sábado, 29 de maio de 2010

Reflexão do dia – Giuseppe Vacca


Aparentemente, estamos todos de acordo ao afirmar que toda uma época terminou. Mas, quando uma época termina, se não conseguirmos pensá-la com conceitos novos, diferentes daqueles que capturaram a mente de quem a viveu, das duas uma: ou não é verdade que ela terminou, ou quem continua a representá-la com os conceitos do passado talvez não saiba, mas na realidade morreu intelectualmente com ela.


(Giuseppe Vacca, no livro, “Por um novo reformismo”, pág.160- Fundação Astrojildo/Contraponto, 2009)

O crime compensa? :: Roberto Freire

DEU NO PORTAL DO PPS

Temos um conhecido adágio popular que afirma que o crime não compensa. No entanto, o governo Lula, em seus oito anos de mandato, vem sistematicamente desmentindo essa nossa crença. No primeiro mandato, tivemos o escândalo do mensalão, artifício usado pela cúpula do PT e de seus principais operadores nos ministérios para construir uma sólida base de apoio ao governo no Congresso Nacional; não em função de comprometimento programático, mas tão somente pela compra pura e simples de parlamentares e partidos, o que contaminou todo o governo. A tal ponto que o procurador geral da República, ao encaminhar sua denúncia ao STF, mencionou “uma sofisticada organização criminosa, especializada em desviar dinheiro público” que tinha se instalado na estrutura do Estado Brasileiro.

No segundo mandato, após uma sucessão de quedas de ministros e desorganização de sua base, tendo como conseqüência imediata a paralisação, ou, na melhor das hipóteses, acentuada lentidão no processo de enfrentamento de nossas angustiantes questões estruturais, políticas e sociais, o governo anunciou o mirabolante PAC. Com pompa e circunstância, no lançamento do programa, o governo prometia um plano de crescimento. Na verdade, não passou de um ajuntamento de obras.

Para desafiar o adágio, o governo Lula vem afrontando sistematicamente todos os órgãos fiscalizadores e a própria Justiça brasileira. É o caso do TCU (Tribunal de Contas da União), que fez reiteradas denúncias de superfaturamento das obras do PAC; do Ministério Público, cuja função de defender o interesse público o Planalto insiste em cercear; da legislação ambiental, que desrespeita acintosamente; da Lei de Responsabilidade Fiscal, que desconsiderou com desdém, repassando recurso a estados e municípios não estão cumprindo os seus preceitos.

Por último, o presidente da República, que deveria ser o primeiro homem a cumprir a lei, comporta-se como um criminoso, que infringe de forma sistemática, sem nenhum pudor, a legislação eleitoral do país que governa. Assim demonstram as reincidentes multas que Lula e sua candidata Dilma vêm sofrendo do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) por fazer propaganda eleitoral antes do período previsto em lei.

O programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento informou que sua próxima pesquisa no país será centrada na importância de valores como justiça, paz, honestidade, solidariedade, responsabilidade e consciência, tão importantes na consolidação de uma nação. Este tema impôs-se após uma ampla consulta com 500 mil brasileiros e brasileiras, no Brasil Ponto a Ponto, pesquisa que o Programa da ONU faz para orientar o enfoque de seus trabalhos. Sabemos que uma nação se funda compartilhando valores positivos, nos quais o respeito à justiça é o elemento central de convivência pacífica. Nesse aspecto, a ação dos homens públicos, mormente dos chefes de Estado, exatamente por ser o representante da nação, deve servir de exemplo a todos, fortalecendo a cidadania no compartilhamento desses valores. A questão que se coloca é: nosso presidente tem sido um bom exemplo a ser seguido?


Roberto Freire é Presidente Nacional do PPS

Vitória do pragmatismo :: Merval Pereira

DEU EM O GLOBO

"A geografia do voto nas eleições presidenciais do Brasil: 1989-2006", um estudo do cientista político Cesar Romero Jacob, diretor da editora da PUC, e uma equipe de pesquisadores brasileiros e franceses, pode ser útil para compor cenários em relação à eleição deste ano, na medida em que, com uma série histórica já de cinco eleições, mostra como os vitoriosos - Collor, Fernando Henrique e Lula - ganharam com estratégias assemelhadas.

Mudanças na chamada "geografia eleitoral" dos partidos mostram que nenhum candidato ganha sem algum grau de compromisso com um Brasil que tem voto e representação política, formando "estruturas de poder" definidas: as oligarquias nos grotões, os pastores pentecostais, os políticos populistas na periferia e a classe média urbana escolarizada.

Este ano, ele prevê uma disputa acirrada, pois os dois candidatos que polarizam a eleição - Dilma Rousseff (PT) e José Serra (PSDB) - são pragmáticos igualmente e buscam alianças políticas sem pruridos ideológicos.

Para Cesar Romero Jacob, o primeiro a entender que existem estruturas de poder no território nacional foi Fernando Collor. Criou-se um mito, até pela falta de uma série histórica, de que a imprensa tinha criado o mito e elegido o Collor.

Não foi a imprensa, no entanto, o fator determinante, afirma Romero Jacob. Segundo ele, Collor, como alguém oriundo da oligarquia, sabia que existiam estruturas de poder no interior do Brasil, que tem cerca de 5.500 municípios, sendo que destes, 5.200 têm menos de 50 mil eleitores, correspondendo a 46% do eleitorado.

Collor contou com as estruturas oligárquicas para vencer, até porque o PFL abandonou o Aureliano Chaves, e o PMDB abandonou Ulysses Guimarães.

Os mapas mostram que ele teve votação no país inteiro, e os percentuais mais altos, na faixa de 64%, numa eleição que teve 21 candidatos a presidente, são sempre em pequenos eleitorados.

Nos grandes centros, o volume de votos é maior, mas o percentual é mais baixo. Collor entendeu, antes dos outros, que ele precisava usar essas máquinas que existem nos grotões.

Na outra ponta, existem os grandes centros urbanos modernos, onde há um eleitorado mais independente das clientelas políticas, sobretudo uma classe média urbana, escolarizada.

Para esses, diz Romero Jacob, o candidato tem que ter discurso, identificado em pesquisas qualitativas. "Aí você trava uma batalha de opinião pública", ressalta.

Entre o grotão e os centros urbanos modernos, há uma periferia pobre onde quem tem poder são os políticos populistas com seus centros sociais, que criam uma clientela, e os pastores pentecostais, que com suas igrejas acabam criando também uma clientela eleitoral.

Através de políticas de alianças, de articulação dessas estruturas existentes, Collor conseguiu ganhar a eleição. O que fazia Mario Covas, então candidato do PSDB à Presidência?

Os mapas mostram que ele teve voto em São Paulo e no Ceará - porque Ciro Gomes e Tasso Jereissati aderiram ao PSDB logo que ele foi fundado - e em capitais.

Também Brizola teve sua votação restrita, naquela eleição, ao Rio de Janeiro e ao Rio Grande do Sul. "E você não pode querer ser presidente da República sem voto em São Paulo, com 22% do eleitorado, e em Minas, com 11%", lembra Romero Jacob.

A campanha de Covas não foi pragmática, foi "ideológica". O tal "choque de capitalismo" que ele propôs, embora estivesse absolutamente certo, não quer dizer nada para o eleitor lá do grotão, comenta o sociólogo.

Cinco anos depois, Fernando Henrique Cardoso pragmaticamente fez a mesma coisa que Collor, só que no sentido contrário: foi dos grandes centros para os grotões.

Aí o choque de capitalismo já não era teórico, era o Plano Real, que catalizou essas estruturas de poder. Mas Fernando Henrique fez alianças com as oligarquias, e por isso foi muito criticado.

