domingo, 16 de maio de 2010

Reflexão do dia – Alfredo Bosi

Segundo sua conclusão, o discurso ideológico seria sempre elaborado na chave retórica da persuasão. Como Mannheim, o senhor sugere que se desconfie da ideologia?

" O pensamento de Mannheim é rico e diferenciado, não podendo ser reduzido a fórmulas estreitas. Para Mannheim , ideologia não é, necessariamente, produção de ideias por uma determinada classe visando sempre a mistificar o próprio poder sob a máscara de verdades universais. Ao lado dessa concepção fortemente valorativa, que descende de A Ideologia Alemã, de Marx e Engels (e que Mannheim em boa parte acolhe), haveria estilos de pensar vigentes em certos grupos sociais e em certos momentos históricos que moldariam esse ou aquele tipo social, sem que se possa acusar neles um caráter intrinsecamente fraudulento e mistificador. Mannheim é um dos criadores da socciologia do conhecimento, mas estava consciente de que, se relativizamos todo o nosso saber condicionando-o à nossa classe, ninguém escapará desse determinismo, a começar pelo próprio sociólogo do conhecimento... Para sair do impasse, Mannheim propõe que o intelectual se dedique à percepção dos limites do seu grupo de origem e se coloque em um ângulo crítico que o livraria dos esteiótipos da sua classe. É uma esperança. "


(Alfredo Bosi, entrevista, ontem, ao suplemento Sabático/ O Estado de S. Paulo)

Olhos nos olhos:: Merval Pereira

DEU EM O GLOBO

O presidente Lula chega a Teerã para uma missão considerada impossível: tirar do governo teocrático de Mahmoud Ahmadinejad um compromisso formal de que o programa nuclear iraniano é para fins pacíficos, em termos que sejam aceitáveis para os países que querem aprovar no Conselho de Segurança da ONU sanções econômicas contra o Irã, sob a liderança dos Estados Unidos.

O problema é que esses países não acreditam na mera palavra do governo iraniano, e qualquer documento tem que ser seguido de fatos concretos, coisa que o Irã se recusa a fazer.

Classificado de ingênuo em diversas ocasiões por líderes internacionais como a secretária de Estado Hillary Clinton ou o ministro das Relações Exteriores da França, Bernard Kouchner, o presidente Lula já teve uma primeira vitória diplomática: sua missão, por mais insólita que pareça, acabou recebendo o apoio dos governos dos Estados Unidos, da França, da Rússia.

Todos céticos com relação às chances de sucesso, mas obrigados a dar um voto de confiança ao carismático líder brasileiro, que procura ter o apoio da presença nas negociações do primeiroministro da Turquia.

O risco de fracasso, muito maior do que a chance de sucesso, faz com que Recep Erdogan relute em comparecer.

Tanto Lula quanto Erdogan fazem parte daquela lista da revista Time de líderes mais influentes do mundo, e os dois parecem mais empenhados em afirmar essa influência, em contraste com o governo dos Estados Unidos, do que realmente em chegar a uma solução, que a todos parece inviável.

Assim como previsivelmente não conseguiu nada no Oriente Médio, a busca de um protagonismo internacional leva o governo brasileiro a assumir uma negociação com o Irã que dificilmente se concretizará, ainda mais na tosca concepção de Lula de que a solução ainda não foi encontrada por que nenhum dirigente internacional sentou-se para negociar com Ahmadinejhad olho no olho.

Hillary Clinton classificou nos bastidores a recente passagem de Lula pelo Oriente Médio de risivelmente ingênua, e mostrou-se cética mais uma vez com relação ao êxito das conversações com o Irã, mas oficialmente o governo dos Estados Unidos se viu obrigado a considerar a visita de Lula como a última chance antes da decretação das sanções.

O ministro das Relações Exteriores da França, Bernard Kouchner, que revelara recentemente o receio de que o presidente brasileiro estivesse sendo embromado por Ahmadinejad, teve que recuar depois da péssima repercussão de seus comentários.

Até o momento, o governo brasileiro está conseguindo se manter dentro de uma zona de respeitabilidade, mas qualquer passo em falso pode se transformar em galhofa internacional.

A posição brasileira de postar-se ao lado do governo do Irã para evitar as sanções econômicas internacionais tem uma explicação oficial que não satisfaz aos observadores internacionais.

O governo brasileiro diz que está defendendo seus interesses, porque teme que uma sanção ao Irã possa transformar-se em arma contra nosso programa nuclear.

De fato, o governo trava uma guerra nos bastidores com a AIEA com relação à assinatura de um protocolo adicional ao Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares (TNP).

Esse adendo ao TNP foi idealizado depois d o s atentados de 2001 nos Estados Unidos, e pretende ampliar as áreas de fiscalização da AIEA, o que o Brasil não aceita.

A principal razão é proteger o segredo das centrífugas utilizadas no programa nuclear para enriquecimento de urânio, que seriam uma invenção brasileira à frente das existentes no mundo.

A resistência à ampliação da fiscalização da AIEA e mais o apoio ao programa nuclear do Irã, no entanto, já está fazendo com que surjam aqui e ali desconfianças de que, na verdade, o que o governo brasileiro quer mesmo é criar condições para retomar o programa nuclear para fazer a bomba atômica, como alguns setores defendem abertamente.

Não há, no entanto, nenhuma razão objetiva que permita uma ilação nesse sentido, pois o país assinou o TNP e a fiscalização hoje existente é mais do que suficiente para garantir que o programa tem realmente fins pacíficos.

O que não acontece com o Irã, que também assinou o TNP mas não aceita a fiscalização dos órgãos internacionais, além de ter enriquecido o urânio a 20% sem autorização formal da AIEA.

O Brasil, para seu programa de submarino nuclear, já tem permissão para enriquecer urânio a 20%, mas nem pretende chegar a tanto.

A questão, no entanto, é política, e nesses termos o governo brasileiro terá que obter do governo de Mahmoud Ahmadinejad mais do que um documento afirmando que o programa nuclear tem fins pacíficos.

Isso, por sinal, o governo do Irã vive afirmando em público, mas a essas afirmações não se seguem atos concretos que as avalizem.

O que os países que fazem parte do Conselho de Segurança da ONU temem é que o Irã esteja usando esse anseio de Brasil e Turquia de se impor no cenário internacional para ganhar tempo, dando continuidade ao programa nuclear sem fiscalização e evitando as sanções internacionais.

O sucesso não previsto pela maioria alavancará a imagem de líder emergente que Lula cultiva com tanta obsessão, abrindo caminho para uma atuação internacional após o fim de seu mandato presidencial.

Se, ao contrário, Lula não sair de sua visita a Teerã com algum acordo razoável que desmobilize a tendência do Ocidente de decretar sanções, estará correndo o risco de explicitar sua irrelevância, e a da diplomacia brasileira, nas negociações internacionais fora de sua área natural de influência, a América Latina.

Cuidado ao pisar:: Dora Kramer

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Ou o líder do governo no Senado, Romero Jucá, não entendeu o espírito da coisa ou não ouviu direito quando o presidente Luiz Inácio da Silva disse que a prioridade do governo é eleger Dilma Rousseff.

Sim, porque quando um líder de governo, porta-voz do Palácio do Planalto no Senado, se refere ao projeto Ficha Limpa de maneira desdenhosa porque "não é um projeto do governo, é da sociedade", é de se perguntar de onde Romero Jucá acha que sairão os votos com os quais Lula conta para eleger Dilma presidente da República.

