quarta-feira, 14 de julho de 2010

Reflexão do dia – Marco Antonio Villa


Como é sabido, o Partido dos Trabalhadores nasceu em 1980. Contudo, muito antes da sua fundação, foi precedido de um amplo processo de crítica das diversas correntes de esquerda realizada na universidade e no calor dos debates políticos. A ação partidária, os sindicatos e as estratégias políticas adotadas durante o populismo (1945-1964) foram duramente atacados. Sem que houvesse um contraponto eficaz, fez-se tábula rasa do passado. A história da esquerda brasileira estaria começando com a fundação do PT. O ocorrido antes de 1980 não teria passado de uma pré-história eivada de conciliações com a burguesia e marcada pelo descompromisso em relação ao destino histórico da classe trabalhadora.


(Marco Antonio Villa, no artigo,’Obsessão pelo poder’, ontem, em O Globo)

Ressentimento e onipotência :: José A. Guilhon Albuquerque

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Demétrio Magnoli publicou nesta página (8/7) uma receita ideal para José Serra perder as eleições e delas sair engrandecido aos olhos de um setor da elite. Mas, como disse o técnico da brava seleção espanhola, "una final no es para jugar, es para ganar".

O autor apresentou um diagnóstico impecável sobre o governo Lula e o "lulismo". Para eleger-se um estadista, entretanto, não se trata de diagnosticar os atores, mas sim o processo eleitoral, que não é um concurso de simpatia, erudição ou correção política aos olhos de jornalistas, intelectuais ou ativistas: o que estará em jogo em outubro é a confiança do eleitor para escolher quem é mais capaz de manter as conquistas que o povo valoriza e evitar as mudanças que o povo teme.

Se Lula tivesse apoiado uma candidatura claramente confiável aos olhos do eleitor comum, comprometida em mudar o que o povo espera, sem pôr em risco os avanços econômicos, políticos e sociais da reconquista da democracia e da estabilidade da economia, o lugar para uma candidatura alternativa não seria o de um estadista, mas o de um profeta que clama no deserto.

Movido pelo ressentimento de ter galgado os píncaros do poder e ter-se recoberto da glória dos palcos internacionais, sem nunca ter conseguido derrotar Fernando Henrique Cardoso, e ofuscado pela onipotência que lhe é atribuída pelos beneficiários das benesses e migalhas que distribui à esquerda e à direita - e com desenvoltura senhorial -, Lula optou pela escolha maniqueísta entre o bem e o mal, lá onde o povo espera um compromisso entre continuidade e mudança.

Um pressuposto comum às análises do atual processo sucessório é o de que, uma vez decidido por Lula, um plebiscito seria inescapável e, porque Lula é imbatível, a vitória de Dilma é inevitável, cabendo a Serra mimetizar o papel de estadista e "perder as eleições falando de política", como diz Magnoli. Inescapável é o fato de que Lula, não o tendo feito no momento oportuno, já não conseguirá derrotar Fernando Henrique nas urnas. Para realizar esse sonho, ainda que sob a forma de delírio, Lula precisaria criar uma Dilma Rousseff à sua imagem e semelhança e levar José Serra a se comportar como um fantoche de Fernando Henrique. Não conseguiu uma coisa nem outra.

Partindo do pressuposto da invencibilidade de Lula e de sua pretensão a cabo eleitoral imbatível, a maioria das análises se ocupou em comprovar - contra as evidências estatísticas disponíveis - como, ao fim e ao cabo, a inevitabilidade de Dilma prevaleceria. Assim, quando Lula, do alto de seus 80% de aprovação, dissesse as palavras mágicas - "meu nome é Dilma" -, os jogos estariam feitos. E ele disse, mas ela não teve os inimigos por escabelo de seus pés.

Alguns aspectos desprezados reiteradamente nas análises eleitorais explicam essa discrepância entre os anseios de Lula e a realidade política. É verdade que Lula foi surpreendentemente hábil em decretar quem iria suceder-lhe e quem ele iria derrotar, como já foi seguidamente comentado na imprensa. Mas, ao fazê-lo, esqueceu - se é que soube um dia - que a realidade política não é uma tabula rasa na qual ele imprime um diktat a seu bel-prazer.

Lula mostrou que não era imbatível quando resolveu antecipar a luta sucessória para as eleições municipais de 2008 e escolheu Serra para ser derrotado de uma vez por todas. Com isso mandaria uma mensagem à oposição, ao seu próprio partido, à elite política e, enfim, ao mundo inteiro. Contudo sofreu uma derrota pouco dignificante e, ademais, escolheu o adversário errado, pois praticamente oficializou o então governador paulista como sua real alternativa de poder.

Como se não bastasse escolher o adversário errado, no momento errado e em inferioridade de armas, não foi capaz de reconhecer a derrota nem de aprender com ela, e promoveu uma polarização que, longe de opor sua imensa popularidade à imaginária rejeição a Fernando Henrique, força a uma comparação que só convém a Serra. Imaginando que seu imenso sucesso tudo lhe permite, não foi capaz de ver - ou, se viu, não levou em conta - que uma maioria significativa dos que aprovam o seu governo também rejeita a corrupção, não aprova o seu apoio às elites oligárquicas, nem a sua amizade com ditadores sangrentos, nem a sua leniência para com movimentos radicais e violentos, nem os atentados à liberdade. E tampouco está satisfeita com a condução de algumas das políticas que mais a atinge em sua própria vida.

Levada para o centro do palco sem nenhum preparo, sua candidata nunca teve o cuidado de se distanciar da corrupção, das oligarquias carcomidas, dos atentados à liberdade, dos governos "amigos" que tratam como inimigos os nossos compatriotas que lá vivem e as nossas empresas que lá produzem. Mas, quod licet Iove non licet bove, ou seja, em latim boi pode rimar com Júpiter, mas em nenhuma língua tem iguais poderes. Os que apoiam Lula o fazem apesar de não aprovarem seus erros, e não por causa deles.

Confiança não se transfere e uma campanha maniqueísta, quando o eleitorado quer continuidade com mudança, não ajuda a vencer uma dúvida que as pesquisas mostram ser persistente: o quanto de Lula - e o quê - pode ter contagiado Dilma, e o quanto de Lula persistiria em Dilma caso eleita. Caso aderisse a um script incendiário anti-Lula, Serra iria realizar o sonho plebiscitário do presidente, dando novo fôlego a uma candidatura com escassa margem para progredir, além de se desqualificar como aquele capaz de estabelecer um equilíbrio produtivo entre a segurança da continuidade e o temor da mudança.


Professor titular de Ciência Política e Relações Internacionais da Universidade de São Paulo

Na corda bamba :: Merval Pereira

DEU EM O GLOBO

A candidata oficial, Dilma Rousseff, continua tentando se equilibrar entre o agronegócio e o MST, e decididamente não está tendo bons resultados falando o que cada plateia gostaria de ouvir. Em uma reunião da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), ontem, ela garantiu que vai continuar a reforma agrária "não porque o MST quer a reforma ou outro movimento queira. Nós vamos continuar fazendo reforma porque é bom para o Brasil".

Dias antes, em uma feira agrícola no interior de São Paulo, ela garantira aos representantes do agronegócio que não toleraria "invasões de terra", que considerou "atitudes ilegais".

Entre essas duas declarações, aconteceu uma entrevista do comandante do MST, João Pedro Stédile, prometendo um aumento das ocupações de terra se a petista Dilma Rousseff vencer as eleições, "pelas afinidades históricas entre os dois grupos".

Com Dilma, disse Stédile, "nossa base social perceberá que vale a pena se mobilizar, que poderemos avançar, fazendo mais ocupações e mais greves".

Na análise do comandante do MST, "se o Serra (José Serra, candidato do PSDB) ganhar, será a hegemonia total do agronegócio. Será o pior dos mundos. Haverá mais repressão e, por isso, tensão maior no campo".

A sensação de Stédile é de que a vitória de Dilma pode dar novo fôlego ao movimento, mas ele não está tão seguro assim da vitória, definindo assim sua decisão: "É como se você percebesse que seu time pode cair pra segunda divisão e faz o que for possível para vencer o campeonato. Não temos alternativa".

Na Contag, Dilma jactou-se das ações governamentais nessa área, afirmando que mais de 60% dos assentamentos existentes foram realizados no governo Lula.

Já Stédile diz que a maior parte do que o governo Lula anuncia ter feito "é propaganda", sem base na realidade.

A candidata colocou o boné da Contag ao discursar, da mesma maneira que em reunião do PT em Sergipe colocara o boné do MST. Mas ela já dissera anteriormente que "não é cabível vestir o boné do MST. Governo é governo, movimento é movimento".