O professor Cesar Romero Jacob usa os mapas eleitorais para rejeitar a tese de que, com o Plano Real, Fernando Henrique poderia ter vencido as eleições sem o PFL.

"Quando você tem uma série histórica com cinco eleições, e começa a ver o mesmo fenômeno se repetir, chega à conclusão de que o eleitorado não é tonto, o voto não é errático. Mesmo que as conjunturas sejam diferentes, você tem as mesmas estruturas de poder sobre o território que têm que ser articuladas".

Fernando Henrique foi o segundo a abandonar as ilusões de que se pode ganhar uma eleição presidencial apenas com uma tese.

O mapa eleitoral do Fernando Henrique é muito parecido com o do Collor, destaca Romero Jacob, e em nada tem a ver com o do Mario Covas.

É claro que o eleitorado do Fernando Henrique nos grandes centros é sempre maior que o do Collor, porque ele reúne o eleitorado tucano dos grandes centros urbanos, com as máquinas oligárquicas nos grotões, explica o professor.

Ele também fez aliança com os políticos populistas da periferia e com os pastores pentecostais. Em 1998, a estrutura da votação foi assemelhada, com algumas diferenças.

Mas, pragmaticamente, ele se aliou em São Paulo a Paulo Maluf e teve uma votação no estado muito maior do que tivera em 1994 - venceu por diferença de 5 milhões de votos.

Até aqui, diz Romero Jacob, temos a vitória do pragmatismo sobre uma posição "ideológica" de Lula, que tinha uma votação, sobretudo, nas capitais, onde há um eleitorado de esquerda, e nos municípios industriais: ABCD mais Osasco e Guarulhos, em São Paulo; em Minas, no Vale do Aço; e, no Rio de Janeiro, tinha voto em Volta Redonda.

(Continua amanhã: a mudança em 2002)

Barbas de molho:: Dora Kramer

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

O que uma decisão da Justiça Eleitoral do Rio de Janeiro sobre a eleição municipal de 2008, à qual ainda cabe recurso ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), tem a ver com a campanha presidencial de 2010?

O motivo: abuso do poder econômico e uso indevido dos meios de comunicação em campanha eleitoral antecipada, o tema em foco na cena nacional.

A prefeita de Campos, Rosinha Garotinho, teve o mandato cassado e junto com o marido, Anthony Garotinho - até então pré-candidato a governador -, ficou inelegível por três anos.

A decisão do TER-RJ coincide com o momento em que a oposição adere com a desfaçatez dos justos de anteontem à farra geral do desacato.

O DEM entregou seu programa partidário à propaganda eleitoral do candidato do PSDB José Serra infringindo a lei duas vezes: fez campanha antecipada e ignorou a proibição de apresentar militantes de partidos diferentes.

Faltam ainda três programas de partidos da oposição a serem apresentados e, pelo aperitivo, haverá reincidência.

Que assim seja. São espertos e nesse código se entendem.

Conviria, porém, aos astutos, relembrar o vaticínio do ministro Marco Aurélio de Mello durante sessão do TSE sobre as repetidas infrações à legislação eleitoral cometidas pelo PT e estendido aos demais partidos.

"O somatório de desvios de conduta pode robustecer uma representação futura. O caminho anterior à escolha do candidato pode se somar a outros e se configurar o abuso de poder econômico, político e dos meios de comunicação. Decisão do tribunal é uma certidão de transgressão! Que os partidos coloquem as barbas de molho."

Faz coro com esse tipo de aviso, a vice-procurador-geral eleitoral Sandra Cureau que considera as multas inócuas em termos de inibição ao ilícito e defende mudanças na legislação para que haja penalidades mais rigorosas.

Nem por isso, na visão da procuradora, a Justiça precisa assistir passiva ao festival de abusos.

Sandra Cureau vem reiterando que a campanha de Dilma Rousseff produz uma série de fatos que podem ensejar a abertura de ação por abuso de poder econômico e político.

Semelhante à que agora cassou o mandato de Rosinha e suspendeu a candidatura ao governo de Anthony Garotinho.

Em se tratando de candidatos a presidentes da República, ou de presidentes eleitos, ou no exercício do mandato, a régua da Justiça é diferente? Muito provável que seja. Mas também já foi para governadores e, no entanto, nos últimos anos três deles - da Paraíba, Tocantins e Maranhão, tiveram seus mandatos cassados.

Há quem pense nisso como golpe nas urnas. Mas se invertermos o raciocínio chegaremos ao verdadeiro golpista que é quem ganha eleição na base da ilegalidade.

Contrainformação. A história da recontratação da Fundação Getúlio Vargas (FGV) para refazer o projeto de reforma administrativa do Senado que teria sido desfigurado pelo Conselho de Administração da Casa é mais complicada do que parecia.

Os senadores Tasso Jereissati e Pedro Simon, integrantes da comissão encarregada de analisar o texto final da reforma, denunciaram as distorções. O diretor-geral, Haroldo Tajra, depois de dois dias em silêncio, resolveu dar sua versão dos fatos.

Em resumo é o seguinte: "Não houve distorção, muito menos alterações secretas. Foram feitas consultas, recebidas mais de 600 sugestões de funcionários e o texto final é produto de 167 emendas apresentadas por 59 senadores, entre eles Pedro Simon".

E por que a denúncia? ""Não sei, já pedi audiência para falar sobre o assunto, mas o senador Jereissati não me recebe", diz o diretor-geral.


Portanto, permanecem em aberto todas as questões, desde a razão das acusações, à motivação do silêncio dos 59 senadores que participaram do processo, passando pela maneira ambígua como o presidente do Senado, José Sarney, lidou com o problema.

Pronunciou-se em linguagem para iniciados que satisfez aos "de dentro". Mas os aqui "de fora" continuam pagando as contas sem entender nada.

Maria Rita - Não vale a pena

A Copa salva Serra e Dilma:: Villas-Bôas Corrêa

DEU NO JORNAL DO BRASIL

Os candidatos José Serra e Dilma Rousseff , que se enfrentam na pré-campanha para a sucessão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ficam devendo à Seleção Brasileira do técnico Dunga a salvação do ridículo em que se afundavam no bate-boca sobre coisa nenhuma. A candidata Marina Silva não aspira a mais do que a coerência de sua luta na defesa do meio ambiente. Já o candidato oposicionista, o ex-governador tucano de São Paulo, José Serra, e a candidata Dilma Rousseff, escolhida e lançada pelo presidente sem dar a mínima importância ao PT, jogam as ambições e os sonhos pela cadeira no Palácio do Planalto.

Até aqui, por falta de coisa melhor, Dilma bate na tecla de continuadora de Lula e dos programas sociais, como o Minha Casa Minha Vida para a construção de milhões de residências populares ao preço de penca de bananas e o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que escancara as portas do paraíso. Serra esperou o prazo final da desincompatibilização para confirmar a candidatura, carimbada pelo PSDB e tenta recuperar a liderança nas pesquisas, ora dividida com com Dilma. Francamente, munição discutível para uma pré-campanha de candidato à sucessão de Lula, com a popularidade passando da lua em disparada para o infinito.

Antes que a zombaria contaminasse candidatos e candidaturas, a Seleção Brasileira alçou voo, desfilou por Brasília em volta de cinco horas para ser recepcionada pelo presidente Lula e pela primeira-dama, Marisa Letícia, em meia hora de descontração simpática. Lula não precisa fingir que gosta de futebol, peladeiro desde a infância, torcedor do Corinthians e do Flamengo e que ainda dá os seus chutes nos rachas na Granja do Torto.