Das profundezas das camadas do pré-sal, a cujos projetos ele confere total prioridade?

Pode até ser uma surpresa para Jucá e companhia, mas sairão da sociedade. Não aquela parcela ainda refém de favores que elege parlamentares sem olhar se dispõem de biografias ou de folhas corridas.

Mas uma outra que tem a felicidade e a vantagem do acesso a informação e conseguiu ser alcançada pelo movimento de mobilização que reuniu 4 milhões de assinaturas (até a última contagem), fez despertar na Câmara dos Deputados uma inexistente vontade - na maioria -, pressionou os políticos a exercitarem na negociação a arte do possível e os empurrou a aprovar o que parecia impossível.

É o ideal? Não é. Mas se não fosse um ganho significativo, sua excelência não estaria a reclamar, a dizer que é necessário zelar pelo futuro de todos os que eventualmente podem se ver enquadrados nas situações previstas no projeto de lei complementar que proíbe o registro que candidaturas de políticos condenados por crimes dolosos em colegiados judiciais com recursos julgados em tribunais superiores.

Muito provavelmente Romero Jucá não fala sem respaldo. Tanto que o governo não fez reparos à sua paquidérmica declaração de menosprezo a um projeto caro à sociedade.

A título de antes tarde, caberia conferida a trecho de poema do irlandês William Yeats: "Pisa com cuidado, é nos meus sonhos que estás a pisar".

Erro a calhar. Essa história do erro na votação da Câmara no índice do reajuste das aposentadorias acima de um salário mínimo tem cheiro, cor e jeito de artimanha para livrar o presidente Lula do ônus do veto ao aumento de 7,7%.

De fato, depois da votação, viu-se que havia um erro de redação. No texto aprovado constava o índice de 7%. O equívoco, no entanto, foi corrigido pela Mesa com base no resultado da votação em plenário.

Equivocado, demagógico, seja o que for, é soberano.

Só que ao chegar ao Senado, o líder do governo, Romero Jucá, argumentou que a correção feita na Câmara não vale. Ao juízo dele cabe ao Senado alterar a redação. Significa que volta à Câmara.

Ao mesmo tempo, o presidente do Senado, José Sarney, se recusa a inverter a pauta de votações para que o reajuste seja votado rapidamente.

Resumo da ópera da protelação: como a medida provisória vence em primeiro de junho, basta o reajuste não ser aprovado até lá para o presidente não precisar vetar.

Fica tudo resolvido na base da manobra e aquele discurso bonito sobre responsabilidade doa em quem doer devidamente arquivado até uma próxima oportunidade.

Horizonte. Assim como o PT teve seu programa partidário na última quinta-feira, partidos que apoiam a candidatura presidencial de oposição também terão direitos aos seus 10 minutos em rede de rádio e televisão neste semestre.

O PT se arriscou ao confrontar de maneira tão explícita a legislação e apresentar um programa de caráter obviamente eleitoral. Ainda que venha a ser condenado e penalizado financeiramente, com multa ou sem multa conseguiu o que queria de imediato: 10 minutos de propaganda para Dilma Rousseff.

E aí se põe a seguinte questão: os partidos de oposição farão o mesmo? Transformarão seus programas partidários em programas eleitorais? Se não fizeram ficarão em desvantagem em relação ao adversário. Se fizerem perderão a moral para reclamar do PT na Justiça, a lei eleitoral cai de imediato em desuso e a eleição de 2010 vai virar o mais completo vale-tudo.

Ciro Serra e Dilmandela:: Eliane Cantanhêde

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

BRASÍLIA - Enquanto José Serra brinca perigosamente de ser Ciro Gomes, reagindo com mau humor e até uma certa agressividade em entrevistas ora para a CBN, ora para a Radiobras, sua adversária Dilma Rousseff testa personalidades.

Numa hora, é chamada de Nelson Mandela brasileiro pelo padrinho Lula. Noutra, surge como Norma Bengell num comício das Diretas, ao qual jamais compareceu. Numa terceira, apresenta-se com diplomas que, na verdade, não tem.

Enquanto candidata, Dilma virou a mãe do Luz para Todos, programa que existe no papel do PT há uns 20 anos, quando ela nem era do partido, e foi implantado no governo FHC. De manhã, é católica. À noite, recebe bênção de mães de santo. E quer virar petista desde criancinha, contrariando sua biografia.

O "Serrinha paz e amor" quer o fim da independência do BC e não resiste à máxima de que "perguntar não ofende". Dilma precisa se reinventar e se pendurar em Lula para tudo. Logo, devem estar loucos para o horário gratuito de TV começar. Ali, não correm risco. Ali, só falam o que mandam falar, só riem como mandam sorrir, só acreditam no que mandam acreditar.

Até lá, porém, não tem jeito. Ajoelhou, tem de rezar. Têm de respirar fundo, recorrer aos florais de Bach e usar daquelas "pulseiras da Nasa" para ficar zen a módicos US$ 200. Porque jornalistas perguntam, candidatos respondem.

E, se não têm o que responder, que dancem tango, cantem ópera, façam como Hugo Chávez e encham linguiça. Só não podem estapear o entrevistador nem a própria história.Sabe por quê? Porque o jornalista é um só, mas os ouvintes, os telespectadores e os leitores são milhares, milhões. Ah. E eles costumam atender pelo nome de... eleitor.


Lula lá, no Irã, passa por um teste nuclear hoje. Ou volta vitorioso ou confirma a acusação de "ingenuidade" feita por Hillary Clinton.

Do enxoval à mortalha :: Wilson Figueiredo

DEU NO JORNAL DO BRASIL

Ao referir-se ao Brasil, que não lhe merece respeito, o presidente Lula tem sido mais cuidadoso quando fala para fora do que quando se dirige aos brasileiros como se falasse sozinho. Usa a arte de não falar para ninguém. Em princípio, trata com desenvoltura do Brasil que inventou para uso pessoal e consumo alheio. Mas geralmente não cuida do país que conhecia de raspão e não lhe deve retribuição pelo que conseguiu antes dele e pelo que colherá depois. Governos passam, e pouco fica. Lula não aguentou, entre duas derrotas eleitorais, valer-se do gabinete de ficção política para acompanhar o governo alheio e adiantar o aprendizado que a pressa interrompeu. É um governo em trânsito.

Desde que chegou ao poder, e depois de resolver o problema do mensalão, não teve mais do que se queixar. A oposição se resignou à balela da fatalidade histórica, e não sobrou ao presidente Lula sequer um companheiro da velha guarda em condições de fazer carreira à sua sombra. Trabalhou bem e se resguardou ainda melhor. Nem Stalin conseguiu tanto com tão poucas baixas. E em muito menos tempo.

Na sua faixa de onda predileta, o tom coloquial que sintoniza o presidente com maior número de brasileiros pela língua geral que costurou a unidade nacional (com a colaboração nunca assaz louvada do feijão, do futebol e peculiaridades exclusivas). Luiz Inácio Lula da Silva não perde oportunidade de ser mais Lula do que Silva. A curto ou a longo prazo, tanto faz, sempre está fazendo investimento político e colhendo resultados alheios. E acomoda novos admiradores, como acaba de suceder ao candidato social tucano José Serra, que o proclamou acima do bem e do mal, onde ele, Lula, monopoliza os benefícios sociais e deixa para a oposição a culpa pelos males passados e futuros. Os presentes estão sob controle oficial.

