sábado, 7 de agosto de 2010

Em crise, Venezuela compra mais alimentos brasileiros

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

O governo da Venezuela aumentou a compra de alimentos brasileiros para conter o desabastecimento no país, a pouco mais de um mês da eleição. Só a venda de açúcar subiu 700% no primeiro semestre ante igual período de 2009. Nos mercados subsidiados pelo governo, costuma faltar todo tipo de produto básico.

Perto de eleição, Chávez recorre ao Brasil para conter falta de comida

Dependência. Único país da América Latina sob o risco de enfrentar retração econômica este ano, Venezuela aumenta importações de produtos básicos do Brasil para frear desabastecimento; projeções indicam que a inflação pode chegar à casa dos 40% em 2010

Renato Andrade e Patrícia Campos Mello

O presidente da Venezuela, Hugo Chávez, vem aumentando a compra de alimentos do Brasil para evitar uma escalada do desabastecimento no país. Faltando 50 dias para as eleições parlamentares de 26 de setembro, a pauta de exportações brasileiras para o vizinho evidencia, em números, a estratégia adotada por Caracas e reforça os sinais de deterioração da economia venezuelana.

Os "Mercales", mercados comunitários instalados por Chávez, estão tomados por produtos brasileiros. O frango, por exemplo, é quase todo importado do Brasil. Todos os produtos são subsidiados e há enormes filas nos dias em que chega carne e frango. "As duas coisas acabam assim que chegam", disse a atendente de um Mercal da favela de Antímano.

De janeiro a junho, a venda de produtos, como carnes congeladas, animais vivos, açúcar e café, lideraram a lista de exportações brasileiras para a Venezuela. De acordo com dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, esses produtos responderam por 37% de tudo o que o Brasil exportou para os venezuelanos no primeiro semestre.

A venda de gado vivo subiu 84% na comparação entre o que foi vendido nos primeiros seis meses de 2010 e o volume comercializado na primeira metade do ano passado. No caso do açúcar, o aumento é ainda mais impressionante. O volume exportado cresceu quase 700% no período.

Único país da América Latina que pode amargar uma retração econômica este ano, a Venezuela tem enfrentado uma diminuição nos investimentos e na produção de petróleo - sua principal fonte de receita -, além de uma disparada dos preços. Projeções indicam que a inflação pode chegar este ano à casa dos 40%, depois de registrar 27% em 2009.

Tradicional importadora de alimentos, a situação venezuelana se agravou ao longo dos últimos anos em razão das constantes intervenções do governo chavista. Um levantamento feito pelo Estado sobre o comportamento das exportações brasileiras para a Venezuela, de 2007 até o primeiro semestre de 2010, revela um movimento claro de aumento da venda de alimentos em detrimento de produtos manufaturados, como automóveis e aparelhos de telefonia celular.

Disparada. Os dados sobre as exportações de café e milho em grão são dois bons exemplos dessa trajetória. Em 2007 e 2008, o Brasil não vendeu um grão sequer de café para os venezuelanos. No ano passado, o produto já apareceu em 15.º lugar na pauta de exportações, respondendo por 1,01% do total vendido para Caracas. Na primeira metade deste ano, ele ocupava a quinta posição, o equivalente a 2,82% da pauta.

No caso do milho em grão, o comportamento é ainda mais simbólico. Não há registro de venda do produto entre 2007 e 2009. Este ano, entretanto, o milho em grão já ocupa a nona posição. Em termos de volume, isto representa 117,8 mil toneladas embarcadas para a Venezuela.

Ao mesmo tempo, a venda de automóveis e celulares desapareceu. No topo da lista em 2007, com vendas respondendo por 19,4% do total exportado para a Venezuela naquele ano, estes dois produtos simplesmente sumiram da pauta na primeira metade de 2010.

Nos mercados subsidiados montados pelo governo venezuelano, costuma faltar todos os tipos de produtos básicos: manteiga, margarina, óleo, papel higiênico e maionese. Uma das indústrias locais fabricantes de óleo, a Empresas Diana, foi nacionalizada por Chávez e, agora, suas fábricas têm faixas com os dizeres "Feito no socialismo", na entrada.

Eleições. A escassez e a alta dos preços de alimentos são perigosas para Chávez por causa da proximidade das eleições. Quem mais sofre com o problema é a população mais pobre, base eleitoral do líder venezuelano. Segundo a Câmara de Comércio e Indústria Venezuelano-Brasileira, os exportadores brasileiros de produtos básicos têm recebido até pagamento adiantado, enquanto outros setores enfrentam atrasos. Tudo para que não falte frango em ano eleitoral.

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