Com a Seleção ninguém pode. Até a estreia contra a Coreia do Norte (15 de junho), cada dia dos craques será acompanhado, sob o controle de Dunga, pela população de olhos grudados na telinha. Com os amistosos para garantir assunto para as conversas e discussões contra Zimbábue (dia 2) e Tanzânia (dia 7), adversários escolhidos com as cautelas para evitar qualquer contratempo Se a taça do hexacampeonato coroar o esforço, uma quinzena será pouco para as comemorações em Brasília e em todos os estados. Só depois, a murcha pré-campanha interrompida terá que dar o ar da sua graça. À dupla de favoritos faria bem uma recauchutagem. Serra está subindo o tom em cada discurso para marcar o seu lugar na oposição. Tática sem alternativa, mas de eficiência discutível. Lula não é candidato, mas o pajé da candidata Dilma.

Os candidatos à reeleição a mandatos parlamentares, para mais quatro anos de fruição de um dos melhores empregos do mundo, com pouco o que fazer e a penca de escandalosas mordomias – algumas com a mancha de uma punga no cofre da Viúva – estacam à porta de Brasília e dão meia-volta para não enfrentar a crise ética, moral que contamina a cidade construída para ser o Distrito Federal, a capital administrada por gerente de livre nomeação do presidente da República. E que desde a inauguração precipitada, antes de estar pronta, transformou-se na inacreditável baderna dos mais de 3 milhões de habitantes, dez vezes mais do que os 300 mil do previsto no plano de Lúcio Costa.

A crise é Brasília. Sem enfrentá-la com a reforma política, que todos prometem até serem eleitos e depois esquecem com o maior descaramento. O presidente Lula desfrutou da solução perfeita: tem casa e palácio em Brasília, e lá pouco para. E com os mais de 100 dias por ano em viagens pelo mundo, conquistou a popularidade nos cinco continentes. Se a Seleção de Dunga chegar à final, Lula dificilmente resistirá à justa tentação de correr o risco de assistir à decisão do hexacampeonato na tribuna de honra. E de voltar ao Brasil no mesmo avião dos seis vezes campeões do mundo. Nem precisará fazer campanha: Dilma será eleita. E aí começa outro capítulo da história de uma campanha presidencial, que será decidida pelo voto que não será conquistado apenas pelas promessas desacreditadas mas pela Seleção que reuniu os craques brasileiros espalhados pelos grandes times do mundo.

Outros carnavais :: Fernando de Barros e Silva

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

SÃO PAULO - Está na praça (ou na rede) uma nova revista eletrônica de intelectuais de esquerda, com ensaios sobre política, teoria e cultura. Chama-se "Fevereiro" e pode ser acessada de graça no endereço http://www.revistafevereiro.com/.

O mentor da publicação é o filósofo Ruy Fausto, professor emérito da USP radicado em Paris, estudioso e crítico de Marx e do marxismo.

"Fevereiro", entre outras citações históricas, faz alusão ao mês da última ofensiva popular contra o bolchevismo, em 1921, que culminou na revolta de Kronstadt. A "private joke" do título tende a reforçar a ideia de que a publicação é só mais uma a alimentar querelas paroquiais da esquerda. Talvez sim.

Ruy Fausto, porém, se destaca há anos pela lucidez com que tem combatido duas vertentes dominantes na esquerda brasileira: de um lado, o pragmatismo de quem aderiu ao PT sem se incomodar com a gangsterização do partido no poder; de outro, o dogmatismo renitente daqueles que ainda não processaram o legado trágico e o fiasco do socialismo no século 20.

Essas duas tendências podem se manifestar muitas vezes na mesma figura. É um pouco isso o que sugere o editorial da revista, "Lula, o PT e os Dissidentes Cubanos", quando afirma: "Marco Aurélio Garcia disse que "violações dos direitos do homem existem por todo lado". Isso seria razão para não protestar contra elas? E será que o fato serve para nivelar ditaduras e democracias? Só nos resta constatar com tristeza a decadência desse antigo homem de esquerda crítico, leitor de Claude Lefort inclusive, que parece ter aderido à realpolitik, cinismo incluso".

Como essa, há boas provocações em "Fevereiro". Inclusive em relação ao enraizamento de certo "jornalismo de conteúdo conservador muito agressivo, mais ou menos articulado com mobilizações de mesma tendência no campo de uma classe média ressentida com a mobilidade social recente do país, simbolizada pela própria ascensão de um ex-líder sindical à Presidência".

Mulheres na política :: Luiza Nagib Eluf

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

As próximas eleições já entraram para a História, independentemente do resultado. Pela primeira vez no País duas mulheres disputam o cargo de presidente da República e estão entre os principais candidatos. Dilma Rousseff (PT) e Marina Silva (PV) são as protagonistas deste pleito. Antes delas tentaram Lívia Maria Pio de Abreu (em 1989, ficando em 17.º lugar) e Heloísa Helena (em 2006, em 3.º lugar, com expressiva votação).

Se o fato de termos duas fortes postulantes ao Planalto numa mesma eleição é histórico e motivo de comemoração, a verdade é que a política no Brasil ainda é essencialmente masculina. A participação das mulheres é crescente na História brasileira, mas ainda está aquém do desejado. Somos a maioria da população do País e representamos 40% da força de trabalho fora do lar, mas continuamos invisíveis na área pública. Só em 1985 uma mulher se tornaria prefeita de capital (Maria Luiza Fontenelle, do PT, em Fortaleza) e apenas em 1995 o Brasil elegeria sua primeira governadora (Roseana Sarney, no Maranhão). Somente dois dos nossos Estados mais populosos já elegeram governadoras - Rio de Janeiro (Rosinha Garotinho) e Rio Grande do Sul (Yeda Crusius).

Na Câmara dos Deputados o cenário é ainda mais desanimador. Em 184 anos de existência do Legislativo, nunca uma mulher ocupou um cargo titular na Mesa da Casa. São apenas 45 mulheres em meio a 513 deputados, ou seja, míseros 8% de representação feminina. No Senado o índice sobe para 13%, mas ainda é inexpressivo. O porcentual de mulheres na Câmara e no Senado brasileiros é um dos mais baixos da América Latina e do mundo.

Apesar de a legislação determinar que os partidos preencham ao menos 30% de suas candidaturas com mulheres, isso não ocorre na prática. Entre os fatores que desestimulam as mulheres a participar da política estão o preconceito, que começa na própria família, a falta de incentivos financeiros e a dificuldade de encarar uma jornada dupla de trabalho, muito mais acentuada no caso de atividade partidária. Trata-se de um problema cultural. Durante grande parte da História do País, as mulheres não tiveram direitos civis nem cidadania plena. A elas eram negados os mais elementares direitos políticos, como votar e ser votadas. Só em 1932, no governo de Getúlio Vargas, as mulheres conquistaram o direito ao voto, depois de muita luta do movimento sufragista. Mesmo assim, apenas mulheres casadas (com autorização do marido), viúvas e solteiras com renda própria votavam.

Com o Estatuto da Mulher Casada, de 1962, algumas liberdades fundamentais foram conferidas às mulheres, como o direito de viajar sem autorização do marido ou de gerenciar seus bens patrimoniais. Mais tarde, a Lei do Divórcio (1976) possibilitou que casamentos fracassados pudessem ser oficialmente desfeitos, permitindo a dissolução do vínculo matrimonial, que, enfim, deixou de ser para sempre. A mesma lei igualou os direitos dos filhos, independentemente da situação dos pais. Esses passos aparentemente elementares, no entanto, resultaram de muito esforço de persuasão das militantes feministas. A verdadeira emancipação feminina só ocorreu com a Constituição de 1988, que equiparou homens e mulheres em direitos e obrigações. Em que pesem os avanços legais, convivemos ainda com os resquícios culturais dessa antiga situação de subalternidade.

