quinta-feira, 2 de julho de 2009

Em busca de um nome

Merval Pereira
DEU EM O GLOBO


Nunca foi tão verdadeiro o axioma da política brasileira pós-democratização de que não é possível governar sem o apoio do PMDB, embora o partido não tenha capacidade de eleger o presidente. Um outro PMDB, o de Ulysses Guimarães e Tancredo Neves, chegou ao poder através de uma eleição indireta, mas acabou entregando o governo a um recémchegado, o senador José Sarney, que rompeu com o PDS do qual era presidente para liderar a Frente Liberal, uma dissidência fundamental para levar Tancredo à Presidência. Pela legislação da época, o vice tinha que ser do mesmo partido do candidato a presidente, e Sarney filiou-se ao PMDB, de onde nunca mais saiu e onde fincou raízes como um de seus principais líderes, se não o principal.

Hoje, a relação de dependência do presidente Lula com o PMDB do senador José Sarney cada vez mais se parece com a que o então presidente Sarney teve com o PMDB de Ulysses Guimarães.

Naquela ocasião, Ulysses Guimarães, que presidia a Câmara e poderia ter ficado no lugar de Tancredo, aceitou a interpretação do que chamou de “jurista do Sarney”, o ministro do Exército, general Leônidas Pires Gonçalves, e deixou que o maranhense assumisse provisoriamente a Presidência na ausência de Tancredo, situação que se tornou definitiva com a morte dele. Mas Ulysses manteve seu poder de veto no governo.

Diante da crise em que se vê envolvido, Sarney aguarda a chegada do presidente Lula da África para bater o martelo com ele sobre a melhor saída para preservar essa aliança política que tem um objetivo maior, o de garantir o apoio do PMDB à candidatura de Dilma Rousseff em 2010.

Parece praticamente impossível que a simples presença de Lula em Brasília debele a crise política que só fez crescer nos últimos dias, embora a simples proximidade já tenha feito o PT mudar de tom.

Pela manhã, uma comissão do PT comunicou a Sarney que a maioria da bancada do partido no Senado gostaria que ele se afastasse da presidência para que uma comissão suprapartidária comandasse ampla reforma administrativa na Casa.

Lá da Líbia, o presidente Lula deu o recado: a saída de Sarney só beneficiaria o PSDB, que tem no senador Marconi Perillo o vice-presidente da Mesa Diretora do Senado.

Os petistas, receosos do contágio de Sarney na eleição de 2010 — a campanha “Fora, Sarney” já virou moda no Twitter —, mais receosos ficaram ainda da reação do presidente Lula e recuaram da proposta.

Aguardam a chegada do “nosso guia” para resolver a questão, que tem que ter uma solução que não magoe Sarney nem deixe o PMDB com disposição de trair, que é seu esporte favorito, com ou sem motivo.

A saída de Sarney parece inevitável, mesmo porque, se ele teimar em permanecer no cargo, tudo indica que o bombardeio continuará pesado. Até mesmo o DEM, simpatizante da candidatura Sarney, agora não apenas retirou o apoio como ameaça levar o caso ao Conselho de Ética do Senado se sua premissa de uma investigação isenta não for aceita.

A questão agora é como encontrar uma saída honrosa para Sarney, que leve a uma nova eleição, e garantir que o próximo presidente do Senado seja um aliado do governo, de preferência do PMDB ou com seu apoio irrestrito.

O PT, no afã de enviar para seu eleitorado um sinal de que não estava comprometido com a administração Sarney, esqueceu-se do “dia seguinte”, isto é, de que quem assumiria a presidência do Senado durante a licença dele seria o representante do PSDB, coisa que Lula não quer.

Especialmente por se tratar do ex-governador de Goiás Marconi Perillo, que lhe causou grandes problemas na época do mensalão, quando revelou que o havia alertado sobre a existência do esquema de compra de votos na Câmara.

Lula teria respondido que esse esquema era atribuído ao ex-ministro tucano Sérgio Motta.

Foi também no mensalão que se cristalizou a amizade entre Sarney e o presidente Lula, quando este estava pressionado pelos fatos, e pelos seus próprios correligionários, a fazer acordo para não ser impedido na Presidência.

Os então ministros Antonio Palocci e Márcio Thomaz Bastos chegaram a sugerir que ele se comprometesse a não se candidatar a reeleição para poder terminar seu mandato.

Lula recebeu a solidariedade irrestrita de Sarney, que era o presidente do Senado na ocasião e disse que renunciaria ao cargo junto com ele se fosse preciso.

O prestígio de Sarney ficou explícito quando conseguiu nomear o senador Edison Lobão para o Ministério das Minas e Energia num momento delicado da energia no país. E foi o de Lobão o primeiro nome a ser pensado pelos correligionários do governo para ser lançado como candidato do PMDB à sucessão de Sarney no Senado, hipótese improvável já que seria como mantê-lo no lugar.

A questão agora parece ser encontrar um nome que possa resistir à ofensiva da oposição, aglutinar a base aliada e manter a aliança PT-PMDB intacta.

O DEM, que fez um acordo heterodoxo com o PT para eleger Sarney, já está descomprometido com sua presença na presidência do Senado e articula uma candidatura alternativa.

Qualquer dos lados, na definição do líder do DEM, senador Agripino Maia, terá que escolher um nome que seja “muito parecido com Jesus Cristo”, e, se for mulher, com “Nossa Senhora”, porque, se não, será triturado pelas denúncias. E está difícil achar esse exemplar entre os 81 senadores de Brasília.

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