Alessandro Moretti foi o escolhido apenas para comunicar à nação as graves revelações obtidas pelo trabalho policial formalmente ele não participou do inquérito. A lealdade no caso era mais vital do que o profissionalismo policial. Número dois na diretoria de Inteligência da PF, Moretti é produto direto do aparelhamento na Polícia Federal.

Não aguento mais receber pedidos da Dilma e do Gilberto Carvalho para fazer dossiês. (...) Eu quase fui preso como um dos aloprados.

Pedro Abramovay, atual secretário nacional de Justiça, em conversa com seu antecessor, Romeu Tuma Júnior

O Pedro reclamou várias vezes que estava preocupado com as missões que recebia do Planalto. Ele realmente me disse que recebia pedidos da Dilma e do Gilberto para levantar coisas contra quem atravessava o caminho do governo.

Romeu Tuma Junior, ex-secretário nacional de Justiça

Luiz Zidane Lula da Silva :: Elio Gaspari

DEU EM O GLOBO

Para ficar na metáfora de Lula, seu comportamento ao comparar o ataque sofrido por José Serra no Rio ao teatrinho do goleiro chileno Roberto Rojas foi semelhante ao do jogador francês Zinédine Zidane quando deu uma cabeçada no zagueiro italiano Materazzi, em 2006.

Lula deve desculpas a Serra. Chamou-o de mentiroso sem ver os vídeos que reconstituem o incidente.

Se os tivesse visto, não teria mentido, pois só uma pessoa desonesta (e as houve, muitas) não via que retratavam dois episódios distintos. Serra foi atingido duas vezes, por uma bola de papel e por um objeto mais pesado. A entrada de Nosso Guia no debate foi um golpe desleal, demagógico.

Se tivesse ocorrido um “dia da farsa”, com Serra simulando uma agressão, teria havido uma malfeitoria de candidato. Infelizmente, o farsante foi Lula, no exercício da Presidência da República, função que está obrigado a honrar até o dia 1ode janeiro de 2011.

Uma foto a mais para esclarecer!


DEU NO BLOG VELINHO NA REDE

Os "Cumpanheirus do Lula" em foto sentimental. Reparem que na hora da foto só o Lula estava claramente alcoolizado.

Este estudantes do Colégio Sacre Couer de Marie são os mesmos que agrediram os participantes da caminhada de José Serra em Campo Grande, no Rio de Janeiro, no último dia 19 de outubro.

Amigos Inseparáveis

Serra critica uso da máquina do governo

DEU EM O GLOBO

Tucano faz apelo para que eleitores adiem a "curtição do feriado" para votar

Adauri Antunes Barbosa

ARARAQUARA (SP) e MACEIÓ. O candidato do PSDB José Serra disse ontem que “o uso da máquina do governo para atacar adversários é comum”. Alegando desconhecer detalhes das reportagens da revista “Veja” e do jornal “O Estado de S. Paulo”, Serra não quis comentar diretamente as denúncias envolvendo pressões no governo para intimidar adversários e um processo em que o chefe de Gabinete da Presidência aparece como réu.

— Não vi a imprensa hoje.

Não me surpreenderia, mas prefiro não comentar. O uso da máquina do governo para atacar adversários é comum e corrente.

É comum, é habitual nesse governo — disse Serra, em evento em Araraquara.

Críticas mais fortes foram feitas pelo governador de São Paulo, Alberto Goldman, e pelo senador eleito Aloysio Nunes (PSDBSP).

Goldman foi incisivo ao comentar a informação de que o chefe de Gabinete da Presidência, Gilberto Carvalho, é réu em processo no qual é acusado, com o PT, de participar de uma quadrilha que cobrava propina de empresas de transporte na prefeitura de Santo André, que teria desviado R$ 5,3 milhões: — Foi esse grupo que assassinou o prefeito Celso Daniel. Porque o Celso Daniel disse, em um certo momento: “Não posso ir tão longe quanto vocês querem que eu vá”. Hoje Gilberto Carvalho passou a ser réu, é o secretário particular do presidente da República. Tornou-se réu.

Ele criticou Lula por defender “a violência contra candidatos que fazem sua campanha eleitoral de forma legítima”, “querendo transformar vítima em réu”.

Serra disse estar preocupado com a possibilidade de eleitores emendarem o feriadão de Finados e deixarem de votar: — Preocupa. É muito importante as pessoas se darem conta da importância que têm estas eleições para o futuro do Brasil e adiarem um pouquinho a curtição do feriado.

Em Alagoas, os senadores tucanos Aécio Neves (MG) e Sérgio Guerra (PE) voltaram a criticar Lula e Dilma Rousseff sobre sua reação à agressão contra Serra.