A desigualdade de gênero nas instâncias de poder é um problema internacional. Em 1995 foi realizada em Pequim a IV Conferência Mundial da Mulher, um verdadeiro marco no avanço dos direitos femininos. Mas muitas das recomendações feitas às delegações oficiais dos países participantes não foram implementadas. As propostas legislativas que visavam a garantir o direito das mulheres ao patrimônio, à saúde e à liberdade sexual não se concretizaram em sua plenitude. Com a população feminina sub-representada nas áreas de comando e compondo apenas 20% dos legisladores em todo o mundo, segundo dados da ONU, estamos muito distantes das metas fixadas em Pequim. Nesse compasso, serão ainda necessárias muitas décadas para haver paridade de gênero nos cargos políticos de relevância.

Mulheres já foram eleitas presidente ou primeira-ministra na Índia, Alemanha, Noruega, Inglaterra, Argentina e no Chile, para citar alguns exemplos, mas uma andorinha só não faz verão. A emancipação efetiva só será realidade quando atingir todas as mulheres, em todas as classes sociais. Enquanto houver violência doméstica, discriminação no trabalho fora do lar e abusos sexuais, nenhuma sociedade poderá dizer que a igualdade de gênero foi alcançada. Por isso, fortalecer e proteger a população feminina deve ser um projeto de governo.

Um exemplo de divisão justa do poder foi adotado por Michelle Bachelet, no Chile, e por José Luiz Zapatero, na Espanha, que decidiram nomear um Ministério paritário (metade homens e metade mulheres). Essa medida, na esfera do Poder Executivo, é fundamental para promover o respeito a uma parcela da população até hoje subjugada e menosprezada pelos padrões patriarcais. Se as mulheres não estiverem no poder, suas reivindicações não serão concretizadas e os projetos que as beneficiam estarão fadados ao esquecimento.

No Brasil foi aprovada nova lei eleitoral (12.034/2009) que determina a obrigatoriedade de os partidos políticos destinarem 5% do fundo partidário à formação política de mulheres, prevendo punição para o descumprimento da regra, e do já mencionado preenchimento de 30% das vagas com candidaturas femininas. Além disso, reserva 10% do tempo de propaganda partidária em anos não-eleitorais para promover a participação da mulher.

Democracia aprende-se, constrói-se e se exerce. No caso das mulheres e de outros segmentos excluídos, a verdadeira democracia requer o acesso ao poder político. O Brasil cidadão precisa ser mais feminino, mais tolerante, mais igualitário, mais atento à preservação ambiental, em suma, mais responsável pelo seu futuro, nos exatos termos consignados em nossa Constituição.

Procuradora de Justiça do Ministério Público de São Paulo

À beira do abismo, no Chile de Pinochet:: Ferreira Gullar

DEU EM GRAMSCI E O BRASIL

Sergio Augusto de Moraes. Viver e morrer no Chile. Brasília/ Rio de Janeiro: Fundação Astrojildo Pereira & Contraponto, 2010.

Este livro é o testemunho de um exilado brasileiro, que nos revela alguns dos aspectos mais dramáticos daquele momento da história chilena, logo após a derrubada de Allende, quando a repressão se desencadeou sobre aqueles que, de uma maneira ou de outra, o apoiavam.

Chegado a Santiago dois anos antes do golpe militar, que daria fim ao governo socialista eleito em 1970, Sergio Moraes nos conta, sucintamente, sua experiência individual que, por envolver outros exilados e ter se vinculado à própria defesa daquele governo, vai além do relato autobiográfico para se tornar parte daquele momento da história chilena. E parte também de nossa história, já que se trata de um comunista brasileiro que, ameaçado pela ditadura militar, teve que optar pelo exílio. O Chile, por ter então um governo socialista, tornara-se o destino natural de militantes brasileiros que buscavam escapar da repressão em nosso país.

Sergio Moraes, engenheiro de profissão, ao chegar a Santiago, conseguiu emprego na empresa estatal Codelco sendo depois transferido para a Madeco, produtora industrial de artefatos de cobre. Ali, relaciona-se com partidários de Allende, dispostos a defender o governo socialista, já então ameaçado pela direita e por setores das forças armadas chilenas. Foi quando surgiu a ideia de construir pequenos carros blindados, que eventualmente pudessem ser usados contra os golpistas. Mas o golpe veio e não houve resistência e, dias depois, Sergio e sua companheira, Zelda, eram presos e enviados para o Estádio Nacional, onde já se encontravam outros militantes chilenos ou não, partidários do presidente deposto.

No Estádio Nacional, de onde frequentemente um helicóptero militar levava prisioneiros para a morte, Sergio viveu a insuportável expectativa de ser também executado. Esse drama terrível é por ele narrado neste livro de maneira sóbria e objetiva, que mais lhe acentua a dramaticidade. Esta narrativa constitui um testemunho impactante daqueles dias aterradores; testemunho que é, por isso mesmo, uma denúncia da ferocidade daquele regime que dominou a nação chilena por quase vinte anos. Um livro que necessitava ser escrito e, felizmente, o foi. Lê-lo é imprescindível.

Ferreira Gullar é poeta. Este texto é o prefácio de Morrer e viver no Chile.

Lançamento do livro de Sérgio Moraes "Viver e morrer no Chile"

Dia 8 de junho de 2010, às 18h30, na Livraria Museu da República - Rua do Catete,153 - Palácio do Catete - Rio de Janeiro/RJ.(Ver convite abaixo)


Tucano vê política de segurança como flanco do PT

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Daniel Bramatti

O ataque de José Serra ao governo do boliviano Evo Morales tem como alvo indireto as políticas externa e de segurança de Luiz Inácio Lula da Silva. O primeiro tema não está na ordem do dia da maior parte da população, mas o segundo é prioritário, como mostram pesquisas de opinião. A segurança é ainda uma das poucas áreas em que a maioria do eleitorado desaprova o governo federal, segundo sondagem do instituto Ibope.

A acusação de que o governo boliviano faz "corpo mole" em relação ao narcotráfico surge depois de Serra ter prometido a criação de um ministério para combater o crime e a formação de uma segunda polícia federal, com o objetivo de vigiar as fronteiras. Em entrevista ao Programa do Ratinho, o tucano chegou a defender o uso de satélites para "controlar a entrada e saída de gente" ? algo que nem os Estados Unidos conseguem fazer na fronteira com o México.

A última pesquisa Ibope encomendada pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), divulgada em março, mostrou que 52% dos brasileiros desaprovam a política de segurança do governo, contra 44% que aprovam. É um dos flancos que Serra vê como atacável no governo, ao mesmo tempo que evita confronto direto com o presidente, para não melindrar os "lulistas" de sua base de apoio.

Os temas segurança e narcotráfico também estão presentes no discurso da petista Dilma Rousseff: ela já anunciou um programa de combate ao crack e chegou a destacar o assunto na propaganda partidária do PT, no início do mês.

A política externa foi colocada na agenda eleitoral pelos dois candidatos - uma das novidades da campanha de 2010. Serra já criticou o venezuelano Hugo Chávez -"eleitor" declarado de Dilma -, o Mercosul e as violações de direitos humanos em Cuba. Também chamou de ditador o presidente do Irã, Mahmoud Ahmadinejad, como forma de bombardear o acordo nuclear mediado por Lula - e que havia sido qualificado por Dilma como um "gol" da diplomacia brasileira.