As posições ambíguas da candidata oficial criam momentos de constrangimento como o que ela passou ontem na Contag, quando foi cobrada por pontos que constavam de diversos documentos do PT e do governo e que acabaram desaparecendo por obra e graça dos prejuízos eleitorais que poderiam trazer à sua candidatura:

Atualização dos índices de produtividade no campo para permitir mais desapropriações, e o limite de propriedade da terra por pessoas físicas e jurídicas brasileiras e estrangeiras, além da revogação das medidas provisórias editadas pelo governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso "que criminalizam a luta pela terra e suas organizações".

O alvo prioritário é a medida provisória das invasões de terra, que retira do programa de Reforma Agrária por dois anos qualquer área invadida.

Essa MP não foi revogada formalmente pelo governo Lula, mas na prática está extinta, pois não é utilizada. Mas os "movimentos sociais" do campo querem a revogação oficial.

Os pontos estavam tanto no Programa Nacional dos Direitos Humanos quanto no programa do PT registrado no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), mas despareceram em sucessivas versões que foram sendo amainadas.

Dilma ouviu as reivindicações, mas fez "cara de paisagem" sobre esses pontos polêmicos. Também em 2002, quando Lula foi eleito pela primeira vez, o MST intensificou a invasão de terras na suposição de que estava sendo eleito "o Lula de 1989".

Aquele Lula, que perdeu para Fernando Collor naquela eleição, não estava preparado para governar, na avaliação do próprio Lula presidente, que já admitiu que teria sido "uma tragédia" se tivesse sido eleito.

Stédile, até hoje, lamenta que "aquele Lula de 1989" não exista mais hoje. E pelo jeito está renovando as esperanças de que, eleita, a companheira Dilma se revele mais próxima "daquele Lula" do que hoje se imagina.

Ao contrário, se eleita presidente a candidata oficial Dilma Rousseff não se submeter à política agrária do MST, terá força política, como Lula teve, para conter o movimento ou, como anda dizendo o candidato oposicionista José Serra, "Lula é mais forte do que o PT. Dilma é mais fraca do que o PT. Se ela ganhasse, quem iria estar por cima era o PT, com todas aquelas contradições, todas aquelas dificuldades que sempre enfraquecem um presidente".

O presidente Lula está diante de uma nova oportunidade para demonstrar na prática que sua política de aproximação de ditadores tem objetivos mais valorosos do que simplesmente se omitir em relação à defesa dos direitos humanos para aumentar nossas exportações.

Lula sempre alega que pode influir mais positivamente junto a ditadores amigos, como Fidel Castro, de Cuba, ou Mahmoud Ahmadinejad, do Irã se trabalhar com discrição.

No caso de Cuba, não se sabe de nenhum movimento que tenha dado certo, como agora mesmo a Espanha e a Igreja Católica conseguiram com a libertação de presos políticos.

Agora, vários países já pediram ao governo do Irã que suspenda a pena de morte por apedrejamento de Sakineh Mohammadi Ashtiani, condenada por adultério.

Existe até mesmo um abaixo-assinado internacional on-line, coordenado pela Anistia Internacional, em http://freesakineh.org. já assinado por diversos brasileiros ilustres.

Não se tem notícia de algum movimento do governo brasileiro no sentido de influenciar nesse caso

Manda quem pode :: Dora Kramer

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

O candidato José Serra recentemente levantou um assunto que suscita discussões e divide opiniões: se Dilma Rousseff for eleita presidente quem mandará no País, ela, Lula ou o PT?

Diz o tucano que será o PT, procurando tirar proveito da polêmica acerca do programa de governo eivado de retrocessos institucionais que a candidata Dilma Rousseff diz que rubricou, mas não assinou.

Essa posição não é unânime, pois muita gente de peso no governo e na oposição compartilha a convicção de que Dilma é um fantoche de Luiz Inácio da Silva que assim continuará se ganhar a eleição.

Fundador do PT que se afastou do partido em 2005, vice-prefeito na gestão de Marta Suplicy na Prefeitura de São Paulo e hoje eleitor de Marina Silva, o professor Hélio Bicudo é taxativo: "Lula quer Dilma no poder para continuar mandando no País."

Já os dois partidos que sustentam a candidatura nutrem cada um a esperança de se sobrepor ao parceiro no comando do espetáculo.

O PT tanto não tem dúvida disso que nem pensou duas vezes em enviar ao Tribunal Superior Eleitoral o programa aprovado pelo partido em fevereiro último, ignorando completamente as propostas entregues solenemente pelo candidato a vice, Michel Temer, à candidata a presidente.

Ademais, dirigentes, parlamentares e governantes (prefeitos, principalmente) petistas falam abertamente sobre a expectativa de dias melhores num governo sem Lula para fazer sombra ao partido.

O PMDB em sua sinuosidade aguarda os acontecimentos razoavelmente em silêncio. Apenas uma vez ousou ser mais explícito falando em ser também "protagonista" no próximo governo.

Prefere posar de disciplinado em público, enquanto se delicia no particular com as confusões em que se envolve o PT, certo de que num eventual governo Dilma elas seriam tantas que o PMDB se destacaria no papel de poder moderador e interlocutor confiável.

Quem entende e tem experiência de poder aposta que, uma vez de posse da cadeira e principalmente da caneta presidencial, a criatura não levaria muito tempo para se distanciar do criador e Dilma Rousseff tenderia a sair da sombra de Lula em função da própria dinâmica do cotidiano da Presidência. Ela, e não mais ele, passaria a ser a referência.

A propósito desse tipo de avaliação um matreiríssimo deputado baiano (do PMDB) costuma dizer o seguinte: "Quando a gente atende à porta não pergunta quem foi, pergunta quem é."

Linha torta. Ficou feio para Dilma e Serra a maneira negligente como ambos apresentaram seus ditos programas de governo à Justiça Eleitoral.

Mas no geral foi bom, pois suscitou debate a respeito dos projetos de País, obrigando os candidatos e as assessorias a dar atenção efetiva a um assunto que raramente ocupa espaço nas campanhas eleitorais.

O que domina ainda são as pesquisas e o bate-boca, mas os programas ganharam um destaque que nunca tiveram.

Nessa seara o PSDB se reorganizou a saiu na frente anunciando a divulgação gradativa do programa, ponto a ponto, a partir de agora.

O PT ainda patina nas desculpas inconsistentes prometendo apresentar um programa conjunto das doutrinas petista e pemedebista.

Cigarra. De 2007, quando foi anunciada a escolha, a 2014 o Brasil teria sete anos para se preparar como país sede da Copa do Mundo. Conforme atesta agora a Fifa ("falta tudo"), perdeu três.

Nesse período muito se festejou, mais ainda se bajulou. Governantes e dirigentes. Nada se fez e, é claro, até a data fatal tudo acabará sendo feito. Mais a que custo e sob quais métodos são questões que os principais candidatos à Presidência da República poderiam se habilitar a debater.

À imagem. Pode ser mera coincidência. O logotipo da Copa 2014 - criação da agência África de Nizan Guanaes - apresenta três mãos abraçando a taça, duas com cinco dedos e uma com quatro.

Jogo aberto:: Fernando Rodrigues

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

BRASÍLIA - Registradas as candidaturas a presidente, o senso comum parece continuar igual ao das semanas anteriores. Se a disputa pelo Planalto é uma partida de xadrez, Dilma Rousseff (PT) joga com as brancas. Tem a vantagem natural de ser governista em tempos de economia aquecida -além do apoio do maior cabo eleitoral surgido na política brasileira nas últimas décadas, Luiz Inácio Lula da Silva.
José Serra joga com as peças pretas. Sempre tentará se recuperar da vantagem natural do adversário. No final -no xadrez, pelo menos-, não é impossível a vitória de quem está com as pretas.

Nesse jogo, um aspecto objetivo deve ser considerado. Há uma unidade muito maior nas alianças estaduais formadas até agora pelo consórcio PSDB-DEM do que o verificado na joint venture PT-PMDB.

Esses partidos protagonizam as duas principais coalizões no plano nacional. Mas, no mesmo dia da eleição para presidente, cerca de 130 milhões de brasileiros escolherão também novos governadores, deputados e senadores.

Quando se observa a lista divulgada pelo TSE com as alianças nos Estados, nota-se que PSDB e DEM estão oficialmente unidos em 21 das 27 unidades da Federação nas eleições locais. Já PT e PMDB são aliados em apenas 14 Estados.

Como ensina o truísmo sempre repetido em Brasília, não se faz política "no Brasil", e sim nos Estados e nas cidades, localmente.

A maior unidade não garante ao condomínio tucano-demista uma vantagem definitiva no processo eleitoral. Aliás, impossível dizer se a união PSDB-DEM em 21 Estados ocorre por afinidade ideológica ou por falta de opção contra o rolo compressor lulista.

Mas esses dados das alianças regionais demonstram como há ainda muitos fatores a serem considerados no cálculo das previsões sobre quem será o sucessor de Lula. A disputa está aberta.