Aécio pediu tranquilidade

Aécio troca discurso pós-Lula por postura anti-Lula

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Senador eleito por MG diz que "por suas últimas atitudes, o presidente terminará seu governo menor do que iniciou"

Christiane Samarco

A radicalização da campanha eleitoral levou o ex-governador e senador eleito Aécio Neves (PSDB-MG) a se mover do discurso do pós-Lula para uma postura anti-Lula. Depois de passar oito anos provocando incômodos no PSDB por conta da boa relação pessoal com o Planalto, Aécio afirma agora que "por suas últimas atitudes, o presidente terminará seu governo menor do que iniciou", e mais: Sugere que Lula faça um "mea-culpa" depois da eleição, reconhecendo os "excessos" para assegurar uma transição "serena e pacífica", independentemente de quem seja o vencedor.

Em entrevista ao Estado, o senador mineiro confessa estar "decepcionado" com o chefe da Nação que "se despe da função presidencial e vira cabo eleitoral" para atacar o candidato da oposição. Mais do que uma queixa, ele diz que sua intenção é fazer um alerta em defesa da democracia e da paz na política. "Entre a chefia de Estado e a chefia de um grupo político, Lula opta claramente pela segunda e presta um desserviço àquilo que ele próprio ajudou a construir, que foi a democracia no Brasil", afirma. A seguir, a entrevista.

Como o senhor avalia o comportamento do presidente Lula nesta reta final da campanha?

É triste o figurino que o presidente resolveu vestir ao final desta campanha, com atitudes absolutamente impróprias e esquecendo que é o presidente de todos os brasileiros. Ele optou, como diz o Serra, por ser o presidente de uma facção. É triste e preocupante ver como as instituições de Estado se colocaram a serviço de um mundo político. A própria Polícia Federal, neste papel absurdo e ridículo que fez nestes últimos dias, criando versões que possam atender aos interesses do PT. A democracia que foi conquistada por tantos brasileiros não merecia, no momento de sua consolidação e amadurecimento, assistir a cenas como estas que não engrandecem o País. É desolador ver a forma como o presidente está terminando esta campanha.

O senhor acha que o presidente está trocando a faixa presidencial pela camisa de militante partidário?

Sempre tive uma boa relação pessoal com o Lula que sempre busquei preservar. Eu reconheço os avanços que houve no governo dele mas, por estas últimas atitudes, o presidente Lula, passadas estas eleições, termina seu governo menor do que iniciou.

Isto compromete de alguma forma a relação entre governo e oposição na próxima administração, qualquer que seja o resultado da eleição?

O que me preocupa é que esta postura de dirigentes do PT e do próprio Lula, independentemente do resultado eleitoral, crie no País um clima de muito maior acirramento e radicalização, no período pós-eleitoral, do que seria adequado e se esperava.

No cenário atual, a transição para o próximo governo corre risco?

Não acredito que corra risco, mas buscar vencer o adversário é uma coisa, e tentar dizimá-lo, é outra. Quando não há palavra de equilíbrio e ponderação das maiores autoridades do País, recomendando cautela e prudência e esses exemplos não vêm de cima, é claro que o pós-eleição pode ser mais radicalizado do que seria bom para o Brasil, independentemente do vencedor.

No ponto em que a radicalização está hoje, dá para recompor as relações políticas entre petistas e oposição?

Todos nós que somos responsáveis temos que trabalhar nesta direção. Mas as últimas ações do presidente não contribuem e vão na direção inversa, a do acirramento. As últimas declarações dele foram imprudentes e equivocadas e não contribuem para o que é essencial: uma sucessão serena e tranquila, qualquer que seja o futuro presidente. Infelizmente, Lula não tem contribuído de forma positiva para sua própria transição.

Abertas as urnas, o senhor avalia que o presidente terá de fazer um gesto pela pacificação?

Acho que o presidente Lula acabará fazendo um mea-culpa, vai compreender que cometeu excessos nesta campanha e que sua figura representa muito mais que apenas um cabo eleitoral. Ele próprio fará um gesto para preservar sua imagem que é um patrimônio importante diante de tantos brasileiros que não votaram nele, mas que o respeitam, como eu próprio. Todos nós, independentemente do resultado eleitoral, temos que trabalhar para que a transição seja absolutamente serena e pacífica porque os governos passam e a democracia deve ser permanente".

Suas observações são uma queixa ou o senhor faz um alerta ao País?

