sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

Respeito à Carta - Editorial

DEU EM O GLOBO

É legítima a intenção do governo Lula de dar uma guinada à esquerda, seja devido a razões eleitorais ou a qualquer outra. Trata-se de caminho equivocado, anacrônico, querer ressuscitar a Telebrás, bem como tentar refazer o monopólio da Petrobras a partir da exploração do pré-sal, empreitada de muitas dezenas de bilhões de dólares, de grande risco financeiro para uma empresa apenas, mesmo uma das grandes companhias de petróleo multinacionais. Porém, o governo está no seu direito de propor o que quiser à nação, por meio dos canais institucionais. Não pode é atropelar o estado de direito.

Mas é o que Lula faz quando antecipa na marra a campanha eleitoral, numa afronta à Justiça eleitoral, inerte, de forma preocupante, diante da evidente ilegalidade — a ponto de o presidente do STF, ministro Gilmar Mendes, alertar para a omissão.

Outra ação inaceitável é atropelar o Tribunal de Contas da União (TCU) e o Congresso ao manter no Orçamento obras embargadas sob suspeita de irregularidades. Em vez de eliminar os erros, o Planalto prefere testar os limites da lei e das instituições. Não faz bem à democracia brasileira.

A rixa em torno dessas obras, a maioria da Petrobras, se arrasta há meses. Num movimento também de inspiração autoritária, o Executivo encomendou projeto de lei para limitar a fiscalização do tribunal apenas a obras concluídas. Diante de tamanho absurdo, até o controladorgeral da União, ministro Jorge Hage, criticou, de público, a ideia.

A mesma ousadia é encontrada no tal “programa de defesa dos direitos humanos”, na sua terceira versão — ele vem da Era FH —, usado como Cavalo de Troia para abrigar investidas contra a liberdade de expressão e a propriedade privada, direitos garantidos pela Constituição.

É esfarrapado o argumento oficial de que se as obras forem de fato paralisadas, como aconselhou o tribunal e acatou o Congresso, 25 mil trabalhadores ficarão desempregados.

Ora, não é porque o crime organizado é empregador que deixa de ser reprimido. Nada justifica a ilegalidade.

Preocupa o fato de um certo cesarismo contaminar a atuação do governo à medida que se aproximam as eleições. Brasília ganha aos poucos ares de Caracas, e o Planalto, semelhanças com o Miraflores.

Grave engano imaginar que o Brasil será um dia a Venezuela chavista.

O presidente não pode interpretar os índices recordes de popularidade obtidos em pesquisas de opinião como carta-branca para ultrapassar fronteiras delimitadas pela Constituição

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