Duas ordens e muita concentração de poder:: Rosângela Bittar

DEU NO VALOR ECONÔMICO

As grandes questões a serem discutidas e votadas no Senado Federal, os temas de interesse do país, as reformas institucionais, os desdobramentos em leis dos planos de governo, tudo isto não está em jogo no traçado da estratégia político-eleitoral do presidente Lula para este ano. Em ordem unida, bem captada por seu exército de negociadores e articuladores, o fim em que empenhará os meios da sua popularidade e o tempo de televisão do PT e do PMDB é a eleição de Dilma Rousseff a presidente da República e, quase que com o mesmo peso, a eleição de uma maioria confortável de senadores, uma vez que a Câmara está garantida.

A candidatura presidencial a suceder-lhe foi formulada, por Lula, há cerca de três anos. De lá para cá, o que foi feito em matéria de ação presidencial teve o objetivo de criar as melhores condições para garantir o duplo objetivo. Por isso as concessões sem limite ao PMDB. Por isso as transgressões à lei. Por isso as rasteiras em aliados históricos para agradar aliados recentes mais poderosos. Sem hesitar.

O que não está posto com a clareza com que foi compreendida a estratégia para eleger Dilma, e só agora, com o fechamento das alianças estaduais, as autoridades próximas a Lula começaram a explicitar, é a cartada presidencial para eleger um Senado de composição favorável, e de lá afastar desafetos.

Lula não quer expulsar apenas seus adversários da oposição, embora esteja neste grupo a maioria das cabeças a tentar cortar. Mas gostaria de ver fora do poder legislativo também colegas de partido.

O Senado que Lula espera fazer para seu sucessor, se for Dilma, e para si próprio, se voltar em 2014, é um clube de convivência mais amável de quantos já se formaram naquela Casa, em sucessivas Legislaturas.

Lula começou a se fixar no Senado quando perdeu a votação da CPMF, há três anos, o imposto sobre o cheque que arrecadava R$ 40 bi, hoje já reposto com folga. O trauma, entretanto, permaneceu, possivelmente pela informação contida naquela derrota. Ficou patente, como se demonstrou, que não haveria futuro, com o paredão erguido nesse Senado, para uma emenda constitucional que instituísse o terceiro mandato consecutivo para o Presidente da República.

Nem a CPMF foi derrubada só pela oposição, nem as demais votações nominais do Senado apresentaram índices importantes de infidelidade, mas os episódios cravaram na mente presidencial a ideia de tomada do Senado.

Votaram contra o imposto do cheque os 14 senadores do DEM, os 13 do PSDB, 3 dos 20 do PMDB, 2 dos 4 do PR, 1 dos 6 do PTB e 1 do PSOL. Votaram a favor os 12 do PT, os 5 do PDT, 1 do PCdoB, 1 do PP, 2 do PRB, 2 do PSB, 12 do PT. Estudo da consultoria Arko Advice analisa votações no Senado de 2003 a 2010. A base do governo não se apresenta tão incontestável quanto o foi na CPMF, o próprio governo não se empenhou na maioria das votações, mas a média de fidelidade, nos partidos governistas, esteve sempre acima de 50%. No PT foi de 77%, no PMDB de 57%, no PP de 70%, PSB 78%, PTB 67%, PCdoB foi de 72%, o PR de 73%. Até o DEM (17%) e o PSDB (13%) votaram a favor do governo. Os maiores percentuais de votos contra o governo estiveram no PSC (66%), no PSDB (58%) e em terceiro lugar no DEM (50%).

Não parece uma zona tão hostil que exija a guerra de extermínio, mas cada um sabe das suas metas.

Do PT, Lula não engole, por exemplo, o senador Paulo Paim (RS), que sempre tem uma proposta contra a posição do governo. Mas não vai ter jeito, ele parece ter reeleição assegurada. Outra de seu partido que também considera problemática (vota 90% com o governo, depois, quanto mais seu voto é necessário, vai contra, é o que explicam), a senadora Serys Slhessarenko (MT), conseguiu deter e ela não se recandidatou. Em seu lugar Lula quer trazer Carlos Abicalil, deputado de confiança do governo nas CPIs mistas do primeiro mandato.

O trabalho mais objetivo do presidente foi o de tentar barrar a eleição de senadores do DEM e do PSDB que, por sinal, estão enfrentando mesmo dificuldades. Tasso Jereissati (PSDB-CE) viu bloqueado o acordo que tinha feito com o governador Cid Gomes (PSB), instado por Lula a lançar dois candidatos da base ao senado na sua chapa de reeleição: Eunício Oliveira (PMDB) e José Pimentel (PT). Heráclito Fortes (DEM-PI) encontrou obstáculos fortíssimos com o lançamento de vários candidatos apoiados por Lula, em diferentes chapas de partidos aliados que lançaram candidatos ao governo. Arthur Virgílio (PSDB-AM) tem a reeleição sob alto risco, todas as chapas fortes aderiram ao governo federal e precisou lançar um vereador do PPS ao governo para ter palanque, caso semelhante ao de Jereissatti.

Lula não queria a volta de Flávio Arns (PSDB-PR), senador que já foi do PT e se bandeou para o partido adversário. Mas não foi necessário articular contra ele porque Arns desistiu da reeleição ao Senado para ser o vice do candidato Beto Richa ao governo do Estado. Por último, há um senador do DEM que Lula fazia questão de derrotar, José Agripino (RN), combativo líder do partido. Mas Agripino resiste na categoria dos desafetos que, a exemplo do senador Paulo Paim, o presidente não está conseguindo derrubar.

Além de trabalhar contra, Lula agiu a favor, batalhou muito para garantir a volta de senadores que considera seu esteio no Senado. Fez tudo o que o senador Renan Calheiros (PMDB-AL) queria que fizesse para facilitar sua reeleição. A exigência ao PT do Maranhão para que se aliasse formalmente a Roseana Sarney, desconhecendo até greve de fome de aliados históricos, se deve à decisão de ter José Sarney, presidente do Senado, sob seu controle.

Esses arranjos, aos quais se somarão as vitórias hoje praticamente asseguradas de muitos candidatos petistas ao Senado, bem como o sucesso de aliados do arco de adesões que costurou, dão ao presidente Lula a certeza de que para Dilma, se for eleita, ou para si próprio, se voltar em 2014, o Senado não será mais seu calcanhar de Aquiles. Se combinar a escrita com o eleitorado, assim será.

Rosângela Bittar é chefe da Redação, em Brasília. Escreve às quartas-feiras

Ana Costa - Não me diga adeus / Lapa - Rio de Janeiro

Tanure anuncia o fim do "JB" impresso

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Em longa agonia financeira, centenário "Jornal do Brasil" terá conteúdo só na internet a partir de setembro

Nelson Tanure, que arrendou "JB" por 60 anos em 2001, fracassou com "Gazeta Mercantil", JBTV e revista "Forbes"

Elvira Lobato

RIO - O "Jornal do Brasil" publica hoje um comunicado aos leitores anunciando o fim de sua edição impressa, a partir do dia 1º de setembro. Seu conteúdo, a partir de então, ficará disponível apenas na internet, com preço de assinatura de R$ 9,90 por mês.

O fim do "JB" impresso abalou o comando da empresa. O presidente do jornal, Pedro Grossi Jr., discordou da decisão e não apareceu na Redação ontem, apesar de o empresário Nelson Tanure, arrendatário da marca JB, negar que o tenha demitido.

O "Jornal do Brasil" vem de longa crise financeira, agravada por passivos fiscais e trabalhistas herdados dos antigos gestores, mas o comunicado de Tanure tenta desvincular a modificação da situação de crise. O texto diz que o jornal fez uma consulta eletrônica aos leitores no último mês e que eles apoiaram a mudança.

""O "JB" vai sair do papel. E entrar para a modernidade", diz o texto, encaminhado à Folha por Nelson Tanure. O comunicado diz que os leitores economizarão R$ 40 por mês ao trocarem a assinatura mensal do jornal impresso, de R$ 49,90, pela assinatura do portal.

CIRCULAÇÃO EM QUEDA

A Folha apurou que a migração vai provocar corte de pessoal. O "JB" tem 180 funcionários, 60 dos quais na Redação. A família Nascimento Britto, dona da marca e antiga proprietária do "JB", disse não ter informação sobre o projeto de Tanure.

O jornal tinha uma circulação diária de 76 mil exemplares quando passou para Tanure. Em 2003, iniciou um caminho de recuperação, chegando a 100 mil exemplares em 2007, para novamente entrar em rota de queda.

Em março deste ano, quando a circulação estava em 20.941 exemplares, Tanure contratou Pedro Grossi Jr. para administrar o jornal.

Já circulava a informação de que Tanure iria acabar com o jornal impresso. No último dia 28, Nelson Tanure confirmou a intenção a Pedro Grossi, que começou a articular um meio de manter o jornal impresso.

Estudou-se transferir o contrato para outra empresa, blindada contra as ações trabalhistas e fiscais remanescentes. O negócio foi desaconselhado porque a Justiça tem considerado que os novos donos são sucessores na dívida.