Acho que é mais um alerta e uma certa decepção de quem sempre reconheceu valores no presidente. Eu continuo reconhecendo, mas acho que ele ultrapassou os limites daquilo que seria adequado a um chefe de Estado. Entre a chefia de Estado e a chefia de um grupo político, Lula opta claramente pela segunda e não é algo que contribua. Com estas ações, ele presta um desserviço àquilo que ele próprio ajudou a construir, que foi a democracia no Brasil.

Oposição e até aliados do presidente sempre disseram que Lula é fundamental para impor limites aos grupos mais radicais do PT. Agora, como fica?

Quando Lula eleva muito o tom, ele incita os setores mais radicais do partido. O que fica é que seus liderados se acharam no direito de agir de forma ainda "mais irresponsável" e isto certamente é preocupante. O presidente deixa uma mancha em sua trajetória ao final de seu governo.

Isso muda o comportamento do PSDB na reta final da campanha?

A estratégia não muda, mas é o momento de deixar um alerta. Há preocupação. Não se sabe como os liderados do presidente Lula recebem esta sinalização do presidente. Vamos ficar na expectativa de que agressões não ocorram. De nossa parte vamos enfrentar isto sempre com muita tranquilidade e serenidade. A orientação do partido à militância tucana é para que não aceitem qualquer tipo de provocação nesta última semana de campanha.

Geraldo Alckmin: 'O que o PT quer colocar é o medo'

DEU EM O GLOBO

Governador eleito de São Paulo, Alckmin diz que discurso da privatização revela falta de argumentos e desespero do PT

ENTREVISTA Geraldo Alckmin

Menos contido que o habitual, o governador eleito de São Paulo, Geraldo Alckmin, assumiu um discurso contundente contra o PT.

Diz que o partido de Dilma Rousseff tenta criar um clima de medo na campanha ao espalhar novamente que os tucanos querem privatizar. E admite que o PSDB errou ao usar a tática do medo, há oito anos, contra Lula.

— Esse tema de privatização é coisa velha, superada.

Isso mostra o desespero deles, que estão sem argumentos para o eleitor votar em sua candidata — diz Alckmin, que no segundo turno, além de São Paulo, foi a quatro estados buscar votos para o tucano José Serra.

E ainda critica o presidente Lula que, diz, “faz piada com coisa séria”, ao zombar das agressões contra Serra.

Flávio Freire

O GLOBO: Como avalia as agressões contra o candidato José Serra (no Rio)?

GERALDO ALCKMIN: Lamento profundamente a postura do presidente da República. Houve uma agressão ao nosso candidato. Respeitamos o direito do PT de fazer a sua campanha, mas o PT nos persegue, ofende e, por vezes, até agride. O presidente da República é o chefe do Estado, deveria dar o exemplo, mas preferiu fazer piada com coisa séria, zombar da lei. Com isso, dá um péssimo exemplo e incita novas agressões.

No caso dos dossiês, o jornalista ouvido pela PF citou Aécio Neves. O senhor acredita em fogo amigo?

ALCKMIN: De forma alguma. O próprio Aécio já afirmou que não tem nenhuma relação com esse caso. Isso é uma tentativa do PT de tirar o foco dos seus próprios malfeitos.

Qual o seu papel neste segundo turno?

ALCKMIN: Em São Paulo, tenho percorrido o estado agradecendo os votos para governador e reforçando apoio. Na última semana fui a Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás e Acre em busca de apoio para Serra.

Por que esses estados?

ALCKMIN: Serra não tem como ir aos 27 estados, a campanha é muito curta, e você tem que gravar, tem debate, tem entrevista. Então, estou procurando ir aonde ele não vai, principalmente nos estados onde ganhei como (candidato a) presidente Essa agenda casada depende de confiança mútua.

Mudou o relacionamento entre os senhores desde 2006?

ALCKMIN: Sou amigo do Serra há 30 anos. Fomos deputados federais constituintes juntos. Fizemos até uma cartilha juntos sobre direitos previdenciários. Fui vice-líder do Serra em algumas ocasiões. Sempre estivemos próximos.

A eleição de 2006 está cicatrizada?

ALCKMIN: Não tem cicatriz, vamos em frente. O PT repete neste segundo turno um tema usado em 2006 e diz que o PSDB privatizará importantes estatais.

Na época, o senhor foi criticado por ter demorado a reagir. Agora, acha que o PSDB está sabendo lidar com esses ataques?

ALCKMIN: Em 2006, quando fui candidato, a minha reação não foi em relação a ser contra ou a favor da privatização. O que coloquei é se era lícito mentir para ganhar a eleição. O PT não questionava privatização do setor de telefonia, da Vale ou da Companhia Siderúrgica Nacional . Diziam só que a gente ia privatizar a Caixa, o Banco do Brasil e a Petrobras.

