quarta-feira, 5 de agosto de 2009

Campanha eleitoral em outra galáxia

Rosângela Bittar
DEU NO VALOR ECONÔMICO


Há uma relevância insuspeita nas conclusões que nos oferecem os dados da pesquisa de intenção de voto encomendada e paga pelo Partido Verde ao Ipespe/MCI, organizações de apuração e análise de informações do cientista político e sociólogo Antonio Lavareda. O PV queria fazer um primeiro teste com o nome da ex-ministra do Meio Ambiente, senadora Marina Silva, na sucessão presidencial. Vinha, há muito, em conversas de aproximação e sondagens, primeiro, com ela própria, depois com um pequeno staff a quem consulta. Muito mais do que foi revelado até agora existe neste levantamento.

Por exemplo, segundo informações divulgadas pelo PV ao jornalista Mauro Zanatta, na edição de ontem do Valor, a depender do cenário, Marina Silva teria de 10 a 14% das intenções de voto. Na hipótese mais alta, em primeiro lugar está José Serra, em segundo Ciro Gomes e em terceiro, empatadas, Dilma Rousseff e Marina Silva, com 14%. Um empate, por sinal, omitido até agora. Já seria demais, levando-se em conta que é uma senadora do Acre, com vida política enraizada naquela lonjura, e uma passagem pelo ministério do governo Lula de onde saiu, digamos, desautorizada em suas ideias, intenções, desejos e projetos, mas apoiada pela opinião pública. Portanto, um contrassenso tendo em vista o fenômeno de popularidade que é o Presidente da República, que a demitiu, e o governo do PT, seu partido.

Nesta pesquisa do PV há, porém, muito mais que isto. Em um cenário com apenas três candidatos, também não revelado até agora, a senadora Marina Silva passa Dilma Rousseff. Serra fica com 37%, Marina com 24% e Dilma com 16%.

E não adianta aos apressados em desmontar o retrato do momento comparar estes índices com outros que surgirem por aí, caso entidades desandem agora a fazer levantamentos sucessivos para incluir o novo nome da agenda eleitoral, como é de praxe. O cotejo só faz sentido se a pergunta apresentada ao eleitor for exatamente a mesma. No caso do PV, foi solicitada uma opção entre "o governador de São Paulo, José Serra, a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, e a senadora e ex-ministra do Meio Ambiente, Marina Silva". Todos muito bem identificados.

Uma correção a respeito da pesquisa do PV: ela é apenas quantitativa. Os eleitores não fazem considerações a respeito das razões de seu voto, nem avaliam qualitativamente os candidatos apresentados. Assim, comentários como os que atribuem a Dilma Rousseff uma imagem "desenvolvimentista atrasada", e identificam Serra como "defensor da indústria paulista", são avaliações políticas, discutidas no partido durante a prospecção da candidatura de Marina Silva, e não resultado de pesquisa qualitativa.

Em 24 horas com a pesquisa do PV circulando já se ouviu juízos de todo tipo, da conjetura pobre de sempre, de que esta pesquisa não tem valor pois é coisa do Serra para desestabilizar a candidatura Dilma, às avaliações mais sérias. Uma, que Marina não deixaria 30 anos de PT por uma aventura de campanha presidencial pelo PV. Mais, o presidente Lula não deixaria que ela saísse do partido e, para isto, mensageiros doces seriam enviados na frente, depois os amargos para a pressão antipática, e por fim iria ele próprio fazer o apelo ao coração. Lula poderia, também, pedir que ela fique no PT até uma avaliação mais à frente da candidatura Dilma, podendo a senadora se transformar, caso Dilma não reaja, na nova candidata in pectore.

Algumas suposições negativas podem se concretizar, embora os sinais, hoje, são de que Marina Silva está muito mais sensível ao convite do PV do que já esteve ao longo desses meses de conversações. Porém, seja qual for o desfecho, e não importa mesmo, neste momento, o mundo das concretudes, o sopro trazido pela pesquisa do Partido Verde remete o mundo político a pelo menos três convicções.

As eleições de 2010 não estão definidas nem para a largada. A sucessão é uma obra aberta, sujeita a chuvas, trovoadas e novidades no elenco de candidatos. Esta, a primeira certeza.

Número dois: neste eleitorado de Marina Silva estão, sim, votos de opinião que abandonaram, decepcionados, as urnas do PT e do PSDB. Mas entre eles encontram-se, sobretudo, eleitores fiéis do presidente Lula. As pesquisas mostram que o prestígio do presidente é excepcionalmente elevado e não se abala significativamente em nenhuma circunstância. Mas o aprofundamento das análises técnicas destes levantamentos revela indícios de que esses eleitores que admiram Lula, até demais, ainda não enxergaram uma simetria convincente entre ele e sua candidata Dilma Rousseff. Boa parte desta alta intenção de voto em Marina Silva, muito provavelmente, segundo as análises políticas do partido, é de pessoas encantadas com o presidente Lula que ainda não foram conquistadas por Dilma. E a história pessoal de Marina guarda, para o eleitorado, similitudes com a história de Lula.

Está aí, identificado, o espaço de crescimento para a candidatura Marina.

Uma terceira certeza é que, com Marina, a campanha eleitoral jamais deixará de tratar dos altos temas, os programas, o projeto de país. É só disso que ela fala e isto é o que pensa e faz. É inadmissível uma campanha presidencial em 2010 sem um extenso e profundo debate sobre a economia sustentável, por exemplo. Principalmente a partir da crise mundial, a discussão tem que dirigir seu foco para a sustentabilidade não só econômica como de todas as políticas públicas: educação, transportes, agricultura, habitação, petróleo. Ah, o petróleo...Apontam os analistas técnicos do partido que a emissão de carbono do pré-sal é altíssima, um combustível fóssil cuja substituição seria proposta em qualquer campanha eleitoral. No governo do PT, a preocupação com o desenvolvimento sustentável foi zero. Numa campanha de Marina Silva a presidente, o programa é o que importa, e a preocupação com o desenvolvimento sustentável será dez.

Rosângela Bittar é chefe da Redação, em Brasília. Escreve às quartas-feiras

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