segunda-feira, 6 de julho de 2009

ENTREVISTA/Itamar Franco, ex-presidente

Ricardo Miranda
repórter
DEU NA TRIBUNA DE MINAS/ JUIZ DE FORA(ontem)

'Minas não pode continuar só cochichando'

Aos menos desavisados, que estão se acostumando com o silêncio político mineiro, vale o aviso: o ex-presidente Itamar Franco está voltando à vida pública e disposto a fazer ecoar a voz das Alterosas. "A voz de Minas precisa ser mais ouvida no país. Minas não pode continuar só cochichando." Para isso, ele irá se filiar ao PPS, o que acontece amanhã em Belo Horizonte. "Se o PPS me permitir ingresso, será meu retorno político. No PPS vamos poder falar de certas coisas que acontecem no país." Nesta entrevista à Tribuna, concedida na última sexta-feira, Itamar antecipa algumas dessas "coisas" das quais pretende falar a partir de agora. A mais cara delas, até pela circunstância temporal, já que se comemora 15 anos do seu lançamento, envolve o Plano Real. "Tem um grupo paulista que teima em dizer que o Plano Real é dele. Tecnicamente havia várias ministros envolvidos e cada um teve sua importância. Mas quem assina politicamente é o presidente da República." Ele também fala da crise do Senado, da indisposição dos políticos com as reformas e da disputa presidencial de 2010. Nesse caso, volta a insistir na necessidade de um nome mineiro (Aécio Neves), mas adverte: "Se Aécio depender da cúpula (do PSDB) não será candidato."

Tribuna - O sr. ingressa no PPS antes de se fechar a janela eleitoral do próximo ano. Há nisso sinalização de candidatura?

Itamar Franco - Estamos entrando no partido num processo político, mas não eleitoral. Se o PPS me permitir ingresso, será meu retorno político. Estamos voltando ao processo político e toda volta é muito dolorosa. No PPS vamos poder falar a respeito de certas coisas que acontecem no país.

- O sr. chegou a dizer que sua filiação estava à mercê apenas de saber o que pensa o PPS nacional...

- Conversei com o Roberto Freire (presidente nacional do PPS), que foi meu líder na Câmara, e ele disse que me recebe com muita alegria. Mas antecipei que teríamos um problema e ele me perguntou qual seria. Disse que queria saber como o PPS vai se comportar nessa briga do Plano Real. Perguntei: como vou ficar? O Freire assegurou que teria liberdade para expressar meu pensamento. Respondi que expresso meu pensamento, mas queria saber o que o PPS iria expressar. Ele disse, então, que na segunda-feira (amanhã) a gente conversaria.

- Mas em relação à disputa interna tucana, o PPS já havia sinalizado apoio a José Serra (governador de São Paulo).

- O PPS não pode tomar posição sem saber quem é o candidato, isso ficou bem claro. Mas o PPS de Minas dá apoio ao governador Aécio.

- No PPS, o sr. pode vir a ser candidato a presidente novamente?

- O PPS mineiro tem Aécio como candidato. Mas, se tivesse um candidato à Presidência, seria o (Roberto) Freire.

- Já é possível vislumbrar qual será o cenário sucessório de 2010?

- Quando as regras eleitorais forem definidas, aí teremos alguma definição. Hoje temos muitas incógnitas para poucas equações. Os cenários mineiro e nacional estão indefinidos por conta das regras, não apenas por conta dos candidatos. A verticalização, por exemplo, é um complicador grande. Ela não vigora mais. O PT, nacionalmente, tem apoio do PMDB - digamos que sim -, mas como vai ficar o PMDB em Minas ninguém sabe. Como vai ficar a candidata ou o candidato a presidente do PT aqui em Minas?

- O governador Aécio refere-se ao sr. como amigo e conselheiro político. O que o sr. tem dito a ele sobre 2010?

- Quando posso, porque conselho só se dá a quem pede, tenho dito ao Aécio que Minas precisa levantar sua voz. Tornar nossa voz mais clara no país. Minas não pode continuar só cochichando. Mineiro não só cochicha. Mineiro quando fala é ouvido. Quem pode levar essa voz é o Aécio.

- Mas ele vai conseguir viabilizar a candidatura a presidente no PSDB?

- Vou ousar a falar do PSDB, mas posso ser desautorizado (risos). Acho que o caminho das prévias está correto. Se ele depender da cúpula (do PSDB) não será candidato.

- Mas, mesmo nas prévias, é uma disputa complicada...