Jarbas anuncia vice e faz promessas

DEU NO JORNAL DO COMMERCIO (PE)

Acompanhado de José Serra, senador lançou oficialmente sua pré-candidatura ao governo, confirmou Miriam Lacerda como vice e adiantou algumas promessas

Sheila Borges

Diante do presidenciável José Serra (PSDB), dos líderes da oposição e de centenas de militantes que participaram, ontem à tarde, do ato de lançamento de sua pré-candidatura a governador, o senador Jarbas Vasconcelos (PMDB) confirmou que a deputada estadual Miriam Lacerda (DEM) é a sua pré-candidata a vice e adiantou algumas promessas de campanha, sinalizando quais são as prioridades de seu futuro programa de governo. Caso seja eleito, pretende dar prosseguimento aos investimentos no Complexo Portuário de Suape e interiorizar, ainda mais, o desenvolvimento. Neste segundo ponto, citou que o Estado precisa melhorar a sua atuação nos polos da sulanca, no Agreste, da fruticultura, no Sertão do São Francisco e do gesso, no Araripe, assim como continuar as obras do Canal do Sertão e da estrada da Uva e do Vinho, também naquela região.

Para demonstrar que não estava recorrendo a um discurso falacioso, apesar de estar empolgado com a receptividade dos militantes, o pré-candidato fez questão de lembrar que não é de fazer promessas à toa. Tomou como exemplo a campanha eleitoral de 1998, quando se sagrou governador pela primeira vez, depois de derrotar, por mais de um milhão de votos – ressaltou este número –, o então governador Miguel Arraes, avô do atual governador Eduardo Campos, que faleceu em 2005. Naquela ocasião, colocou no guia eleitoral da televisão e do rádio que iria duplicar o trecho da BR-232 entre Recife e Caruaru. “Disseram que era obra federal, mas fui adiante”, falou. Ao final do primeiro mandato, frisou que tinha concluído a duplicação de 120 quilômetros da rodovia.

Nesse contexto, disse que assumia, agora, mais estes compromissos “na frente de Serra e de mais de cinco mil pessoas”, uma vez que o atual governo não estaria dando seguimento, por exemplo, aos projetos de irrigação do Sertão. “Precisamos retomar à irrigação. Não temos mais como exportar frutas (em Petrolina). Não se fez um palmo de irrigação. O projeto do Canal do Sertão precisa ser retomado”, argumentou. Para não ficar voltado só para o Sertão e o Agreste, lembrou também dos problemas enfrentados pelas usinas nas Matas Sul e Norte do Estado.

Solicitando a parceria de José Serra, frisou que a classe política deve se unir para ajudar o setor sucroalcooleiro que, no passado, chegou a empregar mais de 300 mil pessoas. Hoje, este número, de acordo com o peemedebista, está em torno dos 100 mil. “Temos que ajudar o operário, o trabalhador rural, o fornecedor de cana e os produtores”, falou.

Para animar a militância, utilizou um discurso forte e bem articulado, conclamando todos a se engajar. Primeiro, repetiu uma explicação que já tinha sido dada aos líderes políticos e à imprensa, quando, há 20 dias, externou sua decisão de disputar a eleição. “Por que estou aqui hoje depois de tanta reflexão? Aceitei (ser candidato) porque o povo de Pernambuco me pediu”. Depois, reconheceu que o momento não é fácil, mas que, sempre trabalha melhor quando é desafiado.

“Minha vida é marcada por desafios. Sempre tive mais determinação e garra quando as lutas eram desiguais, como esta agora. (...) Essa história é desigual agora. Vamos torná-la igual e vencer”, disse, referindo-se ao fato de o governador Eduardo Campos, contar com a máquina estadual e os apoios dos governos federal e do Recife. Terminou seu discurso, falando que, apesar do quadro eleitoral adverso, está tranquilo para “enfrentar” a luta. “Sei administrar a minha cabeça. Vamos voltar a governar Pernambuco”.

Jarbas: Elogios à “guerreira” Miriam, a vice, e a Raul Jungmann

DEU NO JORNAL DO COMMERCIO (PE)

O pré-candidato a governador das oposições, o senador Jarbas Vasconcelos (PMDB), decidiu de última hora anunciar, na festa de ontem, o nome de sua companheira de chapa, a deputada estadual Miriam Lacerda (DEM), que, na noite anterior, tinha conversado longamente com o peemedebista em seu escritório no Recife. Ao oficializar a sua pré-candidata a vice, frisou que o perfil dela era o mais adequado para o momento político: tem voto e força no interior, principalmente no Agreste, já que Jarbas tem maior trânsito no Recife e Região Metropolitana. Natural de Caruaru, na eleição de 2006 Miriam teve 65.839 votos e foi a deputada estadual mais votada na história do Estado.

“Aqui, no Recife, vou lutar com o povo. No interior, tenho que ter uma pessoa assim ao meu lado. Ela vai me ajudar. Esposa do ex-prefeito de Caruaru por duas vezes (Tony Gel), tem tido uma atuação extraordinária na Assembleia Legislativa. É uma guerreira”, avaliou. Visivelmente emocionada com tantos elogios, Miriam subiu ao palco e foi abraçada por todos os líderes da oposição. “Meu objetivo é vencer no Agreste. Vamos trabalhar para isso. Temos chances”, apostou. Para mostrar sua força, levou ontem uma das maiores caravanas do evento. Conseguiu mobilizar vários grupos, lotando quatro ônibus.

Agora, para completar a chapa majoritária, Jarbas terá que resolver o problema da segunda vaga para o Senado, uma vez que a primeira foi ocupada pelo candidato natural à reeleição, o senador Marco Maciel (DEM). O peemedebista não quis adiantar onde está o problema, mas frisou que está conversando com os líderes das agremiações aliadas para fechar a chapa. Sem estabelecer, contudo, um prazo. “Os partidos me delegaram a responsabilidade, mas não quero resolver sozinho”, opinou.

Quando foi indagado se o nome do deputado federal Raul Jungmann (PPS) seria o ideal, Jarbas não poupou elogios para destacar a atuação do aliado. “Raul tem as qualidades que quero. É guerreiro, ousado e fala bem”. Anteontem, o pós-comunista divulgou uma nota, explicando que não tinha sido convidado e reafirmando a sua candidatura à reeleição. Jarbas, porém, deu todos os sinais de que Raul tem mesmo as credenciais que procura e já deixou claro que o PSDB pode ficar de fora da majoritária. “Se isso ocorrer, não vou querer dizer nada. O entendimento meu com o PSDB nacional e regional é extraordinário”.

Além de Jarbas e o presidenciável José Serra, também discursaram no evento Marco Maciel e os presidentes nacionais do PSDB, Sérgio Guerra, e do PPS, Roberto Freire.

Serra promete acumular o governo com a Sudene

DEU NO JORNAL DO COMMERCIO

Presidenciável tucano aproveita ato das oposições para engordar a antiga coleção de promessas sobre a Sudene. Ele avisa que, eleito, acumulará a Presidência com o comando do órgão por seis meses

Cecília Ramos

Em um novo esforço de desconstruir a imagem de antinordestino, o pré-candidato do PSDB a presidente da República, José Serra, antecipou, ontem, na festa das oposições estaduais, no Chevrolet Hall, uma promessa inusitada. Se eleito, pretende acumular, durante seis meses, a função de presidente com a de superintendente da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (Sudene). A promessa foi anunciada após todos os oradores discursarem. O último foi o pré-candidato ao governo do Estado, senador Jarbas Vasconcelos (PMDB). Serra, que já havia discursado por 33 minutos, pediu novamente a fala para firmar o compromisso e também criticar: “Falta planejamento para o Nordeste”.

A novidade não estava no roteiro do evento, mas Serra falou a Jarbas que anteciparia sua proposta sobre a Sudene no palco, instantes antes de o senador discursar. Depois, em entrevista, o presidenciável explicou que a intenção não era anunciar ali, mas que lhe “ocorreu a ideia”. “É um compromisso que não é de campanha. Hoje a Sudene não anda. Fecha, abre. É como se estivesse sempre inexistente. O que é que eu vou fazer?