Por enquanto, seus cálculos não ultrapassam a barreira de 2014, como já está. Dilma sabe que está condenada a abrir mão do segundo mandato como quitação do primeiro (claro, se lhe cair ao colo). A exceção é o preço a pagar pela recaída eleitoral que veio para ficar, até a República se lembrar dos fundadores que exorcizaram a reeleição. Foram cem anos imunes.

Falta agora, mas não é prioridade, o presidente confirmar a cada dia que não precisa mais preocupar-se com a eleição presidencial. Já considera favas contadas para o PT a sucessão que ele reboca enquanto a oposição, sem sair do lugar, se esfalfa para gaguejar a mesma língua, travada pela falta de sotaque popular.

Do lado oficial, a cada curva fechada, os petistas insatisfeitos com as concessões de princípios no varejo político vivem o desconforto de divergências menores, que se multiplicam nas complicações estaduais atreladas à estratégia federal. Aí também Lula vende, simbolicamente, otimismo a perder de vista para inadimplentes e executados. Já ficaram pelo caminho muitos candidatos cuja vitória Lula anunciou em vão e ninguém lhe cobrou. Os que discordam vão caindo fora e abrindo espaço aos pragmáticos, que não se queixam e se arrumam a esse preço módico.

Para Lula, está tudo dominado, como se diz morro acima e abaixo, desde que desceu sobre o primeiro ato, ou primeiro mandato, a insubstituível cortina da aparência para tirar de cena o mensalão. De dois mandatos presidenciais, não sobrou nenhum companheiro com quem dividir os encargos do poder e as vantagens compensatórias.

Esta sucessão já está no papo, foi o que o presidente declarou em razoável português (ou, mais provável, em dialeto portunhol) ao jornal espanhol El País. Uma cortina de fumaça disfarça pormenores que tendem a crescer com o aprofundamento das diferenças e semelhanças que, ao invés de somar, incompatibilizaram o petismo e a social-democracia. Lula faz a sua parte, aqui dentro ou lá fora, com os dons e dotes que trouxe da vida sindical, enquanto espera a candidata Dilma Rousseff firmar-se nas próprias pernas e aprender a falar, sem sotaque burocrático, língua de gente que supre de votos urnas insaciáveis, que decidem eleição.

Dilma está demorando a se desfazer das pequenas gafes com as quais uma candidata, invertendo a ordem dos fatores, compromete o produto: pode fazer mais depressa a própria mortalha do que o enxoval para a solenidade de posse.

Chico Buarque e João do Vale - "Carcará" (1982)

''Plano B'' para vice de Serra agrada todas as alas do PP

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Quando os tucanos mais próximos do ex-governador de Minas, Aécio Neves (PSDB), lançaram o nome do presidente nacional do PP, senador Francisco Dornelles (RJ), para vice do provável candidato tucano à Presidência, José Serra, não imaginaram que, dois meses depois, até expoentes da ala dilmista do PP torcessem por esse desfecho.

A candidata petista a presidente, Dilma Rousseff, perdeu terreno no partido aliado que comanda o Ministério das Cidades e o nome de Dornelles ganhou força real para compor a chapa adversária.

O objetivo do anúncio do presidente do PP como perfil ideal para encarnar o "plano B" dos tucanos teve o objetivo imediato de reduzir a pressão sobre Aécio para compor a chapa puro-sangue com Serra. Passados 60 dias, no entanto, o PP está rachado em três e a presidenciável petista tem apenas uma parte do apoio da legenda.

Dirigentes do PP avaliam que, ao final, o que vai ditar a direção do partido será a expectativa de poder que cada candidatura presidencial representar no fim de junho. Mas, por hora, a ideia de ter Dornelles na vice da chapa tucana não desagrada ninguém. Ao contrário, anima os pepistas.

Nada trivial :: Sergio Fausto

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Peço desculpas pelo economês, mas ele é indispensável para chegar aonde quero com este artigo: o próximo governo não poderá ser um governo de simples continuidade, pois ela não nos levará muito longe, certamente não a tão longe quanto podemos chegar. E aqui falo de continuidade em relação aos governos de Lula e Fernando Henrique Cardoso, ambos. Temos, portanto, difíceis escolhas políticas a fazer depois de 2010.

Nos últimos dez anos consolidou-se um padrão de política macroeconômica com três pernas na área fiscal e duas na área monetário-cambial. As três pernas fiscais são: meta de superávit primário (receitas menos despesas, excluindo juros) alta o suficiente para impedir o descontrole da dívida pública (o governo federal controla a sua meta diretamente e a dos demais membros da Federação, indiretamente); gastos correntes crescendo mais que o PIB; e carga tributária elevada para cobrir o crescimento dos gastos correntes e, ao mesmo tempo, assegurar o cumprimento das metas de superávit primário e o controle da dinâmica da dívida pública. Na área monetária, as duas pernas são os regimes de metas de inflação e câmbio flutuante, pernas que seriam frouxas sem a companhia das pernas fiscais.

Filha do governo FHC, essa política recebeu duas contribuições do governo Lula. Uma, positiva, consistiu em aproveitar os instrumentos disponíveis e o ótimo ambiente externo de 2003 a 2007 para colocar a dívida pública, a inflação e os juros em trajetória declinante. A outra, negativa, consistiu em pisar no acelerador do gasto corrente, dirigindo para esse tipo de despesa 85% do ganho fiscal gerado pelo crescimento da arrecadação e pela diminuição da despesa com pagamento de juros. Além disso, Lula contratou despesas adicionais com pessoal cujo impacto pleno ainda virá.

Até aqui a continuidade dessa política macroeconômica rendeu bons frutos ao País: consolidação da estabilidade econômica com crescimento razoável e maior capacidade de atender às demandas sociais de uma sociedade com muita pobreza e enorme desigualdade. Os pobres, 30% da população no início dos anos 90, passaram a representar menos de 20% nos anos recentes.

Ninguém sensato deseja mudanças nos regimes monetário e cambial. Mas é preciso reconhecer que na área fiscal estamos com os pés trocados e corremos o risco de tropeçar mais à frente.

Os gastos correntes do governo federal têm crescido sistematicamente acima do PIB. Passaram de 14% em 1991 para 22% do PIB em 2009. No mesmo período, a carga tributária deu um salto de aproximadamente 25% para 36% do PIB, um aumento de 11 pontos de porcentagem em menos de 20 anos, fenômeno quase sem paralelo no mundo. Hoje o Brasil tem um nível de carga tributária anômalo para países de renda média, como ainda somos. Cresceu a fatia da União no bolo da arrecadação e aumentou o peso dos tributos em cascata, ruins para a economia e injustos socialmente. Já os investimentos do governo federal não superaram os 2% do PIB no mesmo período. Estados e municípios aumentaram seus investimentos nesses anos, mas não compensaram a queda drástica do investimento público federal em relação ao observado em períodos anteriores.

A atrofia do investimento e a expansão do gasto corrente do setor público se refletem no conjunto da economia. Nota recente da MB Associados mostra que o investimento agregado respondeu por apenas 13% do crescimento na presente década (2000-2010). Já o consumo do governo foi responsável por 20% do crescimento observado, cabendo 70% ao consumo das famílias, estimulado pelo aumento das transferências governamentais (benefícios previdenciários e assistenciais, grandes itens do gasto corrente) e pelo empurrão oficial ao crédito ao consumidor (crédito consignado, "proatividade" dos bancos públicos) no governo Lula. Não é preciso ser economista para saber que essas tendências não são sustentáveis: estamos consumindo demais, poupando e investindo de menos. Cedo ou tarde, isso termina em mais inflação e/ou em crise das contas externas.