- Considerando as diferenças dos tempos, quando o presidente Juscelino Kubitschek foi candidato falaram que ele não tinha apoio de São Paulo. Internamente no seu partido, tinha muito mais dificuldade que o Aécio tem hoje no PSDB. Veio a eleição e, em São Paulo, Juarez da Távora teve 800 mil votos, Ademar de Barros teve um milhão e o Juscelino teve apenas 200 mil. Mas foi ele (Juscelino) quem ganhou a eleição. Mas, claro, que tudo vai depender do eleitor de hoje.

- Independente do candidato, o PSDB quer usar a bandeira do Real. Como o sr. avalia essa estratégia?

- Tem um grupo paulista que teima em dizer que o Real é dele. Tecnicamente havia vários ministros envolvidos e cada um teve sua importância. Era uma equipe técnica. Mas quem assina politicamente é o presidente da República. Se ele não quiser assinar, não tem plano. É isso que esse grupo não quer entender e fala que o Plano Real é do PSDB. Os ministros Eliseu Resende, Paulo Haddad, Gustavo Krause não eram do PSDB. O único do PSDB era o Fernando Henrique Cardoso, e parece que o plano é do PSDB.

- Em recente artigo no jornal "Folha de São Paulo", o presidente do PSDB, senador Sérgio Guerra, cobra ações do Governo Lula sobre medidas de aperfeiçoamento do Real. Essas medidas eram previstas?

- Sabíamos que, já em 1995, eram para ser implantadas as reformas fiscal e tributária. E o que eles implantaram? Naquela época não era Governo do presidente Lula. Era do PSDB. Mas vou aproveitar para lembrar que o presidente Lula e o PT foram contra o Plano Real todo o tempo.

- Avaliando hoje, 15 anos depois, o que faltou ao Plano Real?

- Não é um plano estático, precisa das reformas (fiscal e tributária). E também havia a necessidade de um pacto republicano. A União tem concentração grande e os municípios menores dependem muito do Fundo de Participação dos Municípios (FPM). Quando se reduz o IPI e o Imposto de Renda, há impacto no FPM. Então é preciso pensar numa equação adequada quando vai se fazer um concessão de benefício fiscal, que não sou contra, mas precisa ser pensado. Da forma como é hoje, os municípios ficam à mercê de benesses da União.

- No livro "Era outra história", da Denise Paiva, que foi sua assessora na Presidência, há uma ligação entre o Plano Real e programas sociais como o Bolsa Família....

- Na nossa época, a pedido do senador Pedro Simon, eu recebi o Luiz Inácio Lula da Silva e o Betinho (Hebert de Sousa). Foram falar de um tal plano que o PT tinha. Em função do plano, criamos o Conselho de Segurança Alimentar. Convidei o Betinho para assumir o órgão, mas ele não aceitou. Convidamos o bispo (Mauro) Morelli. Acredito que esse conselho tenha sido o núcleo de todas as obras sociais que vêm até hoje.

- O sr. mencionou o senador Pedro Simon. Ele seria um bom nome para assumir a Presidência do Senado e resgatar a imagem da Casa?

- É um excelente nome para representar o Senado. Um político com seriedade, honradez, decência e amor à pátria. Posso falar do PMDB, porque foi um de seus fundadores. Insisto que seria um excelente nome. Não quero interferir naquilo que não me compete, pois não sou senador, mas seria um grande nome.

- Para o sr, que foi senador por 16 anos, o que é mais preocupante na atual crise do Senado?

- Vejo isso com muita tristeza. O que mais dá desconforto é que o Legislativo não resolve seus problemas e vai recorrer ao Executivo para resolvê-los. Isso na história política brasileira é um fato a se lamentar. É grave a interferência do Executivo.

- Mas a interferência, nesse caso, se deu porque o Legislativo recorreu ao Planalto.

- Veja o caso da CPI da Petrobras. É grave a interferência do Governo na CPI. Tudo bem que a oposição tem que mostrar porque quer a CPI, mas o Governo não pode agir para que ela não aconteça. A Petrobras interessa a toda sociedade. Em 1975, quando cheguei ao Senado, havia uma coisa importante: o acordo nuclear. O presidente Geisel havia tentado conseguir uma cooperação com os Estados Unidos para desenvolver energia nuclear. Eles negaram a transferência de tecnologia. O presidente Ernesto Geisel foi à Alemanha buscar esta tecnologia. Paulo Brossard era o líder da bancada do MDB no Senado. Elegemos a maioria da Casa, com 16 senadores, mas depois criaram o senador biônico. Mas, voltando ao acordo nuclear, o Brossard pediu para se criar uma CPI para apurar este acordo. A CPI foi formada com 11 senadores, três da oposição e oito da situação. Fui presidente da comissão e ninguém tentou bloquear a CPI. E olha que estávamos na ditadura militar. Hoje, temos um regime democrático, mas querem barrar a CPI da Petrobras.

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