FORA DA MÍDIA

O fim do "JB" impresso será também o fim da experiência de Nelson Tanure como empresário de mídia. Ele disse à Folha que não quer mais atuar nesse setor e que vai se concentrar em telecomunicações.

Ele tem 5,15% da TIM Participações (subsidiária da Telecom Italia, que atua em telefonia celular, telefonia fixa local e de longa distância).

Tanure só acumulou fracassos em suas incursões na mídia. Em 2002, comprou os direitos de publicação da revista "Forbes", no Brasil. Um ano depois, a "Forbes" rompeu o contrato.Em 2003, arrendou o jornal econômico "Gazeta Mercantil", que, como o JB, acumulava grande passivo. O jornal deixou de funcionar no ano passado, e a marca foi devolvida ao antigo dono.

Em 2007, Tanure lançou a JBTV, que durou seis meses. Ainda arrendou a Editora Peixes, que também voltou para os antigos donos. Ele diz que perdeu todo o investimento que fez no "JB".

"Jornal do Brasil" foi o sonho profissional de uma geração

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

FERNANDO GABEIRA
ESPECIAL PARA A FOLHA

O "Jornal do Brasil" foi o sonho profissional da nossa juventude desde os anos 1950 até o princípio dos anos 1960. Representou o sonho profissional de toda uma geração no início da década de 1960. Foi a mais radical reforma jornalística feita no país até aquela data.

O uso do espaço em branco na introdução de fotografias com a luz ambiente e excelentes reportagens eram alguns dos seus componentes.

O desenho do jornal, trabalhado por Amílcar de Castro e inspirado no pintor holandês Mondrian, representou durante muito tempo uma atração internacional, porque muitos jornalistas vieram do exterior para observar aquelas mudanças.

Na parte cultural, o "Jornal do Brasil" inovou lançando um suplemento literário voltado para o concretismo, mas que revelou alguns dos principais poetas e escritores do país. Nos últimos anos, o "Jornal do Brasil" tornou-se um fantasma do que era, conservando a máxima de que um jornal leva mais de uma década para morrer.

O jornalista FERNANDO GABEIRA é deputado federal (PV-RJ) e trabalhou no "Jornal do Brasil".

Jornal obteve destaque na ditadura militar

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

RIO - Ao longo dos seus 119 anos de história, o "Jornal do Brasil" foi responsável por uma série de inovações na imprensa brasileira.

Teve papel de destaque na cobertura política, especialmente durante a ditadura militar.

Fundado em 1891, o "JB" chegou a ser conhecido como "o jornal das cozinheiras" nos anos 1930, quando passou a dar menos destaque para fatos políticos, artes e literatura.

A mudança trazia páginas iniciais de anúncio e fazia parte da estratégia para superar a crise do início daquela década.

No fim dos anos 1950, após investir em novos equipamentos, o jornal empreendeu uma reforma gráfica que se tornou referência, com a implantação da diagramação vertical e a valorização dos espaços brancos das páginas.

"O "JB" herdou algo que nasceu no "Diário Carioca": o noticiário objetivo, sem opinião, que procurava informar com clareza. Fico triste porque fiz parte do grupo de jornalistas que participou da renovação do jornal e que teve como principal figura Janio de Freitas", disse o poeta e colunista da Folha Ferreira Gullar.

Durante a ditadura, o "JB" se destacou na cobertura do AI-5, ato institucional que suspendeu garantias constitucionais. Como a Redação estava ocupada por censores, a saída foi publicar um boletim do tempo. Nele, afirmava-se: "Ar estava irrespirável".

Último da turma:: Ruy Castro

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

RIO DE JANEIRO - Em maio de 1959, o "Jornal do Brasil" carregava o peso de seus 68 anos. Era um jornal caótico, feio e ultrapassado -alguns de seus colaboradores ainda usavam bigode encerado. Era, sobretudo, um jornal de classificados- os anúncios ocupavam quase toda a primeira página, e quem fosse visto lendo-o estava procurando emprego ou faxineira.

E, então, sem aviso nem fanfarra, na manhã de 2 de junho, diante de um quase irreconhecível "Jornal do Brasil" nas bancas, todos os outros jornais é que pareceram caóticos, feios e ultrapassados. Ele ficara limpo, elegante e moderno, com os títulos parangonados, os textos e fotos dispostos geometricamente, as colunas separadas por espaços, e não fios. Mas o principal seria sua reforma jornalística, capitaneada pelo jovem Janio de Freitas, depois continuada por seus sucessores.

A partir daí, trabalhar no "JB" tornou-se a aspiração de todo jornalista. Equivalia a um Ph.D.

E mesmo os que, como eu, amavam o "Correio da Manhã" flertavam com o "JB". Bem, deu-se que, muito depois, em 1975, eu fosse levado para lá, para criar uma revista colorida dentro do jornal: "Domingo", a primeira do gênero no país.

Fiquei dois anos no "JB", numa redação estrelada por Elio Gaspari, Marcos Sá Corrêa, Zozimo, João Saldanha, João Máximo, Renato Machado, Norma Couri. Deu para sentir a diferença em relação a empregos anteriores: ao telefonar para alguém e me apresentar como "Fulano de Tal, do "Jornal do Brasil"", ninguém deixava de vir correndo ao aparelho.

A mística do "JB" durou até 1990, quando uma sucessão de erros administrativos, financeiros e editoriais começou a destruir o jornal. Chega agora ao fim, aos 119 anos, com a decisão de limitar-se à versão internet. Parece incrível, acordar e não ter o "JB" de papel para folhear. Mas há muito eu era o último de minha turma a ainda fazer isto.

Jarbas abre campanha de rua com José Serra

DEU NO JORNAL DO COMMERCIO (PE)

Presidenciável tucano e senador peemedebista – candidato a governador – vão a Caruaru e Gravatá na sexta (16). A programação prevê caminhadas nos municípios. No dia 31, os dois visitam o Sertão

Sérgio Montenegro Filho

No momento em que inicia a campanha, em meio a dificuldades de infraestrutura e pessoal, o candidato da coligação Pernambuco Pode Mais (PMDB/PSDB/DEM/PPS/PMN) a governador, senador Jarbas Vasconcelos (PMDB), recebe um reforço importante ao seu palanque, na próxima sexta-feira: o presidenciável do PSDB, José Serra. Na realidade, Jarbas acertou com o tucano duas visitas a Pernambuco este mês. A primeira, na sexta (16), quando Serra irá a Caruaru e Gravatá, no Agreste. A outra passagem do presidenciável pelo Estado está prevista para o dia 31, no Sertão do São Francisco.

De acordo com informações da assessoria da coligação jarbista, Serra desembarca no Aeroporto de Caruaru às 14h30 da sexta-feira, e segue direto para uma caminhada no centro da cidade. Ao seu lado, além de Jarbas, estarão os candidatos ao Senado – Marco Maciel (DEM) e Raul Jungmann (PPS) – e a vice, deputada caruaruense Miriam Lacerda (DEM), anfitriã do grupo. O ex-prefeito e vereador Tony Gel (DEM), marido de Miriam, também deve integrar a comitiva, que concluirá a caminhada na tradicional feira da cidade.

Logo após, Serra, Jarbas e comitiva seguem para Gravatá, onde participam de nova caminhada no centro comercial. À noite, às 19h, o presidenciável e seu grupo prestigiam o show do pianista filipino Victor Assunción, incluída na programação do Virtuosi, festival de música erudita realizado na igreja Matriz de Sant’Anna. Serra deve pernoitar em Caruaru e retornar a São Paulo no sábado.

Se tudo correr dentro do que foi acertado pelos dois candidatos aliados, o presidenciável tucano deverá retornar a Pernambuco no final do mês, mais precisamente no dia 31. Ele se unirá à maratona que a coligação de Jarbas planeja realizar por municípios do Sertão do São Francisco, uma área considerada delicada pelas oposições, mesmo tempo o apoio do prefeito de Petrolina, Júlio Lóssio (PMDB).

O ápice da visita ao Sertão acontecerá justamente em Petrolina, quando Serra e os candidatos majoritários da aliança jarbista visitarão a Feira Nacional da Agricultura Irrigada (Fenagri), um dos maiores eventos realizados naquela área. Os coordenadores da coligação ainda não fecharam todos os municípios que serão visitados na programação de Jarbas pelo Sertão. Eles adiantaram, apenas, que deverá ser uma agenda bastante ampla.


Serra: 'Presidência não se terceiriza'

DEU EM O GLOBO

Tucano critica proposta de Lula de criar nova estatal; após dizer que não assina nada sem ler, ele adia plano de governo

Francisco Junior*

SÃO LUÍS e SÃO PAULO. O candidato do PSDB à Presidência, José Serra, procurou minimizar ontem o apoio que sua adversária do PT, Dilma Rousseff, recebe do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que tem seus maiores índices de aprovação na Região Nordeste. Em visita a São Luís, no Maranhão, Serra afirmou que não é possível terceirizar o exercício da Presidência:

- O Lula termina o mandato em 31 de dezembro. Presidente não se terceiriza. Presidente tem que comandar as coisas. A campanha não está voltada para o Lula e sim para o Brasil - afirmou Serra, ao ser perguntado sobre as pesquisas de intenção de voto na Região Nordeste, onde Dilma lidera.