Falta ao PSDB jogo de cintura nesse jogo político?

ALCKMIN: O PT colocou essa coisa do medo. Era um boato por dia. O Lula não ganhou a eleição por causa disso. Ganhou porque ele era presidente, e o mandato é de oito anos. Como o Fernando Henrique ganhou a eleição, no primeiro turno, contra o Lula. O Lula em 98 nem foi para o segundo. Ele ganhou de mim porque era presidente, estava na cadeira e com a caneta cheia.

O senhor dá a entender que Lula ganhou por uso da máquina.

ALCKMIN: Claro que houve uso da máquina, mas, mesmo que não tivesse, ele (Lula) tinha vantagens de exposição, popularidade, estava no cargo. Vou dizer mais: eles estão errando. Esse tema de privatização é coisa velha, superada. Isso mostra o desespero deles, que estão sem argumentos para o eleitor votar em sua candidata. Eles não estatizaram nada. Pelo contrário, privatizaram bancos estaduais, como no Ceará e no Maranhão. Esse não é um tema que esteja hoje na cabeça das pessoas. O PT está apostando em algo superado. O que o PT quer colocar é o medo.

Não foi o PSDB que lançou o discurso do medo em 2002, na campanha de Serra?

ALCKMIN: Mas veja que não pegou. Politica é futuro, olhar para a frente. Acho que chegou o tempo do Serra. Ele está mais preparado. Além disso, o PT tem outro problema porque o país precisa de instituições fortes. Eles fazem essa coisa atrasada da carteirinha. Veja o que aconteceu com os Correios, que era número um em excelência. Viu no que deu?

A candidata do PT, Dilma Rousseff, prega que, se eleita, terá maioria no Congresso, ao contrário de Serra.

ALCKMIN: Imagina, se o Serra ganha, dois terços já estão com ele. Não tem tanto petista assim no Congresso

Como o senhor avalia a retomada de temas como aborto e casamento gay?

ALCKMIN: Esses temas da campanha são colocados pela sociedade, e as igrejas fazem parte da sociedade. Não é o candidato que escolhe temas, eles urgem e reverberam na imprensa. Sou contra o aborto e a favor da atual legislação, que prevê, nos casos de risco de vida para a mãe e estupro. E sou favorável à união civil. Se quiser fazer casamento, não vejo problema.

O PSDB está mais maduro que há quatro anos?

ALCKMIN: Tem que fazer campanha. A campanha do Serra, no primeiro turno, foi pequena em alguns estados. Encerrada a disputa estadual, a campanha vai ser 100%. O momento é diferente.

Muitos candidatos não apoiaram o Serra por medo de perder a eleição?

ALCKMIN: Isso aconteceu, mas a situação agora é diferente.

Eleito governador, o senhor se cacifa para a disputa presidencial de 2014. Está disposto a brigar com o Aécio Neves?

ALCKMIN: Acreditamos na possibilidade eleitoral do Serra. A prioridade é dele. Já ganhei e perdi eleições. Na derrota, altivez. Na vitória, humildade.

Tucanos farão ofensiva em Rio e Minas

DEU EM O GLOBO

Campanha de Serra acredita que os dois estados, onde Dilma teve melhor desempenho, vão decidir a eleição

Silvia Amorim

SÃO PAULO. A campanha do candidato à Presidência José Serra (PSDB) inicia a última semana convencida de que Minas Gerais e Rio são os estados que vão decidir a eleição. Não é exatamente uma boa notícia para o tucano. Nos dois colégios eleitorais, foi a adversária Dilma Rousseff (PT) quem levou a melhor no primeiro turno. A equipe de Serra está confiante no trabalho feito nesses dois redutos no segundo turno e, para esta semana, planeja uma ofensiva final. De hoje até sexta-feira, estão previstas duas visitas de Serra aos eleitorados mineiro e fluminense.

No Rio, o objetivo do candidato é reduzir a vantagem de Dilma, porque avalia que dificilmente vencerá no estado. No primeiro turno, Serra terminou em terceiro lugar no Rio, com 22,5% dos votos, contra 43,7% da petista e 31,5% de Marina Silva (PV). Já em Minas o esforço é para virar o placar e derrotar a petista, pegando carona na popularidade do senador eleito Aécio Neves (PSDB). No primeiro turno, Serra teve 30,7% e Dilma, 46,9%.