Não será fácil mudar a trajetória dessas variáveis. O padrão a que me referi de início tem implícito um acordo social e político. Será necessário fazer escolhas e contrariar interesses. Embora as mudanças possam ser feitas gradualmente, elas têm de começar desde o início do próximo governo. A principal delas consiste em limitar o crescimento do gasto corrente.

Ao contrário do que fez o governo Lula, trata-se de pisar no breque, e não no acelerador, fazendo o gasto corrente crescer abaixo, e não acima do PIB e, nele, privilegiando o que há de mais importante: educação e saúde. Só assim será possível aumentar o investimento público e/ou reduzir a carga tributária, sem pôr em risco a "responsabilidade fiscal". Uma saída politicamente atraente é dizer: "Bastam cortes na máquina do governo." Atraente, mas insuficiente: os benefícios previdenciários respondem por quase metade do aumento do gasto corrente do governo federal desde 1991. Tal constatação nos força a repensar a política de aumentos reais do salário mínimo, que remonta a 1995, e recoloca sobre a mesa a reforma da Previdência, à luz do aumento da proporção de idosos nos anos vindouros. O Brasil já gasta com a Previdência mais que o dobro do que gasta com educação, um absurdo.

O ambiente político não é favorável a reformas e ajustes no nível e na composição do gasto público. Desde a aprovação da Lei de Responsabilidade Fiscal, lá se vão dez anos, não houve uma só medida aprovada no Congresso, com exceção parcial da reforma da Previdência do setor público, em 2003, que visasse a limitar o crescimento do gasto público corrente. A tentativa do ex-ministro Palocci de limitá-lo legalmente foi bombardeada ainda no Executivo, sob o fogo cerrado da ministra Dilma, então chefe da Casa Civil.

Nada trivial é a missão política que o próximo presidente da República, homem ou mulher, tem pela frente.


Diretor Executivo do IFHC, é membro do GACINT da USP

PSDB mineiro volta a cogitar união entre Serra e Aécio

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Aposta do partido na formação de chapa puro-sangue é retomada após retorno de ex-governador ao cenário político

Julia Duailibi e Malu Delgado

A volta de Aécio Neves ao cenário político, após férias de quase 30 dias no exterior, reacende no PSDB a perspectiva de formar uma chapa puro-sangue em torno da candidatura presidencial de José Serra. Embora os tucanos operem a aliança com o PP, de Francisco Dornelles (RJ), a ação em prol da união com o mineiro voltou a dominar a agenda.

Serra e Aécio mergulharão em uma agenda comum no final deste mês e início de junho em Minas, segundo maior colégio eleitoral brasileiro. Antes de deixar o País de férias, Aécio conduziu pessoalmente pacto com PSDB, DEM e PPS. Os três partidos comprometeram-se a não mencionar o nome dele para o cargo de vice-presidente até o dia 22, data de seu retorno.

Aécio chegou a pedir a interlocutores que segurassem agendas de Serra no Estado enquanto estivesse fora. Está prevista a ida dos dois a encontros sobre agronegócio no dia 31, em Uberaba. Organizado pela Confederação Nacional da Agricultura e pela Associação Brasileira dos Criadores de Zebu, o evento terá como objetivo colar os tucanos na agenda dos produtores rurais.

Na semana seguinte, os dois cumprirão maratona em Montes Claros, quando discutirão políticas para o semiárido mineiro, uma das regiões mais carentes do País. A expectativa no PSDB é de que, nestes encontros, voltem a falar sobre a chapa.

Para os tucanos mineiros, a discussão sobre a vice passa pelo poder de "sedução" de Serra, ou seja, uma sinalização efetiva de que, se eleito, usará o seu capital político para promover reforma que acabe com a reeleição e estabeleça o mandato de cinco anos.

Serra já disse publicamente ser contra a reeleição. Segundo interlocutores de Aécio, o ex-governador pode se balançar com a tese se Serra estiver bem nas pesquisas de intenção de voto e se houver o compromisso do paulista de fazê-lo seu sucessor.

"Serra tem que convencer Aécio, insistir na questão dos cinco anos e dar garantias. Um convite bem conduzido pode ter êxito", disse um aliado do mineiro.

Aécio tem dito reiteradas vezes que pretende disputar o Senado. A declaração leva em consideração duas variáveis: a primeira, de que tem luz política própria e que uma vaga no Palácio do Jaburu seria pior que uma atuação no Senado. A outra de que, caso Dilma Rousseff vença a eleição, ele, no Senado, se tornaria a grande referência da oposição e o nome natural em 2014.

Segunda via. Enquanto a decisão sobre Aécio na vice é tocada discretamente, o PSDB joga paralelamente numa chapa com Dornelles. Além do minuto e meio na TV que a aliança com o PP adicionaria, o PSDB avalia que a entrada do senador na campanha deixará Aécio comprometido com Serra - Dornelles é tio dele. Os tucanos mineiros, no entanto, ainda não veem com entusiasmo a indicação do senador, o que enfatizaria a tese de que Aécio não descarta a puro-sangue.

O temor dos tucanos e aliados é de que a discussão sobre a vice explicite rixas e traga problemas a Serra. "O vice tem que ser alguém que possa ajudar a vitória. Os partidos não devem entrar em atrito sobre isso. Se depender da nossa torcida e desejo, o vice será Aécio", disse o deputado ACM Neto (DEM-BA).

Caso a puro-sangue e a aliança com o PP não vinguem, os tucanos citam os nomes do presidente da sigla, Sérgio Guerra (PE), da senadora Marisa Serrano (MS) e do ex-prefeito Beto Richa (PR). No DEM, os cotados são os senadores Katia Abreu (TO) e Demóstenes Torres (GO), e os deputados José Carlos Aleluia (BA) e Ronaldo Caiado (GO).

"Esse assunto está bem encaminhado, sem precipitação. Aécio não disse de forma sumária que não aceita. Não estamos mais tão ansiosos", disse o presidente do PPS, Roberto Freire.

Serra visita o Ceará de olho nos votos de Ciro

DEU EM O GLOBO

Palanque do tucano no estado será o de Tasso Jereissati, que disputará reeleição no Senado e deve apoiar Cid

Isabela Martin

FORTALEZA. O pré-candidato do PSDB à Presidência, José Serra, desembarca amanhã no Ceará de olho no patrimônio eleitoral do deputado federal Ciro Gomes (PSB-CE), que liderava as intenções de votos no estado antes de ser alijado da disputa presidencial. Essa é a primeira visita de Serra como pré-candidato ao único estado do Nordeste onde o PSDB não deverá ter palanque de governador.

Os tucanos esperam atrair os votos dos simpatizantes de Ciro contando com a mágoa do deputado pela forma como foi rifado da disputa pelo PT e pelo próprio partido, o PSB, que deve formalizar apoio à petista Dilma Rousseff, adversária de Serra.

Antagônicos na disputa presidencial, no Ceará PSB e PSDB podem se aliar informalmente pela reeleição do governador Cid Gomes (PSB), irmão de Ciro e que pedirá votos para Dilma. Mas o palanque de Serra será o de Tasso Jereissati (PSDB-CE), amigo de Ciro e que tentará a reeleição.