Vou fazê-la andar”, prometeu o tucano, em entrevista.

Serra destacou à imprensa que foi “discípulo e colega” de Celso Furtado, o economista paraibano (falecido em 2004) que criou e foi o primeiro superintendente da Sudene. “Andei lendo tudo de novo a respeito dele (Furtado) e a questão do Nordeste, que mudou muito dele para cá. Então eu quero refazer aquela obra de maneira original. Nós vamos copiar o impulso do passado, mas a cópia é original”, disse o tucano.

Embora esteja desenvolto e à vontade diante das câmeras, nos debates e aparições públicas, José Serra – na visita de ontem – não estava no seu melhor momento. Fez um discurso “emperrado”, como classificou um aliado seu. Não fluiu. O tucano ia e voltava em temas, muito preocupado em agradar a plateia. Em boa parte do discurso foi propositivo e derramou elogios a Jarbas – sobretudo para defender que o “bom momento de obras vivido por Pernambuco hoje tem a palma” do senador. “Jarbas é conhecido por lutar contra unanimidades”.

Serra falou a maior parte do tempo que, se eleito, olhará para o Nordeste, embora não seja nordestino, como o presidente Lula, que nasceu em Caetés (Agreste de Pernambuco). Outra promessa que o tucano frisou foi manter o Bolsa Família e criar o Bolsa Estudante para bancar alunos em escolas técnicas. No mais, repetiu promessas feitas no Recife, há 15 dias, quando concedeu entrevista na Rádio Jornal. Entre elas, impulsionar obras federais em andamento, como a Refinaria Abreu e Lima, em Suape. O tucano aproveitou para cutucar: “A refinaria anda a passos de tartaruga”. E disse que a Ferrovia Transnordestina, que Lula visitará no mês que vem (trecho em Salgueiro), “não existe”. Também citou que continuará a Transposição do São Francisco, mas criticou que o governo atual “esqueceu projetos de irrigação”.

No palco, Serra lembrou como conheceu Jarbas e os aliados presentes (Marco Maciel, Sérgio Guerra e Roberto Freire). Contou que “ouviu falar” no nome de Jarbas quando estava no exílio (ficou 14 anos fora do Brasil). Mas só conheceu o peemedebista em 1979, quando veio ao Recife para o comício histórico em Santo Amaro que marcou o retorno do ex-governador Miguel Arraes, também exilado, ao País.

Desta vez, tucano não fez elogios a Lula

DEU NO JORNAL DO COMMERCIO (PE)

Mais uma vez na “terra” do presidente Lula, o presidenciável José Serra não se arriscou a elogiar ou criticar diretamente o adversário petista. Ao contrário. Sequer mencionou o nome – na visita anterior, há duas semanas, disse que Lula estava “acima do bem e do mal”. Mas, ao mesmo tempo, Serra disse que não se sente “intimidado” ao visitar o Estado, onde a popularidade do presidente é próxima de 85% segundo recente pesquisa. “Eu me sinto à vontade aqui porque eu estou à vontade mesmo”, assinalou Serra, para dizer que a força do presidente não o assusta e não lhe tira a disposição de percorrer o Brasil.

“Para mim, fazer campanha é uma coisa prazerosa. É muito prazeroso visitar Pernambuco”, reforçou. “Eu tenho ligações aqui há décadas e décadas. Conheço a região. Conheço o Brasil todo. Para mim é estimulante vir aqui, fazer balanço das coisas, ouvir, conversar com as pessoas. Estou louco para poder ter condições de acelerar o processo de mudanças para melhor. Do Nordeste e de Pernambuco”, completou. Ao discursar, ele repetiu que é um “político nacional” e não regional. Para falar sobre o combate às drogas, discussão em alta, no momento, disse: “Quando eu entro numa briga, é pra valer. Eu não tenho receio de enfrentar adversários”.

A tropa que fez a segurança de Serra, ontem, usou da força contra populares e sobretudo jornalistas para manter o tucano longe do assédio. O próprio tucano pediu calma diante da cena. Ele se assustou com o número de pessoas no palco. “Eu já caí (de palcos) duas vezes. Vamos sair daqui, porque está perigoso. Prometo que falo com vocês (repórteres) lá embaixo (no chão)”, disse.(C.R.)

Tucano volta a acusar Bolívia de fazer 'corpo mole'

DEU EM O GLOBO

Lula posa com Evo Morales

RIO e RECIFE. O presidenciável José Serra voltou ontem a acusar o governo da Bolívia de fazer "corpo mole" em relação ao contrabando de cocaína para o Brasil. E afirmou que, se eleito, vai pressionar a Bolívia para que tome uma providência a fim de coibir o tráfico na fronteira.

O tucano fez o comentário em entrevista à Rádio Jornal do Commercio, pouco antes de viajar para Recife, onde participou da festa de lançamento da pré-candidatura do senador Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE) ao governo do estado.

- A cocaína sai da Bolívia. Não só, mas principalmente. Então temos que conversar com o governo boliviano, pressionar, para que não deixe a cocaína sair. Porque lá tem toda uma cadeia produtiva de cocaína. Disse para a imprensa e repito. Com tanta cocaína vindo de lá para cá, é impossível que o governo boliviano não saiba. Está fazendo corpo mole. Não iria sair tanta cocaína se o governo fizesse alguma coisa.

Ontem, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, fez questão de posar para fotos ao lado do presidente da Bolívia, Evo Morales, durante o 3º Fórum Mundial da Aliança de Civilizações, no Rio. O boliviano não comentou as acusações de Serra.

Tráfico: Lula em defesa de Evo Morales

DEU NO JORNAL DO BRASIL

Junto a Evo Morales, Lula ironiza Serra

Flávia Salme

RIO - Alvo de críticas do pré-candidato a Presidência José Serra (PSDB), o presidente da Bolívia, Evo Morales, foi afagado sexta-feira por Lula. Na quarta-feira, Serra acusou Morales de ser cúmplice e fazer “corpo mole” na repressão ao tráfico de cocaína que sai do país andino para o Brasil. Sexta-feira, durante o 3º Fórum Mundial da Aliança das Civilizações, no Rio de Janeiro, Lula cumprimentou Evo com entusiasmo. Ao convidá-lo a posar para os fotógrafos, disparou:

– Vamos fazer inveja no Serra.

Morales sorriu, mas não comentou a declaração do ex-governador de São Paulo. Minutos antes da foto, o presidente boliviano cancelou a entrevista que daria a jornalistas. Arriscou-se apenas a dar um palpite sobre a Copa do Mundo:

– O Brasil será campeão.

A diplomacia boliviana, porém, reagiu. Em nota, o Ministério das Relações Exteriores da Bolívia disse sexta-feira que as declarações de Serra sobre o tráfico de drogas no país são “irresponsáveis” e “político-eleitorais”. No documento, a equipe da chancelaria de Evo assegurou que o governo de La Paz “ratifica o compromisso assumido de luta contra o tráfico ilícito de drogas”.

Sem conversa

Apesar do manifesto, Serra insistiu nas críticas e desdenhou das declarações diplomáticas da Bolívia.

– Não valem uma nota de três reais – disse, no Recife, onde cumpriu agenda política.
Durante o lançamento da pré-candidatura de Jarbas Vasconcelos (PMDB) ao governo de Pernambuco, Serra voltou a subir o tom das críticas contra a atuação dos presidentes da Bolívia e do Brasil. Antes, em entrevista a uma emissora de rádio local, disse que governo federal precisa de empenho para resolver a questão e prometeu, se eleito, pressionar o governo da Bolívia para tomar providências.