O palpite da coordenação da campanha tem como base pesquisas contratadas pelo marqueteiro Luiz Gonzalez. Os tucanos dão como certa a vitória de Serra nas regiões Sul e Centro-Oeste. O Nordeste é território garantido da adversária e o Norte caminha para dar maioria a Dilma. Pelos cálculos da cúpula tucana, a vantagem que Serra busca consolidar no Sul, no Centro-Oeste e em São Paulo neutralizaria os votos a mais obtidos pela petista no Norte e no Nordeste, restando Rio e Minas para desempatar o jogo.

Apesar do clima tenso da visita ao Rio na semana passada, quando Serra acabou atingido na cabeça por uma bobina de adesivos lançada por militantes do PT, a campanha decidiu que o candidato vai retornar ao estado. O tucano tem compromissos agendados para hoje e terça-feira. Também estão previstas duas idas de Serra a Minas. O PSDB avalia fazer um grande evento com Aécio, que pode se transformar no ato de encerramento da campanha.

- A ideia é fazer uma viagem a Minas antes do debate da Globo e outra depois - confirmou a coordenadora da agenda da campanha, senadora Marisa Serrano (PSDB-MS).

Equipe de Serra acredita em disputa apertada

DEU EM O GLOBO

Debates, horário na TV e cabos eleitorais de peso são trunfos

Silvia Amorim

SÃO PAULO. A cúpula da campanha de José Serra está se preparando para um verdadeiro teste de nervos nos próximos dias. Eles resistem a aceitar pesquisas divulgadas na semana passada (Ibope e Datafolha) que deram vantagem de cerca de 12 pontos percentuais para Dilma. Dizem que a disputa será apertada e decidida por menos de 5 milhões de votos. No primeiro turno, a petista teve quase 14 milhões de votos a mais que Serra.

Também contribuem para o clima de nervosismo os últimos debates na TV. Amanhã, Serra e Dilma se encontram na TV Record, em São Paulo. Na quinta-feira, na TV Globo, no Rio.

- Os debates são eventos de grande importância. O debate da Globo é ainda mais relevante pela audiência e por encerrar praticamente a campanha. Tenho convicção de que será um fator decisivo, principalmente numa campanha apertada, para definir os 10% de indecisos - avaliou o deputado Jutahy Magalhães (PSDB-BA), um dos coordenadores da campanha tucana.

Com regras negociadas com os candidatos, entre elas a ausência de perguntas de jornalistas, os debates não prometem temas espinhosos como a quebra de sigilo fiscal de tucanos e a denúncia de lobby na Casa Civil. O confronto mais acalorado deve se dar sobre a agressão a Serra no Rio. A coordenação política da campanha defende que o assunto seja explorado. A decisão caberá ao marqueteiro.

Aécio, FH, Richa e Alckmin estarão nas ruas

A equipe de marketing tem enfrentado dificuldades para fazer pesquisas para entender a cabeça do eleitor indeciso ou volátil. Cada vez mais, as pessoas têm demonstrado estar seguras da posição tomada e já não ouvem os argumentos contrários, segundo relatos de um integrante das equipes de sondagem.

Os programas no horário eleitoral são outro trunfo. Serra ainda não gravou todos, mas decidiu pela continuidade: resumo das principais propostas, biografia do candidato e forte comparação para reforçar a tese de que ele é o mais preparado.

- O caminho é o mesmo porque estamos no caminho certo que levará á vitória. Não nos intimidamos com agressões ou pesquisas. As urnas vão desmascarar essas pesquisas vergonhosas - disse Jutahy.

Cabos eleitorais como Aécio Neves e os governadores eleitos Geraldo Alckmin (São Paulo) e Beto Richa (Paraná) continuarão nas ruas. Em São Paulo, onde a meta é abrir entre 3 milhões e 4 milhões de votos de vantagem - no primeiro turno, foram 700 mil apenas - , o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso comandará um evento na sexta-feira.

O que pensa a mídia

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O mapa :: Mario Quintana

Olho o mapa da cidade
Como quem examinasse
A anatomia de um corpo...

(É nem que fosse o meu corpo!)

Sinto uma dor infinita
Das ruas de Porto Alegre
Onde jamais passarei...

Há tanta esquina esquisita,
Tanta nuança de paredes,
Há tanta moça bonita
Nas ruas que não andei
(E há uma rua encantada
Que nem em sonhos sonhei...)

Quando eu for, um dia desses,
Poeira ou folha levada
No vento da madrugada,
Serei um pouco do nada
Invisível, delicioso

Que faz com que o teu ar
Pareça mais um olhar,
Suave mistério amoroso,
Cidade de meu andar
(Deste já tão longo andar!)

E talvez de meu repouso...