domingo, 4 de julho de 2010

República sem número romano :: Wilson Figueiredo

DEU NO JORNAL DO BRASIL

Transcorridos 25 anos de continuidade política, o brasileiro que se limita a pagar impostos invisíveis e a votar por hábito, sem se convencer de que há alternativa ao seu dispor, ainda espera por uma explicação menos enfeitada de desculpas esfarrapadas sobre o malogro dos três maiores partidos políticos brasileiros. PMDB, PSDB e PT tiveram tudo para dar certo e erraram a mão ao desenhar o novo perfil democrático na Constituinte de 1986/88. Da efervescência geral resultou um quadro inacabado, de que nem se fala mais. Faltou um empurrão por falta de coragem para completar as reformas implícitas e não explicitadas na complementação legal.

O PMDB e o PSDB, nascidos ambos da tradicional costela republicana, foram os herdeiros presuntivos da transição da velha à nova República, enquanto o PT ficou apenas esboçado com matéria-prima diferente, mas sem o cuidado de se benzer contra as maldições universais que recaem sobre a esquerda. Criou-se o petismo de laboratório, que sobreviveu graças ao sumo sacerdote Lula, em cujas mãos ficaram sua presidência e a do Brasil na última rodada, sem que se saiba com que resultado final uma e outra podem contar.

O PT continua a acreditar que veio ao mundo para reinventar a roda, enquanto o Brasil ainda terá de esperar as consequências atribuídas ao baixo teor ético, que a esquerda não subscreve mas que estão soltas por aí. O fato é que se edificaria mais do que se vê, e a reconstrução constitucional recaiu nos padrões tradicionais, sem maior criatividade. A vida pública é, abertamente, uma licença para aproveitar e até para enriquecer a quem se arrisca por petisco. O desrespeito pela pluralidade política não se restringe, afinal de contas, a erros de concordância gramatical, e mistura ideias para fazer coquetel. A Nova República envelheceu rapidamente pela sobrevivência de caracteres genéticos e pela acintosa multiplicação de práticas que desacreditaram a atmosfera de faz de conta, que não passou disso. E tratou de dar férias ao adjetivo que não ficou bem a uma velha centenária.

O Brasil perdeu a conta das repúblicas tentadas e desistiu de se valer de algarismos romanos para distinguir uma das outras Graças ao que de pior tiveram em comum as anteriores, até se apresentar a atual, depois de muita confusão, a República é única e exclusiva. Lula fez a sua parte, e o julgamento virá a seu tempo. Enquanto espera, o petismo se enrasca nas premissas da social-democracia, que, por sua vez, se vestiu de neoliberal para comparecer ao festival de desenvolvimento nacional. A saída, onde está mesmo?

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