– Quero que o governo federal se envolva diretamente nessa luta para defender as famílias, o direito à vida, o futuro dos nossos jovens. Droga vem do exterior, das fronteiras. O Brasil não produz cocaína, nem a industrializa. A cocaína vem da Bolívia. Então, temos que conversar com o governo boliviano, para que não deixe a cocaína sair.

Propaganda eleitoral

Serra também falou sobre a repercussão do programa político do DEM exibido na noite de quinta-feira em cadeia nacional de rádio e televisão, no qual o pré-candidato tucano foi o personagem principal. O conteúdo levou o PT a acusar os democratas de infringirem a legislação, que impediria a utilização de integrante de um partido no programa eleitoral de outro. Segundo Serra, a responsabilidade, no caso do ocorrido na quinta-feira, é do próprio DEM, que exibiu imagens e discursos de Serra gravados durante uma reunião pluripartidária.

– Não gravei diretamente para o programa. Pegaram trechos e puseram no programa deles – concluiu o tucano.

Conexão Bolívia-Brasil

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Quase meia tonelada de cocaína foi apreendida ontem em Três Lagoas. Droga seria boliviana.

PF apreende 500 kg de coca

A Polícia Federal apreendeu ontem quase meia tonelada de cocaína em Três Lagoas (MS). O delegado Júnior Taglialenha não confirmou a procedência, mas fontes da própria PF em Campo Grande afirmam que pelo menos 90% da droga é proveniente da Bolívia.

No início deste mês, a polícia já havia apreendido 725 quilos de cocaína de procedência boliviana.

Verdes: campanha vai esquentar

DEU EM O GLOBO

Aliados de Gabeira acreditam em ataque maior a Cabral

Fábio Vasconcelos

Um dia após o Tribunal Regional Eleitoral (TRE) tornar inelegível o ex-governador Anthony Garotinho (PR) por abuso de poder econômico nas eleições de 2008, o clima entre os aliados do pré-candidato do PV, Fernando Gabeira, é de expectativa. Na avaliação deles, ainda é cedo para saber se, de fato, Garotinho estará fora da disputa para o governo do estado. Mas eles acreditam que a decisão do tribunal vai esquentar os ânimos do pré-candidato do PR.

- Existem dois cenários. O Garotinho pode sair da disputa, mas pode também continuar, embora mais enfraquecido. Neste segundo caso, que acreditamos que deve prevalecer, Garotinho continuaria na disputa, mas agora mais enfurecido para cima do governador Sérgio Cabral - avaliou um aliado próximo de Gabeira.

Outro político com trânsito com o pré-candidato do PV fez uma análise sobre a questão dos prazos.

- Existe um prazo que é muito importante. O Garotinho tem até dia 5 de julho para conseguir reverter a decisão no TSE (Tribunal Superior Eleitoral). É um prazo bastante curto, já que o acórdão do TRE só deve ser publicado lá para o dia 10 de junho - contou.

Um outro integrante da candidatura do PV foi mais enfático:

- A decisão (do TRE) sacudiu a eleição - disse.

Ontem, Gabeira foi à sede da SuperVia para conhecer o plano de investimento da empresa. Após quase duas horas de reunião com diretores da empresa, o pré-candidato afirmou que será preciso acelerar as melhorias no sistema.

Pelo cronograma da SuperVia, serão investidos cerca de R$2,3 bilhões nos próximos anos, dos quais, R$1,3 bilhão de recursos da própria concessionária. Com isso, a estimativa é dobrar até 2015 o número de usuários, que hoje é de 500 mil. Gabeira afirmou que, se eleito, pretende discutir formas alternativas para acelerar os investimentos no sistema de trens.

Decisão é na urna :: Míriam Leitão

DEU EM O GLOBO

Uma das dúvidas mais instigantes da eleição presidencial este ano é até que ponto um presidente popular como Lula consegue transferir votos para sua candidata. No Chile, uma presidente popular não conseguiu eleger seu candidato. A eleição de amanhã na Colômbia é outro teste. Há especialistas dizendo que o pleito brasileiro já está definido. Respeito demais o eleitor para concordar.

A dinâmica de um processo eleitoral é sempre imprevisível. O presidente Álvaro Uribe tem alta popularidade, mas seu candidato Juan Manuel Santos chega à reta final da campanha empatado nas pesquisas de intenção de voto com Antanas Mockus, do Partido Verde. Por que a popularidade de Uribe não foi suficiente?

O ex-vice-ministro do Planejamento colombiano Alejandro Gaviria, entrevistado no blog, explica que popularidade presidencial é patrimônio pessoal, nem sempre transferível:

- Em um mundo com partidos débeis, a popularidade presidencial é pessoal. Santos representa a continuidade das políticas, mas seu estilo é muito diferente do estilo do presidente Uribe. A opinião pública reconhece as conquistas de Uribe, mas não quer só continuidade, demanda também uma mudança nas políticas sociais e medidas contra a corrupção.

Michelle Bachelet tinha a mais alta popularidade presidencial na América Latina e seu partido perdeu a eleição. Ela agiu como um magistrado no processo eleitoral. Aqui no Brasil, o presidente Lula tem desrespeitado as regras de separação entre o governo e a campanha da sua candidata. Recebe multas e as desdenha. Esse envolvimento está sendo reforçado pela melhora do desempenho da pré-candidata Dilma Rousseff nas pesquisas.

Ao contrário do caso da Colômbia, descrito por Gaviria, aqui o PT não é um partido débil. Porém, ele foi atropelado pelo presidente Lula, que impôs sua escolha no velho estilo mexicano da era do PRI, em que cabia ao presidente escolher o candidato à sua sucessão.

No Brasil, há também uma candidata do Partido Verde que já está com 12% das intenções de voto, mas não se pode fazer um paralelo com o caso colombiano. Segundo Gaviria, Mockus não é exatamente ambientalista, o partido é ambíguo sobre bandeiras que para Marina Silva são consistentes. Lá, ele focou no combate à corrupção e na luta por transparência. Até o fato de admitir publicamente que tem mal de Parkinson o alavancou nas pesquisas. Ele pode perder a eleição, mas Mockus já foi muito além do que se previa que ele iria.

Na Colômbia, a insatisfação com 12% de taxa de desemprego e 60% de informalidade atenuam o efeito da popularidade presidencial, que é baseada no fato de que Uribe enfrentou os narcotraficantes das Farc e reduziu a criminalidade. Nada disso é possível transpor para o Brasil. Aqui, a informalidade é alta, mas caiu; o desemprego está em queda; o país está crescendo forte depois da recessão de 2009. E aqui, felizmente, não há movimento terrorista como há na Colômbia há décadas.

Os países são diferentes, mas em sistemas políticos democráticos é inevitável que haja surpresas e inesperados. Por isso, é tão espantoso que alguns cientistas políticos, ou especialistas em pesquisa de opinião, estejam garantindo mais de quatro meses antes das eleições que o resultado já está definido em decorrência da popularidade presidencial.

O ex-ministro da Fazenda da Colômbia Juan Camilo Restrepo dá os números: a popularidade de Uribe é de 70%, a intenção de votos em seu candidato é de 35%:

- Vai certamente para o segundo turno, mas a eleição não está garantida.

Ele acha que Mockus é um fenômeno ainda mal entendido, porque ele já foi candidato em outras vezes sem ter o mesmo desempenho. Restrepo conta que há um grande desconforto no país com métodos policiais abusivos no governo Uribe. É uma situação ambígua: eles valorizam o resultado alcançado, de maior segurança, mas ao mesmo tempo estão cansados de coisas como paramilitares e escutas ilegais por organismos de segurança. Reforma tributária foi tema de campanha. Santos garantiu que não elevará os impostos, Mockus disse que será inevitável elevá-los.

