sexta-feira, 15 de maio de 2009

Risco político adia mudança em fundos

Sérgio Gobetti, Brasília
DEM EM O ESTADO DE S. PAULO


Para Mantega, mudança na tributação só deve ocorrer como contrapartida da taxa Selic abaixo de 10%

O governo anunciou que pretendia reduzir o Imposto de Renda dos fundos de investimentos, mas está enfrentando dificuldades para concretizar a medida. A iniciativa faz parte do pacote preparado pela equipe econômica para garantir que os fundos de investimentos continuem competitivos em relação à caderneta de poupança. Na quarta-feira, o governo anunciou que pretende taxar o rendimento da caderneta de poupança com depósitos acima de R$ 50 mil, a partir de 2010.

O corte de impostos sobre os fundos de investimentos teria objetivo semelhante à taxação da poupança, mas o governo está hesitando em colocá-la em prática. O governo teme que a oposição transforme o corte de impostos em munição política, usando a iniciativa como desculpa para rejeitar a taxação da poupança. Nesse caso, a equipe econômica teria de prorrogar a redução da tributação dos fundos e demais aplicações além do prazo previsto - 31 de dezembro deste ano. Essa prorrogação agradaria à classe média, aos maiores investidores e aos bancos, mas provocaria perda de receita para o governo.

Nos bastidores, o Banco Central chegou a defender essa redução como permanente, mas o Ministério da Fazenda, preocupado com o jogo de xadrez que pode se estabelecer no Congresso, acha melhor adiar um pouco mais a decisão. Até porque - para os grandes investidores, que são os que mais mudam de aplicação - os fundos de renda fixa atrelados à Selic permanecem mais rentáveis do que a poupança (mesmo com imposto máximo de 22,5%) e continuarão a ser até quando a taxa básica de juros chegar a 9%, o que ainda não deve ocorrer na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom).

Ontem, em São Paulo, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, ressaltou que "não há pressa" para que enviar ao Congresso a proposta de tributação para poupanças com depósitos acima de R$ 50 mil. "A medida só entrará em vigor no próximo ano. Estamos tranquilos." E enfatizou que as reduções do IR para diversas aplicações financeiras só devem ocorrer como contrapartida da queda da taxa Selic para menos de 10%.

A taxa básica de juros está em 10,25% ao ano. A expectativa dos analistas é de que ela ficará abaixo desse nível após a reunião do Copom de junho. No mercado, a curva de juros futura já precifica um corte próximo a 0,75 ponto, o que reduziria a taxa a 9,5%. Mas pesquisa do BC revela que ela dificilmente atingiria em dezembro marca muito inferior a essa. A mediana das estimativas dos analistas indica a Selic em 9,25%.

Do ponto de vista técnico, a redução do IR das aplicações a 15% também tem efeito muito limitado para a maioria dos aplicadores, de menos de 0,5% ao ano, e sua operacionalização por um prazo temporário foi considerada complexa pelos bancos públicos envolvidos no debate. "A ideia parecia ótima a princípio, mas, quando começamos a discutir sua implementação, vimos que existem muitas questões operacionais para serem resolvidas", disse ao Estado uma fonte do governo.

O grande problema é que atualmente as aplicações são submetidas a uma tabela progressiva, cuja alíquota de IR vai caindo à medida que o cresce o tempo de permanência. Para quem resgata a aplicação em menos de seis meses, a alíquota é de 22,5% sobre o rendimento. Para quem só resgata após dois anos, baixa para 15%. Ou seja, o nível de tributação só é conhecido no momento do resgate.

Diante desse quadro, é preciso definir se a redução só vale para novas aplicações ou para as atuais também. Se valer para as atuais, seria preciso calcular um crédito proporcional aos meses em que a medida vai vigorar e só conceder esse crédito se a pessoa resgatar o valor antes de dois anos, já que depois disso todas as aplicações baixam para o nível de 15% de tributação. E, nesse caso, não existiria mais o benefício. Na prática, só se beneficiaria de uma redução temporária do IR quem estivesse fazendo nova aplicação agora e pensando em resgatar em menos de sete meses.

E toda essa engenharia tributária serviria, na melhor das hipóteses, para viabilizar uma redução de mais 0,5 ponto na Selic, o que pode ser suficiente para 2009, mas não para 2010 em diante. A nova regra de tributação da poupança também tem efeito limitado, mas um pouco maior, na medida em que o desconto do IR será tanto maior quanto menor a Selic.

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