Serra foi a São Luís para o primeiro ato de campanha do candidado do PDT ao governo do Maranhão, Jackson Lago, apoiado por uma coligação integrada pelo PSDB. Lago foi cassado em 2009 pelo Tribunal Superior Eleitoral por crime eleitoral durante a campanha de 2006 e teve que deixar o cargo de governador. Sua adversária, Roseana Sarney (PMDB), aliada da petista Dilma Rousseff, assumiu o governo.

Desembarque tumultuado em São Luís

O tucano ainda criticou a proposta do governo Lula de criar uma empresa estatal para a área de seguros, o que, segundo ele, pode estimular a corrupção.

- Empresa de seguros é uma área potencialmente de muita corrupção. É muito difícil em uma empresa de seguro estatal, segurar a corrupção - afirmou Serra.

O desembarque de Serra foi tumultuado: manifestantes do Sindicato dos Professores de São Luís protestavam contra o prefeito da cidade, o tucano João Castelo. Serra recebeu o título de cidadão da capital maranhense e prometeu, se eleito, dar atenção especial à cidade:

- Já tinha obrigação como brasileiro e agora tenho como cidadão de trabalhar para São Luís e para o Maranhão.

Após cutucar Dilma Rousseff, ao dizer que não assina nada sem ler, Serra determinou à coordenação de sua campanha a suspensão da divulgação das diretrizes do seu programa de governo na internet, prevista para ontem, até que ele faça uma nova leitura do documento. A equipe tucana esperava ontem sinal verde para publicar os primeiros trechos do programa na internet sobre agronegócio, gestão pública e portadores de deficiência.

* Especial para O GLOBO COLABOROU Silvia Amorim

Gabeira: Cabral usa a tática do PMDB

DEU EM O GLOBO

Candidato do PV chama de escândalo a compra superfaturada de remédios, sem licitação, pelo governo do estado

Duilo Victor e Rafael Galdo

O deputado federal Fernando Gabeira, candidato ao governo do Rio pelo PV, classificou como "um escândalo" as denúncias de que a Secretaria estadual de Saúde gastou R$81,1 milhões para a compra, sem licitação, de remédios e material médico-hospitalar no ano passado, como mostrou anteontem o "RJ-TV", da Rede Globo. Em visita ontem a São Gonçalo, Gabeira pediu a punição dos responsáveis pela aquisição de medicamentos a preços superiores aos pagos por outros estados e municípios. E criticou o adversário, o governador Sérgio Cabral (PMDB), levantando suspeitas de corrupção no caso:

- Talvez seja a questão mais séria da campanha. É um escândalo que estava sendo abafado. A primeira solução é punir os responsáveis e mostrar que estão gastando mal nosso dinheiro. Temos saída para comprar remédio mais barato. Mas, antes, é preciso combater a corrupção. Desses R$81 milhões, alguns foram destinados para comissão.

Gabeira questionou a alegação da secretaria de que as compras sem licitação eram emergenciais. E voltou a dizer que nem o governador nem o secretário da pasta, Sérgio Côrtes, tinham se manifestado.

- Não há responsáveis. Eles escapam. Cabral usa a velha tática do PMDB, que é a do (senador) Renan Calheiros e do Sarney, que é a tática do não é comigo, não aconteceu comigo. Há compras de R$81 milhões com uma só empresa e sem licitação, às vezes com preço até 78% mais altos do que em outros lugares. Mas o governo não apareceu para explicar, nem o secretário de Saúde - afirmou, ao propor um consórcio metropolitano para baratear a compra de remédios.

Cabral se pronunciou por nota. Sua assessoria informou que "o governador mantém-se atento a todas as questões de governo e ao assunto da Saúde, acompanhando também os esclarecimentos prestados publicamente pela Secretaria de Saúde".

Para Gabeira, o governo gasta mal os recursos da área, citando hospitais em situação precária. Numa reunião com representantes do Movimento Mulheres em São Gonçalo, ele ouviu queixas de descaso no atendimento na rede pública de saúde a mulheres vítimas de violência doméstica e sexual. Gabeira prometeu melhorar o atendimento.

Disputa já foi parar na Justiça Eleitoral

Ontem, a coligação "Rio Esperança", de Gabeira, entrou com pedido de impugnação contra Cabral, da coligação "Juntos pelo Rio". Segundo o advogado Eurico Toledo, ao declarar os bens, Cabral faltou com a transparência exigida ao informar ter uma casa de R$200 mil em Mangaratiba.

Por nota, a assessoria de Cabral disse que a "impugnação não tem fundamento e configura litigância de má-fé. A Lei Eleitoral não obriga o candidato a atualizar o valor dos bens imóveis de que seja proprietário. A legislação do Imposto de Renda não permite essa atualização. O candidato Sérgio Cabral relaciona esse mesmo bem há várias eleições junto à Justiça Eleitoral com esse valor, sem que jamais tenha havido qualquer contestação de quem quer que seja."

Veja. abaixo, o vídeo O Rio de Gabeira


Lula abre guerra à Fifa: ‘Não somos um bando de idiotas’

DEU EM O GLOBO

Apesar de o Brasil ter sido escolhido há três anos para sediar a Copa de 2014 e ainda não ter iniciado nenhuma das obras fundamentais, o presidente Lula abriu guerra à própria Fifa, que, anteontem, manifestou preocupação com o atraso. "Vocês viram que terminou a Copa, agora, e já começam aqueles a dizer. "Cadê os aeroportos brasileiros? Cadê os estádios brasileiros? Cadê os corredores de trem brasileiros? Cadê os metrôs brasileiros? Como se nós fôssemos um bando de idiotas que não soubéssemos fazer as coisas e não soubéssemos definir as nossas prioridades", afirmou o presidente no lançamento do edital do Trem de Alta Velocidade (TAV), em Brasília. Pelo cronograma original, o atraso neste projeto, o do popular trem-bala, é de um ano e 10 meses.

Lula ataca Fifa sobre atrasos

COPA DE 2014

Presidente brasileiro responde às preocupações de secretário da entidade com obras para Mundial de 2014: "Como se fôssemos um bando de idiotas que não sabe fazer as coisas"

Luiza Damé e Regina Alvarez

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva reagiu ontem a cobranças da Fifa em relação às obras de infraestrutura para a Copa do Mundo no Brasil. Durante o lançamento do edital do Trem de Alta Velocidade (TAV), que vai interligar São Paulo, Campinas e Rio, Lula disse que o governo não é integrado por "um bando de idiotas" que não sabe fazer as obras necessárias nem definir prioridades.

- Vocês viram que terminou a Copa do Mundo na África do Sul, agora, e já começam aqueles a dizer: "Cadê os aeroportos brasileiros? Cadê os estádios brasileiros? Cadê os corredores de trem brasileiros? Cadê os metrôs brasileiros?". Como se nós fôssemos um bando de idiotas que não soubéssemos fazer as coisas e nem definir as nossas prioridades - afirmou Lula.

Segundo o secretário-geral da Fifa, o francês Jérôme Valcke, a entidade está preocupada com o conjunto de obras que precisam ainda ser realizadas no Brasil para a Copa do Mundo. Valcke citou, além dos estádios, estradas, aeroportos, rede hoteleira e sistema de comunicação.

O próprio TAV, conhecido como Trem-Bala, é um exemplo desse atraso. Com conclusão inicialmente prevista para a Copa de 2014 , só ficará pronto para as Olimpíadas de 2016.

TCU também aponta atrasos

Não é só a Fifa que está preocupada com o atraso nas obras de infraestrutura da Copa. Auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU) finalizada em abril e aprovada pelo plenário do TCU há duas semanas concluiu que as providências estão "impressionantemente atrasadas".

"Até abril nenhuma obra (de mobilidade urbana) havia sido contratada, apenas um edital de licitação estava concluído", diz o relatório do ministro Valmir Campelo, informando ainda que o Ministério das Cidades só havia recebido o projeto básico de oito das 47 obras previstas.

No relatório, Campello adverte que os atrasos da Copa de 2014 já "potencializam o risco de que a União assuma custos não previstos, a exemplo do que ocorreu no Pan de 2007".

Nos bastidores do governo, também há preocupação com os atrasos. Um conjunto de atos para facilitar a execução das obras da Copa de 2014 e das Olimpíadas de 2016 deve ser assinado por Lula em solenidade no Itamaraty, no próximo dia 19.

Ciente de que alguns dos entraves estão relacionados à capacidade de endividamento das cidades-sede do evento, o governo prepara uma Medida Provisória (MP) para flexibilizar esses limites, permitindo que cidades como o Rio e São Paulo possam contratar novos empréstimos sem ferir os limites legais. A MP deve afrouxar as travas impostas pelas leis de renegociação das dívidas de estados e municípios. No caso dos municípios, o limite corresponde ao montante da receita líquida real, o que impede a contratação de novos empréstimos por algumas cidades-sede.