O jornalista Gerardo Quintero Tello, do "El País" da Colômbia, explicou assim a dissonância entre aprovação de Uribe e a intenção de voto em seu candidato:

- Apesar de ser o ungido pelo presidente, o ex-ministro da Defesa não tem as mesmas origens, nem o mesmo carisma, nem as mesmas ligações que o atual presidente tem com a maioria dos cidadãos. Santos representa a elite de Bogotá, tem pouco contato nas áreas não urbanas.

O jornalista explica que Mockus tem a vantagem de ser um bom administrador como ex-prefeito de Bogotá, fez uma aliança com Sérgio Fajardo, que também teve sucesso como administrador de Medellin e conduziu uma campanha renovadora do cenário político:

- Mockus representa uma reserva moral num país estupefato diante das práticas corruptas da política.

O analista político Camilo González Posso disse que Santos tem o apoio dos uribistas radicais que sempre foram em torno de 33%. Acha também que Mockus atraiu a juventude com a possibilidade de mudança. Ele acredita que há rejeição ao modelo econômico de Uribe construído em cima de muito subsídio para setores econômicos fortes.

Cada país é um país e os fenômenos políticos são distintos, mas há uma questão que não muda: o eleitor é que escolhe em quem votar e ele normalmente surpreende os analistas. Se não fosse isso, nem precisaria de eleição, bastavam as pesquisas. As entrevistas podem ser lidas em meu blog: http://www.miriamleitao.com/.

A Santa Sé também erra :: José Márcio Camargo

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

A discussão em torno da autonomia operacional do Banco Central (BC) ganhou as manchetes dos jornais nas últimas semanas. Essa é uma questão importante para a estabilidade da economia e é muito positivo que, apesar de técnico e árido, o tema esteja no centro do debate neste início da campanha eleitoral.

Desde o início do governo Fernando Henrique o BC tem autonomia de fato. Suas decisões são tomadas por seus diretores, supostamente com base em análises técnicas sobre a trajetória da inflação, sem interferência direta do presidente da República. Nos primeiros anos após a estabilização em 1994, que tinha como principal suporte a âncora cambial, as discussões se concentravam na manutenção de uma taxa de câmbio constante. Após a flexibilização da taxa de câmbio e a adoção do regime de metas para inflação em 1999, o debate se deslocou para o valor da taxa de juros real. Apenas uma vez, nessa transição da âncora cambial para o regime de câmbio flutuante, o presidente da República interferiu diretamente na atuação do BC.

A ideia de que os bancos centrais devem tomar suas decisões de política monetária de forma autônoma, sem interferências, não se baseia em uma suposta infalibilidade de seus diretores. Afinal, os bancos centrais erram e seus erros podem ser bastante custosos para a sociedade. A origem da atual crise, por exemplo, foi a decisão do banco central americano, o Federal Reserve (Fed), de manter taxas de juros reais negativas, por um longo período de tempo, no início dos anos 2000. Como resultado, os bancos passaram a tomar risco excessivo para manter seus lucros, os consumidores se endividaram além do que podiam suportar e se desenvolveu uma bolha no mercado imobiliário americano que, quando furou, levou ao aumento da inadimplência, falências bancárias e ao colapso do mercado de crédito, que gerou a recessão do final de 2008 e início de 2009.

Apesar da falibilidade dos BCs, existe alguma evidência empírica mostrando que países que têm bancos centrais realmente autônomos (que tomam suas decisões de política monetária com base em análises técnicas, sem interferência política) tendem a ter taxas de inflação menores do que os que não os têm. Isso porque a autonomia do banco central gera uma estrutura de incentivos mais propícia à estabilidade monetária do que uma situação na qual as decisões do BC são dependentes de aprovação do presidente da República.

A razão é simples. O Poder Executivo, com aprovação do Congresso, define o Orçamento da União, ou seja, a carga tributária e o total dos gastos do governo. Como consequência, o presidente da República tem uma enorme influência sobre a decisão de o governo adotar ou não uma política fiscal que mantenha os gastos em níveis compatíveis com as receitas governamentais. Se os gastos forem maiores que as receitas, o governo terá déficit fiscal, e vice-versa. Déficits fiscais podem ser financiados de duas formas: pela emissão de moeda, que somente o BC pode fazer, ou pela venda de títulos públicos.

O custo de financiar os déficits fiscais com a venda de títulos da dívida é a taxa de juros que o governo paga para vender esses títulos aos poupadores. E, em linhas gerais, a taxa de juros aumenta com o tamanho da dívida pública e, portanto, com o déficit fiscal, o que reduz o crescimento. Por outro lado, o custo de financiar os déficits públicos via emissão de moeda é um aumento da inflação no futuro. Nesse caso, o aumento do gasto público tende a gerar mais crescimento no presente ao custo de maior inflação no futuro.

Um presidente que consiga controlar a política fiscal e a política monetária terá todo o incentivo para financiar os aumentos de gastos via emissão de moeda, principalmente nos períodos imediatamente anteriores às eleições. Por outro lado, no caso em que o banco central toma suas decisões de forma autônoma, pelo menos teoricamente, seus diretores terão o incentivo a fazê-lo levando em consideração suas análises das condições dos mercados de bens e serviços e das expectativas para a inflação.

Incentivos corretos não garantem decisões corretas, mas aumentam a probabilidade de que isso aconteça. Se o presidente do BC é hierarquicamente dependente do presidente da República e suas decisões têm que ser submetidas e aprovadas por ele, a probabilidade de que os interesses políticos se sobreponham às necessidades técnicas de manter a inflação baixa se torna muito elevada. O resultado é mais inflação. Afinal, ninguém é infalível, nem mesmo o presidente da República, apesar de alguns acreditarem no contrário. Aliás, até mesmo a Santa Sé erra, como poderiam testemunhar as vítimas da inquisição.

É professor do Departamento de Economia da PUC/RIO e economista da OPUS gestão de recursos

O QUE PENSA A MÍDIA

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Melodia Sentimental (Villa Lobos)

A mula de padre:: Ascenso Ferreira



Um dia no engenho,
Já tarde da noite
Que estava tão preta
Como carvão...
A gente falava de assombração:

— O avô de Zé Pinga-Fogo
Amanheceu morto na mata
Com o peito varado
Pela canela do Pé-de-Espeto!
— O cachorro de Brabo Manso
Levou, sexta-feira passada,
Uma surra das caiporas!
— A Mula de Padre quis beber o sangue
Da mulher de Chico Lolão...

Na noite preta como carvão
A gente falava de assombração!
Lá em baixo a almanjarra,
A rara almanjarra,
Gemia e rangia
Oue o Engenho Alegria
É bom moedor...

Eh Andorinha!
Eh Moça-Branca!
Eh Beija-Flor. . .

Pela bagaceira
Os bois ruminavam
E as éguas pastavam
Esperando a vez
De entrar no rojão...
Foi quando se deu
A coisa esquisita:
Mordendo, rinchando,
As pôpas e aos pulos
Se pondo de pé
Com artes do cão,
Surgiu uma besta sem ser dali não...

— Atallia a bicha, Baraúna!
— Sustenta o laço, Maracanã!
E a besta agarrada
Entrou na almanjarra,
Tocou-se-lhe a peia
Até de manhã ...

E depois que ela foi solta
Entupiu no oco do mundo!
Num abrir e fechar d'olhos
A maldita se encantou...

De tardinha.
Gente vinda
Da cidade
Trouxe a nova
De que a ama
De seu padre
Serrador
Amanhecera tão surrada
Que causa compaixão!
.....................................
Na noite tão preta como carvão
A gente falava de assombração