Serra visitará o Porto do Pecém, no município de São Gonçalo do Amarante, região metropolitana de Fortaleza. O pontapé inicial do porto que está sendo ampliado com a ajuda do governo federal foi dado quando Serra era ministro do Planejamento (1996-1996) na gestão de FHC. Ele remanejou verbas, possibilitando a abertura da licitação, em 1996. Na assinatura da ordem de serviço e na inauguração da obra, em 2001, Serra compareceu representando o presidente.
Nessa mesma linha, ele visitará, em Barbalha, município localizado na região do Cariri, um hospital contemplado com recursos federais quando ele era ministro da Saúde (1998-2002).

No Cariri e em Fortaleza, Serra terá encontro com líderes do PSDB e partidos aliados, numa espécie de movimento pró-Serra.

Vox Populi aponta Dilma à frente de Serra

DEU EM O GLOBO

Diferença de três pontos percentuais está dentro da margem de erro

SÃO PAULO. Pesquisa do Instituto Vox Populi divulgada ontem mostra a pré-candidata do PT à Presidência, Dilma Rousseff, pela primeira vez à frente do tucano José Serra. Dilma obteve 38% das intenções de voto, contra 35% de Serra. A margem de erro é de 2,2 pontos percentuais para mais ou para menos, o que, segundo o Vox Populi, indica empate técnico entre os candidatos.

Na terceira posição ficou a pré-candidata do PV Marina Silva, com 8% das intenções de voto. Os votos brancos e nulos somaram 8% e os indecisos, 11%.

Em relação à primeira rodada de pesquisas do Vox Populi, realizada em janeiro, Dilma avançou nove pontos, enquanto Serra recuou três: o tucano tinha então 38% contra 29% da petista. Todos esses números referem-se a um cenário sem o deputado Ciro Gomes (PSB-CE), que até abril ainda se apresentava como pré-candidato.

O Vox Populi apontou que Dilma passou Serra também numa eventual disputa de segundo turno: ela recebeu 40% das intenções de voto, contra 38% do tucano. Encomendada pela Rede Bandeirantes, a pesquisa foi realizada entre os dias 8 e 13 deste mês, período em que 2.000 pessoas foram entrevistadas.

A crise do euro e o Brasil:: José Roberto Mendonça de Barros

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Após duas semanas de muita emoção e volatilidade, estamos num bom momento para tentar responder como o Brasil será afetado pela crise do euro.

Acredito que a resposta envolva três passos: o futuro da situação na Europa; os impactos na economia americana e na Ásia; e, finalmente os impactos no Brasil, sempre lembrando que não temos nenhuma influência nos eventos externos, apenas respondemos a eles.

Europa: já é certo que a crise é grave; que o futuro do euro e do projeto da Europa está em jogo (não é crível que nenhum acabe, apesar dos boatos da sexta-feira, mas ambos serão diferentes no futuro) e que a liderança política da Europa está aquém do necessário para enfrentar uma situação limite como a atual e só se moveu frente ao abismo, elevando o custo do ajuste. A chanceler alemã demorou demais para perceber o tamanho do problema e tentou empurrar qualquer decisão para depois das eleições regionais, que acabaria por perder; o presidente francês sumiu no processo; Berlusconi é uma piada de gosto duvidoso; a Bélgica vive uma grande crise de governabilidade.

O ponto positivo é que o pacote afasta o risco de default (nossa hipótese básica exposta nos artigos de 5 e 18 de fevereiro) e de contaminação do sistema bancário, com as compras e trocas de papéis de dívida soberana, embora ainda não saibamos dos detalhes operacionais. É crítico conhecer qual será o spread que resultará das operações de troca/compra de títulos.

Entretanto, no caso específico da Grécia, todos os agentes acabaram convencidos, com boa razão, que algum tipo de reestruturação no futuro será inevitável. Como sempre, a questão é quem pagará a conta, além do cidadão grego que vai enfrentar uma situação deflacionária.

Aparentemente, será a Comunidade Europeia (entenda-se Alemanha) e o Banco Central Europeu, que acabou por agir de forma muito parecida com o FED e o Banco da Inglaterra, no sentido de aceitar em seu balanço papéis com qualidade inferior ao que sempre costumou exigir.

Desvalorização. Esperamos consequências importantes desta situação: forte desvalorização do euro (imaginamos que o mesmo irá flutuar entre 1,10 e 1,20 em relação ao dólar); crescimento muito baixo por um bom tempo para a região como um todo (com a Alemanha crescendo relativamente bem, empurrada por sua máquina exportadora); alguma redução de preço de commodities (parte como compensação para a valorização do dólar, parte pelo comedimento da demanda numa região cujo PIB global é semelhante ao dos Estados Unidos); aceleração da consolidação de empresas em muitos setores, como de matérias-primas industriais; e, finalmente, uma parada na tentativa de redução do protecionismo agrícola, fonte certa de tensões políticas entre países. A Europa já enfrenta na questão do ajuste fiscal e na defesa do euro uma enorme tensão; o sistema provavelmente não irá permitir dificuldades adicionais.

Países da Comunidade Europeia fora do euro, cujas moedas podem flutuar e se ajustar à nova situação, como Polônia e Suécia, podem se sair melhor, embora enfrentando uma redução no comércio. Isso não vale para a Inglaterra, ainda imersa numa enorme crise e com uma liderança que não tem experiência de poder há um bom tempo. Entre ativos, são ganhadores os papéis de empresas exportadoras globais e os títulos soberanos de países como Alemanha e Suécia.

Como fica o futuro? A rigor, ninguém sabe se o necessário ajuste fiscal será mesmo feito e qual a sustentabilidade das dívidas dos países da região que não a Grécia. A questão é saber se os países em questão acabarão por aceitar a redução do padrão de vida a que se acostumaram recentemente. Não se sabe, pois, qual será o custo do ajuste. Não se sabe também como encaminhar a questão da forte divergência de produtividade e competitividade entre os diversos países, pois é pouco provável que apenas uma forte recessão possa produzir os resultados necessários, como esperam os alemães. Em consequência teremos ainda muita volatilidade pela frente.

O impacto nos Estados Unidos deverá ser modesto, dado que os bancos americanos estão fora deste risco, e que o consumo interno está crescendo (junto com o emprego, especialmente quando se observam os dados do Household Survey). Exportações não agrícolas sentirão mais, afetando várias empresas. Estima-se que mais de 25% dos lucros das companhias do S&P venham de exportações, com a Europa formando o maior componente.

Na Ásia também imaginamos que o impacto provavelmente será modesto. O comércio intrarregional e as exportações para novos mercados, como América Latina, seguirão muito fortes. O problema da China é o superaquecimento.

Finalmente, cabe perguntar quais serão os impactos no Brasil: o mais imediato é uma pressão para desvalorizar o real, enquanto a saída de capital de curto prazo continuar como resultado de uma aversão ao risco. Esse movimento poderá se reverter mais adiante, dependendo da evolução da situação externa e pela atração de capital visando aproveitar o diferencial de juros domésticos. O comércio vai sentir um pouco, com a redução do crescimento europeu, pois o País destina para a região 22% das nossas vendas externas. Sofreremos também com a queda das cotações de commodities, embora estejamos imaginando um movimento modesto, o que ajuda a dar no curto prazo algum suporte a um real mais fraco no segundo semestre do ano.

Não acredito que esses efeitos vindos de fora alterem de maneira relevante a trajetória de crescimento muito acelerado que estamos vivendo (alteramos recentemente nossa previsão de crescimento do PIB para 6,6%). Como consequência, a inflação deverá seguir em aceleração e o Banco Central deverá continuar a apertar a política monetária.

