quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Depois da festa, pré-sal abre guerra de partidos e estados

Cristiane Jungblut, Gerson Camarotti e Vivian Oswald
Brasília
DEU EM O GLOBO

Um dia após o lançamento das regras do pré-sal, governadores e partidos, aliados e da oposição, deflagraram uma guerra política. Em protesto contra o regime de urgência dos projetos enviados pelo Executivo, o DEM, PPS e o PSDB obstruíram votações em plenário. Na base governista, PT e PMDB se digladiaram pelas relatorias dos projetos. Novamente, o PMDB levou a melhor e indicou o relator que cuidará do regime de partilha e da divisão da renda do pré-sal. O governador Eduardo Campos (PE) disse que o atual modelo de distribuição, que beneficia RJ, ES e SP, é "da Idade da Pedra" e quer convocar colegas do Nordeste para fechar uma proposta. Sérgio Cabral prometeu mobilizar parlamentares do Rio. Em Vitória, o presidente Lula disse que o governo é uma mãe que precisa "aumentar o cobertor ou colocar todo mundo mais juntinho". Apesar de bancos recomendarem ações da Petrobras, os papéis caíram.

Pré-sal abre guerra no Congresso

Oposição obstrui votação para forçar retirada de pedido de urgência para projeto de lei

O dia seguinte do lançamento do marco regulatório da exploração da camada do présal foi marcado pela eclosão de uma guerra no Congresso Nacional, com batalhas travadas em público e nos bastidores. Ontem, a oposição resolveu abrir fogo aos quatro projetos de lei enviados pelo governo com as novas regras, com DEM, PSDB e PPS obstruindo votações no plenário e nas comissões da Câmara para pressionar pela retirada do pedido de urgência constitucional dos textos. Na base aliada, houve disputa entre PT e PMDB — com este último levando a relatoria do projeto mais importante, que institui o regime de partilha da produção e trata da divisão da renda do pré-sal.

A tramitação em regime de urgência também não agrada aos governadores do PMDB Sérgio Cabral (RJ) e Paulo Hartung (ES). À frente do terceiro estado produtor, São Paulo, coube ao tucano José Serra pedir que o PSDB endossasse a obstrução, encaminhada primeiramente pelo DEM.

Em discurso no plenário do Senado, o presidente nacional do PSDB, senador Sérgio Guerra, chamou de irresponsável a tentativa de aprovar os projetos em apenas 45 dias em cada Casa: — Um governo responsável, que olhasse para o país, e um presidente que tivesse a responsabilidade devida para o uso de seu mandato chamariam o país para opinar sobre essa matéria.

Em vez disso, um pequeno grupo se reúne por dois meses de portas fechadas.

As decisões são comunicadas na hora e de forma contraditória porque há divisão dentro do governo.

Deputado critica uso eleitoral da proposta

Guerra também criticou a tentativa de o governo fazer uso eleitoral do pré-sal.

— Lula inventa espantalhos e os espanca, antecipando a estratégia eleitoral de sua fraca candidata (a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff), que ele mesmo está enfiando pela goela de seu partido e de seus aliados.

O senador Alvaro Dias (PSDB-PR) chamou o regime de urgência de iniciativa “precipitada, desordenada e desorganizada”: — (O governo) armou o palanque e anunciou o milagre, passando a ideia de que o povo vai se beneficiar com tudo imediatamente. E agora quer empurrar (os projetos) goela abaixo como se o Congresso fosse um carimbador, um homologador.

Para o líder do PPS, Fernando Coruja (SC), há interesses eleitoreiros.

— A urgência constitucional é uma agressão ao Congresso. Onde está a urgência? Vai ter reflexo só em 2022. E o governo quer se apropriar da comercialização do petróleo com a criação da nova empresa. Como não tem PAC, não tem Minha Casa, Minha Vida, arranja outro plano para alavancar a (candidatura) da ministra Dilma Rousseff — complementou o líder do DEM, deputado Ronaldo Caiado (GO).

Por causa da obstrução, não houve votação na Câmara. O presidente da Casa, Michel Temer (PMDB-SP), pediu que os partidos desistissem da obstrução enquanto eles consultavam os líderes da base aliada sobre a possibilidade de não haver urgência.

Mas o pedido foi em vão. O líder do PT na Câmara, deputado Cândido Vaccarezza (SP), minimizou: — A obstrução é direito da minoria e não é a primeira vez que eles obstruem.

Mas a urgência está mantida.

O clima de enfrentamento dominou também as relações dentro da base aliada. Com medo da alteração dos artigos que tratam da origem e da distribuição da renda do petróleo (42, 45 e 49), o PMDB decidiu fincar o pé para relatar o projeto da partilha da produção. Depois de comunicar pessoalmente a Dilma de que o partido ficaria com essa relatoria, o líder do PMDB, deputado Henrique Eduardo Alves (RN), acertou sua indicação para o cargo de relator com Temer.

Aliados brigam por cargo de relator

Nos bastidores, houve embate entre PT e PMDB. Vaccarezza pediu para Alves ceder a vaga ao deputado Antonio Palocci (PT-SP). Mas a proposta foi rejeitada pelo peemedebista, após pressão de Cabral e Hartung para assumir a relatoria.

A Henrique Alves caberá fazer a sintonia fina entre os desejos dos governadores fluminense e capixaba, das demais unidades da federação e da União. Esta não quer que sua renda na produção seja drasticamente reduzida.

Cabral e Hartung querem garantir o máximo do privilégio atual, e os demais querem ampliar sua fatia na riqueza do petróleo.

— Antecipei para a ministra Dilma que a relatoria seria do PMDB. Imagino que ela vai ficar feliz. Não há motivos para que se tenha dúvida do nosso compromisso. Fiquei com a relatoria para evitar uma disputa entre parlamentares de estados produtores contra os demais. Sei que vou receber pressão de todos os lados — disse Henrique Alves.

Perdida a batalha, Vaccarezza contemporizou: — Para nós, o mais importante é que não haja desfiguração dos projetos.

A urgência constitucional é importante porque impede adendos de outros projetos às propostas e estabelece prioridades.

O PT ficará com a relatoria de dois projetos. A Arlindo Chinaglia (SP) caberá o comando do projeto que institui o Fundo Social, e Palocci — que ainda não aceitou — ficaria com o texto da criação da Petro-Sal. O PMDB deverá ceder a quarta relatoria, do projeto de cessão de barris de petróleo à Petrobras e sua capitalização, para outro partido da base, provavelmente PP ou PR. Não está descartada a inversão desta distribuição, com Palocci assumindo a capitalização e o quarto nome da base, a Petro-Sal.

Atendendo a pedido do governo e da base aliada, a Câmara vai criar quatro comissões para discutir os projetos.

A estratégia é concentrar as relatorias para votar em tempo recorde e impedir alterações substantivas nos textos.

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