domingo, 22 de novembro de 2009

Merval Pereira:: Sem terceira via

DEU EM O GLOBO

Ao procurar entender o que aconteceu nas eleições de 2006, trabalho coordenado pelo cientista político Cesar Romero Jacob, da PUC do Rio, publicado na edição de novembro da revista “Alceu”, pode ser útil aos debates sobre as próximas eleições presidenciais. Várias questões são levantadas ao se analisar as últimas eleições, mas as duas centrais no debate político atual são:

As eleições de 2010 serão polarizadas, como em 2006, ou desta vez terão um caráter plebiscitário? Haveria chance para uma terceira via? Começando pela possibilidade de haver uma terceira via que se contraponha à polarização entre PT-PSDB, o trabalho da equipe da PUC do Rio mostra que, até agora ela, não mostrou a sua viabilidade, pois não se observa nada em comum, do ponto de vista eleitoral ou geográfico, entre os terceiros colocados nas eleições anteriores: Brizola (1989), Enéas (1994), Ciro (1998), Garotinho (2002) e Heloísa Helena (2006).

A candidata do Partido Verde (PV), senadora Marina Silva, poderia vir a ser uma terceira via, na análise de Romero Jacob, se fosse adotada pelos evangélicos pentecostais, sendo ela evangélica.

Nesse caso poderia crescer na periferia, um dos três vetores das “estruturas de poder” identificadas no trabalho: as oligarquias nos grotões, os pastores pentecostais e os políticos populistas na periferia e a classe média urbana escolarizada.

Mas, ressalva Romero Jacob, ela nunca fez política usando a religião. “Não acredito na chance de ela vir a ter um desempenho expressivo a ponto de se impor por causa do discurso ambientalista”, diz ele.

Em contrapartida, a senadora Marina Silva teria muita dificuldade de ter voto no interior do país, onde os ruralistas têm muita força. Na classe média urbana, Marina pode tanto tirar voto do governador José Serra quanto de Lula, por razões diferentes, analisa Romero Jacob.

“O discurso dela será no sentido de que tanto PT quanto PSDB são faces da mesma moeda, a social-democracia produtivista, que não está preocupada com o meio-ambiente”.

Não é à toa, portanto, que tanto o governo federal quanto o governador de São Paulo estão se interessando pelo assunto.

Ela pode pegar os eleitores que em 2006 não votaram no Lula no primeiro turno, ou então aquelas petistas que acreditavam que o Lula faria um governo socialista, e não social-democrata.

Romero Jacob lembra que as oligarquias estão presentes em tudo. “Se o Lula tem o Sarney, o Renan Calheiros e o Collor, e o Serra tem o Quércia, o PV tem o Zequinha Sarney”.

Isso demonstraria que, do ponto de vista da estratégia política, não há mais diferença para se chegar ao poder.

Romero Jacob adverte que “nunca tivemos uma experiência de transferência de votos para presidente da República”, o que ressalta o fato de que, além dos apoios nesses setores da sociedade que definem o voto, o candidato tem que ter carisma, história política, e conseguir unir os partidos em torno de si.

Ao mesmo tempo, não há mais espaço, na opinião de Jacob, para o surgimento de uma candidatura individual como a do Collor. Segundo ele, Collor e Lula só se destacaram em 1989 por que a eleição não era casada.

“A máquina do PMDB não trabalhou para o Ulysses Guimarães e a do PFL não trabalhou para o Aureliano Chaves. Em condições normais, a máquina desses dois partidos iria trabalhar”.

Em 2006, Lula cai no Sul, o que significa, para Romero Jacob, que ele perde também em função do bolso, assim como cresceu no Norte e Nordeste por causa do Bolsa-Família: “Não é à toa que o câmbio está na ordem do dia, e esse é um fenômeno que está se repetindo agora”, analisa, se referindo aos exportadores que estão sendo afetados pela desvalorização do dólar.

Lula perde votação no Sul/ Centro-Oeste e sobe muito no Norte-Nordeste; Geraldo Alckmin é o contrário. Quando se comparam os mapas eleitorais dos dois, é o inverso. Alckmim perde três milhões de votos no segundo turno em 2006, e o mapa dos votos mostra que ele cai em Minas Gerais em todas as regiões, e em São Paulo só cresce na capital.

“Ele foi cristianizado pelo seu partido”, comenta Romero Jacob.

Em 2002, Garotinho, com um discurso mais à esquerda do Lula, que àquela altura era um moderado, poderia tomar o seu eleitorado, mas na verdade roubou o eleitorado do Serra.

Fernando Henrique havia tido 53% em 1998, e Serra cai para 23%. Lula sobe de 32% para 46%, crescendo enormemente no Tocantins, por exemplo. Aí já são as oligarquias trabalhando para ele, analisa Romero Jacob.

E cresce também Garotinho, cujo percentual de votação se aproxima muito do tamanho dos evangélicos no Brasil. Um estudo sobre as religiões feito pelo grupo de Romero Jacob na PUC do Rio mostra claramente que no entorno das capitais, nos cinturões de miséria, os pastores evangélicos pentecostais têm uma força muito grande.

Romero Jacob ressalta que o mapa eleitoral do Garotinho “é muito parecido com o mapa dos evangélicos pentecostais e com o mapa das repetidoras da Rede Record de televisão”.

Quanto à polarização, todas as eleições são polarizadas desde 1994, entre PT e PSDB, e, para Jacob, esta não será diferente, embora não acredite que venha a ser plebiscitária.

Existe uma questão anterior: essa polarização PT-PSDB advém do fato de que, tendo São Paulo aproximadamente 1/3 do PIB e 1/4 do eleitorado, é fundamental ter voto no estado.

Porém, São Paulo é condição necessária, mas não suficiente, adverte. Por isso, é preciso fazer alianças. Estão em jogo muitos cargos, e é aí que entra em campo a máquina num interior que representa 46% do eleitorado.

E o tempo de propaganda eleitoral no rádio e TV.

Para o cientista político da PUC Cesar Romero Jacob, só depois de junho, quando todos os acordos forem feitos e as máquinas estiverem azeitadas para entrar em funcionamento, é que vamos ver o cacife de cada um.

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