A situação europeia mostra de forma clara a temeridade da rota de crescimento acelerado dos gastos públicos, acentuada nos últimos dois anos. Preocupa mais que tudo a deterioração do nosso regime fiscal, como a farta utilização de truques para melhorar os números (definição de depósitos judiciais como receita, securitização de dividendos via BNDES para melhorar a posição do Tesouro, emissão de dívida para capitalizar estatais, etc.) e a flexibilização da Lei de Responsabilidade Fiscal.

Tudo isto faz com que eu veja com algum ceticismo o anunciado corte do Orçamento, especialmente quando lembro que o ministro do Planejamento anunciou no ano passado, com pompa e circunstância, que o governo iria suspender certos reajustes salariais do funcionalismo e rigorosamente nada aconteceu. Ao contrário, noticia-se que continua firme o processo de criação de novas vagas no serviço público

Para as empresas, sugiro incluir em seu planejamento de operações a ideia que teremos um cenário muito mais comedido em 2011, tendo em vista os efeitos da subida de juros de pelo menos 350 pontos neste ano e de um provável aperto fiscal de verdade no próximo governo.

Queria também mencionar que aumenta a importância das subsidiárias brasileiras de empresas europeias, dado o crescimento do mercado brasileiro. Por exemplo, em março (antes da piora da crise grega), um determinado produtor de caminhões vendeu no Brasil o dobro de veículos que sua matriz alemã.

As prateleiras vazias da aprovação de Chávez

DEU EM O GLOBO

Inflação em alta e escassez de alimentos podem prejudicar presidente da Venezuela nas eleições legislativas

Mariana Timóteo da Costa
Correspondente


CARACAS. Longas filas e prateleiras vazias nos supermercados, preços cada vez mais elevados e a inquietude de nem sempre encontrar o que se precisa para garantir uma boa refeição.

Esta é a atual realidade dos venezuelanos, não importando sua classe social. A inflação hoje a maior da América Latina, batendo 5,2% em abril e o desabastecimento (resultado, segundo especialistas, do mau gerenciamento do setor alimentício por parte do governo), viraram um problema político para o presidente Hugo Chávez a quatro meses das eleições legislativas de setembro.

Uma pesquisa feita em abril pelo instituto Datanálisis mostrou que, em pouco mais de um ano, a popularidade do presidente caiu de 61% para 44,4%. Além disso, quase 70% dos venezuelanos hoje avaliam mal a gestão de Chávez e quase todos citam a alta nos preços e, principalmente, a dificuldade de ter sua demanda por alimentos atendida entre os principais motivos do descontentamento.

Já votei em Chávez. Hoje, não voto mais. Como é possível eu demorar tanto para conseguir comprar farinha de milho para preparar as minhas arepas? reclama o aposentado Benjamin Cornejo Hugarte, de 75 anos, num supermercado no centro de Caracas.

Classes D e E são as mais atingidas A farinha de milho é a base deste que é o alimento mais popular da mesa venezuelana, uma espécie de panqueca recheada.

Além da falta de produtos, o aposentado critica os preços. Diz que há apenas um ano e com 500 bolívares (R$ 430), conseguia fazer um bom mercado para duas semanas.

Hoje, com este mesmo valor, ele dura apenas uma.

Aposentado da estatal de petróleo PDVSA, ele tem uma renda mensal de 4 mil bolívares (R$ 3.400) e acha um absurdo gastar metade de seu salário com comida.

Luis Vicente León, da Datanálisis, lembra que a Venezuela passava por uma situação semelhante em dezembro de 2007, quando Chávez sofreu sua primeira derrota eleitoral, no referendo pela reforma da Constituição.

O desabastecimento atual é menor do que o de 2007, quando 80% dos mercados não tinham leite, por exemplo. Hoje, o item mais em falta é o açúcar, ausente em 52% dos mercados.

Mas não importa, a irregularidade da oferta de comida é a mesma, assim como a insatisfação.

Aí, as pessoas começam a querer mudanças diz León, que lembra, no entanto, que 44% de popularidade é um índice alto, ainda mais para quem está no poder há tanto tempo. Chávez continua se beneficiando por seu carisma, por não ter adversários políticos com boas propostas de governo e pela mão de ferro com que controla a mídia e o aparato estatal.

Assim como o aposentado da PDVSA, o casal Gustavo e Cecília Sosa, de 28 anos, está entre os 18% de venezuelanos (numa população de 28 milhões) que integram a classe média. Ele, analista financeiro; ela, psicóloga.

Juntos, vivem com cerca de 5 mil bolívares (R$ 4.300) por mês, e confirmam que a inflação os vem deixando sem espaço para poupar.

Antes, sobrava mais dinheiro para, por exemplo, viajar.

Hoje, pensamos muito mais no que vamos comer. Sem falar no tempo que perdemos percorrendo mercados. Nunca conseguimos comprar tudo num lugar só, temos que ir a uma média de três. O fornecimento é muito irregular, as prateleiras constantemente estão vazias e, quando há mais produtos num determinado lugar, é batata: as filas são imensas reclama Gustavo.

Cecilia completa, dizendo que nem sempre consegue comprar o que ela quer: As frutas desapareceram.

Quando existem, a variedade é pouca e a qualidade, ruim.

Votar em Chávez? Nunca, a culpa disso tudo é de suas políticas malucas diz Gustavo.

O problema não atinge apenas a classe média, mas sobretudo quem integra as classes D (38% da população) e E (41%), obrigados a destinar uma parte maior de sua renda à comida. Já a classe alta, que abrange somente 3% dos venezuelanos, é a menos afetada pela crise de alimentos, porque, claro, tem muita margem de manobra, como explica o economista Nicolas Toledo, da Consultores XXI. Segundo ele, a crise aparece aliada a vários fatores: o aumento dos preços, claro, é um problema.

Mas o que mais descontenta a população é a irregularidade no abastecimento, resultado da falta de investimentos do governo na indústria alimentícia. Hoje, 70% dos produtos consumidos aqui são importados. Depois da desvalorização do bolívar em relação ao dólar, no início deste ano, a moeda local perdeu valor, obrigando governo e empresários a comprarem menos. Então, temos uma demanda que não está sendo atendida, num país que produz pouca comida explica o economista.

Há ainda, segundo Toledo, a insegurança internacional em vender para um país em que o governo ameaça ou expropria empresas nacionais e estrangeiras, que adota discursos combativos contra seus adversários políticos.

Depois de uma crise entre governo e produtores de carne, ocorrida na semana passada, o vice-presidente, Elías Jaua, deu declarações sobre o combate à especulação que, segundo analistas, apontariam uma intenção do governo de passar a controlar a quantidade de alimentos vendida nos mercados a exemplo de Cuba ou da antiga União Soviética.

Se o governo fizer isso, será seu suicídio político: 86% dos venezuelanos rejeitam que o país adote um modelo de consumo cubano.

Não acredito que Chávez adotará este tipo de medida. O que ele vai fazer é tentar controlar o problema, como fez depois que perdeu o referendo em 2007, até a crise ressurgir, no fim do ano passado. Se o preço do barril do petróleo continuar em US$ 80, ele pode conseguir.

Além disso, podemos esperar que ele continue fazendo o que faz: culpar a burguesia pela crise da comida diz León

Orgulho e cobiça:: Clóvis Rossi

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

MADRI - Na terça-feira, o rei da Espanha, dom Juan Carlos 1º, deixou o hospital universitário (e público) Clinic, de Barcelona, depois de extrair um nódulo (não canceroso) do pulmão.