Ontem, na solenidade de lançamento do edital do Trem-Bala, o presidente voltou a lamentar o desempenho da seleção brasileira no jogo contra a Holanda:

- O problema de governar é como ser técnico de futebol. Vamos ser francos: ninguém poderia imaginar que o Brasil iria voltar tão enfraquecido para o segundo tempo do jogo com a Holanda. Não é possível que um gol possa desmontar um time, como desmontou o time do Brasil.

Cadê os estádios, os aeroportos... ?

O GLOBO mostrou no último domingo que quase todas as obras para Copa de 2014 não saíram do papel, a um ano do primeiro evento ligado à competição, o sorteio dos grupos das eliminatórias, e há dois anos da escolha do Brasil para organizar a competição. Os dois principais problemas das 12 cidades-sedes são os estádios e os aeroportos, o segundo é a maior preocupação do presidente da CBF, Ricardo Teixeira.

No Rio, as obras do Maracanã sequer foram licitadas. O aeroporto Tom Jobim passa apenas por mais uma maquiagem, resultado de uma disputa com o governo Lula, que impede a privatização dos terminais, como sugere o governador Sérgio Cabral.

São Paulo e Curitiba são as cidades que mais preocupam a Fifa e o Comitê Local do Mundial.

O Morumbi não atendeu às exigência da instituição e está descartado dos jogos importantes. Com isso, a capital paulista está sem estádio. Já a Arena da Baixada, em Curitiba, também pode ficar de fora porque o Atlético-PR alega não ter recursos para bancar a reforma prevista. As arenas de Fortaleza, Manaus, Bahia e Brasília sofrem acusações de irregularidades.

O aeroporto de Curitiba sequer tem projeto. E o de Cuiabá, esbarra na remoção de famílias para ser aumentado.

Lula desafia Lei Eleitoral ao promover Dilma em evento

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

O presidente Lula explorou o lançamento do edital de licitação do trem-bala para promover sua candidata ao Planalto, Dilma Rousseff (PT) - a quem atribuiu a responsabilidade pelo projeto. O uso de eventos públicos oficiais em favor de determinado candidato é um potencial desafio à Lei Eleitoral, como o próprio presidente admitiu, ao dizer que "nem poderia falar" o nome de Dilma. "Mas a história a gente não pode esconder por causa de eleição”, argumentou Lula. Ele fez também críticas às realizações de governos anteriores e citou o desabamento de um túnel do Metrô em São Paulo em 2007, no governo do agora candidato à Presidência José Serra (PSDB).

Lula usa evento do trem-bala para fazer campanha em favor de Dilma

Rafael Moraes Moura

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva usou discurso ontem, durante cerimônia oficial de lançamento do edital do trem-bala que ligará São Paulo, Campinas e Rio de Janeiro, para promover a figura da candidata do PT à Presidência, Dilma Rousseff. Lula atribuiu a Dilma a responsabilidade pelo projeto do Trem de Alta Velocidade (TAV).

"A verdade é a seguinte: eu não posso deixar de dizer, aqui, que nós devemos o sucesso disso tudo que a gente está comemorando aqui a uma mulher. Na verdade, nem poderia falar o nome dela porque tem um processo eleitoral, mas a história a gente também não pode esconder por causa de eleição", disse o presidente, em solenidade no Centro Cultural Banco do Brasil, sede provisória do governo. "A verdade é que a companheira Dilma Rousseff assumiu a responsabilidade de fazer esse TAV, e foi ela quem cuidou, junto com a Miriam Belchior, junto com a Erenice...", continuou, sob aplausos de uma plateia de funcionários comissionados, políticos da base aliada e militantes.

A Lei Eleitoral proíbe os agentes públicos de ceder ou usar em benefício de candidato bens móveis ou imóveis pertencentes à administração. Com base nesse dispositivo, há a interpretação de que agente público não pode usar evento de governo para campanha em prol de seu candidato.

No ano passado, o TSE cassou o então governador do Maranhão, Jackson Lago (PDT), por uma série de motivos. Um deles foi um vídeo incluído no processo no qual o governador na época da campanha, José Reinaldo, declarava apoio explícito a Lago durante um evento de governo.

Torre. O discurso de Lula foi construído para atingir a apoteose com a citação a Dilma. Com críticas aos governos anteriores, ele foi falando das medidas audaciosas que fazem os governos tomar grandes decisões e assumir riscos. "Se a gente olhar, no mundo, todas as coisas feitas, as grandes coisas, foram por gestos de ousadia, de coragem de gente que não teve o medo de enfrentar o debate. Até a Torre Eiffel, que hoje é admirada por todo mundo, deve ter tido umas 5 mil ações populares", disse.

Em sua fala, fez até uma referência à tragédia da linha 4 do metrô de São Paulo, em janeiro de 2007, quando morreram 7 pessoas no desabamento de um dos túneis. "Nós já tivemos, em São Paulo, buraco de metrô que não se encontrou, e isso recentemente." Por fim, arrematou: "O trem brasileiro de alta velocidade é um projeto que nós devemos a uma mulher (...) a companheira Dilma Rousseff."

Na sequência, antecipou-se a possíveis críticas: "Daqui a pouco, se o (ministro do Planejamento) Paulo Bernardo for candidato, eu não vou deixar de falar que ele fez uma coisa boa, que liberou uma medida provisória agora, para resolver o problema do Nordeste brasileiro. Não podemos negar isso."

Conduta. Em entrevista ao Estado na semana passada, o advogado-geral da União, Luís Inácio Adams, comentou que os agentes públicos, inclusive o presidente da República, têm limitações de conduta. "Evidentemente, ele vai poder falar", defendeu Adams. "Não em evento público de governo; ele não vai chegar num ato público e dizer: "senhores, apoiem a Dilma"."

Na ocasião, o advogado-geral defendeu a tese de que não se pode excluir o presidente do processo político. Sobre as multas aplicadas a Lula, Adams disse que ele "não pede voto" e os casos foram interpretação que o "tribunal faz da conduta do presidente".

Ao citar Dilma no discurso, Lula tenta associar sua imagem à da candidata governista. Para isso, o PT e o presidente já utilizaram diversos meios.

Em programa partidário veiculado em dezembro passado, por exemplo, Lula surgiu em cena afirmando que Dilma é "responsável pelo PAC, pelo pré-sal e pelo programa Minha Casa, Minha Vida". Dilma, por sua vez, afirmou que "tem governo que fez pouco e acha que fez muito". Por causa desse episódio, o PT perdeu o direito de exibição de programa partidário no primeiro semestre de 2011 e foi multado em R$ 20 mil; Dilma, em R$ 5 mil.

Em maio, Lula utilizou o espaço de sua coluna semanal, publicada em 153 jornais, para defender o PAC e fazer referência à candidata petista.

Gestão está a serviço de petista e transgressão é bem estudada

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Fernando Rodrigues

BRASÍLIA - O presidente Luiz Inácio Lula da Silva desafiou ontem abertamente a lei ao elogiar sua ex-ministra da Casa Civil Dilma Rousseff durante uma cerimônia pública. A candidata governista ao Planalto foi anunciada como grande responsável pelo projeto do trem-bala que algum dia, em tese, ligará São Paulo ao Rio.

Foi uma transgressão curiosa. O próprio Lula interpretou sua intenção, quase se desculpando: "Eu, na verdade, nem poderia falar o nome dela, por um processo eleitoral, mas a história a gente também não pode esconder por causa de eleição. A verdade é que a companheira Dilma Rousseff assumiu a responsabilidade de fazer este TAV [o trem-bala]".

É como se um cidadão cometesse um ato ilícito e em seguida dissesse para a vítima: "Eu sei que está errado, mas não posso ir contra a minha natureza". E tem sido da natureza de Lula nesses últimos meses colocar toda a estrutura possível do governo a serviço da candidata oficial.

Tome-se o caso da viagem recente de Dilma à Europa. Foi fazer campanha. Posou para sua equipe de marketing filmá-la ao lado de chefes de governo. Até agora não se sabe quem exatamente agendou esses encontros, mas petistas falavam abertamente à época que o responsável havia sido "o Marco Aurélio". Trata-se de Marco Aurélio Garcia, assessor de assuntos internacionais do Palácio do Planalto.

Jamais será obtida uma prova de quantos telefonemas e e-mails de gente do governo foram disparados para Nicolas Sarkozy e outros líderes europeus para Dilma visitá-los em maio.

Para todos os efeitos, o tour se deu por geração espontânea.

Agora, exatamente no momento em que não há mais propagandas do PT para expor Dilma aos eleitores, Lula aparece usando um evento oficial para promover sua candidata.

Desconhecida ainda de parte dos eleitores, é vital para a petista que seu nome não suma da mídia até o início do horário eleitoral, em meados de agosto.

