quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

Rosângela Bittar :: O Palácio observa seus adversários

DEU NO VALOR ECONÔMICO

O panorama eleitoral que se descortina das janelas do Centro Cultural Banco do Brasil, em Brasília, sede provisória da Presidência da República, é, como se poderia esperar, róseo para a campanha governista à sucessão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e bastante nublado para os adversários. No entanto, não está no ar, ali, o clima do já ganhou. Ainda há alguma tensão com o desenvolvimento da candidatura Dilma Rousseff (PT) à sucessão do presidente Lula e um certo respeito, embora o discurso seja o contrário, à candidatura José Serra (PSDB).

O olhar da campanha de Dilma sobre Aécio Neves e Ciro Gomes está impregnado de condescendência e simpatia, numa aposta evidente de que conta-se com um jogo que os inclua mais à frente, agora já cada um por si, uma vez abandonada a perspectiva fantasiosa, alimentada durante longo tempo, da chapa conjunta PSDB/PSB. Apesar da desistência de concorrer à Presidência, Aécio continua no campo oposto e é considerado uma ameaça caso aceite compor chapa pura do PSDB. Ciro está, circunstancialmente, também entre os adversários da candidatura única do governo, contra a vontade do presidente Lula.

Como Serra, a campanha da ministra Dilma não quer precipitar decisões e opções que pode fazer em abril ou em junho, quando estiverem mais claros os cenários da disputa, e por enquanto só observa os movimentos enquanto articula reservadamente.

No momento, o candidato a vice de Dilma, por exemplo, ainda é do PMDB. Ciro Gomes nunca teria manifestado ao presidente Lula o interesse em ser vice, embora se veja como legítimo ele vir a pleitear o posto. Lula fará uma reunião com grupo do PMDB, liderado por Michel Temer, tão logo volte das férias, e a promessa é tratar deste assunto.

Os argumentos de Ciro apresentados ao governo para seguir candidato a presidente são de que esta é a melhor opção porque acha José Serra um candidato muito forte, favorito, e uma eleição plebiscitária só o beneficiaria, podendo levá-lo até a vencer no primeiro turno. Para Ciro, sua candidatura dividiria o eleitorado de Serra, forçando um segundo turno de qualquer maneira, o que criaria uma segunda chance para Dilma ou para ele próprio se conseguir ultrapassar a ministra.

O presidente Lula, e todos os analistas políticos próximos a Dilma, discordam desta avaliação.

Mas acham que só dentro de três a quatro meses isto ficará mais claro para Ciro. Acham que, em três ou quatro meses, se Serra estiver crescendo e Dilma estacionada nas pesquisas, fica reforçada a posição de Ciro. Mas se, ao contrário, Dilma estiver crescendo, Serra e Ciro estacionados na preferência do eleitorado e começar a se evidenciar que a candidatura Dilma tem fôlego, Ciro verá que o grupo do Planalto é quem tem razão, preveem consultores da campanha. E poderá mudar suas opções. É isto que os mais próximos à candidatura da ministra acreditam que vai ocorrer.

Em que caso se poderá considerar a candidatura da ministra reforçada, para efeito destas avaliações? Segundo analistas próximos a ela, a candidatura Dilma se reforçará em março se ela estiver beirando os 25% da preferência do eleitorado, José Serra estiver com 30%, ou pouco mais, e o Ciro não conseguir sair dos 12 ou 13%. Se Ciro crescer na preferência do eleitorado e Serra também, a tese do deputado cearense ganha força, a de que sua candidatura impulsiona o segundo turno.

Quanto ao vice de Dilma, posto reservado ao PMDB, é algo que só vai se definir, assim como o vice de José Serra, por volta de junho, mais perto das convenções. Nas análises do Planalto, a Vice da candidatura do governo é do PMDB, embora todos considerem justo Ciro pleitear o posto, se realmente vier a fazê-lo como condição para abandonar a candidatura a presidente. "Ciro de vice não é a hipótese principal, tem-se trabalhado numa aliança com o PMDB e o PMDB quer ter o vice", explica um interlocutor político da ministra.

O que está implícito na opção até agora firme pelo PMDB é, principalmente, a governabilidade. "Não é só ganhar a eleição, não é só o tempo de televisão para propaganda, é governar no dia seguinte", assinala o mesmo analista. E o PMDB seria o partido que ajuda a governar, embora o governo continue a contar com PSB, PCdoB e PDT no seu grupo.

A articulação das alianças está ligada ao day after das eleições em que o resultado a ser considerado inclui as eleições parlamentares e também as de governador, ambas igualmente definidoras da correlação de forças entre os partidos. O PMDB pode até não ser o maior partido no dia seguinte às eleições, mas é hoje, e é com este dado que a candidatura tem que ser armada, raciocinam os estrategistas.

Quanto aos adversários definidos como tais, o Planalto tem também suas avaliações. Já esperava, como todos que trabalham diretamente a política partidária, que Aécio Neves desistisse por ora da candidatura a presidente e se voltasse para a campanha de Minas. Mas os analistas do presidente Lula não estão admitindo que Aécio opte pela Vice de Serra.

Acreditam que ele nada tem a ganhar com isto: "Se o Serra for eleito, Aécio, na chapa, será no máximo o vice de Serra; se Serra perder e ele for o vice, perde junto e fica sem nada; se o Serra for eleito e ele estiver no Senado, será o comandante do Senado, muito mais influente e com mais poder do que se fosse o vice; se o Serra perder e ele estiver no Senado, vai ser o chefe da oposição, com novo discurso".

Na verdade, embora exponha a argumentação de forma direta e clara, os pensadores do Planalto apenas desejam que as coisas aconteçam desta forma, pois trata-se de cenário mais favorável à candidatura governista. Inclusive as conjecturas sobre Aécio como chefe da oposição contemplam traços que favorecem o governo: "Ele terá um discurso novo, contra o confronto, de pacificação do país, de união, um chefe de oposição que vai fazer oposição como elas são na maioria dos países civilizados. Ele vai virar o chefe da oposição do pós-Lula", é claramente o desejo.

Rosângela Bittar é chefe da Redação, em Brasília. Escreve às quartas-feiras

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