Saiu dizendo que a Espanha deveria se orgulhar de seu sistema público de saúde.

No dia seguinte, o governo, no bojo de um pacotaço de ajuste fiscal, cortou 5% dos salários do funcionalismo, inclusive dos profissionais da saúde. Medida inédita nos 33 anos de democracia.

O que aconteceu de um dia para o outro? O rei morreu? Internou-se em uma clínica privada para curar-se de uma infecção hospitalar contraída no hospital público? Nada. O rei está bem.

O problema é que o rei reina, mas não governa. Até aí, um clássico das monarquias parlamentares. O problema é que o presidente do governo também não governa mais. Nem na Espanha nem em qualquer outro lugar da Europa, pelo menos.

Governam os mercados. A Espanha vinha sendo exemplo de bom comportamento fiscal: deficit minúsculos até 2004 e, daí até 2007, superavit. Vem a crise global, o governo se vê obrigado a estimular a economia, para evitar o colapso total, e inexoravelmente o deficit público dispara, como ocorreu em quase todo o mundo.

Vêm, então, os mercados e exigem sangue, como lobos que são, conforme os definiu o ministro sueco Anders Borg.

A Europa/FMI/Bancos Centrais dão carniça (pacote de US$ 1 trilhão). A Bolsa espanhola tem a maior alta em um dia de sua história. Dois dias depois, sai o pacote de ajuste fiscal, exigido pelos mercados, que impõem, no entanto, uma queda na Bolsa pior do que a do período agudo da crise em 2008.

Os lobos perceberam que vampirizar a economia pode impedir que o governo pague a dívida.

Tarde demais: a cobiça já venceu o orgulho.

Duas opressões e uma lápide:: Vinicius Torres Freire

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Terceira Via morre sem choro nem vela, nos dias em que as vergonhas do mercadismo sucedem o vexame estatista

A Terceira Via mal foi lembrada no falecimento do governo trabalhista de 13 anos no Reino Unido. Em meio a tantos colapsos, como o das finanças públicas europeias e o dos mercados financeiros eficientes e racionais, a ruína do trabalhismo e de seu verniz, a Terceira Via, parece desimportante.

Mas há algum interesse num epitáfio da dissolução da social democracia no mar de indiferença e pragmatismo que se tornou a política tradicional. Se é que restou outra.

A Terceira Via foi ao governo com a ascensão de Tony Blair, premiê britânico, em 1997. Pode-se dizer que vinha sendo teorizada desde o início dos 1990 pelo sociólogo Anthony Giddens. Era uma capitulação organizada da social democracia.

Nessa "Via", a redistribuição social de renda e riqueza deveria ser menos pautada pela ideia de solidariedade; deveria haver mais responsabilização individual (por exemplo, mais previdência privada). O Estado deveria se retirar ainda mais da economia. Enfim, a finança liberalizada, a competição dos "emergentes" e o custo crescente do Estado de bem-estar social europeu impunham, dizia-se, limites à universalização de direitos. Era preciso mais "produtividade" e "competitividade".

Mais cedo, houvera a rendição do Partido Democrata, sob Bill Clinton.

Mais tarde, a social democracia alemã foi pelo mesmo caminho. O socialista François Mitterrand, empossado em 1981 com pouco mais a propor do que estatização tola, recuara já em 1983. Claro, a França não seguiu a via britânica. Mas parou de produzir inovação social e intelectuais "humanistas".

As novidades políticas foram poucas desde então. O ambientalismo se expandiu, na versão egocêntrica-eurocêntrica ("vamos preservar nossos jardim e saúde") ou na primitivista (regressiva, anticapitalista ingênua), assim como as políticas identitárias (sexo, etnia, culturas, guetos etc.). Racismo e extremismo ressurgiram. O terrorismo justificou dentadas nas liberdades individuais.

Nunca houve tanta democracia no mundo? Verdade. Mas num momento em que eleitores e governos nacionais podem muito pouco.

A Europa "terceirizada", da Terceira Via, cresceu pouco como nunca desde a Segunda Guerra. Os EUA, desde Clinton, passaram a viver de bolhas e dívidas, montados na supremacia do dólar e na inventividade de sua finança. Mas a primeira década do século 21 foi a de menor crescimento desde a Segunda Guerra. Aumentou a desigualdade. Os salários reais ficaram estagnados.

A desmoralização do estatismo, de suas ineficiências e opressões, totalitária ou burocrática, foi sucedida pela laudação do mercadismo. Pela supremacia da finança, um oligopólio global capaz de produzir opressão, sob outra forma, ademais capturando o Estado para se sustentar. A Terceira Via foi um breve e medíocre rótulo para uma situação de fato, a transição para o esvaziamento da política. Ou seja, do pragmatismo eleitoreiro e economicista como forma quase única de política.

É irônico que esse fantasma da social democracia desapareça numa era em que ficaram mais que evidentes as falácias dos dois polos da política dos últimos cem anos, "Estado" e "mercado", dois meios de opressão. O que há adiante? Nada?

Uma Nova Lei Fiscal :: Yoshiaki Nakano

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

O Congresso deveria olhar para a tragédia da Grécia e as medidas de austeridade que europeus tiveram de tomar

O governo federal anunciou um corte adicional de R$ 10 bilhões nas suas despesas.Somado ao anunciado em março, totalizam-se R$ 31,8 bilhões. Isso representa redução equivalente a 1% do PIB em relação ao Orçamento aprovado pelo Congresso. A medida vai na direção do que defendi há um mês nesta Folha.

Espera-se que, com essa medida, o Banco Central possa atenuar a trajetória de elevação da taxa de juros e minimizar o seu impacto negativo sobre a recuperação dos investimentos produtivos. Se tudo correr bem, será até possível que o PIB cresça 7% sem grandes pressões inflacionárias, o que será um feito notável.

Neste momento, o Congresso Nacional, que está aprovando medidas absurdas, como o aumento para os aposentados de 7,7% e o fim do fator previdenciário, deveria olhar para a tragédia que está acontecendo na Grécia e as medidas de austeridade que Portugal, Espanha e até mesmo o Reino Unido foram obrigados a tomar. A população desses países passará por um doloroso ajuste, reduzindo o seu consumo. Se tudo der certo, os países deverão ter crescimento negativo ao menos pelos próximos três anos. Essa será a imagem do nosso futuro se o país tomar a direção que os congressistas querem dar.

Dessa forma, a decisão tomada pelos ministros da Fazenda e do Planejamento de implementar uma política fiscal anticíclica merece aplausos. Entretanto, as medidas fiscais têm maior eficácia se tiverem credibilidade, e, quanto maior o horizonte temporal, maior será o seu impacto positivo sobre o crescimento. Assim, o que temos é que fortalecer as instituições fiscais, senão um corte de 1% do PIB será interpretado como medida discricionária e momentânea e seus efeitos serão de curto prazo e neutralizados pelas expectativas de longo prazo.

Essas últimas expectativas se formaram ao longo dos últimos anos, em que os gastos do governo vêm crescendo o dobro do PIB e que a carga tributária subiu mais do que dez pontos percentuais do PIB, sufocando o setor privado. É preciso inverter essa trajetória e ao longo da próxima década reduzir, na mesma magnitude, a carga tributária.Isso será possível se as despesas de consumo do governo crescerem cerca de metade do PIB, o que já será uma expansão real considerável. Exemplo: se o PIB crescer 7% ao ano, poderemos reduzir em dez pontos percentuais do PIB as despesas do governo em dez anos e ampliar a taxa de investimento privado e público, na mesma magnitude, o que será suficiente para sustentar um crescimento de 7% anuais nas próximas décadas.

