segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Luiz Carlos Bresser-Pereira:: Conferência na Índia

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Dois temas dominaram os debates: a regulação e como emergentes devem financiar o seu desenvolvimento

Na última semana participei em Chennai, na Índia, de uma conferência internacional organizada por IDEAs, um "network" de economistas do desenvolvimento com sede em Déli (http://www.networkideas.org/), e patrocinada pela Ford Foundation. Dois temas dominaram os debates: como todos os países e principalmente os Estados Unidos e o Reino Unido devem regular melhor o sistema financeiro internacional e como os países em desenvolvimento devem financiar seu desenvolvimento de forma a evitar crises financeiras.

Em relação ao primeiro tema, a visão dominante foi a de que a opinião pública nos países desenvolvidos demanda maior regulação dos governos, de forma que haverá mudança substantiva no processo de regular os bancos e demais agentes financeiros. Não é realista esperar a separação entre a atividade dos bancos comerciais e a dos bancos de investimento, porque se retiraria uma fonte importante de lucros dos bancos comerciais, mas é razoável esperar uma maior limitação de todos os bancos em realizar operações especulativas, e a proibição de uma série de "inovações financeiras" que criam liquidez excessiva e riqueza fictícia ao embutir riscos elevados para as empresas e bancos nelas envolvidos. Por outro lado, ficou clara a importância de cada país fortalecer seu sistema nacional de financiamento.

Quanto ao problema de como os países em desenvolvimento devem evitar crises financeiras, foi quase unânime a tese de que esses países devem evitar deficits em conta-corrente ou a política de "crescimento com poupança externa". Esse tipo de política aumenta muito pouco a capacidade de investimento do país; em vez disso, aumentam o consumo e a dívida externa, de forma que o país fica sujeito a crises financeiras crônicas.Nessa linha de pensamento, os participantes da conferência ficaram interessados em minha exposição sobre a doença holandesa e sobre o "tripé do novo desenvolvimentismo" da estratégia nacional de desenvolvimento baseada em: (1) crescer com poupança interna, não incorrendo em deficits em conta-corrente; (2) provar responsabilidade fiscal, não incorrendo em deficits públicos crônicos; e (3) dar ao Estado um papel estratégico no desenvolvimento econômico e no desenvolvimento social.

Há uma diferença importante na estratégia dos países do leste da Ásia (China, Coreia do Sul e Taiwan) e dos países do sul e do sudeste da Ásia (Índia, Indonésia, Tailândia e Malásia), porque os primeiros se abriram menos aos investimentos externos do que os segundos, mas todos compartilham uma forte resistência ao endividamento externo. Não usam os investimentos externos para financiar deficit em conta-corrente, mas para aumentar reservas ou para financiar seus próprios investimentos no exterior.

Fiquei surpreso quanto à atitude dos economistas indianos em relação ao desenvolvimento econômico de seu próprio país. Depois que reformas neoliberais foram impostas à Índia no início dos anos 1990, o país experimentou uma forte redução em sua taxa de crescimento.

Entretanto, no final da década, recuperou-se, e desde então vem crescendo a taxas elevadas. Os economistas indianos, porém, não parecem seguros quanto à sustentabilidade do atual crescimento, talvez porque o atual primeiro-ministro foi o responsável pelas reformas do início dos anos 1990. Não tenho, porém, notícia de que Manmohan Singh tenha voltado a elas nesta segunda gestão.

Luiz Carlos Bresser-Pereira, 75, professor emérito da Fundação Getulio Vargas, ex-ministro da Fazenda (governo Sarney), da Administração e Reforma do Estado (primeiro governo FHC) e da Ciência e Tecnologia (segundo governo FHC), é autor de "Globalização e Competição".

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