domingo, 4 de abril de 2010

Continuidade e mudança:: Merval Pereira

DEU EM O GLOBO

O grande mistério dessa eleição presidencial que se avizinha é saber qual a estratégia eficiente para derrotar um governo tão popular quanto o do presidente Lula. Enquanto o presidente joga todo o seu prestígio na continuidade, que estaria assegurada com a eleição de Dilma, a oposição tem que passar a sensação ao eleitor de que tem melhores condições de garantir essa continuidade, o que é insólito em política, pois o papel da oposição seria o de promover a mudança.

O cientista político Alberto Carlos de Almeida, especialista em análise da opinião pública, autor do best seller “A cabeça do brasileiro”, acha que uma das maneiras de desconstruir a imagem da candidata oficial Dilma Rousseff é incutir na cabeça do eleitor que Lula não sabe escolher seus assessores.

Seria uma maneira de voltar a tocar no escândalo do mensalão, para atingir também a candidata oficial no que ela tem de mais vulnerável: a falta de experiência política.

O economista político Alexandre Marinis, da consultoria Mosaico, tem uma análise que pega os resultados das quatro últimas eleições presidenciais — que mostra uma forte correlação entre o índice de popularidade do presidente e o de votos válidos conseguidos por seu candidato — e vai muito mais fundo, até as eleições municipais e estaduais.

Pegando duas vertentes de análises diferentes, ele cruza o resultado concreto de eleição, seja a nível nacional, estadual ou municipal, com as pesquisas de opinião, e avalia como elas caminham ao longo das campanhas. “Dá para constatar que as oscilações dos candidatos acompanham muito de perto a taxa de aprovação dos governantes”, garante.

A principal consequência disso, na opinião de Marinis, é que seria insuficiente a estratégia da oposição de não confrontação com o governo.

“Se você quiser desconstruir a Dilma, mas o governo permanecer extremamente forte, você pode afetar a taxa de transferência de popularidade mas ainda assim garantir a vitória da candidata oficial”, analisa Marinis.

Ele exemplifica: se a popularidade de Lula se mantiver tão alta, ainda que você reduza a efetividade dessa transferência, digamos para 60%, ainda assim sua candidata terá quase metade dos votos. “Isso implica que não basta trabalhar na desconstrução da imagem da Dilma, tem que também encarar as deficiências do governo Lula. Não adianta você fugir desse debate”.

Alexandre Marinis acha que “na cabeça do eleitor típico do Lula, que também é eleitor típico da Dilma, se eu desejo continuidade e não quero mudar nada, por que vou arriscar e votar num candidato de oposição?”.

Para vencer a eleição, o candidato oposicionista precisa encarar as deficiências do governo Lula. “Você pode desconstruir a imagem da Dilma, mas tem que reduzir também a popularidade do Lula. O fato concreto é que a popularidade de Lula é o principal ativo que a candidatura da Dilma tem”.

Até mesmo Ciro Gomes, do PSB, que luta para manter sua candidatura à Presidência, está cometendo o que seria um erro, na opinião de Marinis: critica Dilma, dizendo-se mais preparado que ela, critica a aliança entre o PT e o PMDB, mas poupa Lula e seu governo.

O cientista político Alberto Carlos de Almeida, especialista em análise do eleitor brasileiro e da opinião pública, acha que a luta de José Serra vai ter que ser para manter o eleitorado que, apesar de considerar o g o v e r n o L u l a ó t i m o o u bom, vota nele.

A mais recente pesquisa de opinião do Datafolha informou que 33% desses eleitores de Lula estão com Serra, o mesmo contingente que apoia Dilma.

Para o candidato da oposição atingir os pobres, ele terá que falar sobre redução de imposto sobre consumo, diz Alberto Carlos de Almeida.

Os cidadãos da classe baixa já teriam entendido que pagam imposto indireto sobre os bens de consumo, como alimentação.

E como a sociedade é muito desigual, a população acha que só pobre paga imposto. A percepção é de que há uma exploração na cobrança de impostos, que prejudica a vida dos mais pobres. E como a nova classe C quer cada vez consumir mais, a alta carga tributária é um flanco do governo que pode ser atacado.

Nesse sentido, o Democratas está mais afinado com o sentimento popular, pois comanda uma campanha em São Paulo, com Afif Domingues, para denunciar quanto de imposto está embutido nos preços, e foi devido a uma campanha do deputado Paulo Bornhausen que a oposição conseguiu derrubar a CPMF.

Nas entrevistas qualitativas, Alberto Carlos de Almeida diz que o que aparece quando se discute o fim da CPMF é que ela é uma prova de que o imposto não melhorava a vida das pessoas: “Tinha a CPMF e a saúde era muito ruim. Acabou o imposto e a saúde continuou igual”, resumem os entrevistados.

Mas Alberto Carlos de Almeida considera que as iniciativas oposicionistas nesse campo ainda são tímidas, faltaria-lhes a ousadia que sobra em Lula: “Uma atuação mais decidida nesse campo embaralharia o jogo eleitoral”, analisa.

Ele considera as campanhas realizadas até agora pouco populares. “Quando o outro lado está muito forte, como é o caso do governo atual, você tem que inovar na sua mensagem”, adverte o cientista político.
Ele adverte, também, que o combate à corrupção não pode ser levado para um lado moralista, pois o cidadão brasileiro, ao contrário do americano, não é moralista.

“Ele já entendeu que a corrupção ajuda a piorar a vida das pessoas, e acha que, se houver menos impostos, haverá menos corrupção.”

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