O Congresso Nacional deveria estar discutindo, quando comemoramos dez anos da Lei de Responsabilidade Fiscal, uma Nova Lei Fiscal, que estabelecesse limites de aumento no consumo do governo para alcançar equilíbrio estrutural e abrir um novo horizonte de crescimento. Mas essa decisão caberá à sociedade brasileira, que elegerá o próximo presidente. O meu candidato ideal apresentaria no primeiro dia de mandato um projeto de lei fiscal.

Temos que optar entre surtos de crescimento e crise -que, com as condições mais favoráveis desde 2004, permitiu-nos crescer, em média, cerca de 4% ao ano- e voltar a explorar todas as nossas potencialidades e avançar 7% ao ano ou mais.

Yoshiaki Nakano, 65, diretor da Escola de Economia de São Paulo, da FGV, foi secretário da Fazenda do Estado de São Paulo no governo Mario Covas (1995-2001).

Lula vai deixar dívida recorde para sucessor

DEU EM O GLOBO

Endividamento cresce e chegará a R$ 2,2 trilhões , 64, 4% do PIB

Com o aumento de gastos no governo Lula, a dívida total do setor público no país cresceu e chegará ao maior patamar dos últimos dez anos. Em dezembro deste ano, o endividamento baterá a cifra recorde de R& 2,2 trilhões – 64,4% do PIB -, aponta estudo do economista Felipe Salto, da Consultoria Tendências. Em 2000, a dívida era de R$ 622,2 bilhões , 52,7% do PIB. A herança do governo Lula para o seu sucessor foi turbinada por “empréstimos” que o Tesouro vem realizando com o BNDES desde o ano passado, por meio da emissão de títulos públicos. O crescimento da dívida é visto por analistas como fator de risco futuro, principalmente para a credibilidade do Brasil no mercado.

'Herança maldita' de 64% do PIB

Lula deixará para seu sucessor dívida bruta que é a maior dos últimos dez anos

Regina Alvarez BRASÍLIA

Importante indicador da saúde fiscal de qualquer país, a dívida bruta que é a dívida total do setor público pode chegar a 64,4% do PIB no fim de 2010, o maior patamar em dez anos. Essa herança do governo Lula para seu sucessor foi turbinada pelas operações batizadas de empréstimos que o Tesouro vem realizando com o BNDES desde o ano passado, por meio da emissão de títulos públicos. A projeção de que a dívida pode alcançar o montante recorde de R$ 2,2 trilhões em dezembro (ou 64,4% do PIB) é do economista Felipe Salto, da Consultoria Tendências, e já considera a emissão de R$ 80 bilhões em títulos do Tesouro para reforçar o caixa do BNDES.

Na semana passada, o Tesouro concluiu a emissão desses papéis, que, somados, engordam a dívida bruta em R$ 180 bilhões. A primeira parcela de R$ 100 bilhões foi repassados ao BNDES em 2009, contribuindo de forma substantiva para o crescimento da dívida em cinco pontos percentuais do PIB, em relação ao ano anterior. Passou de 57,9% para 62,8% do PIB.

Endividamento é visto com preocupação

O crescimento robusto da dívida bruta decorrente do aumento da dívida interna, já que a externa corresponde a apenas 3,4% do PIB é visto com preocupação por muitos analistas. É um fator de risco futuro, em especial depois que a crise na zona do euro colocou em evidência a saúde fiscal dos governos. O que está em jogo, no caso do Brasil, é a credibilidade conquistada a duras penas nos últimos anos junto ao mercado internacional.

A crise global de 2009 abriu espaço para uma mudança radical de postura do governo do PT em relação às contas públicas. O acúmulo de superavits, que serviam para reduzir a dívida em relação ao PIB, foi substituído por uma combinação de aumento dos gastos com expansão do crédito por meio do crescimento da dívida pública.

O próximo governo terá a tarefa adicional de sinalizar que a dívida bruta vai cair em relação ao PIB. Não é um cenário caótico, tem ainda uma gordura, mas a gordura acaba destaca o economista Felipe Salto.

A preocupação dos analistas cresceu depois que foram revelados alguns truques que o governo utiliza para reforçar o caixa do Tesouro e abrir espaço para acomodar mais despesas.

O BNDES tem servido de instrumento para essas manobras. Revitalizado pelos empréstimos do Tesouro, o banco passou a repassar à União valores muito maiores em dividendos.

No ano passado, foram R$ 10,9 bilhões, quase o dobro de 2008 (R$ 6 bilhões). Outros R$ 3,5 bilhões foram comprados da Eletrobrás e também transferidos para o caixa da União, ajudando a fechar as contas.

Este ano, o banco já repassou R$ 3,8 bilhões em dividendos ao Tesouro até abril, contribuindo para fechar o caixa no primeiro quadrimestre.

A dívida bruta é um indicador que precisa cada vez mais ser observado pelo uso desses mecanismos de expansão de crédito.

O caminho que está sendo adotado é errado afirma Salto.

Mas o o governo não demonstra preocupação com o aumento da dívida bruta. A equipe econômica prefere destacar em suas avaliações a trajetória da dívida líquida, que não está sendo influenciada por esses empréstimos. Por esse conceito, o mesmo valor dos títulos emitidos entra nas contas como créditos do governo federal, neutralizando essas operações.

O crescimento dos créditos junto a instituições financeiras oficiais nos últimos anos mostra como o governo está expandindo essas operações com emissão de títulos que contribuem para aumentar a dívida bruta. Em dezembro de 2002, esses créditos somavam R$ 5,1 bilhões (0,4% do PIB) e em março de 2010 já chegavam a R$ 149,9 bilhões (4,7% do PIB).

O argumento do governo para esse aporte tão grande de recursos ao BNDES é que o banco tem um papel estratégico no crescimento do país. Mas, seguindo essa política, o Tesouro está bancando os empréstimos subsidiados para o setor privado e para as estatais. O Tesouro empresta os recursos para o BNDES a taxas de 5% e paga 9,5% de juros pelos títulos emitidos, equivalente à taxa Selic.

A política expansionista do governo aumento dos gastos e do crédito contribuiu para a decisão do Banco Central de elevar os juros, mecanismo que utiliza para conter a inflação.

É uma escolha política. O aumento dos gastos leva à elevação de juros para conter as pressões inflacionárias e exige uma carga tributária elevada para sustentar um Estado pesado conclui o economista Felipe Salto.

O QUE PENSA A MÍDIA

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Beethoven - Für Elise (fur Elise, piano solo)

Soneto do amigo :: Vinicius de Moraes



Enfim, depois de tanto erro passado
Tantas retaliações, tanto perigo
Eis que ressurge noutro o velho amigo
Nunca perdido, sempre reencontrado.

É bom sentá-lo novamente ao lado
Com olhos que contêm o olhar antigo
Sempre comigo um pouco atribulado
E como sempre singular comigo.

Um bicho igual a mim, simples e humano
Sabendo se mover e comover
E a disfarçar com o meu próprio engano.

O amigo: um ser que a vida não explica
Que só se vai ao ver outro nascer
E o espelho de minha alma multiplica...