A transgressão de Lula é bem estudada. Talvez renda alguma nova multa, no valor de R$ 5.000, como outras já aplicadas. Para quem fará uma campanha ao custo de R$ 157 milhões, é um risco que vale a pena.

Serra e Marina criticam criação de novas estatais

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Tucano aponta risco de corrupção na área de seguros

Candidata do PV ataca a suposta incoerência dos seus adversários, que defendem a criação de novos ministérios

João Carlos Magalhães
ENVIADO ESPECIAL A SÃO LUÍS
Bernardo Mello Franco
ENVIADO ESPECIAL AO RIO

O candidato do PSDB à Presidência, José Serra, disse ontem em São Luís (MA) que a criação da EBS (Empresa Brasileira de Seguros) é "um perigo", pois a estatal pode virar um foco de corrupção.

"A princípio, eu não achava necessário criar mais uma empresa de seguros. Porque empresa de seguro é uma área potencialmente de muita corrupção. É um perigo."

Segundo Serra, em uma empresa desse tipo, "é muito difícil [controlar a ação de corruptos], pelo tipo de atividade, de você correr riscos maiores, menores. É uma coisa muito subjetiva".

Mais fácil, disse, seria "plantar batatinha": "Aí você sabe quanto você põe, você tira, pega o peso. Seguro é uma área mais complicada".

No Rio, a candidata do PV, Marina Silva, evitou opinar sobre a EBS, mas criticou a proliferação de estatais sob Lula e a incoerência dos adversários que prometem novos ministérios.

Serra já propôs a criação do Ministério da Segurança Pública, e Dilma Rousseff (PT), um Ministério da Micro e Pequena Empresa.

"Em período eleitoral, um cria um ministério aqui, outro cria uma estatal acolá, e vira um concurso de quem propõe mais coisas. Como todos falam que o Estado tem que ser eficiente, há uma contradição muito grande", disse a candidata.

Marina almoçou com 180 empresários na Associação Comercial do Rio, onde prometeu cortar gastos e elogiou as privatizações de FHC. O presidente da entidade, José Luiz Alquéres, exaltou a escolha do vice Guilherme Leal: "É muito grata a referência de a senhora ter recebido como vice um de nós".

Já em São Luís, Serra criticou a aliança de Lula com José Sarney: "Vocês não vão pegar nenhum vídeo meu xingando alguém que depois virou meu amigo. Não tem isso. Pode procurar", disse. "Não tenho problemas com o meu passado. Não tenho que ficar explicando", afirmou.

Tucano critica trem-bala e 'Segurobrás'

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Wilson Lima, ESPECIAL PARA O ESTADO / SÃO LUÍS

A visita do candidato do PSDB ao Palácio do Planalto, José Serra, à capital do Maranhão foi marcada por críticas a grandes projetos de fim de mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Serra afirmou que falta clareza no projeto do trem-bala, cujo edital de licitação foi lançado ontem, e que a criação da Empresa Brasileira de Seguros pode incentivar a corrupção.

De acordo com o presidenciável, o trem-bala é um projeto que não está claro. "Parece que seria tudo do governo, mas é preciso ver se é isso mesmo", disse, destacando a necessidade de uma avaliação sobre os reais benefícios do projeto. "Podemos gastar R$ 50 bilhões nesse projeto. Mas podemos ligar a soja de Balsas ao Itaqui por muito menos."

As declarações de Serra foram feitas no mesmo dia em que Lula assinou o edital de licitação do projeto. Durante a solenidade, o governo ratificou a participação do BNDES no financiamento de 60,3% da obra, o que deve representar a disponibilidade de R$ 20 bilhões pelo banco, do total de R$ 33,1 bilhões previstos para o projeto.

Segurobrás. Serra também foi ácido ao ser questionado sobre a possibilidade de criação da Empresa Brasileira de Seguros S.A (EBS), que ocorreria por meio de medida provisória assinada por Lula já nas próximas semanas. "Empresa de seguro é uma área potencialmente de muita corrupção. Fazer uma "Segurobrás" é um risco desse ponto de vista", pontuou.

Participação de estatais cresceu 34,4%

DEU EM O GLOBO

Professor de economia da USP considera esse aumento um atraso

Geralda Doca

BRASÍLIA. A participação das estatais na economia brasileira cresceu no governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, revela estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Lula iniciou o segundo mandato com as empresas públicas abocanhando uma fatia de 34,4% do patrimônio líquido dos 350 maiores grupos econômicos do país. No primeiro mandato do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, as estatais representavam 51,4%. Com as privatizações, o índice caiu para 31,8%.

O grupo formado pelas empresas mais importantes do país, que foi a base de comparação do estudo, produz o equivalente a 40% do Produto Interno Bruto (PIB). A pesquisa mostra também que a participação do faturamento das estatais no conjunto das 350 empresas também subiu na comparação entre os dois governos: saiu de 22,5%, no fim do período FH, para 25,4% no início do segundo mandato do governo Lula.

A pesquisa faz parte da tese de doutorado de Eduardo Pinto, com o título "Governo Lula e bloco no poder", e que será defendida no Departamento de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), em agosto.

- Há uma tendência de aumento da participação das estatais - disse o pesquisador.

Segundo ele, parte desse aumento está relacionado à Petrobras. Além de ter criado subsidiárias, influenciou no resultado da estatal o aumento do preço internacional do petróleo.

A mesma observação é feita pelo professor do Departamento de Economia da UFRJ Reinaldo Gonçalves. Para ele, o que deve ser levado em consideração não é o fato de o governo do PT ter aumentado o número de estatais, mas a ingerência política nessas empresas:

- É grave a forma pela qual o governo usa essas empresas para atingir objetivos políticos. O aparelhamento crescente das estatais é muito ruim para o Brasil.

Para o professor do Departamento de Economia da Universidade de São Paulo Fábio Kanczuk, o avanço das estatais é um retrocesso, porque representa um maior peso para o Estado e para a sociedade.

- É um atraso para o país - criticou.

Os pobres:: Míriam Leitão

DEU EM O GLOBO

Eles são disputados como moeda política em época de eleição e servem para emoldurar biografias. Mas o que os números e fatos mostram é que há uma continuidade no processo de redução da pobreza brasileira nos últimos 17 anos. É bom que tenha continuidade. Por outro lado, seria necessário dobrar a renda dos pobres brasileiros para se chegar a um nível adequado ao desenvolvimento do Brasil.

Há vários equívocos que se pode cometer na análise do progresso brasileiro no combate à pobreza. O pior é achar que o fenômeno está restrito a um governo. Mas é o que políticos, de partidos diferentes, fazem durante as eleições.

Houve uma forte queda no percentual de pobres e extremamente pobres quando a inflação desabou no Plano Real. Nos anos seguintes, no entanto, esses percentuais ficaram estagnados no novo patamar. No governo Lula, tem havido uma queda constante, ano a ano. Para que a conta fique correta, não se pode registrar a partir de 1995, mas de 1993, quando se pega o que havia antes do Plano Real. O percentual de pobres e extremamente pobres sai de 47% e vai para 38,6%, e lá fica em torno desse número até o fim do governo Fernando Henrique. Em 2003 há uma pequena elevação para 39,4% e começa um novo período de queda, desta vez constante até chegar a 25,3% em 2008. O percentual dos extremamente pobres cai de 23% antes do Real para 17,3%. Cai ligeiramente para 16,5% em 2002. Sobe um pouco em 2003 e depois cai todos os anos, numa média de 1,7 ponto percentual por ano, até 8,8% em 2008.

A explicação do progresso não decorre de apenas um evento, mas de vários, e alguns relacionados a decisões tomadas em administrações anteriores.

O maior especialista brasileiro no assunto, Ricardo Paes de Barros, analisa a questão tecnicamente atrás das causas. Ele não acha que o Bolsa Família é o maior responsável pela queda recente da pobreza:

- O Bolsa Família faz com que mais brasileiros se aproximem da linha, mas para cruzar a linha da pobreza foram necessários outros fatores como por exemplo o aumento do salário mínimo, o impacto da Previdência por causa do aumento do salário mínimo, o progresso educacional, a melhoria no mercado de trabalho do interior, a redistribuição de recursos públicos.

No caso do progresso educacional, tem mais a ver com o que aconteceu no governo anterior do que no atual. Em alguns indicadores educacionais houve até estagnação nos últimos anos.

Os avanços dos últimos três governos - Itamar Franco, Fernando Henrique e Lula da Silva - mostraram ao país um fato animador: está dentro das nossas possibilidades eliminar a pobreza extrema, e reduzir substancialmente o percentual de pobres no Brasil. Outra constatação também é inevitável: ainda estamos muito atrás do que deveríamos estar dado o nível de desenvolvimento econômico do país.

A discussão inteligente deveria ser, não sobre quem fez mais, mas como e com que novas políticas pode-se reduzir mais rapidamente a pobreza e extrema pobreza no Brasil. Mas discussões inteligentes não são o mais comum em época eleitoral. Agora é o tempo em que as versões simplificadas prevalecem sobre as visões mais complexas da realidade.

