terça-feira, 28 de abril de 2009

Existe limite até para a propaganda partidária

EDITORIAL
DEU NO VALOR ECONÔMICO


Mesmo na política, onde alguns acham que é eticamente defensável o uso de quaisquer recursos à mão na luta pelo poder, não se admite que sofismas, insinuações ou atos impensados sejam usados em temas delicados, que provoquem especulações capazes de afetar a vida de toda a população. Isto é: qualquer que seja o conceito de um grupo acerca da maleabilidade ética da política, o que já é discutível, o uso da máxima "os meios justificam os fins" devem cessar imediatamente quando a segurança dos brasileiros como um todo é colocada em risco.

Isso cabe como uma luva à propaganda do PPS em cadeia de rádio e televisão, veiculada. Lá pelas tantas o deputado Raul Jungmann (PE) diz que "o governo vai mexer na poupança como fez o governo Collor". Quando o presidente do PT, Ricardo Berzoini, ameaçou entrar com uma representação no TSE contra a propaganda política, argumentando que o partido de Jungmann "utiliza de forma indevida o horário partidário para espalhar o pânico", o PPS soltou uma nota oficial incluindo uma vírgula na afirmação em cadeia nacional: "Em nenhum momento o PPS afirma que Lula vai confiscar o dinheiro da poupança. Disse, sim, que vai mexer na poupança, como Collor também mexeu. Aliás, o ex-presidente é aliado do governo do PT, que tem no seu rol de satélites todos os partidos do mensalão".

Tudo que o país não precisa neste momento é de uma corrida aos bancos - mesmo sem crise, aliás, isso é uma temeridade para todo o sistema. E a mudança nas regras de poupança que vêm sendo estudadas pelo governo em função da queda da taxa de juros básica da economia está dando ensejo a especulações que são incabíveis.

Se o PPS tivesse acusado o governo de estudar a redução dos rendimentos do investimento que e que é o mais utilizado pelas camadas mais pobres da população e lhes dá maior segurança, e se tivesse discordado veementemente dessa medida, estaria no seu papel. Poderia ter argumentado, com alguma razão, que a fórmula da poupança propicia um rendimento que hoje empata apenas com os fundos de investimento que têm taxas absurdas de administração, e que caberia antes pressionar os bancos a reduzi-las. Todas essas críticas, porém, seriam circunstanciais. Com inflação e juros em queda, a remuneração atual da poupança impediria o declínio dos juros nos financiamentos habitacionais e serviria de piso para a taxa de juros do país, paralisando a política monetária. Seria de se esperar do PPS uma alternativa à política em estudo pelo governo, mas ele ou não vê necessidade disso - o que é um erro - ou não tem opção a oferecer.

Em 16 de março de 1990, Collor bloqueou 80% de todos os depósitos do overnight, das contas correntes e das contas de poupança sobre o que excedesse NCz$ 50 mil - ou Cr$ 50, de acordo com a nova moeda -, que foram congelados por 18 meses e restituídos depois desse prazo em 12 prestações mensais, corrigidas pela inflação mais seis por cento ao ano. Quando sofisma, o PPS não diz, mas induz. É um jogo maroto: da afirmação de que Lula vai mexer na poupança como Collor fez, supõe-se que o PPS está dizendo que, se Collor bloqueou a poupança, Lula também vai bloquear; da frase seguinte, conclui-se que o partido quer dizer que, se Collor apoia Lula, o governo petista fatalmente vai fazer o bloqueio da poupança, como fez seu aliado no passado.

Vai contra qualquer regra do bom senso induzir a esse tipo de pânico. Isso vale para o PPS. E vale também para o PT. Em 2004, o deputado Nazareno Fonteles (PT-PI) apresentou uma emenda instituindo uma "poupança fraterna" por sete anos. Segundo o projeto, nesse período cada brasileiro poderia gastar apenas o correspondente a dez vezes o PIB per capita mensal, e o excedente seria depositado numa poupança compulsória, que seria devolvida apenas 14 anos depois. É certo que o projeto não tem chance de ser aprovado, mas cada vez que se fala de alteração na poupança, ele é apontado como a prova cabal de que existe intenção de fazer um confisco. O PPS induz perigosamente a especulações sobre a poupança e talvez o PT, com a imprevidência do deputado Fonteles, mereça isso. O Brasil, todavia, não merece.

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