Nos últimos anos, Ricardo Paes de Barros, do Ipea, tem liderado vários estudos de diversos especialistas, no Brasil e no exterior, sobre esse tema. Em um dos estudos mais atuais, "Sobre a evolução recente da pobreza e da desigualdade no Brasil", escrito por Ricardo com Mirela de Carvalho, do Programa Nacional de Pesquisa do Desenvolvimento, Samuel Franco, do Iets, Rosane Mendonça, da UFF, Andreza Rosalém, do Iets, eles mostram várias boas notícias. Desde 2001 tem havido aumento maior da renda dos mais pobres do que dos mais ricos. A desigualdade tem caído. Em 2008, o dado foi ainda mais animador: a renda per capita da população como um todo subiu 5,1%, enquanto a dos 10% mais pobres subiu 15%; três vezes mais. A má notícia é que a desigualdade brasileira continua enorme. "O que uma família do 1% mais rico pode gastar em três dias equivale ao que um brasileiro que está entre os 10% mais pobres pode gastar em um ano."

Segundo o estudo: "em função da elevada desigualdade que ainda prevalece, a pobreza e, em particular, a extrema pobreza ainda está acima do que se poderia esperar de um país com a nossa renda per capita." O que a próxima, ou o próximo, governante deve fazer é evitar os erros e confirmar os acertos desse período de mais de uma década e meia de avanços.

Desde 1995, 13 milhões saíram da miséria



DEU EM O GLOBO

Ipea: desigualdade caiu em todo país, à exceção do Distrito Federal. Para analista, isso reflete expansão do funcionalismo

Danielle Nogueira

Entre 1995 e 2008, durante os governos Fernando Henrique Cardoso e Lula, o Brasil reduziu em 12,8 milhões o número de pessoas vivendo na pobreza, segundo estudo divulgado ontem pelo Ipea. Outros 13,1 milhões saíram da miséria. A redução da pobreza veio acompanhada por uma melhora na desigualdade de renda em todos os estados do país, à exceção do Distrito Federal. O Índice de Gini (que mede a desigualdade e, quanto maior, pior) subiu de 0,58 para 0,62 no Distrito Federal nesse período. Na média nacional, o Gini caiu de 0,6 para 0,54 entre 1995 e 2008.

Ironicamente, a região que apresentou o maior crescimento econômico no período foi também a de pior desempenho nos indicadores sociais. No Centro-Oeste, houve alta média anual de 5,3% no Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de bens e serviços produzidos) per capita. Mas a taxa de pobreza na região caiu apenas 0,9% ao ano, o ritmo mais lento em todo o país. Por outro lado, o Sul viu o percentual de pobres cair 3% ao ano, apesar de seu PIB per capita ter avançado apenas 2,3% em média, por ano, no período - a menor expansão econômica registrada.

Sul desbanca Sudeste e é região com menos pobres

O Ipea considera miseráveis - ou que vivem na pobreza extrema - pessoas com renda inferior a um quarto de salário mínimo. Já pobres são os que ganham menos de meio salário mínimo. Atualmente, o piso nacional está em R$510.

Para o presidente do Ipea, Marcio Pochmann, os números do Sul e do Centro-Oeste reforçam a tese de que crescimento da economia não se traduz necessariamente em mais emprego e renda.

- No Sul, predomina a agricultura familiar, que emprega mais gente e cuja produção é voltada para o mercado interno. No Centro-Oeste, são grandes propriedades voltadas para o mercado externo. É um modelo que contribui para o aumento das exportações brasileiras, mas do ponto de vista social talvez não seja a melhor saída.

Com os avanços em seus indicadores sociais, o Sul desbancou o Sudeste como região com menor taxa de pobreza. Entre os sulistas, a taxa de pobreza caiu de 34% para 18% entre 1995 e 2008. No Sudeste, ela recuou de 29,9% para 19,5%.

O avanço da desigualdade de renda no Distrito Federal, por sua vez, é resultado da concentração de funcionários públicos na capital federal.

- Isso reflete o aumento de contratações por parte do governo federal e o inchaço dos salários do funcionalismo - avalia o economista sênior do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) Flavio Comim, frisando que isso veio acompanhado de maior profissionalização do quadro.

Pobreza ainda atinge 53,9 milhões de brasileiros

Apesar da melhora nos indicadores nacionais, o Brasil ainda tinha 53,9 milhões de pessoas vivendo na pobreza em 2008, sendo 19,9 milhões na miséria.

Entre os estados, Santa Catarina teve o melhor desempenho, reduzindo a taxa de pobreza de 29,8% para 11,6%. Já Alagoas foi o que apresentou o pior resultado, com taxa de pobreza de 56,6% em 2008, a maior do Brasil, embora menor que a registrada em 1995 (69,3%), quando estava atrás de Bahia, Piauí, entre outros. É de lá, portanto, que terá de vir o maior esforço para que o Brasil erradique a miséria em 2016. O Ipea prevê que, a um ritmo de crescimento de 4,2% do PIB por ano entre 2008 e 2016, o Brasil não terá mais miseráveis e a parcela de pessoas vivendo na pobreza cairá para 4%.

Sonia Rocha, do Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade (Iets), ressalva que tomar a linha de pobreza como única pode distorcer os resultados. Como o custo de vida é distinto em cada região, diz, o patamar usado para medir a pobreza deveria ser diferente em cada uma delas.

Quanto ao fato de os números do Ipea balizarem a promessa de campanha da candidata à Presidência do PT, Dilma Rousseff, de erradicar a miséria em dez anos, Pochmann disse que "a agenda de pesquisa do Ipea não acompanha a agenda política" e que qualquer candidato pode usar os números da instituição.

- Se isso acontecer, o Ipea está cumprindo sua missão.

O que pensa a mídia

Editoriais dos principais jornais do Brasil
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Ravel - Vladimir Ashkenazy - Daphnis et Chloe -Daybreak

A casada infiel:: Federico Garcia Lorca


(A Lydia Cabrera
e à sua negrinha)


E eu que fui levá-la ao rio
Certo de que era donzela,
Mas bem que tinha marido.
Foi a noite de São Tiago
E quase por compromisso.
As lâmpadas se apagaram
E se acenderam os grilos.
Já nas últimas esquinas
Toquei seus peitos dormidos,
Que de pronto se me abriram
Como ramos de jacinto.
A goma de sua anágua
Vinha ranger-me no ouvido
Como seda que dez facas
Rasgassem em pedacinhos.
Sem luz de prata nas copas
As árvores têm crescido
E um horizonte de cães
Ladra bem longe do rio

Após franqueadas as brenhas,
Franqueados juncos e espinhos,
Por baixo de seus cabelos
Fiz um ninho sobre o limo.
Eu tirei minha gravata.
Ela tirou seu vestido.
Eu, cinturão e revolver.
Ela, seus quatro corpinhos.

Nem nardos nem caracóis
Têm cútis com tanto viço,
Nem os cristais sob a lua
Alumbram com igual brilho.
Sua coxas me escapavam
Como peixes surpreendidos,
Metade cheias de lume,
Metade cheias de frio.
Galopei naquela noite
Pelo melhor dos caminhos,
Montado em potra nácar
Sem rédeas e sem estribos.
As coisas que ela me disse,
Por ser homem não repito
Faz a luz do entendimento
Que eu seja assim comedido.
Suja de beijos e areia,
Eu levei-a então do rio.
Contra o vento se batiam
As baionetas dos lírios

Portei-me como quem sou.
Como gitano legítimo.
Dei-lhe cesta de costura,
Grande, de cetim palhiço,
E não quis enamorar-me,
Pois ela, tendo marido,
Me disse que era donzela
Quando eu a levava ao rio.


Federico Garcia Lorca nasceu na região de Granada, na Espanha, em 05 de junho de 1898, e faleceu nos arredores de Granada no dia 19 de agosto de 1936, assassinado pelos "Nacionalistas". Nessa ocasião o general Franco dava início à guerra civil espanhola. Apesar de nunca ter sido comunista - apenas um socialista convicto que havia tomado posição a favor da República - Lorca, então com 38 anos, foi preso por um deputado católico direitista que justificou sua prisão sob a alegação de que ele era "mais perigoso com a caneta do que outros com o revólver." Avesso à violência, o poeta, como homossexual que era, sabia muito bem o quanto era doloroso sentir-se ameaçado e perseguido. Nessa época, suas peças teatrais "A casa de Bernarda Alba", "Yerma", "Bodas de sangue", "Dona Rosita, a solteira" e outras, eram encenadas com sucesso. Sua execução, com um tiro na nuca, teve repercussão mundial.

A poesia acima foi extraída de sua "Antologia Poética", Editora Leitura S. A. - Rio de Janeiro, 1966, pág. 58, tradução e seleção de Afonso Felix de Sousa.